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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


AS AULAS CONTINUAM / Tatiana Amaral
AS AULAS CONTINUAM / Tatiana Amaral

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Como não reagir àquela garota? Como não amá-la? Como não desejar a sua inocência ousada? Seu fogo incansável, sua forma única de ser, tão apaixonante e irritante que fazia com que ela fosse ímpar.
“Quem tem mais culpa? O tentado ou o tentador?”

 

 

 


 

 

 


CAPÍTULO 1

CHARLOTTE

Andávamos pela mata. A garoa fina ainda descia naquele início de manhã. Alex cuidadosamente me conduzia com uma mão e com a outra, o seu cavalo. O chão encharcado chiava a cada passo, nos lembrando do temporal da noite anterior, assim como os galhos caídos pelo caminho. Um caos do lado de fora e muita tranquilidade do lado de dentro.

A fraca luminosidade me ajudava a enxergar melhor, já que meus óculos estavam em algum lugar daquela mata, perdidos para toda a eternidade. Ajudava não ter luz forte, mas, mesmo assim, era complicado distinguir com nitidez, e eu precisava apertar os olhos se quisesse identificar qualquer figura com mais de dois metros de distância.

Eu não conseguia tirar o largo sorriso do rosto e, aproveitando que “meu noivo” estava de costas, me deixei levar pelas lembranças. Alex era perfeito. Não. Perfeito é pouco para descrever um homem como ele. Alex era inacreditável! E foi tudo tão fantástico que toda hora precisava me convencer de que não era um sonho, que eu não acordaria e me daria conta de que a tempestade continuava.

Quando, em minha sem graça e pacata vida, eu poderia imaginar que me envolveria com um homem como Alex Frankli? Nunca passou pela minha cabeça me jogar sem limites nessa loucura toda e ainda por cima terminar noiva do homem mais incrível que já conheci, na vida e nos sonhos. Sim. Porque nem nos romances que li, e tampouco nas histórias que me arrisquei a escrever, nenhum dos personagens chegava sequer perto dele.

Alex era... algo impossível de descrever!

– Você está bem? – revirei os olhos.

Ele já tinha feito a mesma pergunta quatro vezes desde que descobriu que nossa deliciosa aventura da noite anterior tinha deixado algumas sequelas. Não muito grandes ou graves, na verdade eu imagino que normais para uma primeira noite de prazer intenso.

O que ele queria? Eu era virgem e, apesar disso, sobrevivi a quatro rounds de uma luta. Ok. Estava toda orgulhosa de mim e do meu noivo. Merecíamos uma rodada de palmas pelo nosso desempenho, que não deixava nada a desejar, assim acreditei. O fato foi que fiquei com assaduras e ele descobriu quando tentou me fazer cavalgar.

No cavalo, claro!

– Estou ótima, Alex! Com certeza aguento mais uma rodada – ele sorriu e voltou a olhar para frente, mordendo o lábio como se quisesse esconder o orgulho. – Pare de sorrir como se eu fosse uma aberração. Não tenho culpa se foi muito bom. Maravilhoso! Você poderia ser menos perfeito, facilitaria um pouco.

– Não estou rindo porque você é uma aberração. Na verdade, já esperava por esta reação, Charlotte.

– Sério? – estanquei chocada. Como assim ele já esperava?

– O que você queria? Um belo dia estava eu vivendo tranquilamente a minha vida quando recebo uma proposta indecorosa para te ensinar a fazer sexo. Desde a primeira aula eu tive a certeza de que você seria fogo puro – continuou sorrindo, e eu, mesmo indignada, me derreti por aquele sorriso preguiçoso, torto, cheio de malícia.

Lindo!

– Então por que demorou tanto a se decidir?

Alex se voltou e me puxou para seus braços. Imediatamente meu corpo correspondeu, tanto para o lado bom quanto para o ruim, pois à mínima lembrança e desejo de darmos seguimento aos nossos anseios, também alertava que não estava em meu perfeito estado.

Pensei que meu professor me beijaria, que aproveitaria os minutos que ainda tínhamos escondidos de todos para abusar um pouco mais de mim. Pensei que o chão molhado não faria diferença, ou que o simples fato de estarmos protegidos pelas árvores seria um incentivo impossível de ser ignorado, porém ele apenas acariciou meu rosto. Seus olhos, de um azul profundo, que sugavam tudo o que queriam de mim, atentos aos meus; aquele sorriso que parecia colado no rosto, pois nunca se desfazia, me deslumbrando cada vez mais; os dedos quentes, calmos, percorrendo minha pele enquanto arrumavam meu cabelo para trás da orelha...

Ele me admirou com devoção e eu fiquei ainda mais encantada.

– Não sei – sussurrou muito próximo, sem tirar os dedos do meu rosto. – Hoje estou convicto de que deveria ter deixado acontecer, mas, como dizem por aí: tudo tem o seu tempo e lugar.

– E foi perfeito! – demonstrei minha empolgação envolvendo seu pescoço com meus braços procurando seus lábios. Alex riu e me beijou com doçura. Não foi o que eu esperava, embora tivesse sido bom.

– Realmente. Foi perfeito, apesar de tudo.

Acariciou meus cabelos e minha testa franzida por não entender o seu “apesar de tudo”. Como assim “apesar de tudo”? Foi incrível! Nada nos impediu, eu gostei, foi bem além do que eu esperava para a minha primeira vez. Se ele estava se referindo aos problemas com Tiffany e Anita, na minha cabeça, aquilo já estava muito bem resolvido. Por outro lado, se ele se referia à sua situação profissional, ainda tínhamos muito o que conversar.

– Eu fiquei desesperado quando voltei para casa e descobri que você estava perdida no meio daquela tempestade.

– Eu não estava perdida... – seu indicador me calou. Alex ficou sério, encarando-me com intensidade e eu pude ver o terror que sentiu ao pensar que algo de ruim poderia ter acontecido comigo. Engoli em seco.

– Você estava sozinha no meio de uma tempestade. Eu nunca conseguiria simplesmente sentar e aguardar. Você tem ideia do que foi para mim? Consegue ter alguma noção do tamanho do meu desespero? E se algo tivesse acontecido? Havia raios caindo por todos os lados, o rio transbordou e a força das suas águas varria tudo o que encontrava pela frente, sem contar que as árvores caíram. Você pode pegar uma gripe, até mesmo uma pneumonia – ele se calou, analisando-me com mais urgência.

Alex demonstrava angústia quando relembrava as dificuldades enfrentadas para me resgatar. Foi exatamente por medo daquele tipo de reação que não contei sobre as horas que caminhei na escuridão porque aquele... aquele animal, que ele conduzia como se fosse a criatura mais doce do mundo, se recusou a me carregar e, ainda por cima, abandonou-me no meio do nada, à mercê de toda aquela chuva, raios e trovões.

Quando Alex chegou, eu não quis dar a ele o gostinho da vitória. Estava muito magoada, na verdade, apavorada, e vê-lo me deixou tão feliz que quase pulei sobre o meu professor, chorando. Graças a Deus consegui me conter. Também não disse nada sobre a dor em minha bunda por causa da queda que aquele animal me fez levar. Com certeza eu estava com um puta hematoma que ele só não percebeu por causa da pouca luz e porque pela manhã dei um jeitinho de esconder.

– Eu não estava em perigo – rebati para evitar que ele ficasse ainda mais angustiado. – Já te disse, consegui achar a casa muito rápido e me protegi. Não precisava ter colocado sua vida em risco. Agora é você que está machucado, ou pensa que não vi o hematoma imenso em suas costas? E os arranhões?

– Eu quase morri afogado – fez um biquinho digno de atenção. Estreitei os olhos e segurei o riso. Alex estava se aproveitando da minha preocupação.

– Coitadinho! – levei a mão ao rosto, lembrando-me imediatamente de que os óculos não estavam lá.

– Quase fui eletrocutado – continuou com a carinha de menino pidão.

– Oh, Deus! Sério? – fui entrando em seu jogo.

– Hum, hum! – ele me olhava atentamente ainda representando o menino perdido. – Também quase fui atropelado pelo meu próprio cavalo, sem contar a queda na frente da cabana e que você não deu a menor importância. Por isso os hematomas.

– E o ferimento em seu ombro? – Mantive a voz preocupada, atenta ao homem que se fazia de menino só para ganhar a minha atenção.

– Foi quando eu quase fui levado pelo rio – olhou para os lados parecendo uma criança inocente. Tive vontade de rir, mas me mantive firme na brincadeira.

– Tudo isso só para conseguir comer a sua aluna? Poxa! Estou orgulhosa! Você é um homem determinado.

Alex me encarou, a princípio surpreso, depois riu alto, jogando a cabeça para trás, deixando-me ainda mais deslumbrada.

– Bem, não estava em meus planos, quer dizer... estava, só que não exatamente do jeito que aconteceu. No fim, foi ainda melhor do que o planejado – voltou a me puxar para perto. Estava mais leve, realizado. Acariciei seu peitoral e deixei que meus braços descansassem em seus ombros.

– Não sei o que você pretendia, porém não troco a minha primeira vez por nada nesse mundo – e beijei seus lábios em um beijo rápido e carinhoso. Alex sorriu com olhos brilhantes e apaixonados, daquele jeito que me fazia esquecer como respirar.

Ah! Alex é tão... Alex!

– É melhor continuarmos antes que seu pai consiga mobilizar o exército.

Meu pai! Imediatamente fiquei tensa. Como ele reagiria? Nós contaríamos? Tornaríamos nosso noivado público ou esconderíamos até bolarmos um plano mirabolante? Puta que pariu, eu já estava tensa! Só de imaginar o tamanho da cena que meu pai protagonizaria era o suficiente para me fazer esquecer qualquer lembrança do que tínhamos feito.

Merda!

Peter mataria Alex. Não. Peter me colocaria em um convento, depois me deserdaria e... Não, mais do que isso: primeiro ele gritaria, depois me colocaria de castigo até o fim dos tempos, em seguida me mandaria para um convento localizado no meio de uma ilha deserta, que ninguém conseguiria chegar sem a ajuda de um GPS... e depois mataria Alex, para mostrar quanto as regras dele deveriam ser seguidas com rigor. Que droga! Eu já tinha vinte e um anos, estava praticamente formada e poderia fazer o que bem quisesse da minha vida. Sim, isso se eu quisesse realmente causar um ataque cardíaco no meu pai, cujo coração pertencia ao século dezoito.

O que fazer?

Primeiro eu precisava, a qualquer custo, mantê-lo longe de Alex. Não podia perder o meu noivo antes mesmo de oficializarmos nosso compromisso. E muito menos depois de tudo o que ele havia feito comigo na noite anterior. Se a primeira vez fora tão intensa eu não poderia sequer imaginar as seguintes. Um milhão de formigas marcharam pelo meu corpo, causando comichão e ardor, afinal de contas não dava para ignorar as consequências das nossas travessuras.

Avesso aos meus pensamentos desorientados, repletos de planos que estavam fadados ao fracasso, Alex continuou caminhando, segurando firme a minha mão e conduzindo o cavalo. Estava relaxado, até acrescentaria... feliz, realizado... e eu, apesar dos meus temores e angústias, estava no paraíso, em êxtase. Todo o meu mundo se resumia àquele homem incrível que me segurava pela mão.

Por ele eu enfrentaria o mundo.

– Como você vai fazer... isso... Quer dizer... o casamento.

Um certo incômodo me acompanhava desde que iniciamos aquele assunto, e eu nem fazia ideia do motivo. Tudo bem que casamento nunca fez parte dos meus planos. Não porque tivesse problemas quanto a isso e sim porque me sentia muito jovem ainda para sequer pensar em viver com alguém. Se bem que com Alex... Sim, eu poderia passar uma eternidade ao seu lado.

Mas não tão rápido. Não sem antes viver tudo o que eu pretendia viver com ele.

– Primeiro terei que falar com seu pai, apenas para seguir a tradição. Você aceitou, então nós vamos nos casar com ou sem o consentimento dele – parei chocada. Alex interrompeu seus passos para virar em minha direção me encarando. – Ele vai concordar. Não se preocupe.

– Mas...

– Eu conto que tirei sua virgindade, aí será ele quem irá me obrigar a casar – sorriu cinicamente. Os olhos azuis profundos me encarando cheios de promessas. Alex realmente flertava com o perigo.

– Alex!

– Estou brincando. Não quero ser responsável pela morte do seu pai. Este será meu último argumento, caso ele invente um monte de obstáculos para me impedir de ficar com você.

– Dá para parar? Deixe que eu converso com ele. Vai ser melhor do que deixar vocês fazerem uma competição para decidir qual dos dois é o mais macho – ele riu novamente sem dar a devida importância às minhas palavras.

– Não estou competindo com ninguém. Mesmo porque já sei que serei o vencedor – dei um tapa em seu braço bom e ele riu ainda mais.

– Peter vai enlouquecer.

– Peter tem que entender que você já é maior de idade, é madura e pode perfeitamente escolher com quem vai namorar. Não vejo o porquê de isso ser um problema. Nossas famílias estão agindo como se fossem uma só. Miranda e Patrício estão namorando e ninguém se colocou entre eles e eu já deixei bem claro para seus pais que sou uma pessoa responsável.

– Ah, claro! Com duas mulheres disputando a sua cama descaradamente. Anita e Tiffany não fizeram questão de esconder o que queriam de você e todos naquela casa imaginam que seja um devasso – ele estreitou os olhos e sua boca ficou levemente aberta.

– Eu? Um devasso? Sua mãe certamente não pensa assim – sem largar minha mão, voltou a caminhar, conduzindo-me de volta à casa.

– Minha mãe?

– Sim. Ela já me deu a sua bênção – e eu notei um sorriso presunçoso se abrindo preguiçosamente em seus lábios.

– Minha mãe o quê?

– Ela me abraçou, disse que você me amava e que confiava em mim para salvá-la – falou debochadamente. – Viu? Até sua mãe confia em mim para ser o seu namorado.

– Você não entende – ri sem vontade. – E não acho que o meu pai não vá aceitar, apenas acredito que ele vai enlouquecer antes. Vai dar o maior de todos os espetáculos. Vamos combinar que ele pode ter um ataque cardíaco, e é justamente o que eu quero evitar.

– Peter é um homem forte, não corremos este risco.

– Não se você esconder dele o fato de eu não ser mais virgem, ele pode aguentar – ele me olhou de soslaio. – E já aviso que o máximo que vamos conseguir é um namoro do século quinze.

– Pensei que ele fosse do século dezoito – ele rebateu rindo.

– Mas os costumes são de muito antes. Vamos namorar sempre sob a supervisão de alguém, pegar na mão vai ser um grande avanço, beijos só escondido e transar... – neguei com a cabeça. Alex mordeu o lábio sem interromper a caminhada.

– Eu não acredito que será dessa maneira, até porque nós conseguimos muito mais do que isso antes. E seu pai vai confiar em mim, pode deixar comigo.

– Estou deixando – mentira, eu não estava. Daria um jeito de estar entre eles para evitar um confronto. – Mas não conte que...

– Eu sei exatamente o que fazer, Charlotte – ele me interrompeu falando bruscamente. – O rio ainda está muito cheio – Alex estava preocupado. Atravessar o rio naquelas circunstâncias seria uma grande e arriscada aventura.

– E agora?

– Acho melhor você montar e eu conduzo vocês dois.

– Não vou montar nesse... não vou montar em seu cavalo. Ainda estou dolorida – suavizei um pouco a voz para que ele não desconfiasse da minha antipatia pelo animal.

– Charlotte, eu consigo atravessar. A água não está nem com metade da força de ontem. Já você, não tenho certeza se irá conseguir.

– Posso tentar. Você segura minha mão – ele respirou fundo e, olhando para a água, concordou.

– Tudo bem, mas devo avisar que não será nada agradável. Nesta época do ano a água fica gelada.

– Você consegue mesmo com todos os seus machucados? – ele revirou os olhos desdenhando da minha preocupação.

– Isso não é nada. Nem lembro que estão aí. Vamos, quanto antes começarmos, mais rápido terminaremos. Segure firme em minha mão e tente fazer o mesmo caminho que eu, pisando onde eu pisar.

– Entendido, professor.

Ele me encarou e deu um sorriso leve, depois depositou um beijo casto em meus lábios, para logo em seguida iniciar a nossa travessia.

Começamos a entrar e... argh! Estava gelada demais. Insuportavelmente gelada. Estremeci e Alex percebeu. Claro que ele perceberia. Sem contar que a correnteza estava mesmo muito forte. Batia na lateral das nossas pernas, que pareciam querer ceder a cada investida. Era realmente uma luta. Cada passo tinha que ser muito bem calculado. Quando a água já estava nas minhas coxas eu comecei a tremer e bater o queixo.

Era insuportável.

– Tudo bem, Charlotte. Suba em minhas costas. O seu peso vai me ajudar a ficar mais estável.

Ele parou um pouco, já me posicionando para subir. Aceitei sem questionar, mesmo sabendo dos seus ferimentos. Muito melhor as costas de Alex do que no lombo daquele animal falso e dissimulado. Era incrível como ele fingia ser bem-comportado perto do dono.

Agarrei-me às suas costas e ele continuou a caminhar, com mais cuidado. Livre da água e sentindo sua mão em minha perna, toda a minha atenção foi desviada. Deitei o rosto em seu pescoço e inspirei aquele aroma fantástico que só Alex conseguia ter. Ele, sutilmente, inclinou a cabeça em minha direção, aceitando o carinho. A garoa molhava o seu rosto.

– Onde estão os seus óculos? – ele perguntou e imediatamente me lembrei da armação perdida em algum lugar entre as árvores. Não tive como evitar levar a mão ao rosto para conferir.

– Perdi ontem.

– Perdeu? Como assim perdeu?

– Ah... – o que eu poderia dizer? O seu precioso cavalo me derrubou e depois eu tive que correr no meio do nada na completa escuridão? – Acho que quando começou a chover muito forte ele escorregou enquanto eu cavalgava. Vou providenciar outro assim que conseguir voltar para casa.

– E vai ficar sem enxergar até lá?

– Uso as lentes. Não gosto muito, mas na falta dos óculos... – dei de ombros e senti uma pontada aguda. Meu pai enlouqueceria quando visse os meus machucados. Era melhor desviar a atenção daquele assunto. – Podemos voltar à cabana um dia?

– Quantas vezes você quiser.

– Podemos passar nossa lua de mel aqui? – ele riu.

– Eu tinha pensado em um lugar especial, Paris por exemplo.

– Você sempre pensa em tudo? Já fui muitas vezes a Paris. Aquela cabana é o lugar mais especial do mundo.

– Tem razão. É que eu penso em tantas coisas para nós dois... viajar, conhecer lugares, revisitar. Fazer amor em vários outros... – não resisti, beijei seu pescoço e corri minha mão por seu peito com paixão. – Assim eu não vou conseguir continuar e nós estamos indo bem até demais, então não vamos abusar da sorte.

Naquele momento ouvimos o barulho de motores. Agucei a vista e logo à frente pude enxergar um jipe, uma moto e alguém a cavalo. Caramba!

– O reforço chegou – dava para perceber a sua falta de entusiasmo.

Com certeza estava tão apreensivo quanto eu. Não sabíamos como agir. O que fazer primeiro? Não podíamos simplesmente anunciar que estávamos juntos. Podíamos? Não. Era necessário passar por um obstáculo terrivelmente perigoso: meu pai.

Continuamos andando. Ele com passos firmes e cautelosos comigo em suas costas, agora sem me deitar em seu pescoço ou acariciar seu peito. Estava mais para uma mochila.

Patético.

Alcançamos o outro lado, sãos e salvos, quase que no mesmo instante em que eles. João Pedro e Patrício estavam no Jipe, Johnny na moto e meu pai, como não poderia deixar de ser, a cavalo, como um rei procurando sua linda princesa. Não pude deixar de rir. Meu pai era uma figura.

Peter, apesar de toda aquela história sobre virgindade, de querer escolher o meu marido e tudo mais, é a pessoa mais incrível que eu conheço. Um homem de honra, que cresceu com seu próprio esforço, sem nunca ter prejudicado ninguém. Ele é uma pessoa boa. Por detrás daquela máscara de austeridade, existe um homem bom que se preocupa em proporcionar condições dignas de saúde para quem não tem como pagar. Eu me orgulhava muito dele.

Alex parou, ajudou-me a descer e me manteve do seu lado com a mão em minha cintura. Ele não recuou, nem se intimidou sob o olhar atento do meu pai, que aliás, imediatamente percebeu este detalhe. Alex permaneceu ali, deixando clara a sua escolha, a sua posição a respeito do nosso relacionamento, e isso, mesmo me fazendo temer, encheu-me de orgulho.

Ali, sendo analisada detalhadamente por todos, tendo que aceitar os sorrisos sorrateiros, os olhares estreitos que não tornavam nada delicada a nossa situação, eu corei de uma maneira que nunca achei possível, sentindo minha pele esquentar e queimar. Johnny sorriu cúmplice, deixando claro que tinha entendido tudo: eu não era mais virgem.

Porra, eu não era mais virgem! Tive vontade de fazer a dancinha da vitória, mas me contive.

Por que aquilo me deixava tão envergonhada? Todo mundo ali sabia que eu era virgem e que tinha envolvido Alex num plano absurdo e maluco para deixar de ser. Tudo bem que meu pai não sabia, mas os outros, de uma forma ou de outra, acabaram sendo envolvidos pela situação. Então qual o motivo de tanta vergonha? O fato era que eu estava incrivelmente constrangida. Apesar de absurdamente feliz!

– Charlotte, que bom encontrar você inteira sem nenhum pedaço faltando! – Johnny me agarrou, puxando-me para longe de Alex. Tive tempo de perceber seu gesto de reprovação, mas permiti que meu amigo roubasse a atenção. – Será que está inteira mesmo? Deixe-me observar melhor.

– Idiota! – dei um tapa em seu braço, rindo da sua insinuação.

– Sério, estou feliz por você – a voz baixa e os olhos brilhantes demonstravam a sua real motivação para tanta felicidade.

Não sei por que ele e Miranda estavam tão preocupados com este detalhe. Ser virgem era algo tão assustador a ponto de as pessoas comemorarem só porque deixei de ser?

– Ah, claro! – revirei os olhos. – Vai dizer que não ficou nem um pouco decepcionado por perder a chance de receber a minha herança? – sorriu amplamente, revelando a fileira de dentes perfeitos.

– Esta parte é verdade, mas, ainda assim, é melhor ter você de volta do que aguentar os lamentos do padrinho.

– Posso pegar a minha filha? – meu pai estava logo atrás de mim. – Lottie! – apertou-me em seus braços com força. Dava para sentir o desespero contido. Ah, pai! – Fiquei tão preocupado! Nunca mais faça isso, mocinha! Sua mãe está muito nervosa e não vai sossegar enquanto não colocar os olhos em você – ele lutava contra os olhos marejados.

– Eu estou bem, pai – não pude evitar que meus olhos ficassem úmidos.

– Eu sempre disse a sua mãe que ela te mimava demais – respirei fundo me preparando para o discurso de sempre. – Se ela não fizesse todas as suas vontades, você jamais teria se colocado em risco como fez ontem.

– Eu não estava em risco. Saí para montar, não imaginei que a chuva chegaria com tanta força, nem tão rápido.

– Montar?

– Você sabe que eu adoro cavalos, pai – rebati cansada. Eu não queria ter aquela conversa. Não naquele momento.

– E se embrenhou na floresta mesmo com a ameaça de uma tempestade? Isso foi...

– Pai! – ouvi o risinho abafado que provavelmente partia do Patrício. E eu ainda teria que aguentar aquilo.

– Tá!

Ele respirou fundo, com as mãos em meus ombros. Impedi um gemido de dor por causa da pressão que ele fazia sobre um hematoma que provavelmente me daria trabalho. Seus olhos correram meu corpo em uma análise rápida, típica de médico e pai, os dois misturados em uma figura só.

– Está frio e você molhada. Como foi a noite? Choveu muito. Eu mesmo teria ido, mas Alex... – seus olhos correram para meu namorado e meu coração descompassou.

– Eu estou bem! Ótima! Alex me encontrou na hora certa. Conseguimos acender a lareira e... – suspirei pensando em como tudo deu certo.

– Ela está bem, Peter – meu namorado se aproximou.

Olhei para trás e vi aquele homem seguro, forte e decidido que eu conhecia. Era possível me apaixonar ainda mais por ele? Apesar de o meu pai ter assumido sua postura intimidante habitual, Alex não recuou. Apertaram as mãos sem desviar o olhar.

Ok! Aquilo era mesmo muito estranho.

– Estou vendo – meu pai não largou a mão do meu professor ao falar. Seus olhos astutos liam nas entrelinhas o que havia acontecido.

– Vamos voltar. Vocês devem estar cansados, está muito frio, sem contar que as mulheres estão quase botando um ovo – João Pedro se aproximou e foi repreendido pelo olhar de Alex.

Que história era aquela de botar ovo? Meu Deus! João era muito debochado. Pelo menos serviu para desviar a atenção do meu pai.

– Vamos! – Patrício se intrometeu tentando conter um risinho do tipo “eu sei o que vocês fizeram na noite passada”. Minha vontade era de esmurrá-lo. – Vocês devem estar com fome. Eu estou. Graças a Deus não precisamos ir até a cabana, derrubar a porta, pegá-los de surpresa...

Patrício piscou contendo um riso. Porra, eu queria poder matá-lo! Meu pai voltou a olhar Alex daquele jeito que ele fazia quando deixava claro que me castigaria por quebrar alguma regra.

Merda, e eu quebrei a mais importante de todas!

– Certo. Vá no jipe com eles, filha. Estarei logo atrás, levando os cavalos com Alex.

Puta que pariu! Eu conhecia aquele tom muito bem. Precisava evitar o tal confronto. Alex, mesmo assim, não recuou. Se ele voltasse atrás, eu entenderia. Entenderia até se ele montasse naquele cavalo dissimulado e fugisse para bem longe. Mas ele não fez isso. Apenas ficou e encarou o meu pai.

E não é que príncipes encantados existem mesmo?

– Eu posso montar, pai – Alex estreitou os olhos em minha direção. Ok! Eu não podia montar sem sentir dor, mas, como era por uma boa causa, então tentaria. – Por que o senhor não vai no jipe e me deixa levar os cavalos com Alex? Seria mais confortável – pela minha visão periférica percebi que Johnny abriu um imenso sorriso e balançou a cabeça.

– De jeito nenhum. Você vai no jipe onde estará segura. Eu chegarei logo em seguida.

Puta que pariu um milhão de vezes!

– Mas, pai...

– Charlotte! Tudo bem, vá no jipe. Faça o que seu pai está pedindo.

Alex interferiu me deixando ainda mais irritada. Como se não bastasse o meu pai decidir sobre a minha vida, eu arranjei um namorado mais do que mandão.

Infelizmente, não havia como argumentar. Com Alex e meu pai me dando ordens ao mesmo tempo, o melhor a fazer era me afastar e deixar as coisas acontecerem. Entrei no carro recebendo um olhar de conforto do João e um afago do Patrício. Só fizeram com que eu me sentisse ainda mais criança. O que eles estavam pensando? Eu não era mais uma menininha. Eu nem era mais virgem.

Foi impossível não sorrir.


CAPÍTULO 2


“Os velhos desconfiam da juventude porque foram jovens.”

William Shakespeare


ALEX


Ainda estava atordoado quando Charlotte entrou no jipe e partiu. Johnny hesitou, e Peter o dispensou apenas com um olhar. O clima ficou tenso imediatamente. Eu nem sabia como começar a conversa. Porém não demonstrei fraqueza nem fiquei intimidado. Sabia o que queria e não abriria mão. Não voltaria atrás.

O que ele queria? Charlotte era maior de idade. Ele não podia impedir que ela encontrasse alguém por quem sentisse interesse. Aliás, era até anormal ela nunca ter se apaixonado, nunca ter se aventurado em um namoro escondido na escola ou qualquer coisa do tipo. Por isso foi justificável ela ter ficado tão louca quando começamos nossas... aulas.

Que droga! Ele jamais desconfiaria de como foi o início desse relacionamento. Se Peter imaginasse que começamos com aulas de sexo em que eu fiz o que quis com a filha dele, nunca mais permitiria que eu chegasse perto dela outra vez.

Engoli em seco e fiquei aguardando.

Peter não montou como achei que faria. Ele segurou as rédeas e começou a caminhar. Como fez com Johnny, apenas me olhou indicando que deveria acompanhá-lo. Caminhei ao seu lado em silêncio e cada vez mais tenso. Ele permanecia calado. Só olhava para frente e andava a passos lentos. Foram os dez minutos mais longos de toda a minha vida, ouvindo apenas o chiado das suas botas na grama molhada e sentindo a fria chuva fina que continuava caindo.

– Eu a amo, Peter – falei de uma vez só.

Não dava para manter aquele silêncio, nem ficar aguardando a iniciativa dele. Se era para dizer, então que começasse logo. E a melhor forma de fazê-lo entender que eu não desistiria era revelando o que eu sentia. Mesmo assim, receoso sobre a reação dele, deixei que Peter passasse a minha frente e fiquei um passo atrás, preparado para qualquer coisa.

Para minha surpresa, ele não explodiu, não se fez de ofendido, nem mesmo parecia que estava tendo um ataque cardíaco. Apenas sorriu e parou para me olhar. Aqueles olhos de um azul tão claro quanto os de Charlotte, cheios de interesse e sabedoria, tal como a filha. Ele me avaliou e continuou sorrindo.

– Disso eu já sei – por que ele estava tão relaxado? Eu não me aguentava de nervoso. Preparado para uma batalha. Armado. Pronto. E ele simplesmente reagiu naturalmente.

– Ótimo! – olhei para a frente sem saber como interpretar sua atitude. – Então deve saber que ela me ama também, e que queremos continuar juntos – tentei fazer com que minhas palavras não saíssem como um desafio, como se o estivesse desrespeitando. – Charlotte é adulta, e madura – ele riu desfazendo desta última parte.

Tudo bem que eu também não tinha esta certeza, mas ver o pai da minha namorada deixar claro que maturidade passava longe dela me assustava um pouco.

– Sabe, Alex? – ele começou ainda andando e encarando a paisagem. – Eu sempre fui um pai muito rígido. Acredito que uma família com regras e hierarquia tenha mais chances de sucesso do que estas famílias modernas, em que os filhos fazem tudo e os pais não possuem voz ativa – fez uma pausa, na certa imaginando que eu rebateria, como não o fiz, ele continuou. – As circunstâncias da vida me fizeram estar sempre longe e ausente na maioria do tempo, e pelos mesmos motivos, Mary passou a me acompanhar, deixando três crianças a cargo de empregados, o que você deve concordar que é algo extremamente arriscado, por isso eu tive que ser cada vez mais duro em relação às minhas regras.

Outra vez fez uma pausa. Preferi não falar nada. Quem era eu para questionar qualquer atitude dele como pai? Mesmo achando que suas regras tão rígidas de nada serviram para Miranda e, pelo visto, nem para Johnny. Apenas Charlotte parecia levá-las a sério, pelo menos até antes de começarmos com as aulas.

– É lógico que eu nunca acreditei que eles seguiriam. Miranda é a maior prova disso, apesar de sempre tentar esconder de mim a verdade. E Johnny eu já imaginava, afinal de contas ele é homem, por isso fiz questão de que ficassem em casas separadas, desse modo as meninas não estariam tão envolvidas nos arranjos dele. Agora Charlotte... – puxou o ar enchendo os pulmões. – Charlotte foi uma caixinha de surpresas. Espero que você me compreenda, Alex. Charlotte é minha única filha. Eu sonhei para ela um futuro brilhante. Sacrifiquei a minha vida para que tivesse tudo o que sonhava. Pode não parecer, mas eu, mesmo contrariado, fiz e continuo fazendo tudo para que ela se realize. Não vou me opor à escolha dela. Apesar de tudo, nunca fiz isso. Ela é como a mãe: sonhadora, porém decidida. Vira o mundo de cabeça para baixo se preciso para conseguir o que quer.

Sorri. Aquela era realmente a Charlotte que eu conhecia. A garota determinada que me cercou totalmente e não me deixou a menor chance de escapar. A mulher da minha vida!

– Você deve conhecer muito bem o gênio dela. É impossível e determinada. Eu confesso que a cada volta para casa eu ficava ainda mais apreensivo. Charlotte nunca fez o estilo que aceitava ser comandada, então, cada vez que abria a porta de casa, esperava encontrar uma garota revoltada, cabelos pintados, maquiagem pesada, roupas esquisitas e rasgadas, sem contar as argolas por todo o corpo – fez uma careta engraçada e eu tive que rir. – Mas não. Ela estava lá. Cada vez mais linda. Um anjo! Comportada, apesar da língua afiada. Nunca se rebelou, exceto quando decidiu ser escritora – outra careta, desta vez ele mesmo riu. – Colocou na cabeça que queria ser escritora. Pode até não parecer, mas eu nunca fui contra. Queria que ela fosse médica, ou administradora, você sabe... os hospitais... Johnny vai cuidar de tudo e isso me deixa mais feliz. Eu quero que ela realize todos os seus sonhos.

– Eu te entendo.

– Nunca imaginei que seria assim – olhou-me por alguns segundos, depois voltou a olhar para frente. – Pensei que quando ela despertasse para o namoro, essas coisas de hormônio... – mais uma careta engraçada e eu me vi rindo, relaxado com aquela conversa. – Pensei que ela me apresentaria um louco, um cara meio alternativo, alguém que estivesse totalmente fora dos meus padrões. Também cheguei a imaginar um desses garotos superinteligentes, como o que apareceu lá no restaurante naquele dia.

Merda! Ele preferia o Henrique. O idiota do Henrique.

– Eu quero que ela tenha o namorado da sua escolha, o que não significa que vou facilitar. Minha filha pode se apaixonar quantas vezes quiser, no entanto, o homem que ficar com ela terá que merecê-la. Precisará provar sua capacidade de cuidar dela quando eu não estiver mais presente. Espero que compreenda. Um dia você será pai e não poderá colocar sua cabeça no travesseiro e dormir sossegado à noite sabendo que sua filha pode sofrer, ser magoada e ferida. Eu não consigo conviver com esse pensamento.

– Entendo perfeitamente – afirmei apreensivo. Como eu poderia prometer tudo aquilo? Como poderia saber o que a vida reservava para nós dois?

– Vocês passaram a noite juntos.

Engolir passou a ficar mais complicado. Eu nem conseguia mais fixar meus olhos nele. Rapidamente a conversa tranquila tornou-se tensa e eu me senti um garotinho conversando com o pai da sua primeira namorada.

– Foi necessário, não havia outra alternativa... – porra! Por que eu estava tão tenso e inseguro?

– Sim. Eu sei. De qualquer maneira...

– Nós vamos nos casar... quer dizer... eu quero me casar com ela... Eu a pedi em casamento... – puta que pariu! Estava ficando cada vez mais difícil. – Com o seu consentimento, é claro!

Ele parou, respirou profundamente me olhando como se quisesse dizer “você vai casar com minha filha porque comeu ela, seu filho de uma puta!”. E continuou andando. Novamente em silêncio. Mais intermináveis cinco minutos.

– Você é bem mais velho do que ela – disse por fim, como se estivesse falando sobre o tempo.

– E desde quando idade é um problema? – Estava tão tenso que não consegui impedir a rouquidão da voz. E se ele recusasse? Eu diria que ela já era minha mulher?

– Ela é muito mais rica do que você – revirei os olhos.

Nunca tinha parado para pensar sobre este ponto. Aliás, nunca parei para pensar em nós dois de outro modo que não fosse eu o dono da editora e ela a escritora, ou o professor e ela a aluna.

– Para nós não é um problema. A não ser que seja para você – ele negou com a cabeça, olhando sempre para frente.

– Ela é virgem.

Ferrou!

Quase me encolhi. Engoli com muita dificuldade. Puta merda! Puta merda!

– Isto é algo importante, Alex. Você é homem. Experiente. Vivido. Homens têm necessidades... – não dava para encará-lo. Definitivamente não dava. – Quero que permaneça assim. Se você pensa em casamento... se esta for realmente a sua vontade, vai ter que esperar até que ela seja realmente sua esposa. Não quero que minha filha fique se aventurando por aí. Quero que ela tenha uma vida segura e estável e isso inclui sua vida sexual.

Porra!

O que eu poderia dizer? “Ah, não, Peter! Eu comi sua filha, várias vezes, ontem e hoje. Sinto muito!” Puta que pariu! O que eu poderia dizer?

– Claro, Peter! – ouvi-me concordando com a voz esganiçada. Era aceitar ou me arriscar a perdê-la.

Porra! Como vou sair dessa?

– Eu quero casar o mais rápido possível. Não tenho dúvidas sobre meus sentimentos por Charlotte.

– Por que a pressa? – ele me olhou em dúvida.

E outra vez a acusação estava lá “seu filho da mãe, você comeu a minha garotinha!”. Merda! Engoli em seco tentando encontrar a desculpa perfeita e o tom de voz correto.

– Porque amo a sua filha e quero passar a minha vida ao lado dela. Estou com trinta e cinco anos e não tenho mais tempo a perder. Tenho uma vida confortável, um emprego seguro. Quero e vou me envolver com a carreira dela, além disso, me preocupo com os sentimentos da Charlotte e com a sua segurança, tanto quanto você. Não vejo por que esperar – e claro, eu já transei com ela e não posso deixar você descobrir este “pequeno” detalhe.

Peter não me disse nada. Estávamos próximos da casa. Eu precisava extravasar toda a tensão. Sentia meus ombros rígidos, minhas costas doloridas e a cada respiração minhas lesões protestavam. Meu corpo estava tão atento e na defensiva que podia perceber cada detalhe do seu funcionamento, como se meu sangue estivesse grosso nas veias e forçasse a passagem, meu coração acelerado, meu pulso martelando em meu ouvido, toda a máquina em processo.

Eu merecia “uma bela trepada” para aliviar o meu corpo, embora, pelo visto, isso estivesse fora de cogitação. Pelo menos enquanto estivéssemos sob o olhar vigilante de Peter. Mais do que nunca, casar com Charlotte tornou-se uma prioridade. Eu não conseguiria ficar longe dela, sem a nossa intimidade e sabia que, mesmo com o consentimento do seu pai, aquela seria uma realidade distante. A verdade era que, depois daquela conversa, eu precisava dela em meus braços para ter certeza de que tudo ficaria bem.

– Certo – ele disse por fim e eu senti cada músculo do meu corpo começar a relaxar. – Ela aceitou?

– Sim.

– Sou pai e, como tal, conheço a minha filha melhor do que ninguém. Sinto-me na obrigação de te avisar: Charlotte é mimada demais. Ela será infantil quando você menos esperar, aliás, você nunca conseguirá esperar nada dela, porque esta é Charlotte, alguém capaz de reagir com maturidade quando você estiver preparado para a terceira guerra mundial, e explodir como uma bomba atômica quando você menos esperar. Ela será capaz de te levar à loucura se for contrariada e te fazer passear no paraíso quando conseguir o que quer de você. Tem certeza de que deseja realmente se casar com ela?

Confesso que fiquei assustado. Bom, eu sabia muito bem do que minha namorada era capaz, mas não foi justamente por causa desse seu jeito que eu me apaixonei? Eu já não tinha provado uma dose cavalar do quanto Charlotte poderia ser instável e mesmo assim não desisti, nem por um segundo, de tomá-la para mim? Sim, eu tinha certeza e não me importava se passaria longos anos de minha vida lutando contra a infantilidade dela, ou tentando fazê-la corresponder à nossa realidade, tirando-a do “faz-de-conta” em que ela vive. Sim, eu queria me casar com ela.

– Não tenho dúvidas quanto a isso, Peter. Eu amo Charlotte Middleton e vou casar com ela.

– Ótimo! Só mais um aviso – ele me entregou as rédeas do cavalo que levava e limpou as mãos uma na outra. – Não aceito devolução. Não estou disposto a negociar. Se você vai levá-la, tem que saber que é para a vida toda.

Sorri. Que fosse pela eternidade. Nem assim eu recuaria.

– Encontro você na casa.

E ele saiu andando em direção à construção. Eu fui para o estábulo, acomodar os animais. Depois resolvi entrar pelos fundos e ir até o meu quarto. Seria estranho encarar todos quando eu nem sabia o que poderia dizer. E Charlotte? Ela também precisa de um tempo. Eu sabia que ela não estava livre de uma conversa com o pai. O que ele diria?

Era melhor deixar os pensamentos para um outro momento e tratar de trocar as roupas molhadas e de me aquecer. Mas a paz tão almejada não foi alcançada. Tão logo entrei em meu quarto e me senti protegido do restante do mundo, uma batida em minha porta me deixou em alerta, e eu nem acreditei no que vi.


CHARLOTTE


Chegar foi mais complicado do que imaginei. Primeiro tive que aguentar os risinhos dos rapazes. Era tão constrangedor! Absurdamente embaraçoso.

Depois, precisei acalmar minha mãe. Ela estava muito assustada e queria se certificar de que eu estava realmente bem. Fui inspecionada um milhão de vezes até ela ter certeza de que estava inteira... ou quase. Graças a Deus as roupas escondiam os hematomas, e a felicidade que eu sentia foi encoberta pela alegria de estar de volta.

Miranda e Lana foram mais fáceis. Estavam saltitantes, loucas por alguns minutos a sós comigo para arrancar de mim todas as informações. Elas também sabiam. Poderia ser mais constrangedor?

No entanto, meus pensamentos estavam em Alex e meu pai. Deus! Será que ele contou? E meu pai, será que concordou? Merda de será... Droga! Por que eu não insisti em acompanhá-los? Era melhor estar presente no momento em que Alex contasse, assim poderia impedir meu pai de atirar nele, ou que meu namorado provocasse um ataque cardíaco em meu pai.

Por que demoravam tanto?

Por que ninguém ia atrás deles?

Por que... Merda!

Lana e Miranda insistiam que eu precisava de um banho. Estava frio e eu molhada, mas não queria sair da sala. Não antes de Alex e meu pai chegarem e ver com meus próprios olhos que tudo estava bem. Como a minha vontade nunca prevalecia, elas praticamente me empurraram escada acima e se trancaram comigo no quarto.

– Banho! E desembucha logo tudo – Lana era tão mandona quanto o irmão. Revirei os olhos.

Entrei no banheiro e elas me seguiram.

– Aconteceu? – Miranda não conseguia se conter de tanta curiosidade.

– Como foi? Alex foi um bruto? Pelo amor de Deus, não me diga que ele não aprendeu nada do que eu ensinei... – Lana conseguia me deixar ainda mais sem graça.

– Meninas, eu preciso tomar banho. Vocês poderiam dar o fora?

Eu tinha pressa em voltar para a sala para encontrá-lo. Minha mente não conseguia se desligar. Precisava colocar os olhos no homem que eu amava para ter certeza de que tudo estava bem entre nós dois.

Meu pai não poderia me separar do Alex. Ele não tinha esse direito! Eu estava decidida e iria até o fim para ficar ao lado do homem que escolhi para passar o resto da minha vida. Ele poderia até me deserdar, eu não me importava. Apenas queria o direito de amar o meu professor e de ser amada por ele.

– Tome seu banho, Charlotte! – Lana me olhou sem entender.

– Preciso tirar a roupa.

– Você tem tudo o que eu tenho – ela riu e Miranda a acompanhou. – Não tem nenhuma novidade aí. Ou tem? – arregalou os olhos com ironia, fazendo minha amiga gargalhar.

– Sem chance. Saiam, as duas – onde já se viu! Eu não ia ficar nua na frente delas.

– Eu já te vi nua um monte de vezes, Charlotte. Não tem nada de novo aí, ou tem? – os olhos de Miranda brilharam imitando Lana e ela riu. A irmã do meu professor parecia uma criança de tão alegre.

– Virem de costas! – elas obedeceram, não sem antes revirarem os olhos e fazerem caretas.

–– Conta logo. Aconteceu ou não? – não dava para conter Lana.

– Aconteceu.

As duas viraram em minha direção ao mesmo tempo gritando como duas adolescentes. Cobri meu corpo com a primeira toalha que encontrei, Miranda foi mais rápida e viu o hematoma. Rapidamente seu humor mudou e eu pude ver o pânico no rosto da minha amiga.

– O que aconteceu? Charlotte, o que ele te fez?

Lana levou a mão à boca, assustada demais para falar. Olhei para mim conferindo o que havia de tão absurdo. Eram apenas um ou dois hematomas e alguns arranhões. Depois olhei no espelho e quase não acreditei.

Eu tinha um hematoma enorme no braço direito, tomando o cotovelo, descendo até quase o pulso subindo em bolas separadas e arroxeadas. Havia também arranhões. Na minha bunda, como eu já imaginava, um hematoma cobria um lado quase inteiro. Meus joelhos estavam cobertos por arranhões e duas manchas vermelhas enfeitavam minhas costas. Eu só conseguia me perguntar como tudo aquilo foi parar ali? A única dor que eu sentia, que aliás, nem era dor realmente e sim um leve ardor, estava concentrada no meio das minhas pernas e eu sabia muito bem o motivo.

Ah, como sabia!

Imediatamente voltei a ficar tensa. Alex estava com meu pai, em algum lugar, conversando sobre o nosso futuro. Que droga! Eu precisava sair dali.

– Charlotte, o que ele te fez? – Miranda rosnou já pronta para ter um ataque.

– Não seja ridícula, Miranda. Alex jamais me machucaria. Aliás, ele nem mesmo viu. Deve ter sido por causa da queda.

– Queda? – as duas perguntaram ao mesmo tempo.

– Eu caí do cavalo – elas me olharam sem nada dizer. As duas estavam com expressões tão assustadas que eu tive vontade de rir, mas a vergonha era maior. – E depois escorreguei algumas vezes, sabe como é... estava molhado, lama para todos os lados, e eu não sou muito boa em correr na chuva – elas continuaram me olhando com aquelas caras estranhas. – Por favor, não contem ao Alex. Ele é quase tão paranoico quanto meu pai em relação à minha segurança.

– Como assim ele não viu? – Miranda continuava espantada.

– Sei lá. Eu mesma não tinha visto até agora. Não havia luz e nós estávamos tão envolvidos... não sei, acho que vou ter que usar roupas de frio por um tempo – Lana relaxou e me olhou com carinho.

– Uma queda de cavalo é algo perigoso, Charlotte. Seria bom fazer alguns exames...

– Tenho certeza de que não tem nada de errado, Lana – rebati voltando a afirmar para mim mesma que eu me sentia ótima! Até demais.

– Mesmo assim. Alex não vai gostar nada disso – cruzou os braços na frente do peito, analisando meus ferimentos. – E esses arranhões vão inflamar.

– O padrinho vai ficar louco – Miranda não conseguia tirar os olhos de mim. – Que droga, Charlotte!

– Louca ficarei eu se não descer logo. Eu estou superbem. Tive uma noite maravilhosa e nem me dei conta dos ferimentos. Agora o mais importante é tomar logo este banho e descer. Alex está conversando com meu pai neste momento, e ele me pediu em casamento, então...

As duas gritaram como doidas, voltando a recuperar a empolgação e se esquecendo rapidamente das minhas lesões. Graças a Deus!

– Meninas! – minha mãe falou de fora. – Posso entrar? – fiquei muito aflita, minha mãe veria os hematomas.

Ela entrou no banheiro e estancou me encarando. Imediatamente lágrimas se formaram em seus olhos. Ela levou a mão a boca sem conseguir esconder o desespero. Tentei ficar o mais natural possível. Eu bem sabia o que era encarar um surto da dona Mary.

– Mãe, não foi nada. Eu caí enquanto procurava abrigo. São somente arranhões. Amanhã já terão desaparecido... estava escuro e chovia muito – uma lágrima escorreu dos olhos dela. – Mãe! Eu costumo cair o tempo todo, esqueceu? É o que sempre acontece com a sua filha descoordenada – ela ensaiou um sorriso, embora o pânico continuasse lá.

– Mary, Alex pediu Charlotte em casamento – Lana, como uma bênção, conseguiu desviar a atenção da minha mãe.

– Casamento? – ela piscou várias vezes, deixando as lágrimas escorrerem livremente. Depois sorriu. – Ah, filha! – e continuou a chorar, agora de felicidade. – Posso te abraçar? – ela se aproximou com cuidado, sem saber se me machucaria ainda mais. Dei risada.

– Não. Todo mundo vai achar que eu sou a filhinha da mamãe – mas sorri e me atirei em seus braços.

– Eu sabia que ele estava doidinho por você – a afirmação da minha mãe fez meu rosto pegar fogo.

– Mãe!

– Mas é verdade! – ela me soltou e olhou para as meninas que confirmaram com a cabeça e com sorrisos imensos. – Você precisava ver quando ele chegou e descobriu que você tinha desaparecido.

– Verdade – Lana corroborou. – Foi logo providenciando tudo para ser o seu salvador.

– E eu nem precisava ser resgatada – resmunguei virando em direção ao chuveiro. Era melhor começar logo aquele banho.

– Não? – elas falaram ao mesmo tempo.

– Claro que não! Onde já se viu isso? Eu não sou nenhuma idiota. Achei logo a cabana e fiquei em segurança.

– Não tanto em segurança – Miranda falou, referindo-se aos hematomas.

– Se eu não tivesse caído, não seria Charlotte Middleton.

– Agora sim você falou uma verdade.

Minha amiga riu e continuou falando sem parar sobre o que Tiffany e Anita tinham feito, o quanto Peter ficou preocupado e tudo o que havia acontecido enquanto eu me perdia nos braços do meu amor.

Após o banho, consegui convencer minha mãe de que eu estava bem e que precisava descer para descobrir o que os dois haviam aprontado. Claro que ela me fez prometer que deixaria meu pai examinar os meus ferimentos para determinar sua gravidade. Era um saco, mas como eu sabia que eles não tinham segredos, logo meu pai ficaria sabendo. Enquanto isso não acontecia, aproveitei o frio e vesti calça jeans, uma camisa de manga comprida e botas. Tudo muito bem escondido.

Procurei Alex e não o encontrei. Sabia que eles já haviam voltado, pois ouvia a voz do meu pai conversando animadamente com o Dr. Frankli. Respirei fundo e resolvi me esgueirar evitando-o. A conversa com o meu pai poderia ficar para depois. Aproveitei e fui até o quarto do meu professor, precisava dele mais do que nunca.

Bati na porta e não ouvi resposta, então arrisquei e abri.


ALEX


– O que faz aqui? – fiquei aturdido. Não sabia o que Anita queria em meu quarto depois de saber toda a verdade.

– Vim saber se você está bem. Charlotte disse que você se machucou – ela mantinha um sorriso leve no rosto e a voz mansa. – Posso entrar?

– É melhor não – mantive a mão na porta para impedi-la.

– Deixe de bobagem, Alex – sorriu dando um passo à frente e forçando a passagem. – Só quero saber como você está.

– Estou ótimo, precisando de um banho quente ou vou acabar doente – pensei que com esta ela desistiria e iria embora, mas ela não foi.

– E a queda?

– Não foi nada – desisti de tentar impedi-la e a deixei entrar, mas mantive a porta aberta. – Escuridão se assustou com a tempestade e eu acabei escorregando, nada grave.

– Que bom! – ela se aproximou ainda mais. – Na verdade eu queria desfazer a imagem que deixei na nossa última conversa.

– Está tudo bem, Anita.

– E Charlotte? Foi fácil encontrá-la?

– Foi – afastei-me outra vez, com isso acabei entrando mais no quarto e ela aproveitou para fechar a porta. – Ela estava na cabana.

– Hum! – entortou a boca me observando. – Também queria dizer que a minha proposta ainda está de pé – deu um passo sedutoramente e passou o dedo em meu peitoral já nu.

– Anita... Nós já conversamos sobre isso.

– Eu não quero casar com você, Alex – ela me alcançou colando o corpo ao meu. Imediatamente fiquei tenso. – Quero só me divertir. É um desperdício saber que você vai ficar preso a outra sem nem me dar uma chance – roçou os lábios em meu rosto. – Eu só quero sexo. Matar a minha curiosidade. Realizar o desejo de estar em sua cama – correu a mão pelo meu tórax. – Ninguém precisa saber. Pense bem. Você quer casar, vai se prender e nunca mais terá esta oportunidade.

– Não! – fui firme, com certeza não o suficiente para que ela entendesse. Anita sorriu provocante.

– Tem medo de que ela nos surpreenda?

– Tenho, porém este não é o motivo para eu não querer. É melhor você sair do meu quarto, Anita. Alguém pode aparecer e não vai ser nada legal.

– Entendi – passou a língua nos lábios e, sem que eu esperasse, desceu a mão até alcançar meu pau e, ao mesmo tempo, mordeu meu queixo.

O que havia de errado com aquelas mulheres? Parecia que tinham fixação pelo meu pau. Não podiam encostar em mim sem conferir o material. Porra! Em qualquer outro momento do meu passado eu teria adorado. Teria levado Anita para a cama e aproveitado todo o meu tempo livre com ela. Mas naquele instante eu só pensava em Charlotte e na merda que seria se ela resolvesse me procurar.

Não dava para aceitar que qualquer uma entrasse em meu quarto, passasse a mão em mim e ficasse por isso mesmo. Não depois de ter passado horas incríveis com Charlotte e, principalmente, quando meu corpo rejeitava qualquer outra que não fosse ela.

– Anita, eu já disse – segurei sua mão tentando não ser rude e foi neste exato instante que ouvi uma batida leve na porta.

Meu coração disparou e meus olhos se arregalaram. Anita mordeu o lábio e colocou um dedo em minha boca para me calar. Com um gesto de cabeça indicou o banheiro. Pensei mil vezes. O que poderia fazer? Se fosse Charlotte? Ela nunca entenderia. Porra, ela nunca entenderia.

Pelo que eu conhecia de Charlotte, ela sumiria outra vez e isso seria a maior merda de todas. Por isso, naquele momento, mesmo sabendo que era a decisão errada, fui até o banheiro e me tranquei lá dentro com Anita.

Claro que ela se aproveitaria da situação. Ela me imprensou contra a pia do banheiro. Fiquei tão tenso que pensei que meus nervos não suportariam. Ouvi quando a porta abriu e fechou, depois passos leves, quase inaudíveis. Então a maldita mulher começou a passar as mãos pelo meu corpo, tirando todas as lasquinhas que podia. Tentei impedi-la, porém qualquer reação mais brusca chamaria atenção para nós dois.

– Alex? – a voz de Charlotte me deixou fodido, no entanto Anita adorou.

Ela colou o corpo ao meu com tanto desejo, correndo as mãos pelas minhas costas, roçando os dentes em meu pescoço. Tive vontade de matá-la. Até que finalmente os passos se distanciaram e ouvimos a porta se fechando.

Afastei Anita desejando manter a maior distância possível dela. Ela riu alto, deliciada com o que tinha acontecido.

– Adoro situações perigosas. Deu o maior tesão. Eu transaria com você aqui mesmo, em pé, enquanto a garotinha aguardava do lado de fora – e riu um pouco mais.

– Você é louca? – esbravejei sem me preocupar em ser rude. – O que deu em você?

– Vai dizer que não gosta de aventuras? Que não adorava uns amassos na sala enquanto a mãe da garota estava na cozinha? Eu amava.

– Olha, Anita... – fechei os olhos e respirei fundo, controlando a minha raiva. – Já deu. Preciso sair.

Passei por ela sem aguardar por mais nada e saí do meu quarto decidido a colocar para fora toda a minha frustração.


CHARLOTTE


Alex não estava no quarto. Tentei no escritório, mas encontrei Miranda com Patrício e quase, quase mesmo, vi mais do que deveria. Arrisquei a sala, mesmo sabendo que poderia encontrar o meu pai e ser interceptada para a tão fatídica conversa, porém, quando estava caminhando em direção às escadas, dei de cara com Tiffany, olhando pela janela imensa que permitia ver a parte de trás da casa. Ela percebeu a minha presença e sorriu. Não consegui retribuir. Era uma reação muito ruim?

– Fico feliz que não tenha sofrido nenhum dano.

– Pois é! – pretendia sair o mais rápido possível, mas ela continuou.

– Alex que não parece bem. Ele está na piscina desde que chegou. Com o frio que está fazendo não consigo imaginar o porquê de ele agir assim. Ainda mais estando machucado.

Oh, merda! O que será que aconteceu? Estava realmente frio. Muito frio. Aproximei-me da janela para olhá-lo. Ele nadava metodicamente, de um lado para o outro, indo e voltando, sem parar. Merda! O que meu pai tinha dito para ele?

– Com licença, Tiffany.

Tentei em vão, mais uma vez, escapar dela e da sua tentativa de me envenenar. Eu já tinha ouvido coisas demais e estava decidida a só tirar qualquer conclusão depois de conversar com o meu namorado... noivo... sei lá!

– Será que ele está se sentindo culpado por alguma coisa? – parei, incapaz de evitar a minha reação. – Eu conheço o Alex há muito tempo, sei que ele não se desestabiliza com facilidade, muito menos se pune da forma como está se punindo naquela água gelada, exaurindo o próprio corpo como se com isso conseguisse expurgar todos os seus pecados.

– Por que você acha que ele se sentiria culpado?

– Não sei, Charlotte – sua voz doce não perdia o tom educado. – Fiquei sabendo que ele pediu demissão da faculdade, e Lana me informou que é a mais nova editora-chefe. Você sabe como é, um homem precisa se sentir seguro, realizado profissionalmente e ele abriu mão de tudo. Simplesmente porque acredita que deve recompensá-la... – um pequeno, quase imperceptível sorriso brotou em seus lábios.

Pensei em tudo o que gostaria de fazer com ela. Eu poderia dar uma de louca e esmagar a cara dela na janela, só que esta atitude não me ajudaria muito. Também pensei em simplesmente ignorá-la e sair em busca das respostas de que eu tanto precisava, afinal de contas, somente Alex poderia esclarecer qualquer dúvida. Infelizmente, eu era realmente a menina mimada que o meu pai tanto afirmava e, como tal, jamais deixaria de responder a Tiffany, ou a qualquer outra pessoa que tentasse desestabilizar a minha paz, algo que desse a ela o que pensar.

Tiffany era uma idiota, arrogante, infeliz e venenosa, que se disfarçava de boa moça para ganhar a atenção e consideração das pessoas. Todos, todos mesmo, daquela casa poderiam se enganar a respeito dela, com exceção de mim. Eu tinha conhecimento de que ela era esperta o suficiente para encontrar as fragilidades das pessoas e era com isso que jogava.

Ela sabia que colocar em questão a estabilidade profissional do Alex me faria repensar. O que ela não sabia era que eu era infantil, mimada e egoísta o suficiente para querê-lo mesmo assim.

– Ele me contou.

– Contou? – seus olhos me sondaram. Ela entortou a boca e voltou a olhar para o meu namorado que continuava com suas braçadas obstinadas. – Entendo...

– Alex será o meu agente. Vai cuidar da minha carreira – saboreei a reação dela que me olhou espantada, com olhos imensos e a boca levemente aberta.

Peste invejosa e fingida!

– Ah, e vamos nos casar! Ele me pediu ontem e não me deixou recusar. Já fala até em filhos – sorri com a mesma doçura dela. Instantaneamente vi sua máscara se desfazer.

– E você vai arruinar a carreira dele por causa da sua necessidade infantil de responsabilizá-lo pela perda de sua virgindade?

– Não, Tiffany. Eu não responsabilizo Alex. Ele se reencontrou depois que descobriu seu amor por mim e voltou a sentir necessidade de escrever. Você sabe como funciona: a necessidade impulsiva de colocar para fora seus sentimentos. Escrever com a alma, com a segurança de quem conhece o assunto. Agora ele sabe muito bem como seus personagens se sentem. Alex vai continuar se realizando profissionalmente, a diferença é que agora estarei ao seu lado. Vamos nos casar, nos apoiar, construir a nossa família e seremos felizes, como nunca.

Ela me olhava com raiva e tristeza ao mesmo tempo. Tiffany não rebateria meu argumento. Ela tinha um nível, uma pose de superioridade para manter e não entraria em uma discussão comigo. Pelo menos não naquele momento, nem naquele lugar. Ela reagiria de outra forma e eu já estremecia só de imaginar.

– Charlotte! – meu pai apareceu no alto da escada.

Ele me olhou de uma maneira estranha. Merda! E se ele não aceitou o meu relacionamento com Alex? E se Alex recuou por causa de toda pressão feita pelo meu pai? Fiquei nervosa, mas mantive a postura de tranquilidade para não alertar Tiffany sobre meus medos.

– Pai! – sorri com sinceridade.

– Vou deixá-los a sós – ela se retirou sem olhar para trás. Será que procuraria Alex? Olhei para fora e me certifiquei de que ele continuava lá, no mesmo ritmo incansável. Indo e vindo.

Ah, Alex! O que aconteceu?

Senti os braços fortes do meu pai me envolverem com carinho e a sensação de conforto e segurança foi inevitável. Ficamos abraçados, assistindo meu professor nadar sem parar. Suspirei pesadamente.

– Você tem certeza? – meu pai perguntou atrás de mim. Sorri amavelmente. – Ele é bem mais velho do que você.

– Eu o amo, pai – não tive receio de assumir. Com certeza ele já sabia de tudo.

A questão era: até que ponto? O que eles conversaram que causou aquela reação em Alex? O que tinham definido sem a minha presença ou sem me darem o direito de intervir ou opinar?

– Mesmo? – sua voz parecia surpresa.

Virei-me para encará-lo, deixando as questões que só conseguiria resolver com Alex para depois. Era hora da tão fatídica conversa. Não dava mais para evitar.

– Mesmo! – sorri mordendo o lábio e ele retribuiu. Fiquei tão mais relaxada ao vê-lo sorrindo!

– Você bem que poderia ter procurado algo melhor. Alguém mais de acordo. Por que justamente ele?

Meu pai não entendia que não havia ninguém tão de acordo comigo quanto Alex? Era ele! Ninguém mais.

– Sabe como é: não existem muitos Peter disponíveis. Tive que me contentar com o que havia no mercado.

Meu pai sorriu e seus olhos brilharam. Ele não seria contra o meu envolvimento com Alex, tive certeza naquele momento. Também nunca me senti tão decidida e determinada. Foi mais fácil do que esperava. Constatar tal fato me comoveu. Uma felicidade sem tamanho explodia em meu peito. Eu tinha tudo o que queria. Tinha Alex e o seu amor, e um pai que aceitava a minha escolha.

– Tem razão. Ele é um bom homem e vai cuidar muito bem de você. É o mais importante.

– Achei que o mais importante seria ele me amar – meu pai me olhou com intensidade. Posso até jurar ter visto seus olhos mais brilhantes e um leve sorriso em seus lábios.

– E quem não te amaria, Charlotte?


CAPÍTULO 3


“Aceita o conselho dos outros, mas nunca desistas da tua própria opinião.”

William Shakespeare

 

ALEX


Com o corpo exausto e já me sentindo menos tenso, resolvi que era a hora de sair da piscina. Assim que saí avistei Tiffany aguardando por mim do lado de dentro da casa. Respirei fundo. Eu não precisava de mais uma conversa sobre meu relacionamento com Charlotte.

Ou ela seria tão doida quanto Anita e tentaria algo ali mesmo?

Caminhei lentamente arrumando o roupão no corpo, mantendo-me atento a tudo o que ela fazia. Estava cansado demais para passar por outros momentos como os que passei com Anita pouco antes. Mal tinha começado o meu relacionamento oficial com Charlotte e já precisava esconder coisas deste tipo. Eu me via constantemente tenso por ter que evitar situações que pudessem desestabilizá-la.

Charlotte surtaria se imaginasse o que aconteceu em meu quarto.

Incomodada com a minha demora, Tiffany tratou de diminuir a distância entre nós dois. Parecia abalada, apesar de manter sua postura superior e educada. Eu sabia que aquela conversa seria mais uma batalha, e não estava muito disposto a travá-la.

– Deve ser um problema muito grande para fazê-lo passar tanto tempo nadando neste frio – tentou sorrir enquanto abraçava o próprio corpo para tentar se aquecer. Eu podia sentir a angústia que emanava dela.

– Na verdade, trata-se de um problema resolvido. Eu precisava liberar a tensão do meu corpo – Tiffany me analisou e sorriu maliciosamente. Não era o seu normal.

– Tensão?

Sim, eu sabia que ela estava levando para o lado sexual, como se estivesse insinuando que Charlotte não era o suficiente para mim. Preferi ignorar e dar a ela as respostas que buscava.

– Pedi Charlotte em casamento. Conversei com Peter e você deve imaginar que não é nada fácil uma situação como esta. Principalmente sendo ele tão comprometido em manter a... segurança da filha – tive a impressão de ver os olhos dela brilharem. Como se esperasse uma confissão.

– Casamento? Não acha que é muito cedo? Vocês mal se conhecem, nem sabem no que vai dar esta relação – seu rosto entregava o quanto a informação a deixava nervosa.

Ela me encarou e engoliu com dificuldade, como se quisesse ter outra reação, mas estivesse se segurando para se manter serena, amigável.

– Não acho que exista um tempo correto para tomar atitudes como esta. Eu amo a Charlotte e ela me ama, não vejo motivo para esperar.

– Ela ainda é muito nova – suas mãos se fecharam em punho, controlando a raiva. – Você nem... – puxou o ar com força. – Você nem sabe se ela realmente é a mulher que você precisa.

– Por que você e Anita presumem que tudo se resume a sexo? – rebati, perdendo um pouco a paciência.

– Porque eu te conheço, Alex. Sexo é uma parte importante da sua vida. É fundamental.

– Você conhece poucas partes da minha personalidade, Tiffany. Não posso te julgar, o que aconteceu entre a gente realmente foi sexo e apenas isso, além da parte profissional, que não deve nem ser levada em conta em uma conversa como esta – ela recuou visivelmente ofendida. – Isso foi tudo o que eu permiti que você conhecesse a meu respeito. Só para que não restem dúvidas, sexo é realmente importante para mim e é justamente por isso que é maravilhoso com Charlotte. Ela me completa, não apenas na cama, mas em todos os aspectos da minha vida.

– Até ontem ela era virgem – afirmou debochada.

– E mesmo assim conseguiu ser a melhor mulher com quem eu já transei até hoje – eu disse com raiva. Ela me encarou sem acreditar em minha revelação. Puxei o ar com força. – Nem sei por que estou tendo esta conversa com você. Pensei ter deixado clara a nossa situação e imaginei que seria madura o suficiente para entender – vi quando Tiffany recuou com o meu ataque.

– Tudo bem, Alex. Desculpe, eu só... – fez um movimento vago com a mão e soltou o ar dos pulmões com esforço, demonstrando cansaço. – Só tenho medo por você. Não quero que se machuque se jogando de cabeça em um relacionamento que todos conseguem enxergar que não tem chance de dar certo, menos você.

– Tiffany...

– Eu sei. Não vou mais falar sobre esse assunto. Só quero que saiba que estarei aqui, sempre que precisar.

Droga! Ela realmente acreditava naquilo? Acreditava que um dia eu voltaria para os seus braços por me cansar de Charlotte? O que mais eu poderia fazer para desestimulá-la?

– Eu vou casar com Charlotte e tudo vai dar certo.

– Espero que sim. Ela ainda poderá ter o trabalho de conclusão do curso rejeitado por causa do envolvimento de vocês.

– Não acredito que aconteça.

– Anita me disse que você colocou João para orientar a menina. Tomara que minha prima não apronte. Disse a ela que você tinha o direito de ser feliz, mas...

– Não estou preocupado com o que Anita possa fazer. Nesse momento estou mais interessado em tomar um banho quente, trocar de roupa e procurar pela minha namorada. E espero, sinceramente, que a louca da sua prima já tenha saído do meu quarto – ela me encarou surpresa. – Pois é!

Tiffany ficou em silêncio por alguns segundos, absorvendo o que eu tinha dito e eu nem queria saber que tipo de conclusões tiraria.

– Entendo – Tiffany mordeu o lábio inferior, pensativa, apreensiva. – Você acha que é realmente necessário fazer isso? Abrir mão do seu trabalho, seus sonhos...

– Meus sonhos? – ri sem muita vontade. – Não estou abrindo mão de nada, Tiffany! Estou vivendo o que sempre quis. Charlotte é tudo o que sempre desejei para a minha vida. Além do mais, nada vai mudar, continuo sendo o dono da editora, simplesmente vou me dedicar à empresa de outra forma.

– Sei... – seus olhos não expressavam o mesmo que ela dizia.

– Bom, é melhor eu me apressar ou ficarei doente.

– Certo. Vá.

Afastei-me dela, no entanto não me deixei enganar, Tiffany estava contrariada. Eu entendia o seu lado, embora não pudesse me sentir culpado por seus sentimentos. Nunca menti para ela, além do mais, há muito tempo não rolava nada entre a gente. Eu nunca alimentei qualquer esperança de um futuro para nós dois. Um dia todo mundo acaba encontrando a sua outra metade. Eu encontrei a minha. Ela encontraria a dela.

De volta ao meu quarto, certifiquei-me de que Anita não estava entocada em nenhum lugar. Nem sei o que seria capaz de fazer se ainda a encontrasse por lá. Por sorte o quarto estava vazio e eu pude tomar um longo banho em paz.

Levei um bom tempo inventando coisas para fazer, até resolver que estava na hora de encarar os outros. Precisava procurar Charlotte para dizer que estava tudo bem. Contar a meus pais sobre minha decisão de casar, aguentar as palhaçadas de João e Patrício, as recomendações de Peter... encontrar Charlotte... eu não via a hora.

Bom... voltei a ser adolescente.

Ria sozinho no quarto quando uma batida na porta chamou a minha atenção.

– Entre.

Olhei para a porta enquanto calçava meu tênis e já sentindo a tensão voltar, ao imaginar que poderia ser uma das duas malucas querendo me atormentar. Mas vi meu pai abrindo a porta com cuidado e procurando por mim.

– Pai?

– Oi, filho! Podemos conversar?

– Claro! Entre – ele parecia preocupado.

– E então? Você chegou e não quis falar com ninguém. Vi que estava na piscina. Aconteceu alguma coisa? Nem me deixou verificar os seus machucados.

Ponderei sobre o que dizer. Ele era meu amigo, a pessoa em quem eu mais confiava.

– Não foi nada. Só bati a perna e o ombro, mas estou bem.

– Não quer mesmo que eu dê uma olhada?

– Não é necessário, pai. Nem estou sentindo dor. Vou passar uma pomada apenas por causa do hematoma – ele me sondou e balançou a cabeça concordando.

– E o que está te incomodando tanto a ponto de evitar estar com a sua família? – Adriano me conhecia como ninguém. Ele sabia quando eu precisava estar sozinho e quando estava preparado para uma conversa que só poderia acontecer entre pai e filho.

– Bom... antes de qualquer coisa estou surtando com o assédio da Tiffany e da Anita – ele sorriu com orgulho. Qual pai não se orgulharia em saber que seu filho era disputado por duas mulheres lindas? Foi impossível não sorrir de volta.

– Imagino que o fato de você ter escolhido Charlotte não foi muito bem aceito por elas – e eu não poderia imaginar que meu pai não perceberia. Era tão nítido o que eu sentia que até os mais desligados entenderiam.

– Isso. Agora eu tenho dois problemas. E elas estão decididas a me fazer desistir.

– Mas você não vai, não é? – neguei com a cabeça, deixando-o mais satisfeito.

– Pedi Charlotte em casamento – meu pai me encarou sério. Provavelmente tentando entender o porquê de um pedido tão repentino.

– Eu já imaginava que o que havia entre vocês era muito mais do que uma relação entre professor e aluna. Parece que nenhum dos dois conseguiu esconder de ninguém no jantar. Apesar disso, não esperava por esta revelação – meu pai sorriu. Um sorriso genuíno de quem não me repreendia e sim estava interessado pelos meus reais motivos. – Aconteceu alguma coisa? Você não... engravidou a menina, não é?

– Não! – naquele momento me senti um garoto de quinze anos. Acredito que nunca fiquei tão encabulado em toda a minha vida.

Adriano é um pai maravilhoso, sempre conversamos sobre tudo, inclusive sexo. Mas, naquele exato momento, descobri que tal assunto não era um tabu entre nós porque eu nunca antes tinha me interessado por uma mulher como me interessei por Charlotte. A partir daí, tornou-se complicado explicar qualquer coisa relacionada à nossa intimidade.

– Mas então por que...

– Porque eu estou apaixonado, pai. Amo Charlotte Middleton! – levantei e caminhei pelo quarto. A minha sensação era de que tinha deixado de ser um homem de trinta e cinco anos e voltado a ter dezoito. – Você há de convir que nossa relação não é algo corriqueiro, aceito com naturalidade.

– Por que não?

– Porque eu sou o professor dela. Sou mais de dez anos mais velho e o responsável pelo seu trabalho de conclusão de curso, que, diga-se de passagem, foi o que nos aproximou. Também existe o fato de Charlotte estar escrevendo um livro erótico, por sinal maravilhoso! Aliado a tudo isso está o fato de nossa editora ser responsável pelo lançamento do livro que ela está escrevendo e, como sou editor-chefe, nosso envolvimento poderá ser questionado e nosso trabalho desacreditado. Você sabe que nunca investimos em iniciantes. Charlotte sequer publicou algum texto na internet. Nunca se aventurou a testar seu trabalho utilizando uma dessas plataformas da moda. Até isso será questionado.

– Alex, você precisa parar e analisar calmamente os acontecimentos. Antes de começarmos... este casamento repentino é apenas porque você se sente culpado e deseja recompensá-la?

– Não, pai! Eu já falei: amo a Charlotte e não quero ficar longe dela nem por um dia.

– Tudo bem! Então vamos examinar os fatos. Primeiro não existe nenhum problema em você ser mais velho. Sua mãe é mais velha do que eu e ninguém nunca reclamou – sorri. Era verdade, apesar de não aparentar. – Segundo, ser professor da garota pode ser um ponto negativo, mas não será a primeira vez que acontece. Quantos professores você já ouviu falar que se envolveram com uma aluna? – Bom, pensando por este lado, era outra verdade, o que não mudava o fato de ser errado. – Não é o correto no que diz respeito à ética, Alex, mas ela já está se formando. Praticamente terminou o curso, então qual o motivo de tanta preocupação?

– Porque Anita tem muito interesse em fazer todos acreditarem que o trabalho de Charlotte é ruim e que eu o aprovei por ela ser minha namorada.

– Entendo. E você por acaso transou com Anita?

– Não, pai! Pelo amor de Deus!

– Alex, eu só preciso saber. Você transou com muitas mulheres, meu filho, em algum momento tinha que aparecer uma para estragar a sua festa.

– Puta merda!

– João me contou o que você fez. Acredito que esse problema já foi solucionado. Então o que o preocupa?

Encarei-o por alguns segundos. Meu pai tinha razão. Até um dia antes eu não me sentia pressionado. Anita, Tiffany, editora, universidade, tudo tinha ficado para trás. Naquele momento... Peter era o meu maior problema. Ele e a promessa que eu fiz.

– Pai. Eu...

Não sabia nem por onde começar. Merda! Era tão complicado, eu não era uma criança, por que simplesmente não encarava as coisas com maturidade? Até Charlotte eu estava evitando. Por quê?

– Filho, se você não contar, não poderei ajudar – colocou uma mão em meu ombro e me deixei levar pela confiança que tinha nele.

– Conversei com Peter hoje. Disse a ele que amava Charlotte e que queria me casar com ela.

– Ele foi contra?

– Não. Ele falou que respeitaria a decisão dela – meu pai sorriu, parecendo admirado.

– Isso é muito bom!

– Sim, mas... pai, você sabe como Peter é. Ele precisa estar no controle de tudo, inclusive, e principalmente, da filha.

– Sei. Ele a protege muito. Mas se ele não negou...

– Ele quer que ela case virgem – a princípio meu pai apenas me encarou, sem compreender muito bem, à medida que foi entendendo, um sorriso irônico foi tomando conta do seu rosto. Estreitei os olhos e ele gargalhou com vontade.

– Desculpe! Desculpe! E você está incomodado com este fato? Ela quer casar virgem? Por isso que você quer casar logo? – ele não conseguia esconder seu divertimento.

– Pai, eu quero me casar porque amo Charlotte de verdade. Não existe outro motivo – puta merda! Como me expressar sem que ele entendesse tudo errado?

– Então esperar não é exatamente um problema para você.

– Aí está a questão, é exatamente o meu problema.

– Não estou entendendo, Alex. Estou me esforçando, mas não consigo – ele continuava com o sorriso bobo nos lábios, o que me deixava mais ansioso e envergonhado.

– Pai, Peter deixou bem claro que deseja que Charlotte case virgem e isso não estava em nossos planos, eu não podia dizer a ele, então menti e prometi fazer do seu jeito.

– Então vocês têm planos para mudar esta situação.

– Nós transamos ontem – revelei. Era o melhor a ser feito. Meu pai deixou o sorriso bobo e mordeu os lábios olhando-me atentamente.

– Espero sinceramente que ela não fique grávida. Vai ser ainda mais difícil justificar.

– Ela não vai engravidar, pode ficar tranquilo. Nós já planejávamos há algum tempo e acabou acontecendo ontem – respirou aliviado.

– Ontem – ficou pensativo, olhando para a parede enquanto avaliava a situação.

Ah, merda! Como se não bastasse todos os meus momentos infantis, ainda tinha que me sentir uma criança aguardando pelas instruções do pai. Enquanto ele permanecia calado eu ficava cada vez mais ansioso. Até que Adriano se levantou, colocou as mãos nos bolsos e caminhou pelo quarto.

– Vocês terão que esconder a verdade enquanto o casamento não acontece. É o melhor a ser feito, eu acredito. Não é muito correto, nem combina com você este tipo de atitude, porém, vendo por outro ângulo, Peter não vai ficar muito feliz em saber que você se ofereceu para salvar a filha dele e como pagamento levou embora a sua virgindade – encarei meu pai.

Seu sorriso ridiculamente idiota e irônico estava de volta. Puta merda! Será que ele não entendia o quanto me angustiava mentir?

– Ok, Alex! Ok! Não vejo outra saída. Contar a verdade não vai facilitar as coisas. E já que você pretende mesmo casar, e diz que está amando e tudo o mais, não vejo por que não sustentar esta pequena mentira.

– Vai ser uma merda! – desabei na cama. – Ele já não facilitava antes, quando nem desconfiava do nosso relacionamento, agora que estamos juntos de verdade, tenho certeza de que a marcação será mais acirrada. Para piorar, Charlotte morre de medo de desafiar o pai, o que seria ótimo em outra circunstância, nesta significa que não encostarei um dedo nela enquanto ele estiver por perto. Claro que não teremos Peter o tempo todo conosco, principalmente porque, graças a Deus, ele mora longe! Mas será complicado. Charlotte é... Ela é... – como dizer a meu pai que minha namorada era extremamente fogosa e que conseguia sempre me levar ao limite, obrigando-me a esquecer de todas as regras? – Ela é... difícil. Tenho certeza de que não facilitará minha vida.

– Você está sendo excessivamente rígido. Está parecendo um garoto com sua primeira namorada. Não complique as coisas, filho. Não é tão ruim e muito menos tão desesperador como está tentando fazer parecer. Peter não pode saber que vocês dois já dormem juntos. Essa é uma regra que todos os homens da minha geração seguiram – ele sorriu torto. O mesmo sorriso que eu dava. Mal de família, como dizia a minha mãe – No entanto, ninguém nunca deixou de transar por isso. Nem me lembro de quantas paredes escalei para chegar aos quartos das minhas namoradas. No final sempre dava tudo certo. Você é um homem, Alex. Já tem uma vida estabilizada e sabe o que quer. Vai tirar isso de letra. Tenho certeza.

Será? Eu queria muito acreditar, mas algo dentro de mim dizia que não seria moleza coisa nenhuma.


CHARLOTTE


Cheguei à piscina tarde demais. Somente Tiffany caminhava pensativa pela borda, como se algo não estivesse alinhado. Fiz a volta assim que a vi. Era melhor evitar mais um confronto. Meu objetivo era encontrar Alex e não suas ex-namoradas inconformadas.

Passei pela sala, onde Lana e João mexiam num tablet e riam muito, mais ao fundo, minha mãe e minha futura sogra, conversavam confidentes e, pelo olhar que ela me enviou, entendi que já havia sido informada sobre a novidade. Sorri de volta me sentindo um pouco sem jeito, afinal de contas, eu era a aluna e estaria me casando com seu professor.

Claro que, diante da minha família, este era o menor dos problemas. Teoricamente, para qualquer pessoa normal, eu poderia escolher o namorado que quisesse, mas eu escolhi o Alex, um cara mais velho, que iniciou uma relação acadêmica comigo e acabou me ensinando a arte do sexo. Obviamente este detalhe não precisava ser revelado. O que realmente me incomodava naquela história toda não era assumir um namoro, era ter que encarar um casamento.

Não que eu não quisesse uma vida ao lado dele. Lógico que queria, mas um pedido de casamento não significava que teríamos que casar no dia seguinte, e pelo que estava parecendo era o que todos esperavam de nós dois. Porque se não fosse isso o que aquelas duas pensavam, então qual o motivo daquele olhar brilhante cheio de felicidade, típicos de mães que estavam casando seus filhos?

Será que ninguém achava estranho duas pessoas, que até então eram apenas professor e aluna, assumirem um namoro e imediatamente ficarem noivos? Porque eu estava achando.

Tentei desviar a atenção de todos da minha direção. Não estava pronta para conversar sobre coisas que nem eu sabia como deveria reagir. Nem para ser o centro das atenções, além de precisar urgentemente encontrar o meu professor. Parei um pouco na mesa, conferindo dois livros que estavam lá. Hummm! Interessante. Segurei os dois e os levei comigo escada acima, indo em direção ao quarto que eu ocupava.

Assim que cheguei ao segundo andar, comecei a me sentir mais tranquila, no entanto fui interceptada pelo Dr. Frankli. Ele também me olhou cúmplice e sorriu da mesma forma que Alex costumava sorrir.

Alex! Eu precisava tanto vê-lo.

– Charlotte!

Surpresa, eu me vi em seus braços como meu pai costumava fazer. Aquilo estava ficando embaraçoso. Uma mistura de Alex com o meu pai não era uma boa coisa. Não naquele momento.

– Ah, oi!

– Alex me falou do casamento.

– Falou? – sentia-me uma idiota sendo tão monossilábica.

A atitude do meu futuro sogro estava me deixando confusa. Não estava acostumada com tanta proximidade, nem esperava que as pessoas reagissem tão bem àquela ideia.

– Sim. Estou neste momento indo conversar com Peter e com minha esposa. Sinto-me muito feliz por estarmos unindo nossas famílias.

Por um segundo imaginei que uma gota de suor escorreria por minha testa. Fiquei tensa. Inexplicavelmente tensa. Já havia conversado com meu pai e tinha sido incrível. Fácil como piscar. Minha mãe nem se fala, mas pensar em toda a família reunida conversando sobre um casamento que eu nem tinha certeza se queria que acontecesse... quer dizer... Claro que queria, por outro lado, não queria que meu desejo se tornasse uma obrigação, com pressão dos amigos, planejamento das famílias... queria um “Sim! Eu te amo! ”, em um futuro ainda um pouco distante, depois correr para a cabana e...

Ah, a cabana! Este desvio de pensamento me fez recordar que eu estava à procura de Alex e porquê.

– Algum problema?

– Não. Estou procurando Alex.

Sorri sentindo minhas bochechas esquentarem. Meus pensamentos foram incrivelmente pecaminosos e deixar que eles se manifestassem na frente do meu futuro sogro não era uma boa ideia.

– Acabei de deixá-lo no quarto – ele me lançou um olhar intrigante. Como se não pudesse ter me fornecido a informação. Não entendi. – Você vai até lá?

– Acho que sim – respondi confusa com sua reação.

– Bom... – coçou a cabeça e olhou para os lados. – Onde Peter está?

Pisquei algumas vezes sem entender, então a ficha caiu. Puta que pariu! Meu rosto foi ficando quente, a vergonha tingia minhas orelhas e descia pelo meu pescoço. Eu mataria Alex!

– Não sei – a voz arranhava minha garganta. Eu mal conseguia falar. – Estive com ele mais cedo...

– É apenas para o caso de ele te procurar e... Não seria legal se... É... – e a vergonha foi inevitável.

– Tudo bem. Você poderia avisar o Alex que eu estou procurando por ele? Eu... vou arrumar um lugar para ler... ler estes livros.

– Ah, os livros... sei... claro! Bons livros... – puta merda! Dava para ser mais constrangedor?

– Ok! Estou indo... – disparei escada abaixo sem olhar para trás. Precisava ter uma conversa séria com Alex o mais rápido possível.


ALEX


Desci pelos fundos esperando encontrar Charlotte em algum lugar distante dos outros ocupantes da casa. Tinha que contar a ela sobre minha conversa com Peter. Ela precisava saber. Quando entrei na sala, Lana brincava com João no sofá, minha mãe e Mary arrumavam um jarro de flores e conversavam como amigas de infância.

Estava quase alcançando a porta quando minha mãe me deteve.

– Filho! – abraçou-me com força, sem nenhum desespero em sua voz ou na atitude. Era seu abraço de mãe, como ela gostava. Retribuí. – Estava agora mesmo pensando que horas você apareceria.

Seus olhos brilhavam e no rosto estampava o mesmo sorriso bobo do meu pai. Ergui uma sobrancelha, certo de que ela já sabia que eu tinha pedido Charlotte em casamento, porém aguardava ansiosamente para que eu mesmo lhe comunicasse minha decisão.

– Mãe, eu estou bem. Estou procurando Charlotte – olhei para Mary, que sorria discretamente.

– Charlotte? – estreitou os olhos e depois deu um de seus risinhos que me faziam voltar à infância. – Bom... acho que a vi subindo em direção ao quarto com alguns livros nas mãos.

– Certo – olhei para as escadas, sentindo a ansiedade me dominar. No entanto, não poderia simplesmente escapulir e deixá-las sem nenhuma informação. – Mary, eu conversei com Peter mais cedo, não sei se vocês já falaram a respeito ou se Charlotte contou alguma coisa – dei de ombros tentando não parecer grosseiro.

A verdade era que eu estava com pressa e desejava muito encontrar Charlotte, então fingir que não sabia que ela já tinha conhecimento do que estava acontecendo era meio que parecer um imbecil. Mary me olhava atentamente. Seus olhos brilhavam, os da minha mãe também.

– Mary, Charlotte e eu nos amamos – achei que não foi um bom começo, então decidi recomeçar. – Eu e Charlotte... nós... – porque estava sendo tão complicado? – Pode parecer absurdo, mas... – ela me abraçou com força quase ao mesmo tempo que minha mãe. As duas, penduradas em meu pescoço. Eu simplesmente não sabia o que fazer. Realmente não esperava aquela reação.

– O que está acontecendo? – Lana se aproximou e as duas “loucas” finalmente me deixaram, secando as lágrimas dos olhos e rindo como duas crianças.

– Alex e Charlotte vão se casar – minha mãe revelou. Lana riu e eu entendi que ela já sabia. Charlotte contou, com certeza.

– Eu estava falando sobre isso agorinha mesmo com João. Nós estávamos olhando alguns sites escolhendo alguns detalhes.

O quê? Como assim? Charlotte não deveria participar de decisões como aquela? Lana não podia simplesmente assumir as rédeas da situação e ignorar a vontade da pessoa mais interessada. Ou minha namorada teria pedido a ela? Eu precisava falar com Charlotte a respeito. Aliás, precisava encontrá-la. Já sentia falta da sua presença, do seu riso, da sua pele...

– Com licença, pessoas, estou procurando a noiva – tentei encontrar alguma informação no meio daquela confusão, as mulheres olhando o tablet na mão de Lana e admirando o que quer que ela estivesse exibindo.

– Ela acabou de passar correndo por aqui. Acho que foi em direção ao escritório – João Pedro respondeu, já que as outras não me deram a menor atenção.

Agradeci a meu amigo e segui em direção ao escritório. Só de pensar em Charlotte a saudade se tornou insuportável. Quanto tempo já tinha se passado? Não sabia ao certo, porém eu sentia uma vontade irresistível de beijá-la, tocá-la, sentir o cheiro que pertencia unicamente a ela. E sabendo que nada mais estaria entre a gente, a vontade só aumentava.

Parei em frente à porta do escritório, que estava entreaberta, hesitei. Respirei profundamente e abri, louco para colocar minhas mãos em minha futura esposa.


CHARLOTTE


Minha única vontade era me trancar em algum lugar e ficar por lá escondida de todo mundo. Por que Alex teve que contar ao pai sobre o meu problema em relação a sexo? Aliás, até onde ele contou? O que Adriano sabia para ter me impedido de ir até o quarto do filho?

Porra, e onde Alex estava?

Que saudade!

Tudo bem, eu o perdoaria. Afinal de contas estava morta de vontade de tocá-lo, mesmo ainda machucada e sabendo que meu corpo não suportaria muito naquele momento. Eu sentia a falta dele como se nunca tivéssemos vivenciado algo diferente.

Com os livros ainda em mãos, resolvi me trancar no escritório até que ele me encontrasse ou eu tivesse coragem de sair. No entanto, assim que abri a porta, entrando num rompante, dei de cara com a minha amiga Miranda e seu namorado, Patrício, em uma situação nada fácil, para mim, claro!

Surpreendi os dois no maior amasso sobre a mesa do Dr. Frankli, sem se preocuparem com quem poderia entrar. Na verdade, vi muito mais do que amassos. Vi mãos e boca, que não deveriam estar, ou deveriam, em lugares nada decorosos. Nem preciso dizer que corei absurdamente, sentindo a pele esquentar e queimar o suficiente para que meu rosto, minhas orelhas e pescoço ficassem completamente vermelhos.

Minha reação foi cobrir o rosto e me virar em direção a parede enquanto Miranda emitia gritinhos e tentava se recompor.

– Charlotte! – Patrício exclamou surpreso.

– Ai, meu Deus! – Miranda gritou. – Charlotte, eu... nós...

– Eu só quero chegar até a porta. Por favor, Miranda! Só me diga como eu faço para chegar até a porta – não dava mesmo para olhar para minha amiga e seu namorado naquele momento. O que eu vi foi muito além do que poderia ser compartilhado livremente por aí.

Ela começou a rir histericamente enquanto Patrício não sabia como se desculpar. Eu só queria ter a certeza de que conseguiria sair dali sem ver mais nada que não deveria.

– Dois passos para a direita, Charlotte – Miranda me orientava rindo.

– Ok! Saindo agora – abri a porta e, sem olhar para trás, saí de lá, rumando para os fundos da casa.

Depois daquela eu só poderia fazer uma coisa. Encontrar Alex independentemente de qualquer outra situação. Decidi subir pelos fundos e procurá-lo no quarto, mesmo que seu pai estivesse na frente da porta dando uma de defensor da minha virgindade. Era só o que me faltava.


ALEX


Abri a porta do escritório e dei de cara com Patrício no meio das pernas de Miranda. Ela deitada sobre a mesa, olhos fechados, o rosto demonstrando sua excitação, ele com uma mão acariciando suas coxas expostas e a outra apalpando um seio, não exposto, graças a Deus, enquanto roçava os lábios no pescoço da garota.

Puta que pariu! O que eles estavam fazendo? E se alguém entrasse? Poderia ser meu pai, minha mãe ou até mesmo Peter, e eu não queria estar na pele do meu irmão se aquilo acontecesse.

O que mais me intrigou foi que eles nem perceberam a minha presença. Continuaram os amassos sem se importarem com quem os observava. Patrício é um perfeito filho da puta! Expondo a garota daquela forma. Por que não procuravam um quarto?

Pigarreei.

– Puta merda, Alex! – ele saiu de cima da garota, que imediatamente tratou de se ajeitar sem coragem de olhar em minha direção.

– Faz algum tempo que estou assistindo à demonstração pública de afeto entre vocês dois.

Estava louco para rir, mas segurei o máximo que pude. Pela primeira vez, Miranda não me olhava com desejo, ou até mesmo desdém ou arrogância, como vinha fazendo desde que eu e Charlotte começamos a nos encontrar. Aliás, ela nem olhava para mim.

– Filho da puta mentiroso! Não faz nem quinze minutos que Charlotte saiu daqui com a cara vermelha que nem um tomate – a menção do nome dela me fez esquecer da brincadeira. – Que casal mais empata-foda! – Miranda deu um tapa no braço do meu irmão, sem se atrever a me encarar.

– Charlotte esteve aqui? Estou procurando por ela.

– Mal começou o relacionamento e já perdeu a garota de vista? – ele balançou a cabeça em reprovação. – Sei não. Alguém precisa ensinar o irmão mais velho a como entreter sua namorada.

– Patrício! – Miranda o repreendeu. Mas meu irmão não se intimidava facilmente e deu uma de suas risadas estrondosas.

– E alguém terá que ensinar o irmão mais novo a correr de bala. Esqueceu que Peter está aqui? Podia ser ele a surpreendê-los. Eu adoraria ver esse seu risinho cínico e petulante diante da arma dele – imediatamente Patrício recuou. – E você, Miranda, não tem medo do que pode acontecer? Não tiveram nem a decência de trancar a porta. Por que não escolheram o quarto, ou a cabana... – Merda! A cabana. Eu precisava encontrar Charlotte.

– Foi mal, mano. Estávamos de bobeira e acabamos nos empolgando... – ele começou a falar já nervoso com a possibilidade. Miranda me olhou furiosa. Bom, ela me detestava e eu nada podia fazer a esse respeito. Nem queria, a garota era intragável.

– Vou procurar Charlotte – saí do escritório indeciso sobre que direção tomar.

Resolvi então ir até o meu quarto buscar meu celular, que estava carregando enquanto me ocupava em encontrar a minha namorada. Ao passar pela sala, avistei o grupo reunido, exceto meu pai e Peter, que provavelmente estavam resolvendo coisas sobre a comemoração do feriado, ou verificando as estradas e os estragos da tempestade.

Tiffany, sentada no sofá, sem prestar muita atenção ao que Lana falava, foi a única a me notar. Ignorei o seu olhar. Eu precisava encontrar Charlotte ou enlouqueceria.

Subi os degraus a passos largos e corri em direção ao meu quarto. Pegaria o celular e ligaria para ela, seria mais fácil e não precisaria ficar rodando pela casa à sua procura. Assim que abri a porta dei de cara com quem nem poderia imaginar.

Charlotte!

Como minutos podem fazer uma diferença tão grande? Eu estive com ela na noite anterior, nos amamos durante a madrugada e, pela manhã, estive ao seu lado quando voltávamos para casa, apesar disso, ficar afastado dela por algum tempo fez meu corpo reagir de uma maneira estranha.

Eu sabia que estava sentindo sua falta, só que não com tanta intensidade. Quando abri a porta e dei de cara com Charlotte, seus lindos olhos claros e sagazes me observaram, a princípio com espanto, em seguida com admiração, amor... devoção. Sua pele branquinha e coberta das pintinhas que eu tanto amava, ficou rosada, dando a minha namorada um ar de inocência que me fez arder de desejo. E eu tinha certeza de que meus olhos estampavam os mesmos sentimentos.

Estávamos a um passo um do outro, para mim parecia haver um precipício entre nós, eu precisava vencê-lo. Precisava tocá-la para ter certeza de que tudo não havia sido um sonho, uma alucinação. Necessitava dela em meus braços.

Quase que no mesmo instante em que pensei em avançar, ela o fez e, em um átimo, estávamos nos braços um do outro. Sentir seu cheiro, sua pele era como respirar depois de passar algum tempo submerso. Sem esperar por mais nada envolvi seu corpo com meus braços e tomei seus lábios, consumido pela saudade que sugava todas as minhas forças para resistir àquela mulher.

Nunca antes tive tanta certeza do que sentia: eu amava Charlotte Middleton e não suportava a sua ausência.


CAPÍTULO 4


“Eu aprendi que tudo o que precisamos é de uma mão para segurar e um coração para nos entender.”

William Shakespeare

CHARLOTTE


Ah, os lábios de Alex!

Como pude ficar tanto tempo sem senti-los? E seu toque? Como sobrevivi?

Suas mãos percorreram minhas costas e meu corpo frio se aqueceu. Tão rápido quanto, minha mente se esqueceu de tudo o que eu queria dizer, de todas as dúvidas e incertezas, da dor que incomodava minhas costelas, dos arranhões que protestavam com o roçar do tecido grosso, dos músculos doloridos... A única coisa que importava era os lábios dele nos meus.

Sua língua pediu passagem, acariciando tudo pelo caminho, seus lábios macios brincavam com os meus num ritmo lento e sensual. Meu íntimo reagiu, deixando-me pronta e ansiosa. Era sempre assim. Alex não precisava mais do que um olhar para me deixar úmida, nada além de um beijo para me deixar entregue e de apenas um toque para me fazer queimar.

– Que saudade! – murmurou em meus lábios sem interromper nosso beijo.

Cambaleantes, demos passos inseguros até que minhas costas encontraram a parede e ele conseguiu colar seu corpo ao meu, tão excitado quanto eu estava. Imediatamente sua mão desceu para minha coxa, levantando-a, deixando nossos sexos mais próximos.

Senti um leve ardor, lembrança meio irritante da nossa noite de amor, porém, nada me impediria de continuar, mesmo que eu ficasse impossibilitada de andar depois. Pensando assim, me agarrei em seus cabelos, exigindo mais. Intensifiquei nosso beijo. Alex gemeu em resposta. Um gemido que eriçou meus pelos, esquentou minha pele, desconectou meus neurônios e formou um turbilhão dentro de mim.

Ah, Alex!

Foi quando ouvimos alguém pigarrear.

Alex se afastou tão rápido que me deixou atordoada. Quase desci escorregando pela parede com a falta do seu corpo. Era como se eu estivesse solta no ar, perdida no espaço. O mundo se tornou tão amplo que me consumiu. A vertigem me atingiu, escurecendo minhas vistas e amolecendo o meu corpo.

Então eu caí, e depois flutuei e nem assim, nem mesmo percebendo que meu corpo havia evaporado, eu deixei de sentir e desejar o dele. Quando me dei conta, estava nos braços dele novamente. Foi como se tudo voltasse ao seu eixo.

– Charlotte! O que aconteceu? – sua voz preocupada me despertou e eu sorri ainda mole. A sensação era maravilhosa. – O que houve?

– O que ela tem? – oh, merda! Dr. Frankli. Abri os olhos e encarei o rosto do meu futuro sogro. – Charlotte, você está bem?

– Charlotte, fale comigo! – Alex parecia apavorado.

– Estou bem. Eu... acho que... você me soltou rápido demais – meu professor exibiu um sorriso torto, daqueles que faziam tudo dentro de mim tremer e pulsar. Foi discreto, mas lindo! Enquanto seu pai tentava não rir, fracassando descaradamente.

– Tá! Levante-se bem devagar – obedeci sentindo meu rosto esquentar pela vergonha.

– Sua mãe pediu para que eu o avisasse que está tudo pronto. Vamos descer?

Dr. Frankli avisou Alex, mas suas palavras pareciam mais um alerta do que um aviso. Seus olhos, castanhos como os de Patrício, e com a mesma intensidade franca, como os de Lana, mas em nada parecido com Alex, estreitaram-se um pouco, completando a expressão que me deixava irritada, envergonhada e revoltada ao mesmo tempo.

– Vamos.

Alex entendeu o recado e foi obediente. Claro! Não seria o Alex se não reagisse desse jeito. Meu corpo inteiro protestou, dando sinal da urgência que eu tinha de estar com o meu namorado. Havíamos ficado tanto tempo separados e, quando finalmente conseguimos ficar juntos, precisávamos nos afastar outra vez. Era injusto!

Apesar de contrariada, decidi que o melhor a ser feito era segui-los. O que mais eu poderia fazer? Dar uma de garotinha mimada e começar a discutir o meu direito de ficar sozinha com o homem da minha vida? Eu só conseguiria arrumar mais confusão e no final, como sempre acontecia, acabaria cedendo para agradar a alguém.

Uma droga!

No entanto, assim que entendemos que precisávamos sair daquele quarto, Alex segurou a minha mão. Minha mente fervilhou de ideias e sensações estranhas, deliciosas e desejáveis. Eu conhecia a reação do meu corpo ao ser tocada pelo meu professor, reconhecia o calor que me cercava, o palpitar acelerado do meu coração, a ansiedade crescente, mas nada se comparava a ser tocada daquela simples forma, tão trivial que os casais faziam sem nem mesmo perceber, uma rotina estabelecida, mas que, para mim, fazia toda a diferença.

Aquele toque, o “dar as mãos” era o assinar do contrato, a definição do que éramos. Era assumir e estabelecer aquele relacionamento que até então pertencia somente a nós dois. Por este motivo, a certeza de que teríamos uma plateia me deixou tensa. Claro que todos já sabiam, afinal de contas, a história do pedido de casamento já fora oficializada, mesmo assim, seria a nossa primeira aparição em público, agindo como namorados, sem precisar esconder, nem disfarçar, o que sentíamos.

Andando do meu lado enquanto seguíamos seu pai, ele parecia tão tenso quanto eu, porém em nenhum momento pareceu fazer aquilo por obrigação, ou demonstrou vontade de se desvencilhar de mim. Pelo contrário, à medida que nos aproximávamos da sala, seu polegar passou a fazer uma massagem com movimentos circulares, ajudando-me a relaxar.

Ali, de mãos dadas com o homem com quem eu tinha escolhido viver, o mesmo que havia me amado apaixonadamente pela manhã, nada mais importava. Estávamos juntos, independentemente dos obstáculos que precisaríamos enfrentar.

Descemos as escadas, seguimos em direção à piscina e encontramos o grupo reunido em uma varanda grande. Todos atacavam as comidas que estavam dispostas sobre a mesa, enquanto, do lado de fora, meu pai e Johnny cuidavam do churrasco. Lógico que percebi todos os olhares, mesmo com a tentativa de serem discretos, e os sorrisos que ninguém conseguiu esconder. Em todos eles, reconheci o que gostariam de dizer e não ousavam, saber disso me deixou incrivelmente envergonhada.

Alex apertou um pouco mais a minha mão e então eu percebi que havia parado na porta, sem coragem de me aproximar. O porquê nem eu mesma sei explicar. Quase todos que estavam presentes já sabiam que eu não era mais virgem, um grupo um pouco mais reduzido tinha conhecimento de como aquele relacionamento começou, e todos, com exceção das duas megeras que permaneciam ali sem motivo algum, sorriam animados com tudo o que estava acontecendo.

Claro que notei o olhar ousado de Anita para o meu namorado, além do seu sorriso debochado, e também não deixei de perceber o pesar de Tiffany, que não fazia questão alguma de esconder. Mas Alex não olhou para nenhuma das duas, nem me largou, ele apenas me puxou um pouco e me cercou pela cintura, levando-me em direção ao grupo. Assim que paramos, próximos da cadeira onde estava Lana, ele deu um beijo casto em minha cabeça e me largou para puxar a cadeira para mim. Foi apaixonante, além de muito romântico.

João deu uma risadinha baixa e Lana deu uma piscada, aprovando o nosso comportamento. Minha mãe, sentada um pouco mais à frente, ao lado da mãe do meu namorado, sorria como uma boba e, mesmo tentando arduamente não ficar olhando para tudo o que fazíamos, perdia a batalha e acompanhava cada movimento nosso.

Miranda, que voltava para a mesa segurando um prato com diversos tipos de salada, olhou para mim e sorriu. Não consegui evitar o constrangimento ao recordar a cena entre ela e o namorado.

– O que vai querer? – Alex sussurrou sentando-se ao meu lado.

Olhei rapidamente para a minha mãe, que ainda nos observava com atenção. Ela, discretamente, fez um gesto de aprovação com a cabeça. Sorri sem conseguir evitar a vergonha e olhei para meu namorado.

Ele me encarava, seus olhos azuis profundos, cheios de amor, promessas e admiração, transportavam-me para um mundo só nosso, e eu sabia que me jogar naquele oceano, permitindo que ele realizasse tudo o que me propunha, não era o mais adequado para aquele momento, então desviei minha atenção para minhas mãos e senti minha face esquentar.

Alex tocou meu rosto com a ponta dos dedos, minha pele esquentou um pouco mais. Gentilmente, ele retirou meus cabelos que desciam como uma cortina protetora, escondendo o quanto eu estava envergonhada. Sentindo a ansiedade que crescia a cada toque, mordi o lábio, mantendo os olhos baixos. Por que era tão difícil vivenciar em público o que sentíamos? E por que meu corpo incendiava ignorando as pessoas ao nosso redor?

– Charlotte? – sorri timidamente quando ele inclinou um pouco a cabeça buscando o meu olhar.

– Este não é o meu papel? – falei baixinho, tentando manter aquela conversa apenas entre nós dois. Ele arqueou uma sobrancelha sem entender o que eu queria dizer. – Não é a esposa que cuida do marido? – minha voz ficou ainda mais baixa. Ele sorriu amplamente.

– Gosto de cuidar de você – respondeu no mesmo tom e se aproximou, juntando os lábios nos meus, em um beijo casto. O primeiro em público.

E então meu pai apareceu para tornar tudo muito mais difícil.

– Charlotte?

Não sei por que cheguei a acreditar que seria diferente. Que não teríamos problemas, nem a perseguição constante dos nossos familiares, muito menos a obsessão descabida do meu pai pela minha virgindade. Se ele soubesse... o fato é que a nossa realidade estava muito além dos parcos segundos que conseguimos como namorados normais.

Aliás, para um relacionamento que começou da maneira nada normal, como o nosso, esperar que finalmente tudo encontrasse o seu rumo e seguisse um caminho seguro era o mesmo que acreditar em gnomos.

Virei na direção do meu pai. Alex se afastou discretamente, o que me deixou mais aborrecida. Peter não olhava para mim, e sim para Alex, em uma advertência, ou acordo silencioso, que rapidamente foi reconhecido pelo meu namorado. O que aqueles dois tinham conversado para que Alex estivesse tão disposto a concordar com todas aquelas regras malucas?

– Vou buscar alguma coisa para você – meu professor se levantou e saiu de perto de mim.

Ao passar por meu pai, ele apenas acenou com a cabeça, como se estivesse reafirmando o que quer que eles tivessem determinado. Confesso que a frustração fazia parte de mim naquele momento. Não era para ser daquele jeito.

Meu pai sentou no lugar antes ocupado por Alex. Tentei não demonstrar aborrecimento, porém ele me conhecia muito bem para saber que eu continuava sendo a mesma menina de sempre, mimada e revoltada, mas que nunca se rebelava.

– Tudo bem? – olhou-me com firmeza.

– Sim.

Fiquei aguardando pelo que ele diria e sabia que não se tratava de uma conversa qualquer, apesar de estarmos na frente de todos. Meu pai respirou com força.

– Sua mãe me disse que você se machucou – olhei na direção da minha mãe sem disfarçar o quanto me sentia traída. Ela deu de ombros e sorriu como se não tivesse feito nada. – Por que não me procurou?

– Não foi nada, pai. Nem estou sentindo dor – menti descaradamente.

Eu conhecia o meu pai e sabia que ele me forçaria a fazer um milhão de exames, tomar remédios controlados e ficar em repouso absoluto. E nada disso estava nos meus planos.

– Eu estou ótima! – sorri animada para que ele entendesse e me deixasse em paz, obviamente não foi o que aconteceu.

– Depois do almoço quero examiná-la. Mary disse que os hematomas estão feios. Uma queda de cavalo não é brincadeira, estou até pensando em pedir...

– Pai! Eu estou bem. Pelo tempo que já passou, se tivesse acontecido qualquer coisa, eu já estaria morta – ele me olhou a princípio assustado, depois estreitou os olhos e fez uma careta típica de quando pretendia me dar uma bronca.

– Não custa nada deixar seu pai te examinar, filha – revirei os olhos e cruzei os braços na frente do peito perdendo completamente a minha postura de pessoa madura. Lana e João riram.

– Charlotte? – minha mãe me repreendeu.

– Tudo bem, mas fique sabendo que não vou me enfiar em um hospital e só sair de lá depois que meu pai tiver certeza de que nem um fio de cabelo meu está quebrado – rebati sem conseguir controlar minha revolta.

– Charlotte sendo tão Charlotte! – Johnny entrou na varanda carregando uma travessa cheia de carnes. Ouvi um sonoro “hummmmm” vindo de todos os lugares.

– Cale a boca, idiota!

– Charlotte! – minha mãe chamou a minha atenção como sempre fazia e Johnny riu alto.

– Qual o problema em ser examinada pelo seu pai, Charlotte? Há algo que queira esconder? – Anita se intrometeu na conversa, juntando-se ao grupo, na mesa.

Olhei para ela e tive a certeza de que queria matá-la. Quem ela pensava que era? Como podia acreditar que tinha permissão para se intrometer em um assunto de família? Nada do que acontecia ali era da conta dela, então por que não calava a boca e se recolhia à sua insignificância?

Claro que não falei nada disso. Eu apenas sorri com inocência e educação.

– Não gosto de hospitais – ela ficou surpresa, arqueando as sobrancelhas.

– Meio estranho isso, não?

– Não – e encarei minha professora disposta a encerrar o assunto.

– O que foi? – ouvi a voz de Alex atrás de mim e pelo tom eu já sabia que ele estava tenso.

– Nada.

Forcei a minha a sair tranquila. Não queria que ele soubesse dos meus machucados, já que, estranhamente, meu namorado possuía a mesma natureza obsessiva pela minha segurança.

– Charlotte se machucou ontem, quando estava perdida na tempestade – meu pai revelou encarando Alex como se ele fosse o culpado pelo ocorrido. Merda!

– Como? – Alex piscou sem compreender.

Claro que ele não compreenderia. Primeiro: ele me viu sem roupas, mas estava escuro e recente demais para notar qualquer machucado, além do mais, no calor dos acontecimentos, ninguém estava mesmo atento a qualquer detalhe. Segundo: pela manhã, ficamos escondidos debaixo do cobertor, já que estava frio demais e logo depois eu fiz questão de esconder meus ferimentos.

E por que eu fiz isso? Porque não queria que ele me cercasse de cuidados, se culpasse e com isso resistisse a qualquer chance de me ensinar mais um pouco sobre as minhas mais recentes descobertas.

– Charlotte está machucada – meu pai repetiu num tom ainda mais ameaçador.

Que inferno!

– Não estou machucada!

– Charlotte! – Mamãe me repreendeu mais uma vez.

– Eu caí só isso. Qual a novidade?

– É. Qual a novidade? – Johnny brincou e começou a rir. Miranda fez o mesmo e os dois não escaparam do meu olhar mortal.

– Vamos combinar que Charlotte é uma desastrada de carteirinha. Milagre mesmo foi ela não ter se afogado, nem caído em um buraco, nem perdido o dente da frente – minha amiga colaborou com a brincadeira. Meu rosto ficou tão quente que eu podia sentir o calor se expandindo até minhas orelhas. Dava para ser pior?

Dava.

– Você se machucou e não me disse nada?

Alex não entrou no clima de “zoação” dos meus amigos. A voz estava quase tão autoritária quanto a do meu pai.

– Eu apenas caí. Minha pele é muito branca, qualquer quedinha já deixa marcas – olhei para minha mãe em busca de apoio, mas ela não estava disposta a me ajudar. – Alex também se machucou – tentei desviar a atenção de mim. Não deu certo.

– Charlotte, você tinha que me dizer que estava machucada. Você...

Ele parou a tempo de não revelar nada, mas eu sabia o que queria dizer. Eu deixei que transássemos. Droga! Eu podia ter perdido um braço, uma perna, e nem assim abriria mão da nossa primeira noite. Nem que meu pai estivesse do lado de fora, esmurrando e ameaçando derrubar a porta.

Suspirei desistindo de tentar convencê-los.

– Eu estou com fome.

Alex piscou algumas vezes, meio perdido com minha falta de resposta, mesmo assim me passou o prato que estava em sua mão. Olhei sugestivamente para o meu pai, que entendeu o recado.

– Em uma hora, mocinha – ameaçou levantando.

– Alex, não acha estranho Charlotte ter escondido que se machucou? – Anita provocou, deixando-me profundamente irritada.

– Professora Anita, por que você não vai...

– Charlotte! – Alex rosnou baixinho do meu lado, ganhando a minha atenção. Engoli em seco.

– Almoçar – completei olhando diretamente para o meu namorado, que me encarava incomodado. – Se deixar Johnny comer primeiro, corre o risco de não ter o que comer – fiz uma careta na tentativa de sorrir educadamente, o que apenas deixou bem claro o meu sarcasmo.

Ela olhou para Alex, suspirou e levantou. Então soltei o ar que estava preso em meus pulmões. Olhei para o prato e percebi que minha fome tinha ido embora, junto com a minha paciência.

– Está tudo bem, Charlotte?

Aquela voz educada demais, boazinha demais, amiguinha demais... quase me fez explodir. Olhei para o lado e vi Tiffany. Ela não parecia querer me irritar, pelo contrário, demonstrava estar realmente preocupada.

– Tudo sim.

Ela olhou para Alex, que retribuiu o olhar, mas não gostou nadinha do que conseguiu captar, depois voltou a conversar com Patrício e Miranda.

– O que aconteceu? – ele voltou a sua atenção para mim. Peguei o garfo e fingi escolher o que queria comer.

– Você sinceramente acredita que em uma noite como aquela eu não fosse cair? – Alex me analisou por um tempo, tentando pegar qualquer coisa em meu semblante que me entregasse.

– Seu pai disse...

– Meu pai é exagerado – interrompi-o e coloquei um pouco da salada de maionese na boca. – E minha mãe uma linguaruda – ele fez um muxoxo, contendo um pouco da sua ira.

– Por que não me contou?

– Alex, eu estou bem – encarei meu namorado que nada disse, apenas retribuiu o olhar. – Tome – peguei um pedaço da carne e levantei o garfo em sua direção. – Sua mãe disse que você está muito magro, então coma – ele ficou mais alguns segundos me encarando até que desistiu.

– Minha mãe é exagerada – disse ainda de mau humor, mas comeu a carne que ofereci.


ALEX


Eu continuava irritado com a história dos machucados. Sabia que era muito pior do que ela deixava transparecer. Mas como? Nós transamos. Vi seu corpo e não havia nada! Porra! Estava escuro demais para notar machucados recentes, e pela manhã... Droga! Ela me enrolou, desviou a minha atenção, como deixei passar algo tão óbvio? Como me deixei enganar com tanta facilidade?

Agora Peter jamais confiaria em mim outra vez. Era lógico que ele me acusava, afinal de contas me deu a função de salvar a sua filha e, no final de tudo, eu a trouxe machucada, sem contar que tínhamos transado, contrariando a vontade dele.

Puta que pariu!

– Ela vai te enrolar direitinho – Patrício brincou fazendo João rir.

– Você foi violento com ela? – meu amigo sabia que aquilo jamais aconteceria, por isso apenas olhei para ele, que abriu o maior sorriso. – Só estou eliminando as possibilidades.

– Ela caiu, não a ouviu contar?

– Sim, porém Charlotte está se tornando uma grande mentirosa.

Ouvir aquelas palavras me deixou ainda mais nervoso, simplesmente porque eu sabia que eram verdadeiras. No entanto, tinha consciência da minha parcela de culpa. Eu topei aquela loucura, assumimos juntos a ideia de mentir para poupar a nós dois e com isso nos envolvemos em uma teia de mentiras sem fim. Então, como podia julgá-la por ter me escondido a verdade?

– Não deve ter sido nada de mais, Alex – João empurrou meu ombro. Senti uma fraca dor que ainda incomodava. – Se fosse sério, Charlotte não estaria nem andando, o que dirá transando – Patrício riu alto chamando a atenção da minha namorada.

Nossos olhos se encontraram e eu senti a corrente elétrica que nos ligava. Eu queria estar com ela. Queria poder conversar sem a pressão esmagadora do seu pai. Ter algum momento de paz em que só aproveitaria o fato de estar com a mulher que havia conquistado o meu coração. Era tão mais simples quando ninguém sabia.

Segurei um gemido de lamentação. Quando nos casássemos, seria mais fácil.

Puta que pariu! Aos trinta e cinco anos, eu estava apaixonado por uma menina controlada pelo pai, decidido a aceitar todas as regras dele só para ficar com ela, ansioso para ser merecedor deste amor, da confiança que não apenas o seu pai precisava ter em mim, mas também, e principalmente, a dela.

Lamentei mais uma vez ter que respeitar aquela distância imposta por um pai do século dezoito, que ainda acreditava possuir uma filha virgem e disposto a lutar com todas as suas armas para que aquela situação permanecesse até o dia do nosso casamento. Se ele imaginasse...

Puta merda! Eu não queria que ele sequer imaginasse. Queria que confiasse em mim, que acreditasse que eu era o homem certo para a sua filha. Até porque eu não tinha dúvida nenhuma a este respeito. Eu era o homem certo para Charlotte Middleton. Ninguém mais. E se ele precisava desta pequena mentira para acreditar em uma verdade maior, era assim que seria.

– E aí, como foi? – Patrício se aproximou me entregando uma cerveja e mantendo a voz bem baixa.

– Como foi o quê? – abri a garrafa e dei um longo gole. Meu irmão e João se olharam e sorriram confidentes.

– Como foi... – ele fez um gesto com a mão, tentando ser discreto. João riu e eu fiquei indignado.

– Sério mesmo que você está me perguntando sobre minha vida sexual com a minha namorada?

– Claro que não! – ele se fez de ofendido. – Estou te perguntando sobre a sua quase inexistente vida sexual com a sua namorada. Ou recente e ainda bem distante vida sexual com a sua namorada, já que Peter não vai permitir que você encoste um dedo nela até que finalmente estejam casados – João continuou rindo como se aquele assunto fosse muito divertido. – Puta que pariu, Alex! Se Charlotte não fosse muito rica, eu juraria que este foi o maior golpe da história das mulheres na humanidade.

– Que golpe... – respirei fundo contendo a minha raiva. – Você é um idiota, Patrício! E não vá pensando que vai ser fácil para você, porque não vai. Peter está mais presente e atento, então, vá tratando de garantir que Miranda seja realmente sua alma gêmea ou então compre uma cova – João gargalhou.

– Vocês dois parecem duas garotinhas brigando – ele deu um tapa no peito de cada um de nós, afastando-nos. – Agora parem com isso. Ninguém aqui vai ficar sem sexo. Já deu certo até agora, não é mesmo?

Continuei encarando o meu irmão, que me olhava de forma desafiadora. Um perfeito idiota!

– E então, Alex, esse casamento é para valer?

João tentava amenizar o clima estranho que ficou. Resolvi deixar passar, afinal de contas Patrício não era o único responsável pela minha raiva.

– Espero que sim.

Busquei mais uma vez Charlotte pela sala e ela estava sentada, entre Lana e a mãe, que conversavam animadamente com a minha mãe e Miranda. Ela também me olhou e eu entendi o quanto preferia não estar ali, então ficamos nos olhando, mantendo a ansiedade e a vontade de estarmos juntos. Dei um sorriso para animá-la, ela retribuiu com outro tão sem graça quanto o meu.

– E o cara seguro, cheio de planos para a carreira, que se orgulhava de não precisar se curvar para ninguém, foi fisgado pela garotinha inocente – Patrício provocou outra vez. João disfarçou o riso. Preferi não responder. Charlotte suspirou e voltou a olhar para minha irmã.

– Onde estão aquelas duas doidas? – João perguntou pegando em meu braço.

– Estamos com a casa cheia de doidas, de quais você está falando? – esforcei-me para ficar mais tranquilo.

– Tiffany e Anita. O que elas estarão aprontando?

Olhei ao redor e não as encontrei. Era realmente estranho, mas preferi não averiguar. Toda a minha atenção estava voltada para a mulher incrível, que também suspirava de saudade, e que com certeza estava enlouquecendo no meio de tantas pessoas dispostas a decidirem por ela.


CHARLOTTE


Meu pai me examinava com uma cara terrível!

– Minha pele é muito clara...

– Eu sei! – ele rosnou me calando imediatamente. – Agora me conte direitinho o que aconteceu – respirei fundo, sentindo as costelas protestarem.

Contei a ele a minha história, desde o momento em que resolvi montar até a hora em que a tempestade nos atingiu, impedindo-me de voltar. Relatei como caí do cavalo, o sumiço dos meus óculos e das quedas que acabei levando por causa da falta deles, o que explicava os arranhões em meus braços e joelhos. Fiz questão de frisar que tudo, exatamente tudo, aconteceu antes de Alex me encontrar e vi em seus olhos que ele ficou um pouco mais satisfeito com este detalhe.

Também disse que fiz questão de esconder do meu namorado, já que eu sabia que Alex ficaria tão nervoso quanto ele e que, como não estava sentindo nada significativo, preferi manter em segredo.

– Até que nem foi um segredo, já que deixei minha mãe entrar no banheiro e ver como eu estava – dei de ombros enquanto ele ainda me observava.

– São lesões graves – disse secamente. Fiz um esforço imenso para não revirar os olhos. – Vamos precisar de alguns exames.

– E como faremos isso se estamos aqui?

– Vamos para casa amanhã.

– O quê? – não era possível que meu pai estragaria tudo daquela forma. Eu não queria ir embora. Bom... pelo menos não sem Alex.

– Você precisa fazer alguns exames. Tenho certeza de que Alex concorda comigo.

– Pai!

Gemi com a certeza de que Alex me faria entrar no carro e obedecer meu pai. Foi quando alguém bateu na porta. Abaixei a camisa e aguardei. O Dr. Frankli entrou com uma expressão preocupada.

– Adriano – meu pai se adiantou. – Que bom que veio.

– Eu vim saber o que achou – ele disse sem tirar os olhos de mim. – Alex me pediu para verificar – olhou rapidamente para meu pai. – Ele está preocupado – desta vez revirei mesmo os olhos.

– Eu estou bem! Não é possível que ninguém leva em consideração o que eu digo! – o pai do meu professor sorriu e ali estava o sorriso de Alex.

– Posso? – meu pai concordou e ele se aproximou com cuidado. – Onde está machucado?

– Em todos os lugares – Peter respondeu por mim.

– Caí de lado, então estou com um hematoma no braço esquerdo. Os joelhos e algumas partes dos meus braços estão arranhados, nada de absurdo, só pequenos arranhões que, em uma pele tão clara quanto a minha, parecem ferimentos graves.

– Ela está com um hematoma enorme nas costelas, avançando até as costas – ele continuava tentando agravar a situação.

– Dói quando respira? – Dr. Frankli fez a mesma pergunta que meu pai já havia feito. Balancei a cabeça negando. – Sentiu gosto de sangue na boca em algum momento? – continuei respondendo negativamente às perguntas repetitivas. – Deixe eu verificar isso melhor. Pode levantar um pouco a blusa? – olhei para meu pai, que concordou.

A cara do Dr. Frankli não foi muito legal. Imaginei o que ele diria a Alex e quais consequências eu sofreria. Segurei o gemido de protesto com medo de eles o interpretarem como de dor.

– De fato os hematomas estão fortes.

Ele encostou o estetoscópio em minhas costas. Respirei fundo e repeti o processo, facilitando o trabalho dele. Depois senti seus dedos apertando cada costela, buscando por alguma fratura. Doeu, mas não o suficiente para me fazer temer um mal maior.

– Aparentemente não tem costela quebrada, mas precisaremos de alguns exames apenas para confirmar que nenhuma trincou ou algo do tipo – ele disse diretamente para o meu pai, que concordou imediatamente. – Posso ver os machucados do braço? – Puxei a manga e ele olhou os ferimentos de perto. – Com certeza temos alguma coisa para isso. Não parece que vai inflamar, nem que teremos alguma complicação – apalpou meu braço verificando se havia algo errado, nada encontrou além do que eu mesma havia dito.

– Vamos voltar amanhã, Adriano. Prefiro que ela faça logo os exames – meu futuro sogro retirou o estetoscópio do pescoço, demonstrando muita tranquilidade, e colocou uma mão no ombro do meu pai.

– Eu entendo a sua preocupação, se quiser poderemos conseguir uma radiografia por aqui mesmo. Não acredito que seja necessário mais do que isso. Você bateu a cabeça, Charlotte?

– Não – respondi um pouco mais animada.

– Mas sentiu tontura hoje cedo – ele revelou lembrado do episódio no quarto do Alex.

– Sentiu? – meu pai se aproximou curioso.

– Não exatamente – respondi cautelosa. – Alex me largou quando eu não esperava por isso, então caí – meu pai deu um sorriso inocente e falou:

– Quando isso vai deixar de acontecer? – Dr. Frankli riu com discrição. – Espero que Alex esteja preparado para conviver com a sua falta de coordenação, ou então teremos muitos encontros como este – ele continuou sorrindo, deixando-me cada vez mais sem graça. Por que fazia aquilo comigo na frente do pai do meu namorado? Era demais para mim.

– Agora que já se divertiram o suficiente a minha custa, eu posso sair?

– Onde podemos fazer a radiografia? – meu pai se voltou para o Dr. Frankli, esquecendo-se de mim, aproveitei a deixa e escapuli do quarto.

Estava ansiosa para encontrar Alex e sugerir que escapássemos para algum lugar longe de todos. Da escada pude vê-lo, conversando com o irmão e o cunhado. Avaliei se seria muito ruim interrompê-los, se isso geraria mais olhares debochados, se chamaria atenção demais.

Ao alcançar o último degrau da escada, minha futura sogra me envolveu em seus braços delicados justamente quando eu pensei que finalmente poderia estar um pouco mais com Alex. Eu não queria, mas como era o que normalmente fazia, obedeci, com o coração partido e já sentindo a falta dele.

– Charlotte, temos muito que conversar – ela me conduziu até o sofá onde estavam Lana e minha mãe, além de Miranda, que me aguardava na poltrona ao lado.

Lana me deu um sorriso largo e cheio de promessas que me fez suspirar derrotada. Ela já tinha elaborado um plano mirabolante para o casamento perfeito. Minha mãe e a do meu futuro marido se apressaram em compor aquela equipe decidida a fazer da minha festa um acontecimento. Estavam tão empolgadas!

Fui obrigada a ouvir pacientemente tudo o que Dandara e minha mãe falaram sobre como deveria ser a tal festa. Elas queriam algo imponente e marcante, enquanto eu preferia simplesmente trocar as alianças e me trancar no quarto com o noivo sem me preocupar com o que meu pai poderia fazer.

Minha mãe falava da importância de ser uma festa grandiosa. Eu deveria imaginar que jamais conseguiria fazer algo simples e discreto, visto que meu pai era um homem influente e eu sua única filha. Teria que ser uma grande festa para mostrar ao mundo o quanto estávamos felizes.

Suspirei resignada.

Nada ali se parecia com o meu desejo de casamento.

Corri os olhos pela sala. Só conseguia ver Alex de longe. Ele ainda conversava com o irmão e o amigo. Às vezes, parecia tenso, mas então nossos olhares se encontravam, e eu conseguia captar que ele também estava com saudade. Mesmo assim, em nenhum momento ele se atreveu a ficar comigo.

Eu estava morta de saudades, louquinha para continuarmos de onde paramos. Elas falavam sem parar, sugerindo coisas, discutindo sobre cores, espaços, igrejas, e eu só conseguia me desligar quando as imagens de Alex fazendo amor comigo preenchiam a minha mente. Então eu me esforçava para não fechar os olhos e suspirar.

Devo confessar que usar jeans não era nada agradável. Eu estava assada e úmida por causa da excitação, e, para minha tristeza, não havia nenhuma possibilidade de trocar por uma saia, já que meus joelhos estavam esfolados e eu desejava escondê-los o máximo possível dos olhos do Alex.

– E então? – Lana colocou uma mão em minha coxa, e eu me vi forçada a deixar as lembranças e voltar à realidade.

– Então o quê? – ela riu parecendo não acreditar.

– Não é possível que não esteja interessada em sua festa de casamento, Charlotte!

– Estou – mas minha falta de empolgação alertou a todas.

– Algum problema, filha?

– Não – minha mãe fez aquela cara que ela sempre fazia quando sabia que não estava nada bem. – Na verdade... – olhei para Dandara, que aguardava sentada no sofá da frente. – Eu e Alex ainda não conversamos sobre isso. Eu... não pensei ainda sobre como será.

– Todas as garotas sonham e idealizam o seu casamento antes mesmo de encontrarem o noivo – Dandara brincou. – Como você imaginava que seria? – olhei para Miranda e ela mordeu o lábio entendendo a enrascada em que eu me metera.

– Nunca me imaginei casando – revelei. – Mas ainda temos tempo, não é? – elas se entreolharam. – Quer dizer... o pedido foi feito hoje e, levando-se em consideração que mal começamos a namorar, eu posso esperar um bom tempo para começar a pensar no assunto.

– Ah! Charlotte... – Lana começou. Ela falava com tanto cuidado que fiquei com medo do que viria. – Alex disse que seria logo – encarei minha cunhada absorvendo a informação.

– Mas não um logo imediato – ri tentando desfazer o clima. As caras delas revelavam que não era bem isso o que esperavam.

Puta que pariu! O que estava acontecendo? Eu realmente precisava conseguir falar com Alex, saber o que ele e meu pai conversaram e acertaram e o motivo para ele me manter longe das decisões tomadas. Como assim casaríamos imediatamente? Ele só podia estar brincando.

E se... merda! Alex contou a meu pai. Ele revelou o que aconteceu na cabana e, com certeza, esse foi o motivo para aquela ideia de casamento imediato. Meu pai o estava obrigando a casar, como sempre prometeu fazer.

Merda, merda, merda!

No que eu fui me meter?


CAPÍTULO 5


“Há quem diga que todas as noites são de sonhos. Mas há também quem garanta que nem todas, só as de verão. No fundo, isto não tem muita importância. O que interessa mesmo não é a noite em si, são os sonhos. Sonhos que o homem sonha sempre, em todos os lugares, em todas as épocas do ano, dormindo ou acordado.”

William Shakespeare

 

CHARLOTTE


E em meio a tantas dúvidas, às incertezas que habitavam o meu coração, a saudade absurda que eu sentia dele, mesmo sabendo que meu professor estava ali, ao alcance dos meus olhos, a minha imensa necessidade de tomar o controle da minha vida e a inexplicável necessidade que as pessoas tinham de assumirem-na por mim... o dia foi passando.

As pessoas beberam, comeram e, assim que a noite chegou, juntaram-se na área externa aguardando pelos fogos. Alex ficou do meu lado, sem muita intimidade, já que meu pai fazia questão de nos acompanhar de perto, e eu me sentia a garota de quinze anos que apresenta o primeiro namorado aos pais e precisa ser vigiada. Uma droga! O máximo que conseguimos foi trocar alguns olhares saudosos, e ele se atreveu a massagear minha mão enquanto Tiffany puxava conversa. Acho que foi uma forma de me deixar mais segura.

O que eu queria mesmo era o direito de sair dali com ele, de sentar na grama e conversar sobre tudo o que estava me consumindo. Resolver as pendências e organizar aquela bagunça. Não dava para ser da forma como estava sendo. No entanto, eu nada poderia fazer que não fosse me conformar e aceitar, pelo menos naquele momento. Depois eu pensaria em uma maneira de burlar as regras.

Então jogamos conversa fora e rimos muito das bobagens que Johnny contava. Até Anita estava mais receptiva, conversando com Patrício e tentando se enturmar com Lana. O celular do Alex tocou e ele entrou na casa para atendê-lo livre do barulho que fazíamos. Decidi que não suportaria mais nem um segundo. Aquela era a minha chance.

Por isso aguardei alguns minutos, observando meu pai, para me certificar de que ele não estragaria os meus planos e, assim que me senti segura, saí em direção à casa, decidida a encontrar o meu namorado e termos logo aquela conversa. Mas meu amigo conseguiu me interceptar no caminho.

– Todo mundo já sabe sobre a sua vida, menos eu! – jogou os braços em meus ombros e me puxou para si no exato momento em que Alex olhou em nossa direção, do outro lado da sala. Ele não gostou nadinha do que viu.

– Você está muito ocupado babando o ovo do meu pai – apesar de tentar, não conseguia ser dura com Johnny. Amava o meu amigo.

– Alguém tem que cuidar do padrinho para que sua garotinha possa namorar livremente – sorri abraçando sua cintura, permitindo que ele me levasse para longe, na direção da frente da casa.

– Até parece! Não consegui um minuto a sós com Alex. Parece que todo mundo se empenhou na tarefa de atrapalhar o nosso namoro.

– Noivado – ele me corrigiu de maneira debochada. Suspirei.

– Não é exatamente um noivado, e sim a ideia de casamento. Um dia – completei deixando claro que não concordava com aquela urgência toda.

– Não foi o que eu fiquei sabendo. O padrinho não vai ficar satisfeito com um noivado longo. Você sabe como funciona para ele. Além do mais, essa história repentina está deixando-o muito aflito, então eu acho que logo você estará em um altar.

– E eu acho que esta decisão deveria ser exclusivamente minha. No máximo minha e do Alex – rebati furiosa. Estava tão cansada de sempre aceitar o que escolhiam para mim.

– Charlotte, Alex não parece pensar muito diferente disso. Aliás, pelo que soube, pelo próprio padrinho, a ideia de um casamento para ontem foi do seu noivo.

– Isso porque, com certeza, meu pai o aterrorizou. Vou resolver este problema.

– Não quer se casar? Pensei que estivesse apaixonada – abracei Johnny e encostei meu rosto em seu peito.

– Eu quero. Amo o Alex! Nunca imaginei que teríamos um relacionamento, e que ele corresponderia ao meu amor... Só não quero pular todas as etapas e casar assim, sem nem ao menos termos um tempo para namorar, curtir um pouco o nosso relacionamento... Sei lá! Não estou muito confortável com a forma como as pessoas estão encarando esse casamento – ele me olhou fazendo uma careta engraçada.

– Acho que o padrinho não vai aceitar muito bem esse lance de namorar.

– Ele parece ter aceitado bem.

– Só se foi com você! Comigo ele pegou bem pesado. Praticamente me acusou de deixar a filhinha inocente dele cair nas garras de um homem mais velho, ainda por cima, seu professor. Usou todos os argumentos possíveis, inclusive que isso poderia trazer problemas sérios para os dois – estremeci.

– Ele disse isso? – Johnny confirmou, apertando-me com força em seus braços.

– Não se preocupe vai dar tudo certo e em breve eu não poderei mais abraçá-la desse jeito – ele apertou com bastante força me fazendo gritar de dor. – O que foi? – claro que não teria como esconder de Johnny a gravidade dos meus machucados.

– Nada de mais. São os machucados. Ainda doem um pouco, principalmente quando sou agarrada por um urso – tentei sorrir, mas estava doendo para valer. – Está tudo bem, juro! – engoli a dor em minhas costelas tentando não alertar os outros.

– Charlotte, você precisa de cuidados médicos.

– Meu pai e o Dr. Frankli já me examinaram. Vamos fazer alguns exames amanhã.

– Droga! – ele passou a mão pelos cabelos negros. – E mesmo ferida o Alex te comeu?

– Johnny! – dei um tapa no ombro do meu amigo que começou a rir.

– Mas é a pura verdade! Ele poderia ter te liberado, né? Você está machucada.

– Cale a boca! Quem disse que eu queria ser liberada? Quer saber? Vá à merda!

– Ele vai casar com você. Eu nem acredito que em pleno século vinte e um, as pessoas ainda se casam porque comeram alguém. Esse Alex é mesmo um idiota. Primeiro aceita dar aulas de sexo...

– Para, Johnny! – apesar de furiosa foi impossível conter o riso.

– Charlotte, pense um pouco. Ele levou um tempão para se decidir a fazer sexo com você. Finalmente te comeu ontem e já quer casar amanhã? Só pode ser um mané mesmo!

– Você é um mané! E pare de falar assim do meu namorado – ele me puxou com cuidado, abraçando-me sem me apertar.

– Sabe o que significa casamento? É dormir junto sem transar, engordar por causa dos filhos, discutir por causa das mínimas merdas. Caralho! Ele poderia muito bem ficar mais uns dois anos te ensinando a trepar e só depois desse tempo estragar tudo casando.

– Ok! Já deu! Se você continuar, vou pedir ao Alex te dar umas porradas –afastei-me do meu amigo decidida a encerrar a conversa.

– Ah, isso eu pago para ver – ele deu um soco na própria mão rindo ameaçadoramente. – Você pode mandá-lo ter uma conversinha comigo. Quem sabe não consigo ensinar àquele imbecil uma forma mais prazerosa de viver.

– Vou embora. Fui – dei as costas, porém ele me segurou rindo.

– Ok! Ok! Ele te faz feliz, devo admitir. Também foi muito corajoso enfrentando aquele temporal só para te comer – gargalhou.

– Para, Johnny! Ao menos ele foi mais homem do que você.

– Claro, eu não tinha nenhum interesse em...

– Atrapalho?

Alex apareceu do nada pegando-nos de surpresa.

Estávamos na frente da casa, encostados no corrimão da escada que dava acesso à porta principal, e Alex chegou por fora, parando no primeiro degrau. Johnny não se intimidou, enquanto eu fiquei sem reação. Alex estava bem perto de nós. Próximo o suficiente para ouvir a nossa conversa indecorosa. Ele olhava diretamente para meu amigo. Suas mãos estavam no bolso, seu sorriso aparentemente tranquilo, mas eu sabia muito bem que não era a realidade.

– Não! Estou aproveitando da Charlotte enquanto ela ainda não é uma mulher casada.

Johnny me envolveu com seus braços impedindo que Alex me alcançasse. Quase esbofeteei meu amigo. Só não o fiz para não chamar a atenção dos outros. Ele não fazia por mal, apenas gostava de irritar o meu namorado e realmente se divertia fazendo isso, porém eu não queria forçar demais, além de não gostar que eles se provocassem.

Era pedir muito que eles fossem amigos?

– Seu tempo realmente é bastante curto, Johnny – meu namorado subiu os poucos degraus que nos separavam. – Eu e Charlotte vamos nos casar o mais rápido possível – sem demonstrar sua raiva, estendeu o braço e me puxou para si. Johnny não se opôs. Ainda bem.

Estar nos braços de Alex era como estar de volta ao meu universo. Encostei meu rosto em seu peito e aspirei seu cheirinho gostoso. Era tão... Alex! Ele beijou o alto da minha cabeça e acariciou minhas costas protetoramente. Rapidamente relaxei, esquecendo a tensão que vivi o dia inteiro.

– Calma porque ela está machucada – puta que pariu! Por que Johnny tinha que abrir sua boca grande?

– Você disse que estava bem – rapidamente Alex mudou de humor, encarando-me com intensidade.

– São só alguns arranhões – olhei sugestivamente para o meu amigo, que não ficou muito satisfeito.

Será que ninguém entendia que eu tinha planos para aquela noite e que não queria abrir mão deles?

– O que realmente aconteceu? Seu pai achou o quê? Meu pai disse que vocês cuidariam disso amanhã, então pensei que não era mesmo nada grave – oh, droga!

– Alex!

– Charlotte! Por que você não me disse? Eu... – ele olhou para Johnny e desistiu de dizer o que pretendia. – Por que não me falou ontem quando eu te achei?

– Não é nada de mais, apenas alguns arranhões! Você homens se assustam com qualquer bobagem.

– Lana disse que não estava nada bonito e você continua insistindo que são “só alguns arranhões” – Lana era outra linguaruda que estragaria minha noite. – Droga, Charlotte!

– Acho melhor deixar os pombinhos sozinhos porque não quero presenciar uma briga de casal. Prefiro saborear minha cerveja e assistir aos fogos, com licença – meu amigo sempre se esquivava quando eu precisava dele para desviar a atenção de mim.

– Charlotte...

– Alex, não fique nervoso. Eu estou bem! Seu pai e o meu estão cuidando de mim. Se fosse algo grave eles não me deixariam levantar da cama – abracei-o e desta vez busquei seus lábios. – Senti a sua falta – ele foi relaxando aos poucos. Estava dando certo. Beijei sua boca devagar permitindo que ele me saboreasse aos poucos. – Queria poder voltar à cabana – sussurrei e mordi seu lábio inferior. Ele gemeu baixinho, um misto de saudade, desejo e angústia, que fez com que minha libido começasse a se manifestar.

– Seu pai não vai tirar os olhos de nós dois – sua mão subiu por minhas costas alcançando minha nuca e me prendendo. Minhas pernas fraquejaram.

– Nós conseguimos burlar a vigilância dele outras vezes. Não será diferente agora – sorri tentando ser convincente. Alex fez uma careta de desagrado.

– É diferente agora, Charlotte! – eu não estava gostando nadinha daquela conversa.

– Não precisa ser – rebati sentindo meu lado mimado e revoltado se manifestar. Alex me afastou um pouco pelos ombros, olhando-me nos olhos para deixar claro o que pensava.

– Preciso que seu pai confie em mim.

Fiz um muxoxo e ele sorriu. Lindo demais! Aqueles lábios se abrindo preguiçosamente, escorrendo para o lado realmente roubavam toda a minha capacidade de raciocínio.

– Não posso simplesmente decidir casar com você, impor a minha presença e quebrar todas as regras. Quero fazer tudo da forma certa.

– O que implica um longo período sem sexo – ele ficou sério, piscou algumas vezes e coçou a testa.

– Não um longo tempo.

– Se seguirmos as regras do meu pai, você não vai conseguir encostar um dedo sequer em mim. E eu quero muito mais do que seus dedos – ele me encarou, mordeu o lábio e depois sorriu.

– Você é minha mulher, Charlotte, e ninguém vai mudar isso. Nem mesmo o seu pai – suas mãos voltaram para a minha cintura, desta vez com uma energia renovada, com uma intensidade diferente e um desejo latente. Senti meu sangue ferver.

– Pensei que eu fosse a sua menina – sussurrei me aproximando mais. Alex umedeceu os lábios, os olhos vidrados em minha boca.

– E você é. A minha menina linda! Deliciosa! – sua voz estava mais grave e nossos corpos mais próximos. – Mas preciso fazer com seu pai confie em mim.

– Não deveria ser problema estar com o meu professor – provoquei colando meu corpo ao dele, sentindo o seu calor. – Ou você não é mais meu professor? – aticei. Alex puxou minha cabeça para trás e mordiscou meu pescoço.

– Ah, Charlotte! Claro que sou! Ainda tenho tantas coisas para te ensinar.

– E eu quero muito aprender – fechei os olhos me entregando ao momento.

– Sim. Você é uma aluna aplicada, vai aprender direitinho tudo o que eu ainda quero te mostrar.

– Tudinho – provoquei.

– Tudinho – ele repetiu com um gemido delicioso. – Não vou deixar passar nada.

– E eu vou aproveitar muito – todas as minhas células se agitavam, ferviam e pulsavam.

– Tenho certeza de que teremos aproveitamento máximo. Você é excelente. Minha melhor aluna!

– Melhor e a mais ansiosa por novas aulas – ele me beijou com prazer.

Pela forma como seus lábios se moviam nos meus, pelo avanço da sua língua em minha boca, assim como a avidez de suas mãos em meu corpo, eu podia sentir que Alex ardia de desejo. E eu? Ah! Eu nem sabia descrever o que estava sentindo depois de ouvir tantas promessas.

– Vamos soltar os fogos – a voz de meu pai quase me fez gritar. Alex se afastou, mas desta vez me manteve em seus braços. O que foi ótimo, pois, do contrário, eu realmente teria caído.

– Peter! – Alex pigarreou tentando melhorar a voz.

– Vocês poderiam ser mais discretos. Além do mais, não acho correto... – ele olhava de maneira dura para Alex. Merda!

– Pai...

– Nós vamos nos casar, Peter. Que mal há em nos abraçarmos?

– Era bem mais do que um abraço – meu pai não levantava a voz, nem demonstrava abertamente a raiva que era perceptível na maneira como repreendia Alex, que por sua vez queria rebater, porém acabava concordando com as babaquices dele.

– Somos namorados, Peter, como quer que nos comportemos? Casais se beijam, se abraçam... – ele se perdeu na continuação. Foi neste instante que entendi que havia algo mais naquela história toda. – Compreendo a sua preocupação, no entanto nós não estávamos fazendo nada de mais. Estamos em um local aberto, disponível para todos, pelo amor de Deus!

– Eu não entendo – rebati. – Estamos no século vinte e um, pai. Pare de ser tão antiquado. Além do mais, Alex tem razão, se nós vamos nos casar, não há necessidade de uma marcação tão cerrada.

Encarei meu pai, que me encarou de volta. Eu nem tinha certeza de que deveria usar o casamento como argumento, visto que não estava de acordo com os termos. No entanto, apesar da sua irritação, ele me fitou por algum tempo, depois suspirou derrotado.

– Eu ainda não me adaptei ao século vinte e um, e preciso me acostumar a vocês dois. Enquanto isso não acontece, evitem este tipo de demonstração desnecessária – olhou diretamente para Alex, que concordou e beijou o alto da minha cabeça.

– Pai!

– Estou concordando com tudo, Charlotte. Fazendo todas as suas vontades. Não force a barra senão eu a tranco num convento e você só sai de lá no dia do casamento.

Ai, que ódio! Precisava ser tão cabeça dura, um ogro do século passado?

– Vamos ver os fogos – Alex não queria prolongar o confronto e por isso me indicou o caminho sem se encostar muito. Merda!

– Não entendo por que fogos – eu disse tentando não pensar na raiva que estava sentindo.

– Porque nós gostamos – Alex falou com a voz mansa, como se quisesse me tranquilizar. – Quando éramos pequenos, amávamos o fim do ano porque podíamos ver os fogos, então meus pais criaram mais uma data para soltá-los.

– Você tem bons pais, Alex – meu pai participou da conversa. Olhei para ele, que entrou na sala visivelmente mais relaxado. – Bons pais criam bons filhos – Alex sorriu. Era tudo o que ele queria, ganhar a confiança do meu pai.

– Nem sempre – eu disse com má vontade e meu pai, ao invés de ficar irritado, deu risada.

– Apesar de concordar, não vou dar o seu exemplo, Charlotte. Você só é mimada, e isso é culpa da sua mãe – Alex riu.

– Pai! – eles riram e eu detestei.

O restante da noite foi relativamente tranquilo. Correu tudo be,m tirando o fato de meu pai realmente nos vigiar de perto e de Alex cumprir sua promessa de que pegaria leve, ou não pegaria, já que nem encostava em mim, apesar de permanecer do meu lado.

O único problema era justamente o que eu imaginava. Eu precisava de Alex. Precisava de seu toque, seus beijos e todas as promessas que ele havia feito antes de meu pai estragar tudo. Sem contar que ainda precisávamos ter a tal conversa que definiria o rumo de nossas vidas.

No quarto, após me certificar de que meu pai realmente fora dormir e implorar a minha mãe para que conversasse com ele sobre os limites rígidos impostos, sentei para conversar com Miranda, embora ainda me sentisse péssima por ter dado aquele flagra.

– Preciso dar um jeito de passar a noite com Patrício – ela tirava da mala um conjunto de calcinha e sutiã absurdamente sexy. Meu rosto esquentou na mesma hora e eu sabia que atingira o limite máximo do constrangimento. – O que acha?

– Tudo fica bem em você, Miranda – deitei na cama e olhei para o teto.

O que eu faria? Como conseguiria sobreviver a um namoro com o homem da minha vida, tendo que enfrentar a vigilância do meu pai? Logo quando eu finalmente tinha alcançado o que tanto desejava, as coisas pareciam dar errado. Era uma grande droga! Se eu soubesse, teria mantido tudo em segredo. Esconderia de tudo e de todos o meu relacionamento com Alex, pelo menos teria mais algumas aulas e desfrutaria um pouco mais do que ele tinha para me ensinar.

– Patrício gosta de lingerie pequena. Quero satisfazer todas as suas vontades hoje – meu rosto continuava vermelho e quente, tal como a calcinha que ela levantava para me mostrar. Só de me lembrar daqueles dois... Precisava ser algo tão explícito?

– Como você vai fazer para escapar? Meu pai tá insuportável com toda aquela cobrança e perseguição.

– Sim. Em cima de você. Graças a Deus!

– Que horror, Miranda! – ela riu.

– Charlotte, o padrinho tem um sono de pedra. Nem vai perceber que não dormimos no quarto. É só você esperar o momento certo e correr para o quarto do seu professor. Ou ele vir para cá.

Imediatamente levantei o corpo, ficando sentada na cama e encarando a minha amiga. Valeria a pena arriscar? Mordi os lábios sentindo a dúvida me invadir e a hesitação diminuir a cada segundo. A vontade de ficar com Alex era mais forte do que qualquer outro sentimento.

– Vá se arrumando enquanto não chega a hora, boba! – ela piscou e entrou no banheiro.

Demorei alguns segundos sentada, ponderando e pensando que, se meu pai realmente resolvesse me procurar, pelo menos colocaria um fim naquela idiotice de guardar a minha virgindade. Já que ela nem existia mais. Ele ficaria nervoso, faria um terrível escândalo, mas no final de tudo, entenderia que eu amava Alex, apesar de eu ter certeza de que ele me faria casar no dia seguinte.

E estávamos nós de volta ao mesmo ponto: o casamento.

Quando Miranda saiu do banho, eu já estava com o meu plano todo arquitetado, a lingerie mínima sobre a cama além de um roupão gigante que me ajudaria a esconder os hematomas. Era só pedir para Alex manter a luz apagada por causa do meu pai e pronto, eu teria uma noite incrível nos braços dele.


ALEX


Após o banho vesti uma calça de moletom e uma camisa de algodão. A noite estava incrivelmente fria. Desforrei a cama, deitei e apaguei o abajur que ficava ao lado. Olhei a janela, salpicada pelas gotas da chuva que havia voltado a cair sem a mesma força da noite anterior.

Então meu pensamento vagou para a mulher que me consumia diariamente: Charlotte. Suspirei pesadamente. O que eu faria com Charlotte? Como conseguiria equilibrar o fogo dela, o meu desejo e as regras de Peter? Ficar longe estava fora de questão. Era inadmissível! Eu a amava, queria casar com ela, queria uma vida ao seu lado, só que, para alcançar tudo isso, precisava ganhar a confiança do pai dela antes.

Claro que não poderia ficar sem tocá-la, sem sentir seu gosto, seu cheiro, sem tê-la em minha cama, no entanto, precisávamos ser extremamente cuidadosos. Eu não podia vacilar com Peter, ou ele nunca mais confiaria em mim.

Eu tinha três opções: viver perigosamente, tendo Charlotte apenas quando conseguíssemos uma brecha na vigilância do pai, o que me fazia pensar no quão desgastante seria, sem contar que era impossível prever quanto tempo teríamos disponível. É... esta não era uma boa opção.

A segunda seria aceitar realmente as regras do Peter e manter Charlotte sob controle, sem intencionar levá-la para cama, pelo menos não enquanto não estivéssemos casados. Esta era realmente a opção mais sem noção. Impossível não ceder aos encantos da minha namorada. Seria o inferno não poder transar e assisti-la corar da forma como fazia, me olhar com tanto desejo que chegava a me deixar sem ar, beijá-la sentindo o seu corpo entregue. Não. Não havia como aceitar esta opção.

A terceira era a mais coerente. Precisávamos casar logo. Quando Charlotte se tornasse minha mulher, ninguém mais poderia controlar as nossas ações. Seríamos livres. Poderíamos nos beijar sem Peter achar que era demais para a sua mente antiquada, poderia tirar minha esposa da sala e levá-la para o quarto sem que para isso tivéssemos que arquitetar um plano mirabolante. Eu teria Charlotte todos os dias, em meus braços, em minha cama. Poderia fazer amor com ela quando bem quisesse. E seria o paraíso.

Sorri feito um adolescente apaixonado. Porra! Quando poderia imaginar que desejaria tão desesperadamente estar casado com alguém? Quando em minha vida eu pensei que namoraria uma fedelha controlada por um pai linha dura do século dezoito? E quando foi que imaginei que poderia viver sem ela?

Ouvi uma batida tímida na porta e fiquei em alerta. Pensei em ignorar. Muito provavelmente era Tiffany, ou Anita e, com certeza, isso me renderia muitos problemas. Aquelas duas eram um pesadelo. E eu ainda precisava dar um jeito na perseguição da minha ex-colega de trabalho.

No entanto a pessoa do lado de fora foi mais ousada e abriu a porta. Arrependi-me no mesmo instante de não tê-la trancado. O que eu estava pensando quando imaginei que seria melhor assim, para caso Charlotte ousasse aparecer. Caralho! Sentei na cama pronto para expulsá-la do meu quarto.

Ouvi o barulho da chave trancando e imediatamente fiquei tenso. Então ela surgiu. Estava escuro e a princípio não a reconheci, mas era impossível confundi-la com outra pessoa. Seu corpo magro e delicado, seu jeitinho peculiar, seus passos leves. Era ela.

– Charlotte? – sussurrei para o espectro parado diante da cama.

– Oi – sua voz confirmou. – Não esperava por mim?

Engoli em seco. Lógico que eu esperava por ela, mesmo sem acreditar que tivesse coragem. Eu ansiava por ela, mataria e morreria por ela, só não imaginava que Charlotte derrubaria realmente a barreira construída por seu pai e fosse tão ousada. Pelo menos quando ele estava em um quarto próximo ao meu.

– Não está feliz em me ver? – ela avançou. A luz da noite clareou seu corpo. Cabelos claros descendo pelo roupão de seda branco. Ela estava perfeita.

– Claro que estou, mas...

– Mas? – Charlotte deu mais um passo em minha direção e retirou o roupão.

Eu conseguia ver apenas suas formas insinuadas pela pouca luminosidade. Estava quase que completamente exposta. Meu pau se manifestou no mesmo instante. Minha namorada era deliciosa! O corpo magro e pequeno, com tudo no seu devido lugar.

– Seu pai, Charlotte. Ele não vai gostar nadinha.

Puta que pariu! Eu estava deliciosamente excitado. Queria poder senti-la nem que fosse mais uma vez. Escorregar para dentro das suas paredes apertadas e fazê-la gozar pulsando em meu pau. O proibido definitivamente era mais gostoso. Em se tratando de Charlotte, incrivelmente estimulante.

– Ele está dormindo, Alex. Se preferir eu posso ir embora – fez menção de se afastar.

Uma porra que eu permitiria que ela fosse! Não naquele momento. Nem naquela hora. Eu precisava dela em meus braços, de momentos só nossos. Passei o dia ansiando por isso, e correria todos os riscos para tê-la ali, naquele instante. Levantei, puxando-a pelo braço e jogando-a em minha cama.

Instantaneamente ela gemeu. Um gemido de dor, não de prazer, o que me fez recuar no mesmo segundo. Charlotte arfou um pouco e tentou disfarçar procurando meus lábios. Para azar dela, o estrago já estava feito, eu teria que descobrir a extensão dos seus ferimentos.

Alcancei o abajur antes que ela conseguisse me impedir e acendi a luz. Fechei os olhos quando vi o que procurava. Ela estava muito ferida. Hematomas arroxeados se espalhavam em seu braço e se estendiam pelas costelas. Chequei suas pernas e vi os joelhos arranhados. Sentei na cama e respirei fundo.

– O que aconteceu com você? – as palavras saíram por entre os dentes. Não dava para disfarçar minha irritação.

– Você já sabe: caí do cavalo, também escorreguei algumas vezes, e... – olhei em seus olhos com mágoa. Como não reparei antes? Como ela conseguiu esconder?

– E?

– Acho que... – Charlotte desviou os olhos. – Acho que o chão também machucou um pouco as minhas costas, não sei... Alex...

– Droga, Charlotte! Você estava muito machucada e eu... nós...

– Alex, por favor! Sem dramalhões. Não foi nada de mais. Eu sou muito branca, um beliscão de nada me deixa marcada, imagine uma queda, mas amor... – nossos olhos se encontraram. Eu me sentia magoado, não com ela, mas com a situação e a minha falta de sensibilidade.

– Você está muito ferida. Eu...

– Alex, pare! Você não teve culpa de nada, meu amor. Por favor, vamos esquecer isso e continuar! – Charlotte me segurou em seus braços e eu ri sarcástico.

– Continuar, Charlotte? Você está... você está péssima, dolorida, com hematomas por todo o corpo... e eu estou me sentindo culpado pela metade dos seus ferimentos.

– Pare com isso, Alex! Eu caí! Estava chovendo e aquele... aquele animal que você tanto ama me derrubou no chão e depois foi embora sem esperar por mim – voltei a rir ainda muito irritado.

– Você caiu do cavalo, Charlotte. Poderia estar seriamente ferida. Pode ser que suas lesões sejam...

– Pare! – ela apagou a luz e me olhou. – Pronto. Acabou. O que os olhos não veem o coração não sente, não é o que diz o ditado popular? – ri, desta vez, realmente achando graça.

– Deixe de bobagens. Meu pai não me disse que era tão grave assim. Droga, Charlotte! Por que seu pai não a levou imediatamente ao hospital.

– Porque não são realmente graves. São apenas machucados feios, mas se apagarmos as luzes... – sua voz ficou um pouco embargada e eu me perguntei se ele choraria por causa da minha recusa. Puxei o ar me preparando para o confronto. – Não quero médico, quero ficar com você. Sinto sua falta. Preciso de você.

– Não. Você está machucada, Charlotte.

Ela avançou, sentando em meu colo, colando sua pele na minha, se movimentando e arrancando toda a minha capacidade de raciocínio. Um gemido escapou de meus lábios. Claro que a desejava! Como não desejar? Quantas vezes eu pedi por aquele momento? Quantas noites passei sonhando com o dia em que finalmente ela seria minha? E ela estava ali, em minha cama, prontinha para mim. Mas... droga! Eu nem sabia onde poderia tocá-la sem machucá-la ainda mais.

– Charlotte, não. Pare!

– Por favor! Eu preciso de você, Alex. E você prometeu.

– Prometi o quê? – ela roçou os lábios nos meus ao mesmo tempo que seu sexo roçava meu pau, que já implorava por alívio. Droga! Eu queria. Muito. Mas como?

– Continuar sendo o meu professor. Continuar me ensinando – suas mãos corriam por baixo da minha camisa, arranhando minha pele e me estimulando ainda mais.

– Outro dia. Prometo.

Tentei me afastar da tentação, mas ela não deixou, protestando. Resolvi que tirá-la do meu colo e deixá-la na cama seria uma atitude mais eficaz. Charlotte não se deu por vencida prendendo as pernas em minha cintura.

– Alex, por favor! Eu estou aqui agora.

– Toda arrebentada – rosnei sentindo raiva ao lembrar dos machucados ainda tão vivos.

– E excitada – ela rebateu me surpreendendo.

Eu podia ver aquele seu sorrisinho safado se prolongar no rosto perfeito. Lógico que eu sabia que Charlotte estava excitada! Como mais, uma garota tão fogosa quanto ela, poderia estar? Jamais poderia ser diferente e este fato já era o suficiente para me deixar louco. Para me fazer perder a razão.

Tentei negar. Tentei a todo custo me convencer de que eu só pioraria as coisas. Mas suas pernas estavam em minha cintura, seus quadris dançando uma música lenta e excitante, eram um convite real para a perdição. Ela sorria e mordia os lábios. A escuridão não me deixava confirmar, no entanto eu tinha certeza de que seu rosto estava corado... e lindo!

E... merda! Eu estava louco por ela.

– Excitada? – puta merda! Como eu podia ser tão ordinário a ponto de desejar uma garota coberta de hematomas?

– Hum, hum! Muito! – Charlotte levantou os quadris, rebolando em meu sexo. Porra! Ela era muito safada. E gostosa!

– Não, Charlotte – gemi tentando esconder o quanto estava gostando, mas meu inconsciente já estava totalmente no modo “sim”.

– Eu quero tanto – beijou meus lábios com tanta doçura e sensualidade que senti meu membro latejar.

– Porra, Charlotte! Não! Eu vou deixá-la mais machucada.

– Vai, é? – o sorriso travesso e malicioso estava lá. Ah, eu poderia fazer tantas coisas com aquela boca.

– Vou. E se você continuar me provocando será pior.

– Será?

Ela levantou minha camisa. Naquele momento eu me dei conta de que o quarto estava quente. Abafado. Deixei que a camisa caísse no chão sem sair de cima dela. Era pedir demais.

– Escute, Charlotte, não acho que seja uma boa ideia. Eu nem sei onde posso te tocar.

– Em todos os lugares. Eu sou todinha sua – a diaba continuava se movimentando, esfregando-se no meu pau, ronronando como uma gatinha manhosa implorando por carinho. Como resistir?

– Ah! Charlotte, não faz assim, eu... Ah, Charlotte!

Era impossível não gemer sentindo aquele corpo quente, gostoso e sensual se esfregar em mim. E, verdade seja dita, eu estava doido para me enterrar nela.

– Alex! Estou pegando fogo! – suas palavras saíram como uma deliciosa tortura.

– Eu vou te machucar – puta que pariu! Eu não conseguiria resistir.

– Não vai. É só fazer bem devagarzinho – ela se movimentou com cuidado, insinuando o que estava sugerindo.

– Devagar?

Entrei em seu jogo, aceitando e retribuindo os seus movimentos. Incapaz de lutar contra, beijei seu pescoço suavemente e segurei no travesseiro em vez de em qualquer lugar do seu corpo.

– Ah! Sim, Alex. Bem devagar.


CAPÍTULO 6


“O inferno está vazio e todos os demônios estão aqui.”

William Shakespeare

CHARLOTTE


Pensei que Alex não me daria o que eu desejava. Podia até sentir o gosto amargo da rejeição, então, surpreendentemente, ele concordou e rapidamente caiu no meu jogo. Ele me tocou apenas com os lábios e foi tão gostoso que meu sangue ferveu. Era demasiadamente sensual saber que ele me desejava, mas freava seus instintos.

A intensidade dos seus lábios permitia que eu tivesse noção do quanto ele me queria, pois sua pele tocava a minha, em um beijo molhado e demorado, lento e tenso, como se o esforço para se conter exigisse muito dele. Como se fosse impossível resistir a mim.

Tentei ficar bem quieta, apenas sentindo e aproveitando, permitindo que ele tivesse aquele momento, que me saboreasse sem nenhum impedimento. Sua boca desceu lentamente pelo meu pescoço, o hálito quente marcando o caminho, queimando a pele e me fazendo gemer baixinho com a ansiedade e expectativa que a sua lentidão me causava. Ele se alojou em meus seios, provocando-me.

Com os dentes afastou o sutiã, revelando meus seios e liberando-os para sua apreciação. Eu estava completamente úmida, excitada e ansiosa. Queria descobrir um pouco mais do que Alex tinha para me oferecer. Ir além das brincadeiras e da nossa iniciação. Queria conhecer o sexo em toda sua plenitude e queria naquele momento.

Alex cumpria sua palavra. Estava sendo lento e cauteloso. Angustiosamente lento. Deliciosamente lento. Com os dentes, apoderou-se de um mamilo e puxou ligeiramente. Arrepiei por completo em sua boca. Mantendo-os ali, roçou a ponta do bico com a língua, umedecendo-o. Gemi. Era impossível ficar indiferente.

Repetiu no outro seio e depois alternou, um de cada vez, sugando, lambendo, mordendo e me enlouquecendo até o limite. Como era possível que ele conseguisse me deixar quase no ápice apenas com sua boca em meus seios?

Lento, porém implacável, Alex os abandonou, depositando um beijo suave em cada bico já sensível e intumescido, seguiu descendo por minha barriga, seu hálito queimando minha pele, marcando-me em seu percurso de luxúria e prazer, prolongando-se em meu ventre e alcançando... ah! Ele chegou lá. Entre as minhas pernas.

A princípio apenas me acariciou com a face. Roçou a barba baixa, de um dia, na junção entre minhas coxas e meu centro de prazer, depositou beijos suaves pela sua extensão, fazendo-me pensar que o mundo não mais existia. Tudo havia evaporado, desaparecido, ficando apenas eu, Alex e a cama. Afastou a calcinha e então sua língua macia tocou meu sexo suavemente.

Involuntariamente inclinei meu corpo em sua direção. Eu não controlava os meus gestos, não tinha domínio sobre meus atos. Apenas o queria e faria o impossível para tê-lo. Agarrei seus cabelos, suplicando por mais, mais carícias, mais de seus lábios, da sua língua incansável... mais dele. Muito mais.

Decidido a me matar de ansiedade, Alex se afastou, beijando e mordendo minhas coxas. Contorci-me prendendo seus cabelos entre meus dedos.

– Alex!

– Você está muito ansiosa, amor. Preciso ser cuidadoso ou vou te machucar. Controle-se!

– Não quero me controlar. Quero que você perca o controle – explodi em um ataque de desejo e infantilidade.

Ele riu, deixando-me frustrada, e continuou a mordiscar minhas coxas, traçando um caminho tortuosamente demorado. Contorci-me gemendo baixinho toda a minha ansiedade. Tinha certeza de que Alex me olhava, que me torturava ciente de que estava me empurrando ao limite, e se deliciava com sua capacidade de me enlouquecer.

– Quieta, Charlotte! – ordenou com a voz rouca. O rosto ainda entre as minhas pernas, seu hálito chegando até o meu sexo, deixando por lá uma promessa que me atordoava. Gemi baixinho.

Puta merda! Era excitante demais quando ele falava comigo com autoridade. Como se estivesse pedindo que meu corpo incendiasse. E era o que acontecia. Não consegui me controlar e me contorci toda ao senti-lo se aproximando cada vez mais.

– Quietinha! – sussurrou já muito próximo do meu ponto de prazer.

Eu me sentia incapaz de acalmar o meu corpo. Não havia como impedi-lo. Era humanamente impossível.

Alex levantou um pouco, colocou os antebraços em cada uma das minhas coxas, abrindo-as até que eu estivesse completamente exposta, segurou minha cintura com suas mãos e me imobilizou.

Puta. Que. Pariu!

Era estranho, constrangedor, íntimo e... puta merda! Eu estava em chamas.

– Assim está bem melhor.

Não tive tempo de responder, pois naquele mesmo instante, naquela fração de segundo em que eu procurava algum argumento, seus lábios afoitos tocaram meu sexo úmido. Arfei, sentindo-me deliciosamente impotente em sua boca e mãos.

Alex sabia o que fazia. Movimentava-se como um mestre, um conhecedor do assunto, um verdadeiro professor. Seus lábios se abriam e fechavam em sincronia, beijando e chupando de forma inegavelmente perfeita, até para uma quase leiga, como eu.

– Ah, Alex!

De olhos fechados, permiti-me ser apenas sensações. Sentia seus lábios, sua língua ousada e insistente, seus dentes provocadores pressionando minhas terminações nervosas. Ah!... eu não queria gozar daquela maneira. Não depois de ter experimentado a maravilhosa sensação de tê-lo dentro de mim.

Nossas brincadeiras eram ótimas. Esplêndidas. No entanto, eu não queria me satisfazer com elas. Queria ele, todo e completamente cravado dentro de mim. Queria as mesmas sensações da noite anterior. De ser invadida, tocada por todos os lados. Senti-lo se movimentando com determinação. Avançando e recuando sem cessar, indo muito mais além do que sua língua era capaz.

– Alex, não! Pare! Assim não... ah, assim não, amor – eu não conseguia parar de gemer.

Como evitar o prazer que se espalhava em seu corpo? Como desistir de algo tão gostoso e latejante que avança por suas veias, causando alvoroço em suas células? Como se desfazer de um prazer quente que lambe sua pele se apossando de tudo? Como parar a sensação daquela boca habilidosa e incansável?

– Alex, eu quero você, eu quero...

– Goze, Charlotte!

Seu hálito quente foi o sopro que faltava para que meu barco ficasse à deriva. E eu me perdi em gozo, sonhos, sensações e sentimentos, ainda sentindo seus lábios se fechando em meu clitóris e sugando bem devagar, acompanhando meus espasmos.

Um orgasmo, até onde eu entendia, era algo que, apesar de durar poucos segundos, equivalia a um dia inteiro. Uma sensação de satisfação, um formigamento, que podia ser lento ou intenso, geralmente centralizado na região onde ele foi provocado, que normalmente era no sexo. Como enquadrar este conhecimento ao que eu sentia quando Alex me lançava no espaço com suas carícias?

Não havia comparação entre esta definição e o que eu sentia. O meu prazer não era algo concentrado, ou localizado. A bem da verdade, tudo começava no meu sexo, mas era como uma bomba atômica. Todo meu corpo sentia os efeitos. Iniciava naquela região e em seguida todas as células ficavam em alerta máximo. Um tumulto geral e então explodia. Explodia realmente, com chamas que lambiam cada parte da minha pele, explorando todas as terminações nervosas, arrancando de mim qualquer coerência, qualquer equilíbrio, atirando-me no vazio, no nada. Eu sentia um formigamento intenso. Flutuava sentindo o prazer se estender por meu ventre, meus seios, minha garganta. Cegava meus olhos, tampava meus ouvidos, imobilizava minhas pernas e braços, deixando-me completamente entregue.

Esta era a sensação de um orgasmo com Alex.

Nem tive tempo de me recuperar.

Quando abri os olhos encontrei os dele, pairando acima de mim, encarando, aguardando. Delicadamente, ele se curvou ao meu encontro e, quando seus lábios encontraram os meus, senti seu membro pedindo passagem. Eu ainda estava recuperando o controle do meu corpo, as células ainda se reagrupando, a mente desanuviando quando o mar de sensações voltou a me atingir. Bastou entender que ele me invadiria, para que me contorcesse toda. Eu era normal? Não tenho ideia. Só sei que a excitação voltou como uma onda gigantesca afogando qualquer resquício de cansaço.

Ah, Alex!

Retribuí o beijo e permiti que ele entrasse em meu corpo úmido pelo gozo e pela excitação. A calcinha puxada para o lado deixava tudo muito mais excitante. Alex gemeu ao adentrar as minhas paredes apertadas, mesmo com a lubrificação extra. Seus movimentos eram lentos e contidos, o que não me deixou frustrada. Eu precisava desse tempo de recuperação, gemi em resposta a suas investidas, cada vez mais intensas, profundas e gostosas.

Ele se ajeitou entre minhas pernas e se afundou um pouco mais. Gemi alto e me segurei em suas costas, deixando minhas unhas brincarem com sua pele. Ele buscava meus lábios, provava-os, afastava-se e se aprofundava, entrava, parava um pouco buscando minha aceitação e movimentava os quadris num rebolado sensual, depois saía até quase o seu limite, para logo depois reiniciar.

Surpreendentemente, meu corpo reagia como se não tivesse acabado de ter um orgasmo. Ele simplesmente se preparava para mais um, com a mesma intensidade e desejo de minutos antes. Foi estranho, assustador e, ao mesmo tempo, delicioso descobrir esta capacidade peculiar.

Alex continuou se movimentando lentamente, uma deliciosa e atormentadora lentidão. Cada estocada demorava o tempo exato para que cada parte do meu íntimo fosse tocada por seu pênis, que roçava as minhas paredes, encaixando-se com precisão e causando formigamento por todo o meu ventre. Ele gemia baixinho de forma perfeita, fazendo minha mente reagir.

As mãos espalmadas de cada lado do meu corpo, seu quadril indo de encontro ao meu, forçando-me e abandonando-me sem piedade. Ele me excitava não apenas com o seu sexo, mas com seus lábios, que buscavam os meus em beijos sensuais, provocantes, com seus dentes que pressionavam a minha carne, submetendo-me a suas vontades, com sua língua, que me explorava sem compaixão.

E então cada ação se tornou um todo tão completo e prazeroso que roubava de mim qualquer capacidade de concentração. Meu corpo ganhou vida. Meu juízo, ou a falta dele, levava-me a gemer, a implorar por mais, sem me importar com as consequências daquele ato. Eu apenas o queria cada vez mais, profundamente.

Sem pensar duas vezes, quando Alex saiu quase que completamente de dentro de mim e iniciou lentamente sua volta, movimentei-me em sua direção, forçando-o a entrar com vontade e se apossar de mim com mais determinação. Ele segurou na cama com força, impedindo que seu corpo caísse sobre o meu e parou ofegante.

– Porra, Charlotte! – rosnou sensualmente. Meu corpo vibrou.

Nossos olhos se encontraram. Eu queria me afundar naquele azul profundo que me chamava, me dominava e me puxava cada vez mais para o fundo. Para a imensidão do seu mundo, onde só existia o amor, o prazer e o gozo. Sorri provocando, ciente de que o abalava. Alex piscou, ainda imóvel, sua boca entreaberta, a respiração ofegante, as veias dos braços se destacando pelo esforço de manter-se suspenso. Ele era lindo!

Aproveitei sua fragilidade e rebolei. Ok. Era muito cedo para saber a forma exata de dar prazer a um homem experiente como Alex. Precisaria de muitas aulas ainda e esperava que fossem muitas mesmo, mas eu já havia tido experiência de sobra com ele para saber que rebolar era uma maneira de desarmá-lo, torná-lo vulnerável, por isso, com seu sexo dentro de mim, eu me movi e, sem que ele se mexesse, comecei a rebolar de forma a recebê-lo e expulsá-lo.

– Oh, droga! – ele gemeu com força. Vacilando um pouco. – Calma, amor, assim você...

Levantou o corpo, ficando sobre os joelhos, entre as minhas pernas abertas. Suas coxas dobradas passavam por baixo das minhas, levantando meu quadril e escorregando um pouco mais para dentro de mim.

Bem devagar rebolei mais uma vez, sentindo-o forçar meu interior em busca de mais espaço. Suas mãos esqueceram o medo e logo estavam em minha cintura, sem apertar, apenas como um auxílio.

– Ah!... Charlotte, eu não quero te machucar, devagar!

Arqueou as costas em minha direção, curvando-se sobre mim, mas sem me tirar do seu colo. Ele gemia e me deixava agir, com a testa em meu pescoço, os lábios roçando minha pele e as mãos, antes cautelosas, apertando minha cintura para acentuar os movimentos.

– Amor, assim você vai me deixar louco.

E eu me movia forçando sua entrada, rebolando quando nossos corpos se juntavam, deixando que as suas mãos me conduzissem no ritmo desejado. Ele acariciou minha barriga, as pontas dos dedos deslizando em minha pele com cuidado causavam-me espasmos. Fechei os olhos e gemi saboreando a sensação deliciosa. Então senti o caminho que percorriam e arfei em expectativa até que encontraram meu clitóris. A carícia lenta e com a pressão exata para me enlouquecer me fez intensificar o rebolado. Alex se inclinou outra vez, buscando meus lábios.

– Ah, Charlotte! Sua doidinha. Desse jeito eu vou te machucar – passou uma mão por meu pescoço, segurando meu rosto em direção ao seu e me beijou intensamente.

Um beijo feroz, carregado de paixão, que atiçou mais fogo ao meu corpo. Então se deitou sobre mim, seu peso limitava meus movimentos impedindo-me de continuar com a mesma velocidade. O beijo foi perdendo a força e acabou. Ele logo recomeçou, lento e angustiante.

– Eu disse devagar, Charlotte. Não quero piorar seus ferimentos. Seja boazinha e colabore – enquanto falava, distribuía beijos em meu busto e acariciava minha pele, dos seios à cintura, descendo ao quadril e refazendo o percurso. Nossa! Eu estava em brasas.

Tentei desobedecer e forcei meu quadril para cima, ele me segurou com força, limitando meus movimentos. Tudo bem, eu estava sendo uma garota rebelde e no fundo Alex tinha razão, lento também era gostoso e ele já tinha saciado parte do meu desejo, então por que não fazer como ele pedia? Permiti que ele me dominasse e então, satisfeito com a minha submissão, recomeçamos.

– Isso, Charlotte! É assim que eu quero você – sussurrou e se perdeu em mim.

Com movimentos controlados, o corpo deitado sobre o meu, ele me invadia com cuidado, acariciava-me, brincava com meus seios e me deixava em êxtase.

Todas as vezes que avançava, eu o sentia me tocando em todos os pontos, invadindo, forçando e simultaneamente friccionando meu pontinho de prazer que se manifestava, causando a mesma sensação maravilhosa. Em pouco tempo, eu estava pronta. Prestes a me entregar a mais um orgasmo.

Alex continuava lento, gemendo, baixinho como se estivesse saboreando cada segundo. Seus lábios me tocavam, roçavam minha pele, me exploravam. Suas mãos me apertavam, tomavam e dominavam ditando as regras. Seu quadril rebolava num movimento pertencente apenas a Alex, deixando-me mais sensível a cada investida.

Senti-o estremecer, mas tentando se controlar. Eu não queria mais o controle, queria me perder, afundar-me naquele mar de sensações, terminar com aquela tortura.

– Vamos lá – ele sussurrou em meu ouvido, cravando os dentes em meu lóbulo. – Goze comigo! – Como não obedecer?

Alex tinha o controle remoto da minha mente. Bastava uma ordem, um pedido e o meu corpo obedecia. Ele disse: goze comigo. E foi o que eu fiz. Estremecendo e em convulsão nos seus braços, sentindo-o se entregar e me inundar com seu gozo.

– Eu amo você! – ouvi-o dizer, com a voz rouca e apaixonada entrecortada pelo prazer.

– Eu também amo você, Alex! – meu corpo já estava nas nuvens e nem tenho certeza se ele me ouviu dizer ou até mesmo se as palavras realmente saíram de meus lábios.


***


Estávamos deitados na cama dele. Eu, atravessada em seu peito, o rosto colado em seu tórax, ouvindo seus batimentos cardíacos e recebendo as carícias que as pontas dos seus dedos faziam em meus cabelos e costas. Uma das minhas pernas estava sobre suas coxas entrelaçando nossos corpos nus sem nenhum pudor. Ele, deitado de costas, olhos fechados, os braços me envolvendo, os dedos brincando em minha pele e um sorriso enorme nos lábios.

– Você é mesmo maluca, Charlotte Middleton –encolhi-me em seu peito e depositei um beijo em sua pele, invadida por um enorme sentimento de realização.

– Não conseguiria passar esta noite longe de você – murmurei saboreando o gosto da madrugada e os seus encantos. Ele beijou o topo da minha cabeça.

– Vamos passar todas as noites juntos. Não precisava se arriscar tanto, não quero provocar atritos com o seu pai.

– Alex Frankli, eu nunca pensei que você teria tanto medo de alguém! – levantei o rosto para encarar seus olhos, apesar de saber que a escuridão não me permitiria ver muito.

– Não se trata de medo e sim de respeito – ele me encarou sério. – De verdade, Charlotte. No momento não precisamos de mais problemas.

Não foram suas palavras, mas a maneira de dizê-las. Ter conhecimento dos fatos era simples, encarar a realidade olhando em seus olhos era mais complicado. Com aquelas palavras ele me fez enxergar algo que havia muito além daquele quarto ou do nosso amor. Para ficar comigo, Alex assumiu todo o peso das minhas escolhas. Ainda não tinha conseguido digerir todos os acontecimentos, porém sabia que ele não se esquecia deles.

– Desculpe, Alex! Eu nunca imaginei que lhe causaria tantos problemas ao fazer aquela proposta – ele relaxou visivelmente.

– Você não me fez uma proposta, Charlotte, simplesmente me obrigou a aceitar suas condições – ele sorria daquela maneira majestosa que derretia meus ossos e me desequilibrava.

– Eu não te obriguei a nada! Você que me impediu de agir.

– Eu jamais permitiria que você saísse transando com qualquer um que aparecesse pela frente. Que absurdo! – retirou a mão de minhas costas e jogou-a para trás da cabeça. Seus olhos perderam o brilho e meu namorado assumiu uma postura defensiva.

– Graças a Deus! – abracei-o sentindo falta dos seus carinhos. Eu necessitava de Alex, sempre necessitaria. – Pelo menos minhas loucuras serviram para convencê-lo a ficar comigo. Se eu não tivesse agido assim. provavelmente não estaríamos juntos.

Alex voltou a me abraçar, percorrendo minha pele com sua mão espalmada e quente. Era difícil entender como ele conseguia me deixar tão entregue com toques tão simples. Meu desejo era tão forte que muitas vezes nem me deixava raciocinar direito, como estava acontecendo naquele momento.

– Charlotte – seu tom de voz mudou me deixando em estado de alerta. – Eu não aceitei participar disso porque você agiu como uma desequilibrada. Claro que não poderia permitir que fizesse o que pretendia, embora não tenha sido este o meu principal motivo.

– Não? Então...

– Lembra-se daquela noite na boate, quando você bebeu muito e acabou dormindo na minha casa? – afirmei sem emitir nenhum som. Ele continuou me acariciando. – Naquela noite, eu me senti perdido, sem saber o que fazer para você desistir de sua ideia maluca. Nós tínhamos nos beijado e aquele beijo mexeu bastante comigo. Apesar de todos os meus medos e da minha convicção do quão absurdo seria um relacionamento entre nós, eu me peguei pensando naquele beijo durante vários momentos do meu dia – sorri me encolhendo em seus braços. – Naquela noite, você tinha bebido demais, então achei por bem deixá-la dormir em minha casa. Pelo menos teria a certeza de que não sairia aprontando. Você apagou em meus braços e eu a carreguei para meu quarto, aliviado por não precisar pensar mais em toda aquela confusão e, quando estava deitando você na cama, certo de que estava dormindo, eu me deparei com seus olhos abertos me encarando. Nossos rostos estavam muito próximos, seus braços em meu pescoço e você me apertava com força me envolvendo ainda mais...

Ai, droga! O que eu tinha aprontado? Alex passou os dedos em meus cabelos, intensificando a carícia em minha nuca. Na certa, percebeu minha tensão. Ele respirou fundo.

– Você olhava fixamente. A sensação era de que estava desvendando minha alma através dos meus olhos. Então você falou: Alex faça amor comigo! – puta que pariu! – Disse essas palavras sussurrando em meus lábios e sem desviar os olhos dos meus. Foi quando entendi que não teria como escapar, seu pedido foi como um comando para a minha alma, depois daquilo eu não consegui mais me manter afastado. Sabia que não devia e, ao mesmo tempo, tinha certeza de que não conseguiria fugir. Por causa disso inventei aquela história de ajudá-la com algumas aulas e tudo o que você já sabe. No fundo, acredito que tentei me convencer a desistir.

– Por que nunca me falou?

Não conseguia acreditar naquela confissão. Ele nunca me deu nenhuma dica do que realmente tinha se passado pela sua cabeça.

– Charlotte – gemeu incomodado. – Eu menti para você.

– Mentiu?

– Sim. Eu disse que não sabia como você acabou nua, a verdade foi que você se despiu na minha frente, me beijando e implorando para fazermos amor. Puta que pariu, Charlotte! Não tem ideia do quanto precisei me segurar até você finalmente tirar toda a roupa me abraçar e dormir em meus braços.

Se fosse possível cavar um buraco e enfiar minha cara nele e nunca mais sair, eu o faria. Que porra foi aquela? Que droga! Deve ter sido uma cena patética: eu, bêbada, tirando a roupa e implorando para ele me comer. Ai, meu Deus! Por que não fui fulminada por um raio?

– Não fique constrangida porque sua imaginação não será capaz de chegar nem perto do que ocorreu realmente aquela noite – eu queria morrer! – Foi... lindo! Você parecia sóbria e segura do que queria, estava tão... sensual. Linda! Como sempre foi.

– Ah, Deus! Isso é tão embaraçoso, Alex! Por que nunca me contou? Eu fugiria no dia seguinte.

– Exatamente por isso – ele riu – Eu não queria que você fugisse.


***


Senti a maciez dos seus lábios em meu pescoço. Fiquei confusa. Eu estava sonhando ou acordada? Suas mãos quentes desceram em minha barriga me puxando de encontro a sua ereção. Abri os olhos e a claridade ofuscou o quarto. Alex, colado às minhas costas continuava com seus toques e beijos leves.

– Bom dia! – murmurou muito próximo ao meu ouvido com voz rouca de sono e tesão. – Acorde!

– Não quero – sorri. Dormir com Alex era o mesmo que dormir no paraíso.

Ele mordeu levemente meu pescoço e roçou seu membro em minha bunda, revelando suas intenções. Permaneci quieta, sem me mover ou reagir a suas carícias.

– Acorde, linda!

Eu estava deitada sobre um de seus braços, enquanto o outro me envolvia pela cintura explorando meu ventre.

– Não! – repeti manhosa. Ele riu baixinho.

– Não quer acordar? – depositou um beijo cálido em meu ombro, subindo os lábios sedentos até minha orelha. – Ou não quer fazer amor?

Fazer amor. Ah, como essas duas palavrinhas me deixavam em chamas!

– Hum! – gemi sonolenta fingindo me espreguiçar, roçando minha bunda na sua ereção. A mão de Alex se fechou em minha cintura com um pouco mais de pressão e seu corpo se projetou de encontro ao meu.

– “Hum” quer dizer sim?

Esfreguei-me um pouco mais em meu namorado-noivo-futuro marido, o que ainda me deixava tensa, ao sentir sua mão alcançar meu seio se apossando dele. Gemi baixinho.

– Acho que devo encarar este gemido como um sim – sorri largamente. Aquela voz de “Alex louco por uma foda” era simplesmente deliciosa.

– Hum, hum!

– Duas vezes sim? Estou ficando cada vez melhor nisso – mordiscou minha orelha no mesmo instante em que seus dedos tocaram levemente meu sexo. Meu corpo respondeu imediatamente.

– Ah! – gemi mais ousada.

– “Ah” é um “eu adoro isso, Alex”? – ri da forma debochada como ele interpretava minhas reações.

– “Ah” é um “Alex, faça amor comigo!”.

Joguei para ele as mesmas palavras que o fizeram decidir embarcar naquela loucura toda. Alex puxou o ar com força e instantaneamente senti toda a atmosfera mudar.

– Com o maior prazer, aluna! – seus dedos me invadiram testando e estimulando.

Perdi toda a capacidade de brincar. Fiquei entregue, ansiosa e submissa, implorando por mais. Ele beijava e mordia minhas costas, acariciava meus seios e investia seus longos dedos, enquanto roçava sua rigidez em minha bunda incitando a minha imaginação.

Ah, Deus! Eu poderia passar minha vida inteira daquele jeito.

– Quero que me diga se eu te machucar, ok? – falou um pouco mais sério, no entanto seus dedos não abandonaram meu sexo, roçando a minha carne. Era delicioso!

– Alex...

– Apenas diga, Charlotte! Você está coberta de hematomas, então se sentir dor me avise.

– Certo. Tudo o que quiser – gemi sentindo seus dedos me acariciando de uma maneira maravilhosa.

Alex não perdeu muito tempo me estimulando. Já estava totalmente úmida e preparada. Ele abandonou minha intimidade, correndo seus dedos pela minha lubrificação e pegou minha coxa puxando-a para cima do seu quadril. Fiquei totalmente exposta e a sua disposição.

Então ele me penetrou. Ele me invadiu sem força, também sem calma, apenas foi adentrando sem aguardar meu consentimento, roçando minha bunda e escorrendo até a minha feminilidade. Sua mão se fechou com força em meu quadril me posicionando no ângulo desejado.

Ah! Eu podia senti-lo como nunca, minhas paredes se apertaram ao redor do homem que eu amava, desfrutando do seu avanço.

Já totalmente dentro de mim, Alex levantou-se um pouco, ajeitando o braço que estava debaixo de mim, para me dar mais equilíbrio. Passou a mão por meu pescoço e puxou meu rosto de encontro ao seu. Não me beijou, seus lábios entreabertos estavam a menos de um centímetro dos meus.

Sua mão livre avançou, percorrendo-me enquanto capturava meus olhos com os seus, sem me permitir desviá-los, como se quisesse me dizer que eu era dele e que faria o que quisesse comigo.

Puta. Que. Pariu!

Eu realmente queria que ele fizesse o que bem entendesse com o meu corpo.

Quando seus dedos chegaram ao meu ponto de prazer, diminuiu o ritmo, acariciando-me lenta e cuidadosamente. Fechei os olhos perdida nas sensações. Alex estava imóvel, todinho dentro de mim me estimulando apenas com os dedos. Uma situação como aquela era de enlouquecer qualquer pessoa.

– Pronta para a sua primeira aula?

Abri os olhos, despertando do meu transe, seus dedos continuavam me acariciando, experimentando, provocando como só ele sabia fazer. Não encontrei as palavras, consegui apenas mover a cabeça, mesmo com ele segurando meu rosto, indicando que sim.

– Ótimo! – Seus lábios exigiram os meus num beijo forte, quente e rápido.

– Primeira regra. Você pode se entregar aos prazeres, mas nunca fique desatenta, este é um jogo para dois, o que você quer eu também quero. Temos um único objetivo, Charlotte, e trabalharemos juntos para alcançá-lo. Certo?

Pisquei várias vezes, confusa com a mudança dos últimos segundos.

– Certo, Charlotte?

– Ce... certo! – Consegui responder e ele sorriu me atirando no purgatório. Puta merda! Por que ele tinha que sorrir daquele jeito tão sexy?

– Então... eu me enfio em você – lentamente ele saiu de mim e entrou novamente, sem tirar os dedos do meu clitóris. Gemi voltando a fechar os olhos. – Não se perca – advertiu. Oh, droga! – É para viver intensamente a sensação – continuou saindo e entrando sem aumentar o ritmo. – Sem me deixar agir sozinho.

– Alex...

Toda aquela conversa estava me deixando enlouquecida de tanto tesão. Eu não queria nenhuma aula, só queria que ele aumentasse a intensidade de suas investidas e aliviasse o latejar entre minhas pernas.

– Não, Charlotte – falou como um professor. Um legítimo professor de sexo ou fodas extremamente prazerosas. – Agora... todo homem gosta de foder a sua companheira. De investir nela e submetê-la a suas vontades. É gostoso, mas não é tudo. Por isso você precisa saber quando deve e quando não deve agir.

– É muita informação para o meu segundo dia de sexo – ele mordeu meu ombro me fazendo gemer.

– Você quer ou não aprender, gostosinha?

– Gostosinha? – ri sem conseguir me controlar.

Alex estava quase fora de mim quando falei e como reprimenda ele voltou com força total. Gemi ensandecida, de prazer e de dor. Ok, mais de prazer do que de dor. Ou quase nada de dor. Eu estava me acostumando.

– Deliciosa! Gostosa! Fodidamente excitante! O que você quiser, Charlotte Middleton. Fique calada e se concentre em me dar prazer.

– Quanto machismo! – retruquei. Eu estava tão deliciada que desejava que ele concentrasse toda a sua raiva em estocadas iguais a de pouco antes.

– Cala a boca! – e me tomou para um beijo apaixonante. Seus dedos fazendo mais pressão no meio das minhas pernas. – Pronta? – abandonou meus lábios me deixando tonta. – Agora... – reiniciou suas investidas lentas e deliciosas. – Quando eu disser, você ficará quietinha, porque será o que estarei precisando no momento. Também vai rebolar esta bunda gostosa na hora em que eu mandar, entendeu?

– Hum! – gemi deixando-o me dominar com suas regras e ordens quando eu queria apenas que me fizesse gozar.

– Vamos recomeçar – aumentou o ritmo das estocadas. – Fique bem quietinha.

Esforcei-me o máximo possível para me manter imóvel. Alex segurava meu quadril, me mantendo parada, enquanto pegava o compasso adequado, entrando e saindo sem me deixar contestar.

Puta merda! Era muito bom! Tudo bem que rebolar de encontro a ele era uma delícia, mas ficar quieta, enquanto ele me tocava e estocava em seu próprio momento, era de acabar com qualquer resquício de sanidade. Gemi entregue a seus desejos.

– Ah, Charlotte! – ele gemeu em minhas costas. Aquele gemido extasiante, de puro prazer, fez com que todos os pelos do meu corpo se eriçassem.

Ele continuou me levando ao limite por um tempo imensurável enquanto eu lutava para manter meu foco. Era complicado, cansativo e, acima de tudo, revelador e prazeroso. Enquanto eu lutava com todas as forças para me manter focada no que fazíamos, minha mente registrava cada acontecimento, cada sensação, cada toque, cada roçar de seu membro em meu sexo. Eu estava desperta para tudo e cada mínimo detalhe ganhava uma proporção gigantesca. Como sempre Alex estava certo.

Diminuiu o ritmo, suas mãos se tornaram mais urgentes, puxando-me de encontro ao seu corpo. Era a minha deixa. Este é o momento para confessar: eu não tinha ideia do que fazer. Poxa! Eu tinha mesmo pouca, muito pouca, experiência. Sabia a respeito das coisas que já tínhamos feito, porém nem imaginava como fazer para rebolar em uma ereção quando a pessoa estava às minhas costas.

Sim. Eu assisti a inúmeros filmes pornográficos, até porque precisava saber como era o sexo. Depois de Alex, entendi que desperdicei meu tempo. Aquilo não era sexo, pelo menos não um sexo bem feito. O que eu estava fazendo naquele momento com meu namorado era sexo de verdade, e com qualidade.

Respirei fundo sem ter ideia de como agir. Alex, com a mão em minha cintura percebeu minha indecisão e, no mesmo instante, começou a me guiar.

– Para frente e para trás, bem lentamente para que eu não saia de dentro de você – obedeci imediatamente. – Isso! – repeti o movimento duas, três... várias vezes enquanto ele ficava parado atrás de mim, apenas me guiando com as mãos e me assistindo forçar a sua entrada e saída. – Ah, Charlotte! Você é maravilhosa! – e como eu gostava que ele me visse assim. – Agora, amor, para frente movimentando os quadris. Como você faz quando estou em cima. Você vai para frente movimenta só um pouco... Ah, Charlotte! – ele travou os dentes e gemeu me apertando com força. Bom... não precisa de muito para saber como rebolar. Ele falou e eu obedeci. Não tenho culpa se rapidamente aprendi a fazer direitinho. – Puta que pariu! –segurou-me, forçando-me a parar.

– Mas você disse...

– Eu sei. Eu sei – respirou fundo. – Vamos com calma ou termino rápido demais – beijou minhas costas e reiniciou as carícias atordoantes no meio das minhas pernas. – Vamos recomeçar.

As estocadas lentas e profundas me invadiam causando formigamento em meu ventre. Alex beijou meu ombro, meu pescoço e deixou seus dedos brincarem em meus seios. Rapidamente me senti de volta à luta que era tentar me manter atenta ao que fazíamos. Eu queria simplesmente fechar os olhos e deixá-lo me conduzir ao paraíso. No entanto era necessário estar presente de corpo, alma, pensamentos, movimentos, gestos, sentimentos...

Ah, Alex! Quando você vai parar de me deslumbrar?

À medida que ele diminuía suas investidas eu aumentava as minhas, até que meu namorado, mais uma vez, parou para me observar. Fiz o meu melhor e acredito que agradei, pois ele gemia gostosamente, incentivando-me a continuar.

Finalmente conseguimos trabalhar juntos, eu rebolando e ele entrando e saindo, roçando minhas paredes, tocando meus pontos sensíveis e me deixando no auge da excitação. Passei minha mão em suas costas desajeitadamente, já que ele estava atrás de mim. Alex aprovou meu gesto, então desci alcançando seu quadril, sentindo em minha mão o seu movimento de vai e vem.

Quando ele novamente entrou com força, sem hesitação segurei em sua bunda, guiando o meu homem, fazendo-o entrar no ritmo que eu desejava. Alex gemeu forte e se entregou, estocando profundamente e com mais força. Eu estava no meu limite. Ele estava no limite dele, empurrando-me para a beira do abismo, onde eu desejava cair, me jogar.

– Hum, delícia! – sua voz era absurdamente sexy. Como se estivesse no auge do prazer. – Puta que pariu, amor! Você pulsa forte quando está para gozar – oh, Deus! Eu estava à beira do orgasmo, ainda mais depois de ouvi-lo falar daquele jeito. – É tão... ah, amor! Agora...

Então estremeceu deixando-se levar, empurrando-me com ele para o nosso lugar comum, único e soberano, onde o nada existia em perfeita harmonia com o tudo. Onde nada fazia sentido e ao mesmo tempo era completamente lógico. Onde eu me sentia desconectada, solta, flutuando e também perfeitamente abrigada nos braços do homem que eu amava.

O prazer chegou como fogo. Como uma bomba que ao ser acionada explodia entre as minhas pernas, suas chamas atingindo pontos impossíveis de serem alcançados. Eu podia sentir cada célula do meu corpo vibrar no momento em que minha pele era lambida, da maneira mais prazerosa possível, pelo calor.

Alex ainda gemia se espremendo em mim nos últimos segundos do seu orgasmo. Suas mãos ficaram menos urgentes e sua respiração mais pesada. Ele beijou minhas costas, meus ombros. Acariciou meus braços, seios, pernas e bunda. Por fim, saiu de dentro de mim, deixando um imenso vazio.

– Desta vez, você vai ter um problemão. Da forma como gemeu nesses últimos segundos, com certeza seu pai ouviu. Vamos aguardar só o tempo necessário para ele arrombar a porta e atirar em mim.

Virei-me para meu namorado apavorada com suas palavras. Eu tinha feito aquilo mesmo? Quando? Onde? Como? Ele sorriu daquele jeito que... puta merda! Como conseguia?

– Você tentou se manter concentrada, mas falhou nos últimos momentos –encolhi-me envergonhada e ainda assustada.

– Desculpe! Eu...

– Você foi perfeita! – acariciou meus cabelos diminuindo o tom de sua voz e depositando um beijo casto em meus lábios. – Eu te amo! – outro beijo e mais um pouco daquela voz rouca e incrivelmente sexy. – E amo fazer amor com você, até mesmo quando perde o foco – aquele sorriso fazia com que tudo abaixo do meu umbigo formigasse.

– Alex! Eu não perco o foco, eu...

– Perde sim. E fica deliciosa quando acontece. Você me deixa louco de tesão – ele me abraçou passando suas mãos quentes por minhas costas e beijando meu pescoço.

– Amo você, aluna!

– Amo você, professor!


CAPÍTULO 7


“O amor só é amor se não se dobra a obstáculos e não se curva às vicissitudes... é uma marca eterna... que sofre tempestades sem nunca se abalar.”


William Shakespeare


ALEX


Charlotte saiu do banho e eu fiquei mais alguns minutos no chuveiro. Depois da nossa brincadeira, voltei a pensar em seus machucados. Não estavam mais tão assustadores, mesmo assim, eu continuava querendo ter certeza de que ela estava bem, apesar de demonstrar não sentir dor, e que fizesse os tais exames sugeridos pelos nossos pais. Charlotte era teimosa e tinha batido o pé dizendo não ser necessário, mas eu sabia o que ficou acordado, e ela, querendo ou não, passaria parte daquela manhã no hospital.

Fechei os olhos e deixei meus pensamentos seguirem outro curso. Iríamos embora no dia seguinte e eu precisava reorganizar minha vida. Teria um tempo extra, o que não seria problema, já que estava ansioso para escrever, além disso, precisava cuidar da carreira da minha futura esposa, organizar a sua vida, cuidar dos detalhes finais e também acertar tudo referente à editora com Lana. Teríamos uma semana cheia.

Quando saí, encontrei Charlotte já arrumada, ela havia levado roupas para o quarto, assim não chamaríamos a atenção de ninguém, exceto pelos cabelos molhados. Minha namorada estava sentada na cama olhando para todos os lugares, menos para mim. Eu conhecia muito bem aquele seu jeito. Ela queria me perguntar algo e não sabia como fazer.

– O que foi? – passei a toalha no cabelo e andei em direção ao closet.

– Por quê? – ela me acompanhou, andando com os pés arrastados, como uma criança que esconde um segredo.

– Por que, o quê? – virei na direção dela, que encarou meu peito com a boca semiaberta. Charlotte era mesmo uma tarada. – Charlotte? Vai ficar me devorando com os olhos? – sorri encantado com seu jeito único. Charlotte corou deliciosamente, depois sorriu.

– Não consigo fazer diferente – resmungou revirando os olhos.

– Não sei aonde iremos parar se continuarmos assim – retirei a toalha presa em minha cintura, dando-lhe as costas, e procurei por uma cueca.

– Gosto da sua bunda – tive que rir. Charlotte era incrível. Uma hora corava totalmente envergonhada e na outra era a mulher mais ousada que já conheci.

– Eu também gosto muito da sua – coloquei a cueca e me virei de volta a tempo de ver seu rosto rosado. – O que você queria me dizer mesmo? – não conseguia parar de sorrir para ela e toda aquela imensidão que era a sua presença.

– Eu? Nada – desconversou. – Por quê? – andei até as calças e escolhi um jeans claro, meio desbotado.

– Porque eu conheço esta cara, Srta. Charlotte Middleton, e sei que esta cabecinha está repleta de pensamentos absurdos.

– Sexo é algo absurdo? – fez cara de paisagem me fazendo rir. Andei até minha aluna parando diante dela.

– Você não está pensando em sexo – ela arqueou uma sobrancelha sem quebrar o contato do nosso olhar. – Tudo bem! Pelo menos não era o que estava pensando antes de começarmos esta conversa – beijei seus lábios e ela me envolveu com os braços frágeis.

– Mas estou pensando agora.

– E seu pai, com certeza, está preocupado com o sumiço da filhinha – desfiz o aperto e voltei para pegar uma camisa que tinha deixado sobre a poltrona.

– Frouxo!

– Ninfomaníaca!

– Eu? Eu... Alex! Que horror! Como pode falar isso de mim?

– Acredite. Eu posso – coloquei a camisa e abracei minha namorada com cuidado enterrando meu rosto em seus cabelos.

– A culpa é sua, não minha – ri deixando-a sozinha indo pegar meus tênis. Sentei na poltrona e ela cruzou os braços me observando.

– Charlotte, pergunta logo de uma vez – nem me dei ao trabalho de olhá-la para saber que estava explodindo por dentro.

– Não tenho nada a perguntar.

– Ok! Então vamos. As pessoas já devem estar dando por nossa falta.

Saímos do quarto de mãos dadas, depois de me certificar de que não encontraríamos Peter no corredor. Caminhei praticamente puxando-a pelo braço, eu tinha pressa. Não queria que meu futuro sogro desconfiasse de nada, apesar de que... era melhor não pensar na possibilidade. Ouvíamos o barulho dos outros, provavelmente já desfrutando do café da manhã. Então ela soltou a bomba.

– Eu não quero casar – paralisei imediatamente. Foi como se tivesse sido atingido por um raio.

Estávamos na saída do corredor. Podíamos ser vistos, mas não ouvidos. Virei para ela e encontrei seus olhos. Estavam fixos em mim, imensos e desesperados.

– Charlotte?

– Alex, eu... não é o que está pensando – ela falava baixo sem querer chamar a atenção dos outros.

– Então o que é? – permaneceu calada me encarando e mordendo os lábios. – Charlotte?

– Não acho que deva ser tão rápido – estava visivelmente nervosa. – Nós mal começamos a namorar. Estamos nos conhecendo. Nossa vida sexual está no início. Não precisamos de um casamento agora. Eu... – ela parou quando entendeu que seus argumentos não estavam ajudando.

– Alex? – minha mãe chamou, porém eu não tinha mais cabeça para nada.

Não podia simplesmente deixar aquele assunto em suspenso para ser retomado em outro momento. Sem pensar duas vezes, peguei Charlotte pelo braço e a reboquei em direção à saída da casa.

– Agora não, mãe! – foi só o que consegui dizer.

Passei pela porta de casa sem olhar para trás, sabendo que tinha dado algo para todos pensarem. Eu estava com um problema muito maior e o segurava pela mão. Charlotte tentava acompanhar meus passos. Não protestava nem reclamava, apenas me seguia. Quando já estávamos bem afastados, na campina um pouco antes do lago, parei.

Virei de frente para ela, encarando-a. Charlotte parecia assustada. Foi o suficiente para me desarmar. Sentei na grama puxando-a para os meus braços.

– O que aconteceu? Eu pensei...

– Nada aconteceu, Alex. Só acho que estamos indo rápido demais.

– Você não tem certeza dos seus sentimentos?

– Não! Quer dizer... tenho. Eu te amo! Não tenho nenhuma dúvida. Eu te amo! – relaxei visivelmente.

– Por que não quer casar? Eu pensei que você também quisesse. Aliás... você disse sim.

– Alex... – ela gemeu em desagrado. – Eu disse sim. Eu concordei, apenas não quero que seja tão rápido!

– Eu não estou entendendo. Não tenho dúvidas quanto ao que sinto e estou certo que serei completamente feliz ao seu lado. Você está me deixando frustrado, confuso e...

– Alex! – ela segurou meu rosto em suas mãos capturando meus olhos. – Eu. Amo. Você! – sorriu docemente. – Eu. Amo. Você! Quero passar a minha vida inteira ao seu lado. Cada minuto, cada segundo dela. Não existe a menor possibilidade de isso não acontecer. Deixe-me tentar explicar, comecei a viver muito tarde, estive presa a um único objetivo e acabei negligenciando o restante. Todas as experiências que deveria viver. Tenho tanta coisa pela frente...

– Você quer... – engoli em seco – ... viver novas experiências? Conhecer outras pessoas?

– Amor, não pense besteiras! Eu já disse: eu te amo. Muito! Tanto que não sei como poderia viver sem você, mas olha só... – abriu os braços mostrando ela própria. – Veja a confusão que fiz com nossas vidas, apenas porque nunca quis ser uma pessoa normal. E agora... – beijou meus lábios rapidamente – ... agora tenho você. Mal comecei a aprender a ser namorada e já tenho que aprender como ser atraente, sexualmente falando – sorriu me fazendo sorrir de volta. – Eu não conheço nada. Tenho muito a aprender e estou me segurando para não surtar. Não tenho a menor condição de encarar uma formatura, uma vida profissional e um casamento ao mesmo tempo. Por favor, por favor, por favor!

– Casar não vai modificar em nada nossos planos.

– É claro que vai! Eu nem sei como me comportar como sua namorada, imagine como esposa.

– Charlotte...

– Vamos viver uma coisa de cada vez – Charlotte sentou em meu colo, cruzando as pernas e me puxando de encontro a ela. – Vamos ser namorados, trocar mensagens, esperar ansiosos pelo horário do nosso encontro, passar noites inteiras nos braços um do outro... – beijou meus lábios com amor. – Vamos enrolar meu pai e rir das nossas travessuras, vamos viajar pelo mundo, escrever juntos...

– Poderemos fazer tudo isso depois de casados.

– Alex! – falou dengosa. – Eu nunca tive um namorado – mais uma vez me beijou, sendo um pouco mais ousada. – Deixe-me aproveitar a sensação. Deixe-me primeiro ser a sua namorada, depois serei sua esposa com tudo o que tenho direito. Quero ser sua, apenas sua, porém sem queimar etapas – eu já estava completamente entregue a seus encantos.

Como resistir a Charlotte Middleton quando a tinha em meu colo, falando com seu jeito manhoso, beijando-me e grudando-se ao meu corpo como uma felina louca por carinho, afirmando o seu amor e me pedindo para concordar com seus argumentos?

– Charlotte, eu quero me casar com você. Quero passar todas as noites ao seu lado. Quero acordar e fazer amor com a minha esposa. Quero você comigo em todos os momentos.

Ela me olhou um pouco desanimada, então me dei conta de que não poderia forçá-la. Não podia obrigá-la a se casar apenas para satisfazer minha vontade, esquecendo-me das necessidades dela. Eu a amava o suficiente para saber que precisava ceder.

– Tudo bem – falamos ao mesmo tempo e ambos de maneira resignada.

Eu sorri ao perceber que ela estava cedendo por mim, assim como eu estava cedendo por ela. Então rimos saboreando a nossa descoberta.

– Eu amo você, Charlotte! – toquei seu rosto e admirei a sua beleza, sentindo sua pele macia.

– Eu amo você, Alex!

– Seis meses é tempo suficiente? – beijei seus lábios, seu pescoço e coloquei seu cabelo atrás da orelha. Ela se encolheu como uma gatinha manhosa.

– Um ano.

– Um ano? – ela riu.

– Seis meses como sua namorada e seis como sua noiva, depois poderemos ser marido e mulher. Fechado?

– Vou pensar no seu caso.

– Alex! – ri e ela corou daquela forma deliciosa.

– Adoro poder ficar assim com você, sem medo, sem precisar me esconder... – outra vez juntei seu cabelo colocando-o atrás da orelha. Ela mordeu o lábio.

– Eu também adoro. É por isso que quero prorrogar o máximo possível – suspirei.

Eu não queria um ano de namoro, sofrendo a perseguição de Peter, precisando estar longe e aceitando que ela não estivesse comigo. Mas como contestar sabendo das suas necessidades?

– Casados também namoram – sussurrei. Ela sorriu e levantou a cabeça, fechando os olhos para sentir um pouco do sol fraco daquela manhã.

– Eu sei. Meus pais parecem dois adolescentes.

– Os meus também – ela me olhou de soslaio. – Não tenha medo, Charlotte! – vi quando ela mordeu o lábio e evitou me olhar diretamente. – Casados fazem mais sexo do que namorados – ela riu alto.

– Que mentiroso! – e me empurrou com o ombro.

– No seu caso, sim – ri acompanhando o seu riso inocente e infantil. – Seu pai vai pegar no nosso pé – beijei seu pescoço. Ela se encolheu, ficando tensa.

– Vou resolver isso – garantiu como uma menina rebelde.

– Não. Não quero me indispor com Peter – provoquei.

– Frouxo!

– Vou passar o resto da vida ao seu lado, tenho que ter uma boa convivência com os seus pais – continuei despreocupado. Sabia que aquela era uma questão forte que talvez a fizesse repensar.

– Frouxo! – repetiu rindo. – Meu Deus! Eu pensei que me casaria com um homem.

– É só se casar para saber – continuei provocando.

– Esperei vinte e um anos para perder a virgindade, Alex. Posso esperar mais um sem muito sofrimento –encarou-me desafiadoramente. Levantei a mão e toquei seu rosto com carinho e fitei seus olhos.

– Duvido muito, Charlotte!

Ela abriu a boca para rebater, fechando-a logo em seguida, ciente de que não tinha argumentos.


CHARLOTTE


Assim que entramos na casa, percebi meu pai andando de um lado para o outro da sala e minha mãe olhando para ele sem saber ao certo o que fazer. Quando me avistaram, sua atitude se modificou. Ele parecia tenso e minha mãe aliviada.

– Onde estavam? – perguntou com a voz aparentemente calma, porém eu sabia que lutava para se controlar.

– Caminhando. Caminhando e conversando – eu disse, impedindo Alex de começar a se explicar.

– Conversando? – ele olhou para Alex com uma expressão estranha.

– Isso – continuei firme. Ele olhou de mim para Alex e depois voltou a me olhar.

– Esqueceu da nossa ida ao hospital?

– Não. Estou pronta – segurei a mão do meu namorado, não permitindo que ele a soltasse. Meu pai precisava entender.

– E vai sair sem comer nada? – minha mãe interferiu. – Ela não pode sair sem comer nada.

– Podemos comer alguma coisa antes de sair. Vai ser rápido – Alex falou por fim. Agradeci por ele não recuar pela presença do futuro sogro, como vinha fazendo.

– Você vai? – ele olhou surpreso para Alex, o que me deixou um pouco aborrecida. O que tinha de estranho com o fato de o meu namorado me acompanhar?

– Sim. Quero ter certeza de que está tudo certo com Charlotte – Alex manteve a segurança na voz.

– Claro! – Peter recuou um pouco. Algo fora do normal para quem passou a vida ameaçando matar qualquer um que se aproximasse. – Claro que você tem direito de acompanhar a sua noiva, afinal de contas é do seu interesse que ela esteja inteira.

– Por falar nisso... – comecei sem saber ao certo como dizer. Alex apertou minha mão e me interrompeu.

– Se ficarmos conversando iremos nos atrasar. Vamos comer alguma coisa – acabei concordando apenas porque ele tinha razão quanto ao atraso e eu conhecia muito bem o Peter para saber o quanto isso o incomodava.

Alimentados e prontos, aguardamos pelos nossos pais na entrada de casa. Alex estava muito calado, as mãos nos bolsos da calça, balançando o corpo para frente e para trás, e vez ou outra me olhando pelo canto dos olhos. Fiquei incomodada. Era estranho demais assistir meu professor com atitudes tão adolescentes. Alguma coisa o angustiava, e eu sabia que estava diretamente ligada a mim, no entanto, continuei calada.

Meu pai apareceu saindo da garagem, acompanhado por Johnny. Eles conversavam seriamente, o que me deixou em alerta. Ele só falava tão sério com meu amigo quando o assunto era relacionado a mim, o que era uma droga!

– Vamos? – Dr. Frankli apareceu atrás da gente, pegando-nos de surpresa. – Como está se sentindo, Charlotte? – Alex se moveu, visivelmente incomodado.

– Bem, obrigada!

– Sentiu alguma coisa durante a noite?

Porra, eu havia sentido muitas coisas durante a noite, mas nenhuma delas estava ligada aos meus ferimentos e definitivamente não me causaram dores.

– Nadinha – senti meu rosto esquentando e tive que desviar o olhar e me proteger cobrindo a face com o cabelo.

– Ótimo! De qualquer forma, os exames vão nos deixar mais seguros. Você vai, filho? – graças a Deus ele voltou a sua atenção para Alex, e eu pude levantar o rosto e observar suas atitudes.

– Sim – meu namorado se moveu incomodado, retirando as mãos dos bolsos e cruzando-as no peito. Fez uma careta estranha. – Não posso ficar aqui aguardando para saber se está tudo bem com ela – Dr. Frankli sorriu, aprovando a atitude do filho.

– Então vamos. Parece que vamos ter uma comemoração esta noite, e Lana já avisou para não demorarmos.

– Uma comemoração? – senti Alex segurar minha mão para me conduzir até a garagem.

– Sim – meu futuro sogro me olhou com curiosidade e depois para Alex. – Você não está sabendo? – olhou outra vez para o filho, que suspirou retribuindo o olhar, em uma conversa muda. Aquilo foi estranho. Muito estranho.

– Bom... pelo que eu soube alguém te pediu em casamento – ele disse com um tom divertido.

– E? – tentei não ficar tensa, mas minha nuca já pinicava.

– Precisamos comemorar – ele me olhou outra vez, e não parecia mais se divertir, muito pelo contrário. Voltou a procurar pelo olhar do filho, que ficou visivelmente desconcertado.

– Sério? – minha voz saiu esganiçada. – Vamos comemorar um pedido de casamento?

– Hum!

Alex puxou o ar com força e parou de andar. Fiquei em alerta. Ele olhou para o pai, que entendeu e continuou andando.

– O que está acontecendo?

– Primeiro: eu disse a seu pai que queria casar com você e que seria logo – puta merda! Aquilo não era nada bom.

– Nós combinamos...

– Eu sei, só que ele não. Aliás, ninguém além de nós dois. Seu pai quer um casamento para ontem.

– O quê? – falei alto demais e Alex ficou incomodado.

– Ninguém vai te obrigar a casar, Charlotte! Relaxe – sua voz saiu seca demonstrando sua desaprovação.

– Então por que vamos comemorar?

– Porque ninguém sabe que você é esta pessoa inconstante – rebateu aborrecido. Recuei sentindo as suas palavras. – Desculpe! – passou a mão no cabelo e depois na testa, fechando os olhos para recuperar a calma. – Você conhece o seu pai. Ele quer que case virgem...

– Impossível! – ele me olhou por um tempo e depois sorriu de leve, sem muito efeito.

– Eu sei, mas ele não. Então... – puxou o ar outra vez. – Ele quer garantias de que aconteceria.

– Ele disse isso?

– Não! Não exatamente. Disse que você era virgem e que ele queria que fosse assim até o dia do casamento. Eu concordei.

– Como você pôde concordar se sabia que eu não era mais...

– Fale baixo! – só então percebi que estava falando alto demais. – Merda! O que queria que eu dissesse? É o seu pai!

– Droga!

– Ele só quer comemorar o noivado! Apenas isso!

– Alex!

– Que diferença poderá fazer, Charlotte? Parece que para você isso é uma tortura. Não vê o que está fazendo comigo quando se recusa desta forma a casar?

– Pensei que você tivesse entendido – eu não tinha mais vontade de argumentar.

Não queria machucá-lo, apenas não queria casar como se o mundo fosse terminar no dia seguinte. Era tão difícil de entender? Por que era tão importante concordar com um casamento feito às pressas? O normal não era esperar? Aquilo tudo estava me cansando demais.

– Eu entendi, e respeito a sua vontade. De verdade! – intensificou seu olhar no meu. – Mas não custa nada atendermos um desejo dos nossos pais. É só um noivado, Charlotte! Não vamos nos casar amanhã.

Encarei meu namorado e percebi que para ele era difícil demais, só não entendi o porquê. Não havia motivo para aquela ansiedade toda. Eu o amava! Nada mudaria se esperássemos pelo menos um ano.

– Tá! Desculpe! É que isso tudo é novo para mim. Eu... não entendo essa urgência.

– É novo para mim também – ele me abraçou pela cintura. – Posso ser mais velho, mas não sou o mais experiente neste quesito. Quando você reluta tanto fico pensando: o que tem de errado? Porque, se dependesse de mim, casaríamos hoje. Eu te amo! Quero que fique comigo para sempre. Não tenho vontade de deixá-la ir e é o que vai acontecer. Amanhã você vai voltar para a sua casa, seremos fiscalizados de perto pelo seu pai e eu não sei até quando isso será suportável – segurou meu rosto com as duas mãos exigindo o meu olhar. – Não queria passar mais nenhum dia sem você.

– Ah, Alex! – suspirei fechando os olhos. O amor que ele descrevia era o mesmo que eu sentia e me emocionava vê-lo expressando tanto sentimento. – Não tenha medo – foi a minha vez de fazer este pedido. – Eu te amo, e não tenho dúvida disso. Só preciso de um tempo.

– Pelo menos que seja um tempo curto – suplicou tocando os lábios em minha testa. Estremeci.

– Vocês estão comprando um problema – Johnny passou por nós dois e riu. – O padrinho mandou vocês andarem mais rápido. É melhor obedecer – Alex se distanciou e fez uma careta de desagrado. Johnny piscou para mim e saiu dando um tapinha no braço do meu namorado.

– É disso que estou falando – rosnou se afastando ainda mais. – Vamos.

Alex segurou em meu braço como se eu fosse uma criança e começou a me levar em direção à garagem. O Dr. Frankli já nos aguardava em seu carro, e meu pai estava do lado de fora, olhando-nos atentamente.

– Algum problema? – Peter olhou diretamente para Alex.

– Alguns – Alex suspirou longamente ao falar. – É melhor seguimos ou não vamos terminar tão cedo os exames.

– É algo que eu deva saber? – meu pai insistiu.

– Com certeza sim, Peter – ele abriu a porta dando-me passagem. Olhei para meu namorado sem acreditar que ele teria coragem de contar ao futuro sogro sobre a nossa conversa. – Mas vamos aguardar até que tenhamos uma oportunidade melhor.

– Alex, eu...

– Estamos atrasados – gritei de dentro do carro para que eles encerrassem aquela conversa.

– Tudo bem! – imediatamente senti minha tensão aliviar. – Mas nós vamos ter esta conversa – disse ameaçadoramente para Alex. Revirei os olhos.

Meu namorado entrou, sentando ao meu lado, enquanto Peter se acomodava ao lado do Dr. Frankli, que dirigiria. Assim que o carro ganhou movimento, meu namorado me olhou com um misto de apreensão e cansaço, fazendo-me estremecer. Ele não estava nada satisfeito.

Que droga!


ALEX


Fiquei do lado de fora da sala, aguardando por eles. Charlotte estava estranha, parecia assustada, como se não estivesse satisfeita com o que estava acontecendo. Eu tinha certeza de que não era nada relacionado ao fato de estar em um hospital, mesmo sabendo que ela detestava. Dentro de mim, um incômodo insuportável deixava claro que o problema da minha futura noiva era justamente este fato, o noivado rápido demais e a promessa de um casamento mais rápido ainda.

Gemi insatisfeito. Onde eu estava com a cabeça? Não era natural, em pleno século vinte e um, um casamento relâmpago como o nosso seria. Por outro lado, todos os dias, casais apaixonados juntavam suas vidas dividindo um apartamento, e isso era perfeitamente aceitável.

Bom... aceitável para qualquer pessoa deste século, mas jamais para uma do século dezoito, como Peter.

Claro que o fato de ele ser turrão, exigente, de pegar no meu pé, mesmo sendo eu um homem de trinta e cinco anos, de não aceitar que as mulheres de vinte e um sejam independentes e já transem, jamais me obrigaria a casar. Não. Eu nunca me casaria por obrigação. Nunca!

Era por amor. Porra, era por amor! E eu não conseguiria aceitar que fosse de forma diferente. Mesmo que Peter facilitasse, que não se importasse, que nada exigisse, eu casaria com ela.

Existia em mim uma necessidade profunda de ter Charlotte sempre ao alcance das minhas vistas. De poder colocar as mãos nela sempre que me desse vontade. Existia uma ânsia por mais, muito mais do que estávamos vivendo e que, com certeza, não viveríamos caso ela insistisse em levar um ano de namoro.

Por que Charlotte não entendia que eu queria apenas ser dela, e que ela fosse minha? Sem interrupções, sem despedidas, sem medos... Eu queria fazê-la feliz e sabia que era capaz disso, só precisava que ela dissesse sim. Não um “sim, quem sabe um dia”, mas um “sim”, forte, decidido, sem espera. Eu queria um “sim” para ontem e não ficar aguardando até que ela cansasse de brincar de ser a namoradinha.

Porra! Charlotte estava fodendo com o meu juízo!

– Oi!

Ela estava parada na minha frente. No auge do meu devaneio, deixei de enxergar tudo ao meu redor e me perdi em pensamentos. Quando fui arrancado de lá pela sua voz tímida e receosa, eu me dei conta de que estava encostado na janela, as mãos segurando o parapeito tão forte que parecia que, se eu o soltasse, desabaria de vez.

– Como foi? – minha voz saiu rouca, com resquícios da raiva que sentia por não conseguir entender aquela garota.

– Bem! – ela deu de ombros, abraçando o casaco dobrado como se ele fosse a sua proteção contra a minha fúria. – Levando-se em conta que eu não fui furada, acho que devo dizer que estou no lucro – sorriu um pouco, como se quisesse quebrar o gelo.

– E meu pai?

– Está lá dentro. Disse que acompanharia os resultados.

– E o seu pai? – Charlotte desviou o olhar e roçou um pé no chão, igual a uma criança.

– Vai acompanhar o seu. Disse que poderíamos aguardar aqui, ou no carro, como você preferir – soltei o ar que estava preso nos pulmões. Este pesava que nem pedra.

– O que quer fazer enquanto aguardamos? – tentei relaxar, mas era praticamente impossível. A resistência de Charlotte estava minando as minhas forças.

– Acho que... – outra vez desviou o olhar. Ela corou um pouco, sorriu com muita timidez e mordeu o lábio. – Não podemos fazer o que eu gostaria – disse, por fim, voltando a me olhar.

O ar entrou em meu corpo dando vida a cada célula. Meus olhos ficaram presos em Charlotte, em sua boca carnuda e rosada, em suas bochechas quentes, afogueadas pela ousadia, seus olhos atentos e brilhantes, sua pele clara, cheia de pintinhas lindas que me faziam ter vontade de beijá-las, uma a uma.

Como não reagir àquela garota? Como não amá-la? Como não desejar a sua inocência ousada? Seu fogo incansável, sua forma única de ser, tão apaixonante e irritante que fazia com que ela fosse ímpar.

Levantei a mão e toquei seu rosto. Desci meu polegar até seus lábios, acariciando-os. Como os desejava! Eu queria beijar Charlotte lentamente, saborear sua boca, sua língua, mantê-la presa neste encanto enquanto, seguindo o mesmo ritmo, retiro suas roupas, toco com todo cuidado a sua pele. Queria deixá-la nua, beijar cada detalhe do seu corpo e fazê-la se perder em seu próprio desejo, como sempre acontecia.

Eu podia roubá-la, nem que fosse por só alguns minutos. Podia levá-la para um passeio e então encontrar algum lugar, um motel, uma pousada, qualquer lugar onde eu pudesse me enterrar nela tão profundamente que meus neurônios entrassem em parafuso, impedindo-me de pensar em qualquer problema.

Também poderia fazer Charlotte gozar inúmeras vezes, tantas e tão imediatamente, que a faria entender que não podíamos aguardar tanto tempo, que o nosso amor exigia a urgência que nos cercava. E que pouco importa o que manda a etiqueta, as regras sociais, o parecer da vizinha, nós casaríamos quando o sol nascesse e daríamos paz aos nossos corações.

Era um bom plano, mas depois lembrei que Peter estava logo ali, na sala ao lado, cobrando de mim que eu fizesse de tudo para merecer aquela menina que ele tinha mimado e resguardado do mundo. Uma joia escondida. Só a possuiria aquele que merecesse.

E era o que eu queria fazer.

Ganhar a confiança do meu futuro sogro era fundamental. Mesmo que Charlotte não entendesse a minha posição, eu me conhecia, e sabia que se não fosse desta maneira, se não tivesse a aprovação do pai dela, não seria completo.

E então me dei conta: eu também era um cara “à moda antiga”.

– O que foi? – ela me tirou daquele devaneio. Balancei a cabeça e fiz uma careta que não passou despercebida pela minha namorada.

– Nada. Podemos ir à lanchonete – ela não se animou com a proposta. Tudo bem, eu não tinha fome, pelo menos não de comida. – Tem uma livraria bem pertinho daqui, podemos passar lá e ver as novidades – ela entortou a boca, desaprovando minha escolha. – Não podemos transar, Charlotte – desisti de tentar persuadi-la. Ela sabia o que queria, infelizmente eu não poderia ajudá-la. Minha namorada arqueou uma sobrancelha, observando-me com atenção.

– É lógico que não podemos transar, Alex. Estamos em um hospital! – continuou me encarando.

– Existe uma pousadinha ótima a poucos metros daqui – tive vontade de rir da cara que ela fez. Charlotte abriu a boca, fechou, olhou para os lados, abriu outra vez, sem encontrar palavras, então fechou, engoliu em seco e aguardou. – Então, o que quer fazer?

– Aguardar pelos resultados –afastou-se demonstrando má vontade, sentou-se em uma das poltronas e ficou olhando para a porta da sala.

– Aqui? – concordou com a cabeça. – O que foi? Ficou aborrecida comigo?

– Tirando o fato de eu ter certeza de que sua imensa necessidade de agradar o meu pai vai me impedir de estar tão cedo em sua cama, não. Estou ótima! Superfeliz com o cara que me prometeu um mundo de prazer, o mesmo que quer a todo custo me convencer de que um casamento às pressas não será algo precipitado, mas para quê? Para continuar seguindo as ordens do meu pai?

Suspirei pesadamente. Eu estava entre a cruz e a espada. Não dava para ceder para Charlotte quando precisava ceder para o pai dela. Eram dois extremos impossíveis de conciliar. Abaixei-me diante dela. Charlotte desviou o olhar e começou a coçar as bordas dos olhos. Estavam vermelhos, começando a ficar irritados.

– Não coloque a mão suja nos olhos, Charlotte – ela revirou os olhos com impaciência.

– Tudo bem, mãe – rebateu como uma menina rebelde.

– É sério. Está irritando. Já está começando a ficar vermelho – ela coçou mais uma vez. – Charlotte!

– Está incomodando! – foi brusca. – As lentes incomodam depois de um tempo – oh, droga!

– Você dormiu com elas? – afirmou com um aceno de cabeça, voltando a colocar o dedo do olho. – Não passe a mão – segurei seu dedo impedindo-a. – Não sabe que não pode dormir com as lentes?

– Eu durmo às vezes, mas nunca fiquei tanto tempo com elas.

– Por que não tirou? – Charlotte me encarou por alguns segundos, logo em seguida seu rosto ficou tão vermelho que me deixou ansioso. O que ela havia aprontado. – Esqueceu o soro, não foi? – Mordeu o lábio e concordou. – Merda, Charlotte!

– Não sabia que perderia os óculos. Trouxe as lentes apenas como precaução, não gosto delas, então não pretendia usá-las.

– E acha mesmo que vai conseguir ficar com elas até amanhã? Como pode ser tão negligente com você mesma? – ela recuou um pouco, arqueando o corpo, abalada com a minha acusação.

– Aconteceu alguma coisa? – Peter apareceu bem na hora em que eu ia começar uma bronca.

– Charlotte... – levantei encarando meu futuro sogro. – Ela esqueceu o soro para as lentes e seus olhos estão começando a irritar – ele olhou para a filha, segurando o queixo dela para analisar seus olhos.

– Lottie, você sabe que não consegue ficar tanto tempo com as lentes, por que não as retirou? – outra vez ela ficou corada.

– E o que eu faria com elas? Não posso guardá-las sem o soro.

– Mas pode com água – me intrometi. Ela fez um muxoxo, desvencilhando-se do pai.

– Não quero ficar sem enxergar nada – disse por fim com a voz bem fraquinha. Meu coração compadeceu.

– Podemos providenciar óculos novos – sugeri, e Peter concordou, ainda analisando a filha.

– Isso – ele disse por fim. – Vão. Saiam e providenciem os óculos. Vamos demorar um pouco – voltou-se para mim, colocando uma mão em meu ombro. – Consegue resolver isso?

– Claro! – ele sorriu e eu sorri de volta.

– Então vão, mas fiquem atentos aos celulares. Ligaremos quando estivermos com tudo pronto.

Saí de lá satisfeito comigo mesmo. Peter tinha confiado em mim para cuidar da filha dele, era tudo o que eu queria. Entrei no carro, depois de acomodar minha namorada no banco do carona. Só quando dei partida percebi que ela estava séria e calada demais. Não era uma birra, mais uma demonstração da sua personalidade mimada e infantil, por isso senti meu coração acelerar. Havia mesmo um problema.

– O que foi? Não quer comprar óculos novos?

– Quero sim, obrigada! – sua atitude educada não demonstrava se ela estava ou não feliz.

– Qual é o problema, Charlotte? – ela suspirou, parecia querer falar, mas nada disse. – Amor, o que foi? Continua aborrecida com aquela história de não transarmos? – brinquei na esperança de que ela risse, ou que rebatesse com rebeldia, como sempre fazia. Charlotte me olhou aflita, depois voltou a olhar para frente. – Ei! – desliguei o carro e segurei seu rosto, puxando-a para mim. – O que foi?

– Você.

– Eu? O que eu fiz?

– Alex, você está parecendo o meu pai. Sabe o quanto eu detesto esta superproteção, esta mania que ele tem de resolver tudo por mim, de querer estar sempre no comando, sem se importar com o que eu quero... – olhou-me aflita e com mágoa. – Eu entendo que se preocupe, e sou grata por isso, mas, Alex... – fitou-me com intensidade. – Eu não preciso de mais um pai.

Puta que pariu! O que eu estava fazendo?


CAPÍTULO 8


“Sabemos o que somos, mas não sabemos o que poderemos ser.”

William Shakespeare


CHARLOTTE


Encontramos a franquia da ótica que eu costumava comprar meus óculos e lentes. Eu sabia que nela tinha o arquivo da minha última receita, então não precisaria fazer outro exame, já que ainda estava no prazo.

Alex ficou carrancudo o tempo todo. Eu tinha certeza de que era pelo que eu tinha dito, no entanto não estava arrependida, era melhor que tivesse sido assim antes que o mal fosse instalado. Precisava fazê-lo entender que não precisava assumir a posição do meu pai para ser alguém digno do meu amor. Essas bobagens só serviam mesmo para que Peter acreditasse que tinha o controle da minha vida.

Alex era o meu amor, independentemente dos seus cuidados exagerados, das suas ideias absurdas e da sua pressa descabida. Eu o amava e ponto final. Sem vírgulas, travessões, aspas ou qualquer outra coisa que colocasse em dúvida o que eu sentia.

– O que achou? – perguntei pela milionésima vez em mais uma tentativa de fazê-lo relaxar.

– Ficou lindo – sua voz não tinha muito entusiasmo. – Gosto de você de óculos – não consegui esconder o meu espanto. – Gosto quando você fica parecendo uma nerd – ele falou por fim, deixando um sorriso, o primeiro desde que chegamos, se apresentar.

– Você é estranho, professor Frankli – ri sem graça.

– Porque te acho linda independente de como esteja? – tocou o meu rosto com a ponta dos dedos. – Eu sou um homem apaixonado, Charlotte! – meu rosto queimou ao constatar duas vendedoras nos olhando e sorrindo, como se estivessem assistindo a um capítulo de novela e torcendo pelo casal principal.

– Então, eu... – olhei sem graça para a vendedora que estava me atendendo – ... vou ficar com este – entreguei a armação para ela, que sorria educadamente.

– Adicione um kit de soro para lentes de contato – ele disse, não para a vendedora, mas para mim, como se estivesse me lembrando e não exigindo. Sorri. Alex era incrível.

– Um kit? – não desviei o meu olhar do dele e apenas balancei a cabeça, concordando. Ela saiu, deixando-nos sozinhos.

– Quer fazer mais alguma coisa? Olhar algumas vitrines, comprar alguma outra coisa... temos uma hora inteirinha pela frente – mordi o lábio sentindo a angústia que sempre se apossava de mim quando Alex me perguntava o que eu queria fazer.

– Aqui está.

A vendedora me entregou uma nota para que eu pudesse pagar no caixa. Vi quando Alex levantou a mão para pegá-la, então fui mais rápida, retirando-a das mãos da mulher e escondendo onde ele não conseguisse alcançar. Meu namorado me olhou aborrecido, rapidamente desistiu sem nem lutar, suspirando e levantando da cadeira.

– Peter pediu para que eu cuidasse disso – argumentou caminhando ao meu lado até o caixa da loja.

– Para cuidar disso, o que significa me trazer, me auxiliar e garantir a minha segurança, mas não pagar as minhas contas – ele me olhou outra vez com aquela expressão de choque. Reconheci em seu rosto o quanto aquilo tudo era complicado para o meu namorado.

– Vou ser o seu marido, Charlotte! – virei em sua direção antes de chegarmos à atendente.

– Alex, você será o meu marido, não o meu provedor.

– Charl...

– Não há necessidade – rebati com firmeza.

– Mas...

– Não – ele desistiu com uma careta que deixava claro que apenas não continuaríamos com aquela discussão em um local público.

Ok! Tenho sérios problemas com alguns assuntos. Dinheiro era um deles. Não contestava o fato de o meu pai me sustentar, eu era filha única, sua herdeira, apesar de saber que Miranda e Johnny dividiriam a herança comigo, ainda assim, continuaria sendo rica. Muito rica.

É natural os filhos dependerem dos pais durante uma fase da sua vida e eu não podia ignorar que o que ele construiu ficaria comigo e com mais algumas gerações, então gastar o dinheiro que ele me dava não me atormentava tanto quanto imaginar qualquer outra pessoa pagando minhas contas.

Talvez seja natural para algumas mulheres aceitar dinheiro dos seus maridos. Existe todo tipo de relacionamento e de necessidade, eu não estava sendo contra este fato. Apesar de Alex ter uma vida confortável, eu sempre teria mais do que ele, desta forma, não era nem justo nem necessário que ele pagasse qualquer conta minha.

Entreguei o cartão de débito para a atendente, que sorriu com educação, sem deixar transparecer que ela esperava que Alex pagasse. Claro! As pessoas românticas sonhavam com o homem fantástico, rico, apaixonado, e que, principalmente, pagasse toda e qualquer compra que ela fizesse. Não por interesse, ou em alguns casos, sim, apenas por interesse, mas pela ideia fantasiosa descrita em alguns livros.

Bom, eu nunca desejei alguém que saldasse minhas contas e este pensamento pode ser pelo fato de nunca ter precisado disso. O que eu sempre quis era que um dia alguém aparecesse e me tirasse daquele mundo em que eu vivia, que me mostrasse uma vida diferente, e que nunca, nunca mesmo, tomasse decisões por mim. Isso eu já tinha demais em minha vida, todos aqueles que eu amava faziam desta forma, o que me fazia desejar o contrário.

– Obrigada! – a atendente me devolveu um papel.

Guardei-o na pequena bolsa que levava comigo e voltei a olhar o meu namorado. Ele fez cara de desagrado e segurou a minha mão, tirando-me de lá.

Saímos para a rua fria e molhada. A fraca chuva continuava caindo, sem nos incomodar. Alex permanecia calado, a mão na minha ainda firme, até que alcançou o carro, estacionado embaixo de uma árvore grande. Ele não abriu a porta, nem mesmo destrancou o carro, apenas se encostou nele, cruzou os braços e me encarou.

Pensei mil vezes em como fugir daquela conversa, no entanto sabia a importância de definirmos alguns limites e, finalmente, ajustarmos os nossos interesses, afinal de contas, ficaríamos noivos naquela noite e, se Alex conseguisse o que todos sempre conseguiam de mim, nós nos casaríamos antes mesmo que eu me acostumasse com a ideia.

– Olha, eu não queria te aborrecer, é só que...

– Tudo bem, Charlotte – ele me sondou com atenção. – Eu entendo a sua posição e aceito, mas existem alguns pontos que precisamos acertar, já que vamos dividir uma vida – estremeci com a ideia.

Casar para mim era algo tão sério que me fazia temer. Eu sabia e, provavelmente Alex também, que eu não estava preparada. Não era madura o suficiente para assumir algo tão importante. Mesmo reconhecendo esta fraqueza, não me sentia nada confortável tendo que aceitar que minha infantilidade me faria recuar, quando a única certeza de que eu tinha era a de que queria passar cada segundo da minha vida ao lado daquele homem.

– Não tenho problemas com o fato de você ser rica – desviei o olhar.

Nunca consegui entender muito bem o motivo de eu me sentir culpada quando minha fortuna era assunto de debate, como se eu devesse me desculpar pela minha riqueza. Como se ser rica, ou absurdamente rica, fosse um fato desonroso. E eu sabia que não podia me sentir assim, afinal de contas, eu gostava de ter dinheiro.

– Mas gostaria que entendesse que não sou mais nenhum garoto. Eu tenho uma vida tranquila, confortável, construí a minha segurança financeira e me orgulho muito disso. Nunca irei te proibir de continuar usufruindo o que seu pai lhe oferece, no entanto, quero preservar a minha independência. Eu respeito o seu pai e todas as inseguranças dele em relação a você, o que não significa que permitirei que interfira na administração da minha casa, muito menos da minha vida.

Alex falava com muita tranquilidade, não deixando dúvidas quanto a sua posição em relação à utilização do dinheiro do meu pai em nosso relacionamento. Claro que eu sempre soube que ele nunca seria capaz de usufruir e aproveitar da minha posição financeira.

Meu namorado era um homem que valorizava cada degrau que precisou subir e gostava de gozar do que havia conseguido na vida. Porém, ouvindo-o falar daquela forma, parecia que aquele ponto o incomodava mais do que deveria. Era como se o ofendesse, e não havia motivos para ele pensar assim.

– E o que exatamente isso significa? – notei a cautela da minha voz, percebendo o medo que me atingia sem nem ao menos saber o porquê.

– Que sou perfeitamente capaz de sustentar você e a nossa casa – ele respondeu prontamente, sem pestanejar e um frio capaz de gelar meu sangue me atingiu. Respirei profundamente sem saber como conduzir a situação.

– Não tenho nenhuma dúvida a respeito da sua capacidade, Alex – ele me encarou, relaxando um pouco os ombros. – Da mesma forma que você quer que eu respeite a sua posição, preciso que compreenda que vivo do que meu pai deixará para mim um dia, porém não apenas disso. Quando completei dezoito anos recebi de presente algumas ações e, todos os anos, este fato tem se repetido. Sei que não contribuí em nada para a construção deste patrimônio, mas ele me pertence e não temos como fugir disso – vi meu namorado ficar cada vez mais tenso.

– Puta merda! – resmungou sozinho e manteve uma careta sofrida no rosto.

– Eu vou lançar meu livro – suavizei a voz para que ele não continuasse tão incomodado. – E se der certo? Você também terá objeções em relação ao dinheiro que vou ganhar com o meu próprio trabalho? – fez um muxoxo, soltando os braços, colocando as mãos nos bolsos da calça.

– Não. Eu não vou implicar em momento nenhum, Charlotte. Só não quero que nossa casa seja sustentada pelo dinheiro do seu pai.

– É o meu dinheiro também – rebati impaciente. – Não sei o que você espera de mim, não sei em que mundo acha que vivo, o que acredita que eu sou, mas isso tudo só está deixando bem claro o quanto você não me conhece. Jamais me permitiria ser sustentada pelo marido, ou por qualquer outra pessoa. E esta confusão toda só me faz acreditar que realmente precisamos cumprir todas as etapas, Alex – ele ficou espantado com a minha reação. Não recuei. Precisava continuar. – Não temos nem uma semana de namoro e já entramos numa discussão absurda sobre dinheiro, um fator que nem eu nem você precisamos nos preocupar. E o que importa se será você ou eu a pagar uma conta, a comprar um móvel? Esta não é a minha ideia de amor. Era para sermos um só, mas parece que somos apenas você.

– O casamento faz de duas pessoas uma só, difícil é determinar qual será – ele sussurrou me encarando. Estremeci.

– William Shakespeare – minha voz ficou fraca.

Era muita coincidência Alex citar justamente o autor que eu tinha como referência de vida? Coincidência ou conhecimento? Não. Não havia forma de ele saber que eu venerava meu conterrâneo, e que seus textos me inspiravam a ponto de muitas vezes servirem de guia para a minha própria vida. Ou havia?

E existia alguma maneira de eu ir contra a sua citação? Não quando eu sabia, dentro de mim, no fundo de toda a minha consciência, que Shakespeare estava certo. Ele sempre estava.

Alex parecia assustado demais. Ele me olhava sem reprovação, mas como se minhas palavras o ferissem e causassem dor. Apesar de eu ver o quanto estava atordoado, não tive vontade de confortá-lo. Não achava correto, nem digno. Ele não precisava que eu cedesse, nenhum relacionamento sobrevive à anulação de um dos lados e o orgulho dele não poderia ditar as regras.

Naquele momento eu percebi o quanto estava cansada de ter a minha vida escrita pelas mãos de outras pessoas. Era sempre assim. Meu pai, minha mãe, meus amigos, eu estava sempre fazendo o que eles queriam e abnegando da minha própria vontade. Poucas vezes lutei pelo que eu queria e, quando isso acontecia, tornava-se uma obsessão tamanha que eu não conseguia fazer mais nada que não fosse me dedicar àquela vitória, como quando precisei ir contra todos para ser escritora, quando precisei colocar Alex naquela loucura de relacionamento para conseguir a sua aprovação.

Eu o amava, mas não precisava abrir mão do que eu era para que este amor fosse verdadeiro ou possível. Bastava apenas que Alex me amasse sem que quisesse me modificar, porque eu jamais seria capaz de mudar qualquer detalhe de quem ele era.

– Você também tem dúvidas – continuei e ele negou com a cabeça, mordendo o lábio. – Não precisamos fazer isso para agradar ninguém, Alex. Não deixe meu pai te intimidar.

– Não é nada disso – sua voz estava fraca, como se ele precisasse fazer esforço para que ela saísse.

– Não pode casar comigo só porque ele quer assim – ele gemeu em protesto, negando com a cabeça tudo o que eu dizia. – Como pode querer se casar comigo quando não consegue me aceitar do jeito que sou? Como pode me amar se não aceita a vida que eu tenho? Nenhuma pessoa é apenas o seu corpo e a sua mente, todas levam consigo uma bagagem, umas são mais leves que outras, mas sempre, sempre, precisamos carregá-las. A minha bagagem é pesada demais para você...

– Não é isso, Charlotte!

Ele me puxou com força, pegando-me de surpresa e me apertando de encontro a seu corpo. Seu rosto muito próximo ao meu, os olhos sofridos em uma súplica muda. Uma mão acariciou o meu rosto, enquanto ele decorava cada parte da minha face. Pensei que me beijaria. Desejei que o fizesse, mas Alex apenas me abraçou e enterrou sua cabeça em meu pescoço, suspirando pesadamente.

– Desculpe! – sussurrou. – Não sei o que acontece comigo quando estou com você. Tenho necessidade de ser tudo o que você precisa e medo de não conseguir ser o suficiente.

Dei um meio sorriso, não de felicidade e sim de desânimo. Alex não conseguia entender que bastava ele estar comigo? Que sempre seria suficiente, porque ele era tudo o que eu mais queria.

– Você não entende, Charlotte! – voltou a me encarar, sem me segurar com a força de antes. – Eu me sinto tão perdido! Olho para mim e não me reconheço, sinto-me um idiota, um adolescente imaturo, agindo por impulso. Não consigo controlar minhas atitudes quando estas estão relacionadas a você, a nós dois. É como se cada experiência vivida por mim, cada detalhe da minha vida, tivesse se apagado, porque eu não consigo encontrar nada que me coloque de volta no meu mundo. E não quero o meu mundo de volta se não puder estar com você.

– Você não precisa abrir mão de nada – tentei ser mais racional, mas estava abalada e emocionada com as suas palavras.

– Claro que tenho, e você também. Não sou o mais experiente quando o assunto é amor, não entendo nada sobre estar apaixonado e por isso estou metendo os pés pelas mãos, mas de uma coisa eu tenho certeza: o amor é feito de renúncias, Charlotte.

– E o que quer que eu faça, que diga a meu pai que não vou aceitar mais nada que venha dele? Que não adiantou toda a sua luta, tudo o que precisou sacrificar para garantir minha segurança financeira? Essa sou eu, Alex! Sou o que ele criou para mim e não posso simplesmente ser ingrata quando me orgulho do que ele é, do que conseguiu.

– Charlotte! – ele aumentou a voz, segurando-me pela nuca e fazendo-me calar. – Eu só não quero que isso se transforme em um obstáculo entre nós. É pedir demais?

Olhei seus olhos sofridos, meu coração acelerado machucava o peito, e um desejo de chorar lutava contra a minha vontade de permanecer firme. Fechei os olhos, forçando-me a engolir as lágrimas. Alex respirou fundo e me puxou para um beijo. Não foi como sempre. Apenas colou os lábios nos meus com força e depois soltou o ar que prendia. Fiz o mesmo.

– Vai ser sempre complicado assim? – senti o medo do que seríamos me dominar.

– Não, não vai – ele foi apaziguador, correndo seus dedos pelas minhas costas. Senti frio, mas não era por causa da temperatura e sim os meus medos me cercando como fantasmas.

– Ainda quer noivar esta noite? – prendi o ar ao fazer esta pergunta. Ele me segurou pelos ombros e olhou firme em meus olhos.

– Quero sim, mas não vou forçar você a nada – eu podia ver o seu medo. Estava estampado em seus olhos. Chegava a ser estranho ver um homem como Alex tão vulnerável. – O que você quer, Charlotte? – Sorri desejando que aqueles problemas nunca mais voltassem a nos atingir.

– Quero nossa bolha de volta – ele mordeu o lábio e me abraçou com cuidado, deitando minha cabeça em seu peito.

– Acho que estamos colocando peso demais em tudo – falou baixinho. Eu concordei com a cabeça. – Eu também quero a nossa bolha de volta – beijou meu cabelo. – Mas tenho motivos reais para acreditar que ela só voltará quando estivermos casados – gemi sem conseguir esconder meu desagrado com aquele assunto. Não éramos obrigados a nada. – Charlotte... – ele segurou meu rosto para que eu o olhasse. – Não me importa o que os outros querem, somente o que nós dois queremos. Eu quero que você seja minha, sem que ninguém precise opinar, ou se meter entre nós dois. Quero poder voltar para casa e me fechar em nosso mundo, ter tudo de volta e com você.

De repente a ideia me pareceu tentadora. Ter Alex de volta, apenas para mim, em um lugar onde ninguém nos alcançasse ou pudesse nos impedir de estarmos juntos. Onde pudéssemos curtir um ao outro, sem reservas ou regras, sem os medos que nos cercavam, ou as diferenças que podiam nos distanciar. Eu queria nossas tardes quentes, poder ficar em seus braços, permitir-me ser amada sem interrupções. Eu queria que o nosso amor fosse livre. Sorri sentindo a tranquilidade voltar ao meu corpo.

– Tudo bem. Vamos encarar este noivado – ele entrelaçou os nossos dedos e sorriu de volta.

– Tem certeza? – seus olhos brilharam com a expectativa.

– Como nunca tive antes – e então eu vi o que buscava. Um Alex, forte, seguro, decidido. O homem que eu amava e que me amava sem limites.


CAPÍTULO 9


“Em tempo algum teve um tranquilo curso o verdadeiro amor.”

William Shakespeare


CHARLOTTE


– Charlotte! Até que enfim vocês voltaram – Lana entrou na sala como sempre fazia, atropelando tudo e todos sem se preocupar se estava sendo indelicada ou não. – Passei a manhã inteira esperando o seu retorno. Vi uns vestidos perfeitos. Você nem vai acreditar, consegui um exclusivo. Mal acredito que tenha conseguido um feito destes tão em cima da hora. Pensei que teríamos que escolher algo pronto, ou aceitar qualquer costureira menos que perfeita...

– Não precisa desta pressa toda, Lana – Alex anunciou calando a irmã e chamando a atenção das outras pessoas presentes na sala que fizeram silêncio para ouvir. – Não sabemos ainda quando vamos casar e, com certeza, não será tão cedo.

– Como assim? – meu pai deu um passo em direção a Alex.

– Charlotte não quer casar, Peter – Alex respondeu antes que meu pai o matasse, dando de ombros. Quase ri. Quase, porque precisei me colocar entre os dois e segurar Peter que já estava ficando meio roxo. – Pelo menos não por agora.

– Pai, não! Pare com isso! – minha mãe se colocou do meu lado. – Eu disse que não queria casar. Quer dizer... – recuei diante do seu olhar assassino. – Nós vamos nos casar, não vamos, Alex? – fui covarde o suficiente para procurar apoio em meu namorado.

– Vamos sim, amor – era impressão minha ou Alex parecia se divertir com a situação? – Assim que você decidir quando. Eu continuarei esperando. Por mim seria amanhã mesmo – porra!

Ele jogou toda a responsabilidade em minhas mãos. Fiz uma careta que não passou despercebida. Alex mordeu o lábio para não rir e colocou as mãos nos bolsos, sem nada acrescentar.

– Charlotte Middleton, o que você está aprontando dessa vez? Está vendo, Mary? Eu disse que ela estava sendo muito mimada. Eu avisei para não dar a ela tanta liberdade, ninguém me ouviu. Concordei com tudo e agora a sua filha está dizendo que não quer mais casar, depois de me convencer de que tinha encontrado o homem da vida dela.

– Pai! – meu rosto queimava de vergonha, tendo a minha vida sendo discutida abertamente diante de todos. E Alex nada fazia para me ajudar.

– Peter, não seja melodramático – minha mãe nem se importava mais com as acusações dele. Só ela para abstrair tudo o que havia de ruim no marido. – Ela está dizendo que vai casar, só que não será agora. Não é isso, Charlotte? – assenti com a cabeça. – Acalme-se e ouça o que a nossa filha tem a dizer.

– Espero que tenha um ótimo argumento ou a levarei hoje mesmo para um convento, Charlotte. E eu nunca falei tão sério em toda a minha vida. Era só o que me faltava. Eu concordo e ela desiste. Só pode ser implicância de adolescente. Só pode.

– Eu não sou mais uma adolescente, e minha decisão não tem nada a ver com você, pai. Que droga! – explodi fazendo-o recuar surpreso. Estava cansada de ter todas as minhas escolhas contestadas, ignoradas ou ridicularizadas. – Sou maior de idade. Sou uma mulher. Sei o que é melhor para mim e assumo todas as consequências das minhas resoluções. Não preciso de ninguém para me guiar, tá legal? – ele permaneceu calado me ouvindo.

Alex se postou atrás de mim, colocando a mão em meu ombro. Não sei se para me conter ou me apoiar, mas de uma coisa estava certa: o sacana me colocou naquela situação.

– Eu decidi que não quero me casar por enquanto. Apesar de ter certeza do meu amor pelo Alex e de querer passar o resto da minha vida com ele, optei por não queimar etapas. Eu, como adulta que sou, conversei com Alex, o outro principal interessado, e, juntos, decidimos que podemos esperar algum tempo. Não quero me casar como se o mundo fosse acabar amanhã. Nem quero o casamento do século. Também não quero ninguém me dizendo como será a minha festa ou o meu vestido.

Percebi que Lana não tinha gostado desta parte, por outro lado, eu estava, pela primeira vez na vida, colocando a minha vontade acima da de todos os outros e não voltaria atrás. Minha cunhada precisaria entender e aceitar.

– Estamos apenas comunicando a vocês que este casamento vai demorar um pouco mais para acontecer, e que, quando estivermos prontos, voltaremos a discutir o assunto.

Dei como encerrado, cruzando os braços na frente do peito e encarando meus pais que me olhavam aturdidos. Ouvi o riso nada discreto do Patrício e podia jurar que, mesmo tentando esconder, Johnny sorria. Quebrar as amarras que me prendiam era o seu maior desejo. Ele também não concordava com a forma sufocante que meu pai conduzia minha vida.

– Olha como ela está falando, Mary. Como se nossa opinião não valesse de nada nas decisões da sua vida. Veja...

– Peter – minha mãe segurou meu pai pelos ombros. – Nossa menina está nos mostrando que cresceu. Não era o que queríamos? – ela sorria e mantinha-se tranquila, apesar de eu ter percebido que algo não estava em seu devido lugar.

– Mas, você...

– Peter, nós precisávamos disso.

Alguma coisa na forma como se olhavam me fez estremecer. Por uma fração de segundo, algo tão mínimo que passaria despercebido para qualquer um, eu vi o medo refletido no olhar do meu pai.

Não era algo que os pais precisassem decidir juntos no que se refere ao futuro dos filhos. Pareciam compartilhar um segredo. Como se meu pai estivesse assustado e soubesse que minha decisão traria uma consequência grave. Involuntariamente, senti-me sufocada. Entrei em pânico. O que poderia acontecer só porque decidi adiar o casamento? O que aquela decisão tinha a ver com a nossa vida?

– E você? – ele praticamente sussurrou.

– Eu vou ficar bem. E feliz! – ela sorriu com os olhos levemente umedecidos.

Eu quis reagir e perguntar o que estava acontecendo, no entanto, esta situação durou apenas alguns segundos e ficou tão íntima que as pessoas não se importaram com o momento e passaram a conversar sobre seus próprios problemas. Eu estava atenta e chocada, porque tinha a certeza de que aquela conversa, apesar de expressar a sua cumplicidade, ao mesmo tempo não expressava o amor deles e sim um desespero. Algo ruim.

– Pelo visto não vou poder te ajudar com a festa – Lana estava ao meu lado reclamando como se nada estivesse acontecendo. Ela me olhava com mágoa. Tive vontade de revirar os olhos.

– Você vai – respondi sem muita convicção, sem realmente prestar atenção ao que ela dizia.

– E o noivado? – Dana se aproximou de Alex, que permanecia com as mãos em meus ombros, pressionando os polegares em minhas costas, massageando-as. – Devemos continuar com os preparativos?

– Sim – Alex respondeu certo de que aquela era a minha escolha também. – Nós vamos continuar com o planejado – falou um pouco mais alto, voltando a ganhar a atenção do meu pai e de mais alguns curiosos que se aproximaram. – Eu e Charlotte precisamos de um tempo para definir como será. Um casamento não pode acontecer do dia para a noite e eu quero que seja tudo como ela deseja, então vamos dar este tempo, organizar nossas vidas, e aos poucos a cerimônia vai ganhar corpo e alma. Sei que vocês estão felizes – mesmo tendo meu namorado às minhas costas, eu podia jurar que ele sorria. – Nós também estamos, e temos certeza de que estamos fazendo a coisa certa.

– Isso – colaborei tentando manter minha voz firme, mas falhei totalmente ao encontrar os olhos do meu pai.

– Agora eu preciso realmente descansar e me preparar, pois preciso ir a uma festa de um noivado esta noite.

Um murmurinho ganhou o ambiente. Dandara e Lana conversaram sobre os preparativos, Dr. Frankli conseguiu fazer meu pai sair daquele clima pesado, Miranda e Patrício sussurravam e riam, presos em seu próprio mundo. Eu apenas segui minha mãe com os olhos. Ela saiu sozinha, com um ar estranho, que fez meu coração acelerar.

– Então, Charlotte, precisamos encontrar um vestido perfeito para você usar hoje à noite. Não sei por que tenho a certeza de que em sua mala só encontraremos calça jeans, camisas xadrez e tênis – Lana me cercou pela cintura, tentando me envolver no clima festivo do noivado.

– Agora não – recuei sem conseguir desviar a minha atenção da porta por onde minha mãe havia saído.

– Mas... – ela tentou sem sucesso.

Alex apertou meu ombro, sem entender. Olhei para ele, no entanto não precisei nem de um segundo para que meu eterno professor entendesse que eu precisava daquele tempo.

– Deixe Charlotte respirar, Lana – minha cunhada fez cara feia para o irmão, que não cedeu nem um centímetro.

– Tudo bem, mas depois não quero ninguém lamentando o fato de ter usado roupas casuais quando estiver olhando as fotos do próprio noivado. Eu estou fazendo a minha parte... – levantou as mãos se rendendo. Suspirei resignada.

– Com certeza tenho um vestido adequado entre as minhas roupas – tentei ser menos broxante para a irmã do meu futuro marido. – Posso te mostrar, mas não agora – ela abriu a boca para protestar, porém consegui impedi-la. – E você tem todo o direito de trocá-lo se não gostar do modelo. Só me dê um tempo – ela soltou o ar e colocou as mãos na cintura.

– Tá certo, Charlotte. Vou verificar o que ficou decidido sobre o menu. Não demore uma eternidade para me mostrar o tal vestido.

– Lana! – Alex a advertiu e ela arqueou uma sobrancelha desafiando-o.

– Nós teremos muito tempo. Com licença! – disparei em busca da minha mãe.

– Alex! – ouvi Peter chamando meu namorado de longe, mas não dei importância ao fato.

Não me preocupei com Alex. Ele saberia como lidar com a sua família. Naquele momento eu precisava entender o que acabara de presenciar. O que havia de errado e o que significava aquela conversa.

Encontrei minha mãe parada no jardim do qual Dana tanto se orgulhava. Ela, muito discretamente, enxugava uma lágrima. De longe era possível acreditar que retirava um cisco do olho, porém, eu conhecia minha mãe como ninguém e sabia que aquele gesto era exatamente o que eu estava pensando. Ela estava chorando.

– Mãe?

– Charlotte! – tentou disfarçar. – Filha o que faz aqui? Lana precisa de você para...

– O que está acontecendo? O que foi aquela conversa estranha? O que...

– Do que você está falando? – Sorriu. Seus olhos brilhavam como só minha mãe podia fazer.

– Da conversa lá dentro.

– Alguém tinha que conter seu pai. Você sabe como ele é com toda esta mania de controle – fez um gesto vago com as mãos. – Tenho certeza de que você consegue entender o seu pai, assim como ele a entende – fez uma careta. – Não de imediato, mas ele entende. Acredite em mim – segurou minhas mãos com força. – Agora me conte tudo. Por que esta decisão tão repentina? Quer dizer... na verdade tudo aconteceu tão rápido que ainda não consegui acompanhar – sua risada genuína soou e eu me senti em casa. Verdadeiramente em casa!

– Ah, mãe!

E começamos uma conversa cheia de confidências, confissões e ensinamentos como sempre deve ser entre mãe e filha. Eu e minha mãe sempre tivemos sintonia e amizade suficiente para nos proporcionar momentos como aquele. Deitei em seu ombro e falei sobre Alex, sobre meu livro, sobre a minha vontade de namorar e, aos poucos, conhecer o meu futuro marido. Ela foi incrível! Dizendo as palavras certas nas horas certas.

No final daquele dia, eu estava convicta de que nenhuma das minhas atitudes tinha sido um erro e que as minhas decisões foram as mais corretas possíveis.


ALEX


Vi Charlotte saindo da casa à procura da mãe e não quis atrapalhar a conversa delas. Eu acreditava que apenas Mary poderia aconselhá-la corretamente. Assim como sabia que ela nunca seria contra a vontade da filha de aguardar, mas, mesmo consciente de que aquela era a decisão mais adequada, afinal de contas, fora minha a louca ideia de não querer aguardar mais do que o necessário para tê-la só para mim, e também entender esta como sendo a única solução para me livrar da perseguição do Peter, eu ainda estava incomodado, mais até do que deveria, por ter concordado que assim fosse.

Tive que aguentar um interrogatório interminável da minha família, além do sorriso absurdamente esperançoso de Tiffany. Perdi a conta de quantas vezes precisei repetir que estava tudo bem entre nós dois. Que nada havia acontecido e que apenas respeitei a vontade dela de vivermos cada uma das fases do nosso relacionamento.

Ao que parece não fui muito convincente.

A pior parte foi quando, muito disfarçadamente, observava Charlotte e a mãe conversarem caminhando pelo jardim, ora parando em um ponto, ora caminhando por outro e fui abordado por Tiffany. Não me sentia confortável para ter qualquer conversa com ela, infelizmente éramos obrigados a ter, no mínimo, uma relação profissional, por causa disso eu me via preso àquela convenção social.

Sorri educadamente disfarçando meu aborrecimento.

– A menina é cheia de vontades, não é? – ela se acercou de mim com intimidade. – Ontem tinha certeza de que queria casar e hoje já não quer mais – riu tentando parecer inocente, embora ela não me enganasse mais.

– Eu e Charlotte conversamos e decidimos. Não se trata de indecisão ou infantilidade. E ela tem razão, por que um casamento às pressas se podemos esperar e fazer tudo da forma convencional? – até eu mesmo podia sentir que não soava confiante, apenas tentava parecer ser, e isso me envergonhou.

– Eu sei. Desculpe! – passou a mão em meu braço. – Sei o quanto está sendo difícil para você, afinal de contas foram muitas decisões e obstáculos. Você abriu mão de tantas coisas... Desculpe, novamente! Não quero me meter em sua vida. É que... eu não queria vê-lo envolvido neste turbilhão de acontecimentos. Apenas isso.

– Tiffany, eu não abri mão de nada por causa da Charlotte. Tudo o que fiz foi por mim. Porque acreditava e ainda acredito que era o certo. Estou fazendo o que deveria ter feito há muito tempo. Charlotte foi apenas o catalisador. E eu quero ficar com ela independentemente de qualquer coisa. Vamos ser namorados, depois noivos e, finalmente, marido e mulher, vamos viver isso juntos e nos amando – era como se eu estivesse dizendo aquilo para me convencer e não para persuadi-la.

– Eu sei. Eu sei – seus olhos marejaram, porém sua postura de superioridade não permitiria nunca que demonstrasse como realmente estava se sentindo. – De qualquer maneira precisamos entender: Charlotte é jovem, ainda tem muito o que aprender e está cheia de energia para sair em busca de novas experiências. Já tivemos a idade dela e sabemos perfeitamente bem como víamos o mundo naquela época. Tudo é novo e mágico, além de estimulante.

Não era para me sentir assim, até porque aos trinta e cinco anos já possuía maturidade suficiente para não me abalar com inseguranças de adolescente, mesmo assim as palavras de Tiffany conseguiram me desestabilizar. Realmente, Charlotte era jovem e havia acabado de se descobrir. Pela primeira vez se permitia viver.

Merda! Eu estava completamente inseguro. E se ela quisesse realmente aproveitar a vida? Conhecer outras pessoas? Não. Ela já disse que não. Mas e... Não. Eu precisava estar mais centrado e manter a minha posição.

– Charlotte sabe o que quer. Assim como eu.

– Como pode ter tanta certeza?

Olhei para Tiffany disposto a rebater seus argumentos, então Peter se aproximou, com uma cara péssima, e meu único pensamento foi “não podia ficar pior”.


CHARLOTTE


– Não sei se a cor é a mais adequada.

Lana me observava sem demonstrar se tinha gostado ou não do vestido. Enquanto isso, Miranda se decidia entre usar uma calça preta combinando com um suéter gola alta verde bem claro ou arriscar o frio e colocar um vestido azul que fica lindo nela.

– Não existe uma cor adequada para um noivado, não que eu saiba – rebati sem conseguir me empolgar com aquela festa.

– E não há – Miranda disse sem tirar os olhos das peças espalhadas sobre a cama.

– Precisamos pelo menos não deixar que pareça tanto com algo improvisado. É o seu noivado, tem que sair perfeito! – ela me olhava com a emoção que eu deveria sentir.

Não conseguia entender. Eu estava certa de que queria me casar com Alex? Sim, estava. Não havia dúvida em relação a esta decisão. Então por que aquele noivado ainda me incomodava tanto? Por que eu simplesmente não relaxava e me deixava envolver pela atmosfera festiva?

– Mas o vestido é lindo! Veja como ficou perfeito nela – minha amiga finalmente resolveu esquecer suas roupas e prestar atenção em mim.

Ela sorriu ao me encarar. Seus olhos brilharam de contentamento e eu sorri de volta. Finalmente comecei a me sentir melhor, como se encontrar o carinho em seu rosto e a certeza de que ela também estava de acordo, ajudasse-me a relaxar. Era disso que eu precisava, de me sentir de volta ao eixo, entre pessoas que eu amava. Claro que esta parte excluía Tiffany e Anita, para meu azar elas eram convidadas e eu nada podia fazer além de ignorá-las.

– Não vamos ter discursos, apresentações e blábláblá, não é? – Lana riu da minha rebeldia e não se intimidou.

– Alex pediu para que fosse apenas uma singela comemoração. Deixou claro como você se sentia sendo o centro das atenções e determinou que eu não ultrapassasse os seus limites, então, não. Vamos apenas conversar, brindar e comer.

– Graças a Deus – suspirei aliviada, fazendo uma nota mental para agradecer ao meu noivo por ser tão atencioso.

– E também vamos dar um jeito de impedir que o padrinho pegue tanto no seu pé – minha amiga piscou para Lana que riu baixinho.

– Charlotte, eu tenho que admitir que finalmente consegui a minha vingança contra Alex e toda a sua perseguição na época em que eu namorava com o João – ela ria, mas eu fechei a cara sem querer pensar naquele problema enquanto pudesse evitá-lo.

– Posso tirar o vestido? – ela me analisou um pouco mais, depois, com um saltinho e palminhas, sorriu feito uma criança diante de uma torta de chocolate. – Acho que o preto não vai contar tanto. E se colocarmos uma sandália que eu tenho, com alguns acessórios ficará perfeito.

Revirei os olhos ciente de que não conseguiria ter paz enquanto não estivesse completamente do agrado da minha cunhada.


ALEX


Caminhei com Peter sem um rumo certo. Percebi que ele queria estar longe do tumulto com os preparativos para a festa. A casa estava agitada e, pelo que entendi, ele queria um lugar reservado. Já podia até imaginar o teor daquela conversa, e, sinceramente, estava de saco cheio. Era uma merda voltar a ser tratado como um adolescente, não ter domínio da situação, ser forçado a concordar, a aceitar... era mesmo uma merda!

– O que deu nela? – suspirei. Que comece o show!

– Não sei, Peter. Aliás, não sei o porquê do espanto. É natural que um casamento aconteça dentro de um tempo razoável...

– Em um tempo razoável, Alex. Não indefinido – olhei para o meu futuro sogro sem saber o que responder.

O que ele queria? Que eu ignorasse as razões de Charlotte e simplesmente agisse como um homem das cavernas, levando-a a força para o altar? Até parece que ele não conhecia muito bem a filha que tinha.

– Charlotte quer apenas curtir um pouco a relação – falei cansado. – Ela é muito jovem, Peter. Não adianta nada ficar pressionando a garota. Eu bem queria que fosse feita a minha vontade, mas...

– Então faça acontecer – ele retrucou mais exaltado do que deveria.

– Não posso forçá-la a se casar! – acabei me exaltando também. Ele se afastou visivelmente incomodado.

– Eu pensei que era você quem ela queria – ele resmungou e as suas palavras me feriram. Claro que eu era quem ela queria. Não era? – Charlotte adora fazer isso. Adora me contrariar. Eu deveria saber desde o começo que se trata do que ela quer.

– Não é nada do que você está falando. Eu e Charlotte temos certeza do nosso amor – ele riu cinicamente, sem me olhar nos olhos, o que me deixou ainda mais irritado. – O que você quer que eu faça? Charlotte é maior de idade. É uma garota cheia de vontade, força a barra até conseguir o que quer, e, se você que é o pai não conseguiu dobrá-la até hoje, não serei eu a conseguir.

Peter se virou para mim, encarando-me firmemente. Pensei que iniciaríamos uma briga ou qualquer coisa parecida, mas ele concordou com a cabeça e voltou a ficar agitado. Alguma coisa estava errada naquela reação.

– Você a ama de verdade?

– Lógico que sim, Peter! – foi a minha vez de me afastar. Corri minha mão pelo meu cabelo, descendo pela nuca e pressionando o local. Acho que nunca antes me senti tão tenso. – Claro que eu a amo. Se não a amasse não... – pensei no que poderia falar. Merda! – Não estaríamos juntos – suspirei me encostando à cerca. Tínhamos caminhado até o celeiro. – Charlotte é o tipo de problema que eu me manteria o mais longe possível. Ela é minha aluna, será uma das minhas escritoras e é bem mais nova do que eu, sem contar que o nível de inexperiência de Charlotte aumenta a diferença entre nós dois. Mas eu a amo, Peter! E não posso nem quero ficar longe dela. Se dependesse exclusivamente de mim, casaríamos hoje mesmo, infelizmente não depende. Eu tenho que levar em consideração a vontade dela. Tenho que respeitar o que Charlotte quer.

Peter me encarava sério. Ele me observava e analisava como se quisesse encontrar em mim alguma saída. Puta que pariu! Eu nem conseguia acreditar que toda aquela pressão era simplesmente para manter a virgindade da filha. Aquilo era loucura demais até mesmo para ele!

– Olha, Peter, eu sei que você fica preocupado, entendo todos os seus motivos, mas Charlotte já é adulta, eu também. Não estamos brincando um com o outro, estamos apaixonados. Ajudaria muito se você confiasse em mim e nos desse mais espaço.

– Você não entende – ele disse assumindo uma posição que não combinava nada com o Peter de outrora. Parecia cansado, triste e confuso. Ele encostou-se na cerca e olhou para longe, perdendo-se na paisagem. – Você não entende, Alex!

– Eu entendo que você queira protegê-la, que está tentando cumprir o seu papel de pai, eu até consigo ver sentido nisso tudo...

– Vai muito além do que você pode imaginar – ele me olhou outra vez me avaliando, como se lutasse para conseguir dizer o que realmente queria.

Eu via em seus olhos um sofrimento escondido por baixo de toda aquela pose, regras... Peter estava apavorado com alguma coisa, e algo em sua postura me levava a crer que estava diretamente ligado a Charlotte. Meu coração disparou, e minhas mãos ficaram suadas. O que havia de errado com ela? O que estava acontecendo para que Peter precisasse agir tão estranhamente?

– Qual é o problema, Peter?

– Bom... – ele correu os olhos pelo ambiente, certificando-se de que estávamos realmente sozinhos. – Primeiro eu preciso saber se você é capaz de guardar um segredo.

Puta merda!


CAPÍTULO 10


“Tarde demais o conheci, por fim; cedo demais, sem conhecê-lo, amei-o.”

William Shakespeare


CHARLOTTE


Depois que consegui me livrar de Lana, que estava ansiosa com a demora de João Pedro que havia saído com Patrício para buscar as flores as quais ela encomendara, decidi procurar por Alex.

Ainda estava abalada com a nossa conversa, com a rapidez das coisas e com o noivado que, mesmo com tão poucos convidados, parecia ser uma cerimônia real. Minha mãe e Dana estavam na sala principal escolhendo o jogo de mesa. Evitei me aproximar. Eu bem sabia o que aquelas duas fariam comigo caso eu resolvesse apenas dizer um “oi” e eu não estava nem um pouco a fim de ouvir uma discussão profunda sobre a prataria.

Saí para a área da piscina e encontrei Johnny conversando com a professora Anita. Ela sorria e parecia estar interessada no que ele dizia. Revirei os olhos. Eu conhecia a capacidade do meu amigo de jogar charme e encantar as pessoas mais improváveis.

Tudo bem que ter a professora Anita como nova conquista do meu melhor amigo não era algo agradável, no entanto, era muito melhor do que ter que me preocupar com ela tentando colocar suas garras em meu namorado... noivo...

E ele não estava em lugar nenhum.

Claro que eu era insegura o suficiente para notar a ausência de Tiffany e formular um monte de teorias absurdas em minha mente infantil. Mesmo assim senti minhas pernas tremerem e meu coração disparar. Depois de toda briga que tivemos desde que eu resolvi revelar o que achava a respeito daquela pressa toda para casarmos, Alex poderia facilmente desistir de mim e entender que minha rival era muito menos complicada, além de estar totalmente disponível para um casamento à velocidade da luz.

– Charlotte! – a voz suave e segura do meu futuro sogro me pegou de surpresa, fazendo-me estremecer. – Tudo bem?

– Oi! – falei sobressaltada. – Tudo. Eu estou... – olhei ao redor sem conseguir me concentrar em nada.

– Procurando Alex – ele afirmou quando deveria ser uma pergunta.

Eu não podia culpá-lo. Desde que coloquei meus pés naquela casa, apenas o meu professor tinha conseguido o meu total interesse.

– Isso – coloquei as mãos por dentro dos bolsos do jeans e não consegui conter minhas pernas, que balançavam meu corpo de um lado para o outro. Dr. Adriano sorriu compreensivamente.

– Eu o vi caminhando com Peter em direção ao celeiro.

Merda! O que meu pai estava fazendo? Com certeza aterrorizando Alex com aquela porcaria de conversa sobre casamento e virgindade... Merda um milhão de vezes. Eu precisava fazer meu pai entender que não casaríamos apenas por causa de sua fixação absurda pela minha pureza.

– Posso fazer uma pergunta sem que você ache que estou me intrometendo demais?

Olhei para o Dr. Adriano sentindo meu corpo gelar. Que tipo de assunto ele teria para tratar comigo? Se ele estava salientando que eu não deveria achar que ele estava se intrometendo, era porque ele realmente se intrometeria em algum assunto que não era da sua conta. E eu sabia muito bem de que merda de assunto ele queria tratar.

– Claro! – meu futuro sogro sorriu gentilmente, pegou minha mão, cruzando-a em seu braço e começou a caminhar lentamente comigo.

– Que você e Alex estão realmente apaixonados, eu não tenho dúvida.

Tentei prestar atenção em meus passos e respirar ao mesmo tempo. A tensão era algo que conseguia me travar e causar um pequeno acidente, fazendo-me tropeçar em alguma raiz, ou qualquer saliência no solo, o que não seria uma grande surpresa no que diz respeito a alguém como eu. Levei a mão livre ao rosto, ajustando a nova armação dos óculos. No entanto, nada falei. Não havia o que dizer já que o meu amor pelo filho dele não estava sendo colocado em questão. Mas então o quê?

– E eu sei que Alex espera um pouco mais deste relacionamento do que você está disposta a dar – seu tom de voz não parecia acusador, mas era.

– Como assim? Eu...

– Charlotte, Alex está ansioso demais, e eu bem posso entender os seus motivos –ofereceu-me um sorriso de conforto que me fez corar. Minha pele esquentou e cada centímetro alcançado pelo rubor era sentido com bastante intensidade. – Não sei se posso repreendê-lo, quando conheci Dana parecia que meu mundo tinha deixado de girar em meu eixo e passou a girar no dela, então eu posso dizer que entendo as atitudes do meu filho – sorri sentindo-me mais segura em relação aos sentimentos de Alex por mim.

– Eu sei que parece estranho eu reagir da forma como venho reagindo – falei por fim e ele concordou com um gesto de cabeça, fazendo-me continuar. – Eu amo Alex, Dr. Adriano.

– Apenas Adriano.

– Adriano.

Sorri recebendo um sorriso de volta. Era fácil e leve conversar com o pai do meu futuro marido. Ele me conduzia tornando a conversa mais proveitosa, fluía, e eu me sentia à vontade para falar.

– Eu amo Alex – reafirmei. – Apesar de estarmos neste...

Pensei sobre como classificar tudo o que eu já tinha vivido com Alex, mas não encontrei nada que pudesse nomear o nosso envolvimento, então escolhi o termo que seria aceito com mais facilidade, sem maiores explicações.

– ... Apesar de já estarmos neste relacionamento há um pouco mais de tempo do que vocês têm conhecimento, ainda acho cedo para um casamento.

– Mesmo assim você aceitou se casar com ele.

– Aceitei. Eu aceitei, só não sabia que seria um casamento relâmpago – Adriano entortou a cabeça para o lado e estreitou os olhos. – Eu pensei que passaríamos por todas as etapas, não imaginei que meu pai faria esta confusão pressionando Alex.

– Não, Charlotte – ele me interrompeu. – Isso não tem nada a ver com a pressão do seu pai, e eu sei que Peter é linha dura, mas nem isso faria com que Alex agisse como um adolescente inseguro, como vem agindo. Ele quer casar porque te ama e porque, assim como você, demorou demais para viver algo deste tipo. Alex está amando e não sabe o que fazer com o que está sentindo. Eu o entendo – apesar de todo o medo que eu sentia quando o assunto era a urgência do meu namorado, consegui me sentir confortável com aquelas palavras.

– E eu vou me casar com ele, Adriano.

– Então... – ele se virou para mim, recolhendo a mecha que descia em meu rosto e colocando-a atrás da minha orelha, assim como o filho fazia. – Permita-se ser amada. O que ele está sentindo é forte demais e, quando você cria uma barreira, como vem fazendo, faz com que ele se sinta ainda mais perdido e desesperado. Você ama Alex, hoje é o seu noivado, encare tudo com este amor que vocês sentem um pelo outro e esqueça o que existe do lado de fora. Apenas aproveite!

Senti toda a emoção daquelas palavras percorrer minhas veias. Adriano tinha razão, eu estava dificultando as coisas para Alex, sem que houvesse um motivo real para tudo isso. Era o nosso noivado e eu queria aquilo. Naquela noite, Alex reafirmaria o seu amor por mim, deixaria claro que era meu, assim como eu era dele. Por que não?

– Ali está ele – Adriano apontou para o lado, mostrando-me onde meu namorado e meu pai estavam.

– Obrigada! – ele sorriu outra vez, com doçura e confiança e eu não sentia mais nenhum ponto de tensão.


ALEX


Ele ainda me olhava como se dependesse da minha resposta para continuar respirando. Eu me sentia confuso. Confuso demais para dizer a verdade. Minha cabeça não conseguia se situar, não formava uma resposta coerente. O que inferno estava acontecendo com Charlotte para que ele precisasse da minha palavra de que manteria tudo em segredo? E que merda era tão importante a ponto de ele praticamente me implorar para arrastar sua filha para o altar?

Se eu transformasse meu romance com Charlotte em um livro, as pessoas diriam que só na ficção algo assim poderia acontecer, porque era tudo extremamente duvidoso. Fantasioso demais e irreal ao extremo para se tratar da vida real.

Há uma semana, eu nunca conseguiria imaginar que chegaríamos a este ponto. Aliás, eu nem me imaginaria casando, quem dirá implorando a uma fedelha para casar comigo. Ri sozinho imaginando a comédia da vida. Seria um romance erótico, com certeza, a bem da verdade seria o romance erótico mais engraçado e dramático que já existiu na história dos livros.

– E então? – ele falou impaciente.

– E então o quê? – cruzei os braços na frente do peito e encarei o pai da minha namorada. – O que quer que eu diga? Lógico que eu sei guardar um segredo, desde que não prejudique ninguém.

– Não. Eu jamais faria algo assim.

– É alguma coisa com Charlotte?

– Indiretamente, sim.

– Tem a ver com os hospitais, algum problema financeiro? Porque...

– Não. Não. Acontece que...

– Oi!

Viramos os dois ao mesmo tempo em direção a Charlotte que se aproximava a passos lentos, com bastante cautela, conferindo o clima da conversa e completamente insegura, além de nervosa.

– Lottie – Peter voltou à sua postura autoritária e segura. Em nada se parecia o homem que estava diante de mim segundos antes de sermos interrompidos. – Como está sua mãe?

Charlotte franziu as sobrancelhas e, sem entender o porquê da pergunta, levantou os ombros delicadamente.

– Bem – ela disse ainda analisando o pai. – Vocês estavam conversando? Eu...

– Não, não – meu futuro sogro a interrompeu. – Estávamos apenas jogando conversa fora, acertando alguns pontos – engrossou um pouco a voz e arqueou a coluna. Charlotte revirou os olhos e eu tive vontade de rir daquele pequeno gesto de rebeldia. – Eu vou entrar agora, Alex – ele se virou para mim me encarando firmemente. – Em breve terminaremos esta conversa.

– Claro.

Respondi ainda incomodado com o tal segredo que envolvia indiretamente a mulher com quem eu queria passar o resto da minha vida. E se fosse algo que nos limitasse? Balancei a cabeça tentando expulsar todas as perguntas sem respostas que me ocorriam.

Peter saiu deixando-me sozinho com Charlotte, o que também era estranho. Assim que me vi longe da sua presença, soltei o ar dos pulmões, sentindo meus ombros tensos e doloridos. Movimentei a cabeça tentando relaxar um pouco e levei a mão até minha nuca pressionando o local.

– Ele pegou muito pesado?

Charlotte estava parada na minha frente, no entanto, mantinha uma distância segura. O receio dela parecia levantar uma parede entre nós dois. Uma barreira que eu não queria que existisse, principalmente depois daquela conversa maluca. Estiquei o braço e puxei para mim a garota que eu tanto desejava, cercando-a e colando meu corpo ao dela. Beijei seu rosto, aspirando seu aroma tão familiar e reconfortante. Ela relaxou em meus braços.

– Oi! – deixei-me envolver pela imensidão que era Charlotte. Minha voz baixa e rouca demonstrando o quanto eu sentia sua falta. – Parece que tem um ano que não te vejo – sussurrei. Ela fechou os olhos e deitou a cabeça em meu peito.

– Parece que tem um ano que você me tocou uma última vez – ela disse utilizando o mesmo tom, baixo, cansado e saudoso.

– Por onde você andou nos últimos dez anos, menina? – estreitei meu abraço.

– Provavelmente no jardim da infância.

Rimos juntos, e o clima ficou suave instantaneamente. Afrouxei o aperto, e ela levantou o rosto para me olhar. Acariciei seu rosto ainda com traços infantis, correndo as pontas dos dedos pela sua pele alva, contornando seus lábios cheios.

– Pensei que Lamara não te deixaria em paz.

– Ela tentou, mas não conseguiu.

– Então acredito que ainda teremos mais algum tempo para aproveitar.

Beijei Charlotte com uma saudade que nem eu sabia sentir. Os lábios doces e saborosos se renderam aos meus em uma dança lenta e sensual. Primeiro nos provando, saboreando o momento, até que passei minha língua em busca da dela e o beijo ganhou mais corpo, mais avidez.

Sentindo Charlotte se aproximar, se é que era possível, descansei uma mão na base da coluna dela, puxando-a para mim, enquanto as mãos delicadas da minha namorada roçavam meu peitoral. Minha outra mão subiu lentamente pelas costas dela, acariciando aquele corpo maravilhoso até encontrar a nuca, aprofundando o beijo.

Eu amava beijar Charlotte Middleton!

Então senti que as coisas estavam esquentando além do que poderíamos aguentar, ou que ficariam impróprias para o local. Pensando nisso, afastei meus lábios dos dela, mas me permiti um pouco mais daquele doce sabor, descendo a boca e, por vezes, a língua pelo seu pescoço até chegar ao ombro.

– Alex! – ela sussurrou cheia de desejo.

Minhas mãos não conseguiam ficar longe. Ansiavam por toques mais ousados, por lugares não permitidos, pena que eu precisava me limitar ao seu tronco. Era uma tortura!

– Casa comigo! – sussurrei minha súplica ainda em seu pescoço.

Era uma necessidade que ultrapassava os limites do meu corpo. Eu a queria, e queria completamente. Sem limitações, sem pudores, sem bloqueios. Charlotte riu baixinho, encolhendo-se com o toque dos meus lábios em sua pele.

– Eu já disse que sim –afastou-se outra vez para me olhar nos olhos. Ela sorria, e estava linda.

No mesmo instante a conversa estranha com Peter me atordoou. E se fosse algo com Charlotte? E se alguma coisa de muito ruim fosse acontecer e eu acabasse perdendo-a? Droga! Fechei os olhos e colei minha testa a dela.

– Case comigo amanhã – supliquei e sorri para a loucura que tinha acabado de dizer. Ela riu.

– Em um ano.

Suspirei abrindo os olhos e me sentindo incomodado com sua recusa. Voltei a olhá-la, analisando cada detalhe, pensando em todas as alternativas, tentando encontrar os argumentos corretos. Ela sorriu, retribuindo o olhar.

– Tem certeza de que quer abrir mão de tudo o que fizemos até agora? – ela fez uma expressão divertida. – Você sabe que não vamos ter sossego.

– Alex...

– Eu vou esperar, Charlotte. Vou aguardar todo o tempo de que você precisar – tentei parecer relaxado, como se o assunto não me incomodasse. – Mas não sei se você conseguirá ficar um ano sem sexo – ela deixou de sorrir.

Segurei firme na cintura dela, afastando-a lentamente. Charlotte resmungou desgostosa. Sorri sentindo o quanto adorava saber que ela me desejava como antes. Nada havia mudado.

– Não vamos ficar sem sexo. Meus pais viajam a maior parte do tempo – continuei sorrindo e mantendo minha postura relaxada. – Pare de tentar me aterrorizar, Alex!

Ri com vontade. Charlotte era inacreditável.

– Eu só estou me certificando.

– Para!

Ela me deu um tapa leve no braço, mas, mesmo assim, encolhi-me, rindo do seu rosto vermelho. Em um movimento rápido, agarrei Charlotte com força, prendendo-a junto a mim e comecei a fazer cócegas. Ela soltou um gritinho e se debateu rindo sem parar.

– Charlotte!

Ouvi Lana gritando e deixei que minha namorada se afastasse. Ela ria e limpava as lágrimas que escorreram por causa dos seus risos. Então, sem pretender assustá-la, voltei a puxá-la, envolvendo seu corpo com meus braços, deixando-a de costas para mim. Eu sabia que a minha irmã levaria Charlotte para longe de mim, por isso enfiei meu rosto em seus cabelos desgrenhados e aspirei seu cheiro, como um viciado.

Eu era viciado em Charlote Middleton.

– Eu sabia que era por pouco tempo – resmunguei em seu ouvido, observando minha irmã se aproximar. Charlotte gemeu descontente. – Não vá! – brinquei travesso e ela riu.

– Não me deixe ir – pediu antes que Lana nos alcançasse.

Apertei meus braços em volta dela e beijei seu pescoço com vontade.

– Pode parar com isso, Alex! – minha irmã nos alcançou sem se sentir intimidada por perturbar um casal apaixonado. – Eu preciso levar Charlotte ou não conseguirei deixá-la pronta tão cedo.

– Você sabia que 34% dos divórcios são motivados pelas cunhadas? – ela me olhou sem se alterar, aguardando que eu largasse minha namorada.

– É sério isso? – Charlotte ficou assustada. Eu ri.

– É claro que não – Lana riu também. – Mas 73% dos divórcios acontecem porque o noivo estragou o momento da noiva na produção para o noivado.

– Tá de sacanagem comigo! – Charlotte deu um gritinho infantil, entrando na onda da minha irmã.

– Contra fatos não há argumentos – soltei minha namorada, a contragosto, é bem verdade. Ela aceitou a mão de Lamara e virou-se para me olhar.

– Vejo você depois? – seus olhos tristes quase me fizeram recuperá-la das mãos da minha irmã.

– E por que não?

– Não sei. Meu pai e as suas conversas misteriosas – levei mais tempo do que o necessário para responder.

– Nem se ele estivesse realmente armado – sorri, apesar de não me sentir realmente alegre.


CHARLOTTE


– Sem base – rosnei para Lana que me olhava sem acreditar no que eu dizia.

– Todas as mulheres naquela sala estarão com a pele mais bonita do que a sua. Já pensou nisso?

– Não estou me importando. É um noivado simples, não preciso reconstruir o meu rosto com esta infinidade de maquiagem.

– Use esta aqui – Miranda entrou no banheiro como a senhora da situação. Minha amiga me conhecia muito bem. – É bem leve e fininha, ela nem vai sentir.

– Hum! – Lana avaliou o pequeno pote em sua mão. – Importada?

– Com certeza! – ela saiu do banheiro deixando-me outra vez nas mãos da minha cunhada.

– Tudo bem! Vou tentar fazer o meu melhor. Esse lance de maquiagem nunca foi o meu forte, apesar de eu adorar. Como não tivemos tempo de organizar um noivado como deveria ser, ou seja, não temos um profissional para cuidar da sua pele e cabelo, vou usar tudo o que consegui aprender nos infinitos tutoriais que assisti, para deixá-la pelo menos aceitável.

Ri da minha cunhada. Por que ninguém naquela casa conseguia encarar aquele noivado como algo simples? Era tão difícil entender que o que aconteceria ali seria apenas a formalização de algo de que tanto eu quanto Alex já tínhamos certeza? Esta festa servia apenas para alimentar o ego dos nossos pais permitindo que eles participassem da comemoração de algo que só dizia respeito a nós dois.

Mas se era assim que eles queriam, eu faria, até porque não era nenhum sacrifício. Aliás, com Alex nada era. Ficava até mais fácil aceitar o casamento quando eu pensava que o noivo, ou o prêmio, era ele. Que depois do fatídico “sim” eu teria uma longa vida adulta e madura ao lado do homem que eu amava e desejava loucamente.

Adulta e madura.

Puta que pariu!

Puxei o ar com força sentindo a familiar ansiedade guerrilhar bravamente para ganhar mais espaço no meu estado quase fragilizado de paz. Levar uma vida adulta e madura poderia ser algo normal e corriqueiro para a maioria das pessoas que já haviam cruzado o meu caminho, ao passo que, para mim, era o meu principal obstáculo.

Não que eu não fosse madura, eu era. Bem... digamos que algumas vezes sim.

Tá legal! Eu vivi quase que 99,9% da minha vida em um mundo criado exclusivamente para mim, meus sonhos e minhas vontades. Não vou negar esta realidade. Não vou mesmo. Minha vida se dividia a antes de Alex e depois de Alex, e posso jurar que na primeira parte eu vivi em um mundo fictício, longe de qualquer realidade. Eu era a garotinha rica que, apesar de não ser uma patricinha, permitiu-se viver afastada do mundo real.

Até a chegada de Alex.

– Se continuar enrugando o rosto vai ficar com uma maquiagem digna de filme de terror.

– Desculpe – puxei o ar tentando não me deixar impactar pelos pensamentos.

Eu sabia, tinha certeza, que estragaria tudo. Pelo amor de Deus! Alex era um homem! Um homem maduro, experiente, seguro... merda! Eu não deveria pensar assim. Não deveria ser tão insegura, tão infantil...

– Charlotte! – Lana me repreendeu.

– Desculpe, Lana!

– O que foi? – ela me encarou pelo espelho. – Você está hiperventilando. É um ataque de ansiedade?

– Não. Eu... é só... nossa! Não sei dizer – ela me encarou por mais alguns segundos. Depois fechou o frasco da base, segurou um pincel grosso e sorriu.

– Feche os olhos – obedeci imediatamente. – Relaxe. Eu sei que não deve ser fácil.

– Não é – suspirei mais uma vez.

– Mas com certeza é muito melhor casar logo do que sofrer a perseguição das pessoas que só pensam em sabotar os amassos que todos os namorados merecem dar – ri com gosto.

– Eu vou ter todos os amassos que puder. Meus pais ficam a maior parte tempo fora do país, ou seja, teremos uma longa temporada de adaptação – meu corpo conseguiu relaxar um pouco com a possibilidade.

– Vocês já estão totalmente adaptados. Vá por mim. Basta olhá-los para perceber o quanto estão na mesma sintonia. Alex está tão... não sei se posso falar sobre isso sem a autorização dele – ela riu diabolicamente. – Pensando bem vou falar mesmo assim. Ele está apaixonado. Bobamente apaixonado, eu posso dizer. Está do tipo que não enxerga mais nada quando você está presente e não faz questão de esconder de ninguém, para o desespero da oferecida da Anita.

– E da Tiffany também – Lana parou por alguns segundos e eu percebi que Tiffany era um assunto delicado.

– Tiffany tem motivos para se sentir assim, Charlotte! Não pense nela como alguém que não mereça a sua consideração. Ela só está... – ouvi o seu suspiro e me senti incomodada. – Ela tinha esperança que Alex voltasse, afinal de contas eles tinham uma boa química, não como é com você, claro! – acrescentou rapidamente. – Era como se eles formassem uma dupla de sucesso, algo acima do que sentiam um pelo outro, porque eu sempre soube que Alex não amava Tiffany, mas eles se davam bem. Não foi surpresa quando Alex pôs um fim na situação, pelo menos não para mim, eu sabia que nenhum relacionamento funciona da forma como eles estavam fazendo e ela estava cada dia mais envolvida, porém foi um choque para ela. Tiffany foi embora do país, talvez acreditando que ele se arrependeria ou sentiria a sua falta, só que isso não aconteceu, e a partir daí eu passei a tomar conta dos negócios dela dentro da nossa editora e Alex foi se distanciando como pôde.

Fiquei em silêncio absorvendo o que ela tinha dito. Alex e Tiffany tinham uma ótima química. Aquilo era uma merda! Bom, pelo menos ele nunca a amou e afirmava me amar. Era melhor não seguir este rumo de pensamento ou então eu ficaria cheia de rugas. No entanto, seria importante uma conversa com o meu futuro marido sobre o que foi o relacionamento dele com a sua querida escritora. Que ódio!


ALEX


Fechei os últimos botões da camisa, a única social que havia levado. Ainda bem que eu sempre procurei estar preparado para todas as ocasiões. Olhei para o espelho alisando o tecido e sentindo o quanto o meu corpo estava tenso.

– É apenas um noivado, Alex. E com a mulher que você ama – disse a mim mesmo. Ainda assim eu continuava nervoso.

A conversa com Peter me incomodava mais do que deveria, e eu nem sabia do que se tratava, poderia até mesmo ser qualquer bobagem tipo “como manter a virgindade da filha já desvirginada”. Ri sozinho. E então ouvi a batida leve na porta.

Depois de tudo o que havia passado com Anita, era melhor não abusar da sorte, por isso caminhei até a porta.

– Quem é?

– Tiffany – ela disse mantendo a voz baixa.

Suspirei pesadamente encostando a testa na porta, guerreando contra a vontade de mandá-la embora.

– Só quero conversar, Alex. Lá embaixo será impossível – abri a porta ainda com receio, mas infelizmente não podia me recusar a conversar com ela.

– Sobre o que deseja conversar? – não lhe dei passagem.

Vi o quando Tiffany ficou decepcionada com a minha atitude e me senti miseravelmente canalha por tratá-la daquela forma. Ela usava um vestido prata muito bonito, embora inadequado para uma noite fria e chuvosa. Não pude deixar de notar o decote aprofundado revelando seios fartos e incrivelmente firmes. Os bicos estavam rígidos e, mesmo eu sabendo que era uma reação ao clima, foi inevitável não apreciar.

Porra! O que eu estava fazendo?

– Não posso mais entrar em seu quarto?

Seus olhos brilhantes pelas lágrimas que ela tentava conter me fizeram recuar. Saí da frente deixando que ela passasse e roguei a Deus para que Charlotte não resolvesse me procurar. Pensando nisso, resolvi trancar a porta evitando maiores problemas.

– Desculpe, Tiffany! É que...

– Charlotte não compreenderia. Eu sei – ela abraçava o próprio corpo como se tal atitude pudesse mantê-la firme. – Não podemos exigir muito da garota.

– Eu não gosto que fale de Charlotte como se ela não fosse madura o suficiente para entender qualquer situação. Além do mais, nenhuma mulher compreenderia se encontrasse seu noivo no quarto com a ex dele, não concorda? – ela mordeu o lábio inferior e eu tive a impressão de que evitava um sorriso.

– É verdade.

Caminhou até a cama e sentou-se nela, correndo os olhos pelo quarto. Eu sabia o que ela pensava e me senti péssimo por também lembrar. Em seguida, deixou a mão alisar a cama e fechou os olhos se permitindo vivenciar as lembranças do que já havíamos feito nela. No movimento, o vestido desceu um pouco pelo braço, revelando mais de seus seios, e as pernas trabalhadas ficaram mais expostas. Percebi que ela estava maquiada, sem exageros, mas de uma maneira sedutora.

Engoli com dificuldade. Tiffany era elegante e sensual e eu me lembrava do quanto ela era boa de cama, o único lugar onde se permitia perder a compostura.

– Nós éramos bons, não éramos?

– Éramos.

Não sei por que não evitei a resposta. Apenas sentia que não seria justo com Tiffany renegar o que havíamos vivido, no entanto, a sensação de que estava traindo Charlotte, permitindo-me ter aquela conversa, atormentava-me.

– Olha, Tiffany...

– Eu só queria dizer que não vou desistir – ela me encarou com firmeza. – Eu não vou desistir, Alex. Não vou jogar sujo, não vou agir como uma sem classe, nem vou fazer nada para destruir o que você quer viver com a menina – sorriu ao se referir a Charlotte de uma maneira infantil. – Apenas não vou desistir e vou lutar com todas as minhas armas. Eu sei o que vivemos, sei o que era forte em nosso relacionamento – mais uma vez as lembranças alcançaram minha mente e a reação irracional do meu corpo me incomodou.

Tive vontade de me bater. Por que homens são sempre tão irracionais? Por que bastava uma mulher ser gostosa e se oferecer para que, mesmo que fosse uma parcela mínima do seu cérebro, pensar na possibilidade? Cara, eu tenho que ser honesto comigo mesmo e não ficar tentando sustentar uma imagem que não existe, porque nenhum homem da face da terra passaria incólume por uma mulher como Tiffany, principalmente tendo conhecimento de todas as possibilidades.

Ao mesmo tempo que eu pensava o quanto senti tesão... tudo bem que não era aquele tesão incontrolável que me faria perder a cabeça, mas era uma sensação que me incomodava e alertava... ao mesmo tempo que tudo aquilo me atingia, eu pensava no quanto o meu amor por Charlotte era verdadeiro.

Sim, era um amor verdadeiro, e tal constatação aqueceu meu corpo eliminando qualquer vestígio de Tiffany. Era apenas tesão, algo irracional e sem força alguma. A leve sensação de sentir a boca salivar ao lembrar do sabor de uma comida, sem desejar voltar a comê-la. Já Charlotte... Ah, Charlotte! Ela era tão adequada para mim, tão na medida certa, exatamente o que eu necessitava, o que eu ansiava... ela era o que eu desejava, na cama ou fora dela.

Quis sorrir ao me dar conta da sensação gostosa que aquele amor me fazia sentir. No entanto, eu não o fiz. Não poderia dar a Tiffany qualquer incentivo para toda aquela loucura.

– Não vai dizer nada?

Olhei para aquela mulher linda, sentada em minha cama e não sabia o que dizer além de tudo o que já tinha dito. Coloquei a mão no bolso, encostando-me na parede e respirei profundamente tentando aliviar um pouco a tensão.

– O que eu posso te dizer? Você é livre, é maior de idade, é decidida. Além do mais, tenho certeza de que nada do que eu diga, ou faça, vai mudar a sua decisão. Eu só... – pensei em uma maneira de me expressar que não a machucasse – ... lamento por ser assim.

– Lamenta? – seu tom de voz me deixou alerta. – O que você lamenta?

– Que você prefira me afastar em vez de superar isso e ser minha amiga. Nós costumávamos conversar sobre nossas carreiras, eu gostava da forma como você conduzia a sua e adorava participar de cada conquista. Tudo bem que somos muito diferentes em diversos aspectos e pensamentos e, apesar deste ser um empecilho para qualquer coisa que pudesse acontecer entre a gente, eu nunca a olhei de uma maneira ruim.

– Eu não quero ser sua amiga, Alex! Não quero restos. Não quero ter que me contentar em assistir a sua felicidade, até porque eu sei que você nunca vai ser feliz com aquela... aquela... garotinha! Pelo amor de Deus! O que está acontecendo com você? Eu sei que a fantasia pode durar até mais tempo do que podemos imaginar, mas coloque a sua cabeça no lugar. Você está abandonando tudo, está desistindo, e tudo porque ela era virgem! O que é isso? Ficou fascinado por pessoas sem experiências? Pelo que me lembro essa nunca foi uma marca sua.

– Fale baixo! – rosnei para contê-la.

Tiffany saiu do controle como poucas vezes eu tinha visto. Foram tão poucas que eu podia contar em apenas uma mão e quase todas estavam ligadas a meu relacionamento com Charlotte.

– E se fosse o contrário? Se você caísse fora do relacionamento me deixando apaixonado? Se você se apaixonasse por um rapaz mais novo, ou mais velho? E se eu te amasse como você diz me amar, o que você faria? Gostaria de sofrer toda esta perseguição? De ser acuada sempre que estivesse sozinha? De ser desrespeitada com um assédio tão explícito?

Ela recuou se dando conta do quanto estava sendo ridícula. Seus olhos foram para o chão e seu corpo perdeu a postura sensual.

– E você desistiria? – sua voz saiu tão fraca que foi quase um sussurro. – Desistiria de um amor só porque não é correspondido? – pensei imediatamente em Charlotte e soube a resposta.

Puta que pariu!

– Só que você não me ama – mantive a voz calma e baixa. – Pode achar isso hoje, pode continuar acreditando amanhã, só que quando se der conta da verdade, vai se sentir patética – outra vez ela demonstrou sentir vergonha pelas minhas palavras.

– Assim como você não ama Charlotte, e ela não te ama.

– Não fale o que não sabe.

– Eu casaria com você no mesmo segundo do pedido – puta merda! Ela soube me dar a rasteira certa.

– Isso não quer dizer nada.

– Quer dizer muita coisa, Alex, é uma pena que esteja deslumbrado demais para perceber a verdade.

– Tiffany...

Alguém bateu na porta fazendo-me estremecer. Rapidamente me dei conta de que ela estava trancada e respirei aliviado. Tiffany levantou da cama expressando o mesmo temor que eu. Levei o dedo aos lábios pedindo para ela fazer silêncio. Outra batida e depois a pessoa tentou abrir a porta.

– É ela? – Tiffany sussurrou. Eu dei de ombros sem nada dizer e então ela sorriu. – Está com medo?

– Tiffany, por favor... – sussurrei me afastando ainda mais da porta. O que aquela louca estava pensando em fazer?

– Alex? – Ouvi a voz da minha noiva e tive vontade de xingar alto. Duas vezes. Duas vezes no mesmo dia aquela merda acontecia comigo.

Eu não entendia por que era tão castigado por Deus. Por que eu precisava passar por toda aquela tensão, tantas e tantas vezes, como se não tivesse direito a paz. E paz era a única coisa que eu queria naquele momento.

– Abra a porta, Alex – Tiffany me desafiou mantendo a voz baixa.

– Está maluca? – quase rosnei.

– Se ela te ama realmente, vai entender – ela se aproximou da porta e sorriu.

– Não se atreva!

Minha mente dava giros, um carrossel de pensamentos e possibilidades. Foi quando Tiffany se atirou em meus braços nos jogando contra a parede. Ela riu e eu tive vontade de matá-la.

– Isso é um mal de família? Puta que pariu! – fiz muito esforço para controlar a minha voz.

– Charlotte! O que faz aqui? – ouvi a voz de Mary um pouco mais distante. – Ainda não está pronta? Todos estão esperando. Onde está Alex? – Tiffany me encarou e sorriu largamente.

– Um beijo pelo segredo – ela sussurrou em meu ouvido.

– Pare com isso! – tentei afastá-la, mas estávamos muito próximos e eu morrendo de medo de ela fazer alguma loucura.

– Só um beijo – implorou manhosa se enroscando em mim. Senti o cheiro do álcool que exalava dos seus lábios. Puta merda! Como não percebi antes?

– Você bebeu? Perdeu o juízo?

– Um beijo e eu não conto nada. Juro!

– Não seja ridícula!

– Eu pensei que ele ainda estivesse aqui. Queria só... – Charlotte fez silêncio e meu coração quase parou. Os lábios de Tiffany alcançaram os meus. Eu estava petrificado, os olhos colados na porta.

– Alex!

A maluca sussurrou roçando os lábios nos meus. Não reagi. Não consegui reagir nem para afastá-la, nem para dar logo aquele maldito beijo que a manteria quieta. Eu apenas aguardei, sem nem mesmo respirar, tal era o meu pânico.

– Pensei ter ouvido algo. A porta está trancada – ela tentou novamente.

– Charlotte! – Mary, agora mais perto da porta, recriminou a filha. – Que coisa mais feia! Não pode entrar no quarto de um rapaz assim.

– Eu vou casar com ele, então, teoricamente, eu posso sim – ela tentou mais uma vez.

Porra! Que merda era aquela? O universo decidiu conspirar contra mim?

– Alex deve estar no banho e você precisa colocar logo aquele vestido. Vamos – tive certeza de que Charlotte hesitou, mas finalmente ouvi os passos se afastando até desaparecerem.

Então respirei aliviado sentindo tudo girar. Sem pensar duas vezes, segurei Tiffany pelo braço e a joguei sobre a cama, para longe de mim. Ela riu, mas eu vi o quanto ficou ofendida ao me ver limpar a boca horrorizado com o que ela tinha feito.

– Eu quero você longe da minha casa – falei com firmeza sem gritar. Eu ainda tinha receio. – Quero você e a sua prima louca longe da minha casa e da minha vida.

– Alex! – ela arfou vendo-me tão decidido e ofendido.

– Vá. Embora!

– E o que você vai dizer a sua noivinha? O que vai dizer aos pais dela quando eu tiver que partir.

Merda! Merda! Merda!

– Puta que pariu, Tiffany! Você enlouqueceu?

– Desculpe-me! – falou chorosa, como se tivesse acabado de se dar conta do que havia feito. – Meu Deus, desculpe-me! Eu... – olhou para si mesma horrorizada. – Alex, perdoe-me, eu não devia ter bebido, não devia ter vindo aqui, eu... – e começou a chorar.

Era só o que me faltava!

– Porra! – falei um pouco mais alto, esfregando o rosto tentando encontrar um jeito de acabar logo com aquilo.

– O que Anita fez? – ele me olhou suplicante, envergonhada.

– Basicamente o mesmo que você. O que eu vou precisar fazer para que vocês entendam que eu...

– Eu entendi – ela levantou rapidamente, visivelmente constrangida. O que estava acontecendo com Tiffany? – Eu entendi. Perdoe-me! Não sei o que me deu. Eu vou... – ela foi em direção à porta, mas voltou. – Pode verificar se tem alguém no corredor?

Fiquei tão confuso que não consegui nem retrucar. Havia algo de muito errado com aquela mulher. Mesmo assim fui até a porta, abri e olhei o corredor me certificando de que ninguém veria Tiffany sair do meu quarto. Apenas lhe dei passagem e ela praticamente correu para fora, sumindo da minha vista sem ao menos se despedir.

Fechei a porta, andei até a cama e me atirei nela desejando poder voltar logo para a minha casa.

As mulheres, definitivamente, eram loucas.


CAPÍTULO 11


“Ninguém admira a pressa, a não ser o negligente.”

William Shakespeare


ALEX


Puxei o ar sentindo-me sufocar. Era uma merda tudo o que estava acontecendo. Primeiro Anita, com aquela oferta ridícula, aproveitando-se de uma situação delicada, depois, como ironia do destino, Tiffany com a sua ameaça e então tudo outra vez. O que mais faltava acontecer?

Não. Eu não queria nem pensar que algo mais poderia acontecer.

Era o meu noivado, porra!

Como se não bastasse o noivado por si só já ser uma situação complicada. Com um rompante levantei da cama e segui para o espelho do closet, conferindo minha imagem. Fora a camisa levemente amassada, tudo estava no lugar. Nada me entregaria. Mesmo assim fui ao banheiro e escovei os dentes. Jamais beijaria Charlotte tendo beijado, mesmo que forçadamente, e não tendo sido um beijo real, outra mulher.

Conferi de novo a imagem no espelho e ouvi alguém batendo na porta. Revirei os olhos. Definitivamente eu não teria paz enquanto não estivesse em casa. A pessoa abriu a porta e eu pude ouvir o som dos saltos se chocando contra o chão. Estava preparado para mais uma rodada de confusão quando vi a imagem da minha mãe surgir no espelho. Confesso que soltei o ar e fechei os olhos, completamente agradecido.

– Alex? Algum problema? – ela entrou no banheiro parecendo preocupada. Sorri aliviado

– Tirando o fato de ter duas loucas me cercando, não, mãe, está tudo certo – ela franziu o cenho e eu virei para encará-la.

– Isso é realmente estranho – ela me encarou séria. – Você não está...

– Não, mãe! – passei a mão no rosto e deixei meus dedos bagunçarem meu cabelo. – Eu amo a Charlotte! Jamais faria qualquer coisa para magoá-la – vi minha mãe relaxar e sorrir contente com a minha afirmação.

– Ótimo! Porque não quero enfrentar todo este processo de noivado às pressas para saber que você vai desistir.

– Eu não vou. Pode ficar tranquila.

– E Charlotte é uma ótima menina – ela continuou sendo firme, mas não estava zangada.

– Eu também acho – cruzei os braços no peito encostando-me na bancada e aguardei até que ela completasse o seu discurso.

– E o pai dela é uma fera – sorri. – Eu estou falando sério, Alex! – Ri e ela me abraçou. – Vocês estão atrasados. Todo mundo aguardando por vocês e até agora nenhum dos noivos apareceu.

– Eu estava só escovando os dentes e já ia descer.

– Mas foi bom te encontrar aqui – seus olhos ficaram marejados, uma emoção típica das mães que viam seus filhos darem passos importantes.

– Você não vai chorar, não é? – brinquei e ela riu já deixando claro que choraria. – O que foi?

– Eu conversei com Lana e juntas decidimos uma coisa muito importante – aguardei enquanto ela tentava segurar a emoção. – Peter e Mary são milionários e nós sabemos que eles vão assumir este casamento sem aceitar a nossa ajuda.

– Não vai ser assim – tentei falar, mas ela me impediu.

– Não estamos preocupados com isso. O importante é que dê tudo certo, então... – ela hesitou puxando o ar como um adolescente. Minha mãe era linda! Seu sorriso era capaz de contagiar o mundo. – Como eu ia dizendo, eu e Lana conversamos. Este noivado aconteceu de forma inesperada, acredito que nem você poderia imaginar que ele acontecesse – concordei com a cabeça sem interrompê-la – Por isso não comprou nenhum anel para a Charlotte, estou certa?

– Está, mas não acredito que ela vá se importar com isso. Amanhã mesmo eu posso providenciar um.

– Você sabe que o meu anel de noivado estava na família do seu pai por muitas gerações.

– Mãe... – eu não acreditava que ela seria capaz daquilo. Não comigo – Lana herdou ele, foi o anel do noivado dela e será o da filha que ela tiver ou da noiva do filho dela – minha mãe sorriu e revelou o anel em sua mão. – Mãe, eu não sou...

– Não faça isso, Alex.

Ela me interrompeu antes que eu pudesse falar sobre aquele assunto que tanto evitávamos. Uma volta ao meu passado que não levava paz a nenhum de nós. Eu não podia acreditar que Lana abriu mão do anel. Não podia acreditar que teria direito, ou mereceria ter.

– O anel vai continuar na família – ela disse com a voz embargada. – E será da primeira neta que casar, e depois vai para o dedo da próxima e eu espero realmente que isso nunca se torne uma confusão – riu ao deixar uma lágrima cair. – Seu pai está de acordo – ela sussurrou.

– E também estou orgulhoso em saber que você esperou até encontrar a garota certa para recebê-lo – meu pai entrou no banheiro pegando-nos de surpresa. – O anel é seu também, filho – o bolo em minha garganta não me deixou responder.

Eu estava tão grato e emocionado que não conseguiria dizer nada. Minha mãe esfregou a mão em meu peito me confortando, depois me abraçou bem forte. Assim que ela me largou, foi a vez do meu pai.

– Obrigado! – sussurrei sem conseguir conter a emoção. – Obrigado, pai!

– Agora vamos, antes que Charlotte pense que você desistiu – minha mãe brincou. Meu pai riu, dando tapinhas nas minhas costas, e juntos saímos do meu quarto, deixando todos os problemas para trás.


CHARLOTTE


Abri a porta do quarto ansiosa demais. Eu queria ver Alex, sentir a sua pele, provar seus lábios e ter a certeza de que aquilo tudo era real, mas Lana demorou tempo demais me maquiando. Meu cabelo não queria ficar de uma forma bonita, nem ao menos apresentável, era sempre aquela mesmice lisa, sem nenhuma volta, que me irritava profundamente e, para piorar, minha mãe ficou na minha cola sempre repetindo que eu precisava ter bons modos, que não era de bom tom ir ao quarto de um homem, que quando eu descesse deveria me comportar educadamente com todos... eu queria poder gritar que não tinha mais seis anos.

– Alex já deve estar lá embaixo – eu disse passando para o estreito corredor, ainda olhando para a minha mãe. Ela parou, olhou para além de mim e sorriu.

– Parece que vocês possuem o “timing” perfeito – virei rapidamente na direção em que ela olhava e vi meu namorado.

Ele estava lindo! Não que ele não estivesse antes. Alex é lindo com qualquer roupa e especialmente sem elas, porém ele estava realmente lindo, parecia um anjo brilhante, e o seu sorriso... ah, aquele sorriso! Seus olhos me tocaram como se fossem as suas mãos e eu me vi prendendo a respiração.

Espere um instante! Se ele estava ali, com os pais, saindo do seu quarto, porque não abriu quando o chamei? Minha mãe havia dito que ele ainda não tinha aparecido e se não estava no quarto onde mais poderia estar?

Então me vi andando decidida em sua direção e tinha certeza de que não estava com uma expressão tão agradável quanto deveria estar.

– Charlotte!

– Onde você estava?

Alex me encarou com os olhos imensos. Ele desviou o olhar por uma fração de segundo, o que me levou a acreditar que tentava formular a desculpa perfeita. Meu sangue ferveu, embora eu não soubesse muito bem o motivo de estar tão aborrecida. Ou sabia? A falta que eu sentia dele seria capaz de me fazer sentir algo tão violento? Não. Havia algo estranho naquela história.

– Eu...

– Eu estive aqui. Seu quarto estava trancado. Eu bati e você não me atendeu.

– Charlotte! – minha mãe sussurrou tentando manter a calma, mas deixando claro que me recriminava.

Juro que por um segundo, apenas um segundo, eu vi o rosto de Alex, sempre bronzeado pelo sol, empalidecer. Podia ser loucura, mas eu percebi que Alex ficou pálido, como se tivesse sido pego fazendo algo muito errado. Mas que merda de erro ele teria cometido?

Eu tinha um sério problema de comportamento. Quando alguma coisa me intrigava, eu simplesmente me esquecia de onde estava, com quem e por quê. Eu apenas queria entender e sabia que não sossegaria até encontrar uma resposta justificável. Mesmo assim senti meu rosto esquentar absurdamente quando ouvi a risada do meu futuro sogro, acompanhada de uma mais fraca da minha futura sogra.

– Onde você estava? – cobrei sem a mesma brutalidade de antes.

– Aqui – ele respondeu endurecendo as feições. Seus olhos profundamente azuis me queimaram. Ele tentava me intimidar.

– Charlotte, pelo amor de Deus! – minha mãe se posicionou do meu lado e só então me dei conta de que estava praticamente colada em Alex. – Não seja grosseira.

– Não estou sendo – recuei sem deixar de encará-lo. – Eu queria te ver.

Continuei buscando nele sinais e vi quando meu namorado engoliu com o maxilar trincado. Alex me escondia alguma coisa. Definitivamente era isso o que acontecia. Suas mãos nos bolsos da calça me alertavam para este detalhe. Era assim que ele se posicionava quando precisava conter uma situação.

– Eu estava aqui mesmo, Charlotte – piscou voltando a engolir apreensivo. – Qual o problema?

– Nenhum – minha mãe se intrometeu. – Charlotte só é ansiosa demais, e acredita que pode ter tudo no tempo dela – esta última parte ela praticamente rosnou me encarando com olhos duros. – E eu acredito que deixar as pessoas esperando por tanto tempo é algo grosseiro demais.

– Vocês... – Alex hesitou, fechando os olhos um pouco, e ainda sem tirar as mãos dos bolsos. – Vocês poderiam nos dar alguns minutos?

Vi Dana acariciar o ombro do filho, como se estivesse desejando “boa sorte” a ele. Adriano estava com um sorriso irônico no rosto, que não se apagou nem quando eu fiz cara feia. Minha mãe, claro, reclamou coisas que eu não consegui me concentrar direito para compreender, principalmente porque ela falava em inglês e muito baixo, mas captei algo como “pode ser que Peter tenha razão” e “eu mimei demais esta menina”, e até mesmo “quem vai te suportar sendo tão infantil assim”, mas esta parte eu preferi ignorar.

Também não posso dizer que ter agido daquela forma não me incomodava. Incomodava, e muito! No entanto eu preferia deixar para pensar no assunto em outro momento. Se Alex estava pedindo para que todos nos deixassem a sós, era porque ele tinha mesmo algo para me contar e seria algo que eu não gostaria de ouvir.

– Nós vamos mesmo começar esta noite brigando? – ele disse assim que nossos pais sumiram de nossas vistas.

– Depende do que você está me escondendo.

– Como pode saber que eu estou escondendo alguma coisa? – falou um pouco mais alto, no entanto tudo em seu corpo gritava que ele estava tenso por ter sido pego. – Como pode saber? – definitivamente ele havia sido descoberto.

– Você está me dizendo.

– Eu? – seu nervosismo deixava isso muito claro.

– Você ficou tenso no momento em que perguntei onde estava. Sua pele ficou levemente mais clara, suas mãos estão nos bolsos, você teve dificuldade para engolir, havia suor em seu rosto, e você sabe que hoje está realmente frio, além disso, sua mandíbula rígida, em um aperto mais do que desnecessário, é apenas mais um indicativo de que existe um segredo em seu sumiço.

– Eu não sumi. Estive no quarto o tempo todo – ele parecia assustado com o que eu disse. – Como você pode ter notado isso tudo em mim em tão pouco tempo?

– Porque eu estou te olhando. Cada segundo, cada momento ao seu lado, eu estou te olhando. Eu sei que você reage assim quando fica nervoso, mas não nervoso por ter sido ameaçado ou desagradado. É um nervoso que indica medo. Medo de algo que fez, ou que deixou acontecer e que não quer que seja descoberto porque tem medo das consequências.

Ele respirou fundo sem tirar os olhos de mim. Por um motivo inexplicável, meus olhos ficaram úmidos. Eu não tinha mais certeza se queria saber o que ele havia feito. Alex deu um passo a frente e me abraçou. Seu abraço foi tão forte, como um pedido de desculpas, que fez meu coração acelerar.

– O que você fez? – sussurrei. Seus braços me apertaram ainda mais.

– Nada. Mesmo assim preciso que você acredite em mim – fechei os olhos ponderando.

Eu poderia confiar em Alex? Eu poderia superar qualquer coisa que ele me contasse? Eu não tinha esta certeza, apesar de confiar plenamente nele, não sabia se seria capaz de superar. Apesar desse pensamento me vi subindo as mãos em suas costas, acariciando-as, confortando-o. Alex me soltou voltando a me encarar, seus olhos eram uma súplica. Ele engoliu em seco antes de começar.

– Hoje pela manhã, Anita esteve em meu quarto – minhas pernas vacilaram, mas me mantive firme. Eu tinha começado, então iria até o final. – Você sabe o que ela queria, então nem vou explicar. Também não preciso te dizer que nada aconteceu. Quando você entrou no quarto, eu me desesperei, porque não sabia como te explicar o que ela fazia ali, por isso me tranquei com ela no banheiro e a maluca se aproveitou da situação.

– Se aproveitou? – ele continuou firme me encarando. Não mais com medo, e sim com determinação.

– Sim. Não como provavelmente você deve estar pensando, mas o fato de eu precisar contê-la sem chamar a sua atenção deu a ela muitos trunfos – respirei fundo sem querer entrar em pânico antes de ele contar toda a história, porque eu sabia que não acabava ali. – Agora há pouco, Tiffany também esteve em meu quarto, e pode parecer loucura, porém, o simples fato de você ter aparecido deu a ela a liberdade para agir como a prima e... puta que pariu, Charlotte! Eu nem sei como lidar com isso tudo. As duas estão loucas, e eu...

– A porta estava trancada – eu afirmei ainda sem saber o que dizer.

– Estava. Eu não queria que acontecesse outra vez. Não queria ter que me trancar no banheiro com Tiffany, nem sabia como explicar a você aquela situação, então tranquei a porta acreditando que Tiffany não desceria tão baixo. Deu tudo errado – ele bagunçou o cabelo ficando ainda mais bonito.

Nós nos encaramos por um tempo indeterminado. Eu não sabia o que dizer. Acreditava em Alex. Porra, eu acreditava nele. Confiava cegamente naquele homem à minha frente e, se estava me contando aquela história daquele jeito, era porque foi o que aconteceu. E eu não tinha o direito de duvidar.

– Fale alguma coisa, pelo amor de Deus, Charlotte!

Pisquei, como se estivesse voltando a enxergar. Ele estava parado, seus olhos em súplica, aguardando por mim. Eu sorri. Alex era um homem forte, inteligente e maduro. Maduro demais para entrar em desespero por não saber lidar com alguém como eu e isso era muito engraçado. Então eu ri. Eu sabia que não deveria, não era apropriado e, definitivamente, a situação não pedia algo como a gargalhada que eu estava dando.

Eu sentia medo, raiva, desespero, decepção... queria matar Tiffany e Anita por terem se atrevido a colocar as mãos no homem que era meu. E pensar nisso me deu alívio, porque eu sabia que Alex era meu, meu e de mais ninguém.

– Charlotte? – ele parecia bastante confuso com a minha reação.

– Alex... – tentei conter o riso que subia desesperador por minha garganta. – Da próxima vez que isso acontecer...

E então eu fiquei séria. Não sentia mais a graça da história, apenas entendia a gravidade da situação. Eu entendia, e ele precisava entender também.

– Não vai haver...

– Da próxima vez – eu continuei –, não tranque a porta.

Ele me encarou, e então sorriu. Foi um sorriso verdadeiro, com a certeza de que finalmente tinha entendido. Um aceno leve de cabeça confirmou o que eu pensava.

– Vamos. Nós temos um noivado para encarar – segurei a sua mão e caminhei sem medo.


ALEX


Encarar o noivado foi muito fácil depois da minha conversa com Charlotte. Juro que nunca antes uma pessoa definiu tão bem aquela garota quanto o pai dela na nossa primeira conversa. Ele disse “ela será infantil quando você menos esperar, aliás, você nunca conseguirá esperar nada dela, porque esta é Charlotte, uma pessoa capaz de reagir com maturidade quando você estiver preparado para a terceira guerra mundial, e explodir uma bomba atômica quando você menos esperar.”.

Sim, ele disse que Charlotte agiria com maturidade quando o mais provável seria ela dar uma de louca e fugir de casa, era realmente possível. E eu me vi sorrindo para a loucura que era aceitar aquela menina em minha vida, e o quanto eu estava convicto de que nunca mais teria tranquilidade. Mesmo assim, eu nunca desejei tanto uma tempestade quanto passei a desejar desde que me dei conta de que amava Charlotte Middleton.

Ela me olhava com carinho enquanto eu colocava o anel, o mesmo que pertencia a família de Adriano e que passava de geração em geração. Ficou meio folgado, mas isso poderia ser resolvido facilmente. O importante era o ato de poder colocar um anel em seu dedo e deixar claro para todos que ela era minha.

Aquele foi o passo mais seguro que dei em minha vida.

Depois um beijo suave, porque Peter estava lá e eu não queria abusar da sorte, então todos começaram a nos abraçar. Todos mesmo. Sim, Anita e Tiffany me abraçaram. Foi mais como uma provocação, porém eu fingi não perceber e interpretei o papel de bom moço agradecendo.

O melhor daquela noite foi quando elas foram felicitar Charlotte. Minha noiva sorriu amplamente, agradeceu, e depois acrescentou bem baixinho, de maneira que só as duas mulheres ouvissem, mas eu também ouvi, e adorei. Ela disse: “se encostarem um dedo sequer em meu homem novamente, eu mato as duas. Não duvidem disso” e sorriu com uma inocência genuína.

Puta que pariu! Charlotte era uma caixinha de surpresas.

Tiffany simplesmente deixou o local, enquanto Anita deu um sorriso debochado. Passei a mão pela cintura da minha noiva, puxando-a para mim. Se Charlotte foi capaz de falar o que falou para aquelas duas malucas, sabe Deus o que mais ela poderia fazer.

– Vamos jantar? – sussurrei em seu ouvido, fazendo-a andar na minha frente, agarrada a mim.

– Sua mãe chorou – ela brincou, sem demonstrar qualquer aborrecimento pelos fatos anteriores.

– Eu sei. A sua também. Se no noivado elas já choraram, imagine no casamento?

Peter passou por nós dois e apenas sorriu, dando um tapinha em meu ombro. Achei estranha aquela reação, porém não parei para pensar no assunto por muito tempo. Charlotte brincou chamando a minha atenção, e eu logo me perdi nela.

– Vai servir sua futura esposa?

– Este é um papel da esposa. Eu sou servido e você me serve.

– Muito sugestivo, Professor Frankli – ela girou em meus braços, jogando os dela em volta do meu pescoço e capturando o meu olhar.

Observei seu rosto. Ela era tão linda! Parecia uma boneca de porcelana, com pintinhas que a maquiagem não conseguiu esconder, e eu estava realmente agradecido por isso. Seus olhos de um azul claro como um dia de sol me davam vontade de não fazer mais nada além de olhá-los. Seus cabelos emolduravam seu rosto perfeito, mesmo com traços ainda infantis, desciam pelo ombro como uma cortina de mel. Seus lábios fartos estavam pintados de um rosa simples, como era a minha Charlotte, e eu me perguntei quando antes eles foram tão desejáveis quanto naquela noite?

– O que foi? – ela disse num sussurro que impedia que o meu encantamento acabasse.

– Você.

– Eu? – foi inevitável sorrir diante da confusão nos olhos dela.

– O que está fazendo comigo?

– Nada, Alex! Mas vou fazer.

O rosto dela corou levemente enquanto ela se aproximava para um beijo casto.


CHARLOTTE


– Eu?

Perguntei sem entender e sentindo um leve aperto no estômago. Eu tentei ser discreta quando ameacei as duas doidas que tentavam roubar o meu futuro marido de mim, mas tive a certeza de que Alex ouvira e ele não deixaria passar batido. Meu noivo era um homem que gostava de ser discreto, não tolerava certos posicionamentos e realmente curtia mulheres que mantinham a compostura. O que eu fiz não se assemelhava a nada disso.

Mas ele sorriu. Não simplesmente sorriu, mas daquele jeito que me tirava o ar. Era aquele sorriso que puxava seus lábios para o lado de uma forma preguiçosa, tornando o mundo um lugar muito mais bonito.

– O que está fazendo comigo?

Sua voz rouca insinuava o quanto ele estava entregue às suas emoções. Aquelas palavras mexeram comigo de uma forma absurda e eu imaginei um mundo de possibilidades. Tudo o que eu poderia fazer com ele e que ele poderia fazer comigo. Então me vi ansiando por isso.

– Nada, Alex! – notei minha voz tão rouca e baixa quanto a dele. – Mas vou fazer.

Eu vi a pontinha da língua do meu eterno professor umedecer o lábio inferior. Foi algo impensado, mais animal do que racional. E seus olhos. Meu Deus, aqueles olhos ficaram mais escuros. Repletos de todos aqueles pensamentos impróprios e promessas luxuriosas. Notei que nossa respiração estava mais pesada. Ambos respirávamos no mesmo ritmo, deixando o ar mais denso, isolando-nos do mundo ao nosso redor.

– Alex! – ouvi Dana chamando. Alex virou lentamente na direção da mãe, não antes de fazer uma careta, como se tal atitude lhe causasse dor. Bom... causava em mim. – Venha, Lana precisa de algumas fotos – outra careta e eu ri.

– Fotos? – fiquei espantada, mas não quis chamar a atenção de ninguém, então apenas falei baixinho para o meu noivo.

– É melhor não contrariá-las – e ele me conduziu com a mão na base da minha coluna, lembrando-me a todo instante de que ele estava ali, bem pertinho e todinho para mim.

Tiramos todas as fotos que Lana quis. As primeiras foram sérias, aquelas que serviriam para o álbum do noivado, e depois começou a virar uma bagunça. João Pedro agarrava o Alex na hora do “clic”, Patrício fazia pose de fisiculturista, Johnny se tornou o apoio dos outros dois palhações que tentavam destruir a seriedade da foto e inclusive teve uma em que todos os homens saíram fazendo careta, menos meu pai, que nem sabia o que estava acontecendo, mas o Dr. Frankli, mesmo não querendo, acabou saindo com uma careta também, pois fez uma cara engraçada quando percebeu o que os outros faziam.

Depois do jantar fomos para o sofá com nossas sobremesas nas mãos. Eu queria simplesmente sentar com as pernas por cima das do Alex, falar bobagens, rir das besteiras que Johnny sempre fazia e não me preocupar em estar me expondo demais ao admirar o homem com quem um dia eu me casaria.

No entanto, não foi bem isso o que aconteceu. Primeiro estávamos sob a vigilância, mesmo que discreta, mas constante, do meu pai, e eu podia jurar que o Dr. Frankli concordava com aquilo tudo e colaborava revezando com o obstinado Peter. Segundo que, se eu simplesmente sentasse esparramada e jogasse minhas pernas sobre as do Alex, minha mãe teria um ataque cardíaco.

Por isso eu estava sentada comportadamente, com a coluna reta e as pernas cruzadas, mantendo a postura da menina bem-educada. Às vezes, eu pegava um risinho debochado de Alex ao meu lado, principalmente quando o flagrava me observando como quem quisesse dizer “eu sei que você não é assim”. Apesar disso, meu noivo estava educadamente sentado, com uma postura e graciosidade reservada para poucos. Era incrível como ele conseguia ficar ainda mais sexy quando assumia toda a sua máscara de dono do pedaço.

Existia também um terceiro motivo para que eu não estivesse totalmente relaxada e entregue à felicidade do momento. E esse motivo se dividia em dois, ou em duas: Anita e Tiffany. Claro que eu agradeci por Alex ter optado por me contar a verdade. Eu odiava quando as pessoas escondiam a verdade de mim como se eu fosse um monstro incompreensivo, porém, saber que aquelas duas... melhor não usar termos pejorativos, mas aquelas duas tinham tentando tirar o homem que eu amava de mim e ainda tinham a cara de pau de ficarem perambulando entre as nossas famílias como se fossem realmente desejadas ali, estava me tirando do sério.

Tiffany, por exemplo, dedicou a sua noite a conversar com minha mãe e Dana. Eu tinha até medo de imaginar o que ela estava planejando. E ainda peguei Alex olhando-as intrigado. Pelo visto, ele também tinha medo.

Já Anita ficou a maior parte do tempo conversando com Johnny, rindo de tudo o que ele dizia e fazendo comentários que deixavam bem claro o que ela achava do meu amigo: que ele era uma criança. Eu fiquei imaginando se ela não fazia aquilo para mostrar alguma coisa a Alex, ou para captar a sua atenção.

– Você gosta de chocolate.

Ele disse, tocando bem levemente na base da minha coluna. Esse mínimo toque já me deixava ansiosa e, aos poucos, eu percebi que quase nunca conseguia esconder dele o meu desejo. Alex sorriu daquela forma única e eu me vi presa ao seu sorriso encantador.

– E quem não gosta?

Levei mais uma colherada do pavê a boca, sem deixar de olhá-lo. Alex acompanhou o meu gesto, como se o contato dos meus lábios com a colher fosse algo absurdamente sexy. Ele deixou os olhos correrem pela sala, buscando por possíveis testemunhas e então voltou para mim, aproximando-se um pouco mais.

– Posso fazer coisas incríveis com você e este pavê.

Assim.

Ele simplesmente falou estas palavras como se estivesse comentado sobre a música que tocava ao fundo. A colher ainda estava em minha boca e eu tive certeza de que meu rosto estava tão vermelho que eu poderia ser diagnosticada com insolação. O calor descia pelas minhas orelhas e pescoço enquanto ele acompanhava a minha reação com uma atenção especial. E meu rosto não foi o único lugar do meu corpo que ficou quente.

Instantaneamente eu passei a desejar que aquela reunião acabasse.

– Posso roubá-la por alguns minutos? – a voz do meu pai me fez piscar repetidas vezes e eu senti mais vergonha do que já estava sentindo por estar excitada na sua presença.

– Claro, Peter.

Alex acariciou minha mão, tirando-me do transe e sorriu. Existia muito mais do que deboche naquele sorriso sacana. Existia uma promessa avassaladora e um desejo capaz de me fazer querer que o tempo passasse mais rapidamente. Ele disfarçava muito bem seus sentimentos aparentando calma e indiferença, enquanto eu ficava úmida, com a respiração acelerada, os olhos brilhantes e o rosto pegando fogo. Era tão injusto.

Ele me ajudou a levantar, pegando a vasilha da minha mão e me apoiando. Senti seus dedos nos meus, solidários, entendendo que eu não tinha nenhuma vontade de deixar aquele sofá. Rapidamente a mão do meu pai substituiu a do meu noivo, tirando-me da nossa bolha.

– Vejo você depois – Alex ainda disse antes de o meu pai me arrastar para longe.

– E eu estou perdendo a minha filha muito rápido – Peter resmungou.

– Pai!

Ele deu dois tapinhas em minha mão e continuou andando até que estivéssemos do lado de fora da casa. Estava frio, e o céu carregado prometendo um pouco mais de chuva. Meu vestido não me manteria aquecida, mesmo assim eu continuei, até porque eu sabia que meu pai jamais me levaria para um lugar longe de todos se não tivesse realmente algo importante para me dizer.

– O que aconteceu? –perguntei sem estar de fato preocupada. Não havia nada de errado com as nossas vidas, salvo pela sua obsessão em controlar tudo.

– Nada. Não posso querer conversar com a minha filha sem ser interrompido a cada segundo, ou ter a atenção dela roubada por um certo professor? – sorri e ele retribuiu.

– O senhor já está acostumado a ficar muito tempo longe de mim, não vai morrer por causa de uma ou duas noites – foi uma brincadeira, porém eu percebi um brilho triste em seus olhos e me arrependi de imediato. – Sobre o que quer conversar?

– Você está feliz? – fui pega de surpresa pela pergunta e acabei atrasando em alguns segundos a minha resposta.

– Sim. Estou – e ri sem saber ao certo se de nervosismo ou de felicidade.

– Isso é bom – ele olhou para frente, como se buscasse uma forma de introduzir o que realmente queria dizer. – Eu gosto do Alex.

– Eu também – meu pai me deu um olhar que me fez rir.

– Ele vai cuidar bem de você.

– Eu não preciso de mais um pai. Chega dessa ditadura – ele me olhou novamente, dessa vez eu não ri, apenas recuei. – Eu sei me cuidar, então quero apenas que Alex me respeite e me ame. É o suficiente.

– E se você o ama com tanta coragem a ponto de me desafiar, se tem tanta certeza do que quer e sabe o quanto ele te ama, por que está fazendo questão de adiar o casamento?

– Eu não estou adiando o casamento. Estou seguindo o curso normal das coisas. Não preciso começar a namorar e casar no dia seguinte – não deveria me exaltar, mas aquele assunto realmente estava me enchendo o saco.

– Isso era perfeitamente normal há alguns anos. Continua sendo em alguns países e é o certo para algumas religiões.

– Pai... – respirei fundo não querendo transformar aquele momento em uma briga. – Eu preciso de um tempo.

– Por quê?

– Porque sim! Porque tenho que me adaptar a Alex... não sei... não que eu não tenha certeza... eu apenas... puta merda!

– Charlotte!

– Desculpe!

– Você não me parece assim tão certa – encarei meu pai sem vontade de prolongar aquela história. – E não é justo com Alex.

– Ele entendeu.

– Não, ele apenas aceitou a sua vontade, como sempre acontece, Lottie. As pessoas vivem se desdobrando para fazer o que você quer e com Alex não é diferente. Seria ótimo, já que você diz amá-lo, que não pensasse apenas em você neste momento.

– Eu não o entendo. Passou a vida inteira me amedrontando, cuidando para que nenhum homem encostasse em mim e agora quer me forçar a casar como se o mundo fosse acabar amanhã.

– Talvez acabe – seu olhar triste me fez prender a respiração. – Quem sabe o que poderá acontecer amanhã?

Não consegui continuar falando. Havia algo de sinistro nas palavras do meu pai. Algo que me fez temer.

– E pelo que tenho notado você não é a única na fila do Alex.

– Como assim?

– Anita e Tiffany – seu olhar parecia o de um gavião pronto para atacar. – Elas também querem este anel – senti a raiva subindo pela minha garganta. – Mas você que sabe. Alex já é homem, você é apenas uma menina, muito mimada, diga-se de passagem.

– Não pense que vai me intimidar com estes argumentos – retruquei, mas ele já tinha alcançado seu objetivo. – Eu confio no Alex.

– Eu também – respondeu despreocupadamente.

– Eu vou entrar pai – não consegui esconder a minha ansiedade em me certificar de que as duas mulheres em questão estavam longe do meu noivo.

– Ah, esqueci de dizer. Eu e sua mãe conversamos e decidimos que vamos passar mais tempo em casa, cuidando de vocês.

E o recado estava dado. Ele não facilitaria em nada. Minha vida seria um inferno dali em diante.


CAPÍTULO 12


“Tenho medo é do seu medo. ”

William Shakespeare


ALEX


Charlotte ficou estranha desde que voltou da conversa com seu pai. Não foi como se estivesse aborrecida. Aparentemente ela não estava, pelo menos não comigo. Mas ela estava pensativa e, vez ou outra, eu a pegava suspirando, como um lamento ou uma impotência para mudar algo. Fiquei preocupado, mesmo sabendo que ela me contaria na primeira oportunidade que tivéssemos.

Por isso encerrar a comemoração do noivado e voltar para o meu quarto me deixou mais aliviado. Deixei a porta destrancada, como havia prometido, com certeza ela apareceria a qualquer momento. Não tive medo de Anita ou Tiffany aparecerem, apesar de ter quase certeza de que elas não apareceriam. Eu não tinha mais nada a esconder de Charlotte, o que me tranquilizava.

Tomei um banho rápido, coloquei uma calça de pijama e uma camisa de manga comprida. A noite estava ainda mais fria. Escovei os dentes e sentei na cama, ligando a TV enquanto minha noiva não chegava.

Não ouvi quando ela girou a maçaneta, mas o movimento da porta chamou a minha atenção. Meus olhos ficaram presos ali até que ela apareceu. De cabeça baixa, Charlotte deslizou para dentro do quarto e, cuidadosamente, fechou a porta, evitando fazer barulho. Ela estava com um robe leve e curto, parecia ser claro, mas a cor eu não soube definir por causa da escuridão do quarto. Com certeza não era a roupa mais adequada para uma noite fria, mesmo assim eu gostei do que via.

Sua cintura fina, definida pela tira de seda, as pernas expostas, os pés protegidos apenas por uma sandália, o corpo sensualmente envolvido pelo pouco pano e os cabelos longos completando a imagem. Foi impossível não pensar em como eu queria tirar aquela roupa e em tudo o que queria fazer com aquele corpo.

Sorri quando vi que ela havia trancado a porta, então se virou em minha direção. Uma mão escondida o tempo todo atrás do corpo, o que me deixou intrigado. Charlotte se aproximou e deu um sorrisinho safado e, ao mesmo tempo, envergonhado. Depois mordeu seu lábio inferior e desviou os olhos dos meus, observando a TV ligada iluminando a cama.

– O que está aprontando, menina? – não me movi nem um centímetro. Tive medo de estragar o que ela pretendia fazer, e o que eu queria que ela fizesse.

Charlotte parecia hesitar. A sua confiança e determinação não estavam presentes. Apesar da pouca luminosidade, eu tive a certeza de que ela corava deliciosamente. Com calma, eu me levantei, sentando-me na cama, de frente para ela, que recuou ligeiramente.

– O que tem aí? – ela sorriu outra vez. Havia inocência e malícia naquele sorriso. Eu me vi cada vez mais ansioso. – Não vai me mostrar?

Charlotte balançava levemente o corpo, girando-o em torno de si mesmo. Uma atitude meio infantil, típica de crianças travessas. E ela parecia não perceber que agia assim. Olhei seu rosto pensando no quanto ainda era jovem e na forma como a sua vida contribuiu para que ela fosse ainda mais infantil do que a sua idade permitia. Aquela era a minha garota, confusa, egoísta algumas vezes, mimada quase sempre, cheia de determinação e boa vontade. Eu a amava.

Ela deixou que a mão escondida se revelasse. No primeiro momento, não tive ideia do que se tratava, logo em seguida me dei conta. Ela trazia um pouco do pavê da sobremesa. Rapidamente minha mente foi invadida por imagens, desejos e luxúria. Meu corpo correspondeu imediatamente.

– Eu fiquei curiosa – ela disse ainda sustentando a sua inocência.

– Curiosa?

Observei-a mordiscar o lábio inferior e balançar a cabeça, sem conseguir manter os olhos nos meus. Levantei da cama parando em frente à minha noiva. Fiquei deliciado quando a vi umedecer os lábios e me vi repetindo o gesto.

– Você disse que poderia fazer muitas coisas comigo e o pavê – ficou de repente mais corajosa.

– Sim, eu disse.

Nossos olhos se conectaram. O que eu sentia era algo tão gostoso e envolvente que eu não tive pressa de saciar a fome que eu sentia dela. Eu queria saborear cada detalhe. Queria prolongar o momento, deixar-nos envolver cada vez mais. Cada segundo de expectativa contava com o mesmo valor de cada olhar, cada respiração e o toque que desejávamos e não acontecia.

Ao mesmo tempo, eu tinha consciência de que não seria possível. Era arriscado, além de corrermos o risco de que alguém descobrisse que ela esteve em meu quarto naquela noite. O pavê seria a prova. Ou o que restasse dele nos lençóis e fronhas.

Era frustrante e instigante. O proibido era definitivamente mais gostoso.

Peguei a colher, que estava no doce, retirando um pouco. Ela me observou sem nada acrescentar. Em um segundo, pensei um milhão de possibilidades, uma infinidade de desculpas para continuarmos, fui derrotado pela consciência. Eu não podia expô-la. Não podia dar a Peter um motivo para não confiar em mim.

– Eu vou te ensinar o que podemos fazer com isso.

Levei a colher a sua boca. Charlotte recebeu o doce sem protestar e até o movimento dos seus lábios recolhendo o pavê me deixou excitado. Bom, não podíamos fornecer provas, mas podíamos fazer amor, sem provas, só nós dois.

– Mas hoje ele será apreciado somente desse jeito – sorri enquanto pegava o pote de sua mão e buscava um pouco do doce para mim.

Charlotte não entendeu logo de cara. À medida que ela foi se dando conta da minha recusa, seu semblante foi ficando mais ameaçador. Foi hilário, e eu ri recebendo um tapa no braço.

– Idiota! – continuei rindo cada vez mais. – Você é um idiota, Alex Frankli! Um completo idiota!

– Eu sou o único adulto neste quarto – rebati sem conseguir parar de rir. – Sou o único que pensa antes de agir.

– Imbecil! – ela ia virar para sair do quarto, eu a impedi, segurando-a pela cintura. Coloquei o pote sobre o criado-mudo, segurando minha noiva com mais vigor.

– Você fica ainda mais linda quando está com raiva – enfiei meu rosto em seu cabelo sentindo aquele cheiro familiar que tanto me agradava.

– Me deixe, Alex – ela se debateu. Eu não conseguia deixar de rir e me divertir com toda aquela reação. – Eu sou o seu divertimento. A palhaça.

– Com certeza você é o meu divertimento – mordisquei seu pescoço sentindo-a ceder um pouco. – Uma deliciosa diversão.

– Você me enganou! – fingiu indignação.

– Não enganei – virei Charlotte para deixá-la de frente para mim. – Mas se eu me atrever a colocar aquele doce em qualquer parte do seu corpo, amanhã todo mundo vai saber o que aconteceu aqui – ela me encarou conscientizando-se aos poucos. Vi quando minha noiva engoliu em seco sem querer se dar por vencida.

– Frouxo – ri de novo, desta vez com menos intensidade. Charlotte era inacreditável.

– Lençóis brancos, amor. O pavê estará por todos os lugares – ela olhou pelo quarto à procura de uma alternativa e seus olhos se demoraram no chão. – E eu não vou fazer nenhuma sacanagem com você no chão. Pode tirar esta ideia da cabeça. Você ainda está machucada – ela ia contestar, mas eu a impedi. – Eu vou te mostrar tudo, Charlotte, não hoje. Em casa – voltei a me aproximar, puxando-a pela cintura. – Com calma – beijei seu pescoço e ele se encolheu com o contato. – Quando eu puder aproveitar toda a doçura – segui até os seus lábios. – Do pavê e do seu corpo.

Beijei minha noiva sem encontrar nenhuma resistência. Fechando meus braços em torno da sua cintura fina e deliciosa. O gosto do pavê misturado ao gosto de Charlotte era algo estimulante. O roçar da seda cedendo em minhas mãos e acariciando o corpo dela me deixava cada vez mais excitado. Gemi involuntariamente e ela estremeceu.

– Quero tirar sua roupa.

Rosnei com os lábios presos ao pescoço dela. Minha mão já subia pela barra do robe, levantando o tecido e desfrutando da pele delicada. Eu queria muito poder tocar todo o seu corpo. Charlotte para mim era como a mais pura droga e eu era completamente viciado nela. Queria o seu efeito, queria tudo o que ela me proporcionava, mas sem pressa, sem a ânsia dos apaixonados.

Com poucos passos, alcançamos a cama. Charlotte estava tão entregue! Ela deitou, subindo até que seu corpo estivesse todo sobre o colchão, os cotovelos erguendo o tronco, ela me encarou com a mais pura lascívia. Por um segundo, eu me senti perdido, sem saber ao certo o que fazer ou o que fazer primeiro.

– Menina! – ouvi minha voz carregada de desejo. – Não me olhe assim.

– Por quê?

Ela inclinou a cabeça para o lado, fitando-me com mais intensidade. Mesmo com pouca claridade eu vi seus olhos varrerem meu corpo. Ainda sem conseguir agir, acompanhei sua mão abrir o roupão, mostrando-me uma calcinha pequena, em um tom claro e um sutiã que cobria parcialmente os seios que eu tanto adorava. Ela, parecendo não perceber o que fazia, roçou as pontas dos dedos por entre os seios, descendo até quase o limite da calcinha.

– Porque eu vou te comer, Charlotte – senti toda a ferocidade da minha voz revelando o quanto eu estava excitado.

– Vai? – ela sorriu diabolicamente.

Um convite ao inferno.


CHARLOTTE


Eu sorri sentindo o meu corpo inteiro esquentar. De repente, não havia mais nenhum resquício da noite fria dentro daquele quarto. Eu podia sentir a fonte de calor que iniciava no centro das minhas pernas e se espalhava como fogo, correndo pelas minhas veias e se instalando em cada parte do meu corpo.

Alex segurou em meu pé esquerdo. Suas mãos eram decididas. Fiquei extremamente surpresa quando ele levou meu pé à boca, lambendo e mordiscando minha pele. Nunca imaginei que um ato como aquele fosse algo tão sexy, mas era. Muito!

Gemi me contorcendo de prazer enquanto ele me olhava atentamente. Era impossível não reagir a tudo o que Alex fazia. Uma delícia! Ele colocou meu dedão na boca, chupando-o e... porra, aquilo foi demais! Ainda sem tirar os olhos de mim, e eu senti que quase explodiria com tão pouco que ele me dava, meu professor acariciou minha panturrilha. Dedos experientes tocavam e apertavam minha carne com conhecimento e propriedade.

Eu não queria fechar os olhos. Não queria perder nada do que ele faria comigo. Por isso não apenas senti sua mão se aprofundando em mim, mas as assisti com a expectativa de uma criança em uma noite de Natal. Eu ansiava para que ele me encontrasse, para que me tocasse exatamente onde eu queria. Alex não pretendia me torturar, ele queria me dar tudo o que eu desejava e eu podia ter esta certeza apenas observando seus gestos, seu toque descendo, explorando-me.

E então eu vi o quarto girar. Alex, usando de toda sua técnica, virou-me de costas para ele, deixando-me de encontro ao colchão. Eu não esperava por isso, no entanto em vez de ficar assustada, de me desestimular por estar impedida de vê-lo, eu me vi ainda mais excitada.

Rapidamente senti o peso extra no colchão indicando que meu noivo havia subido, e quase no mesmo instante suas mãos me acariciando, uma em cada perna, percorrendo toda a minha pele até encontrar a minha bunda. O robe subia com o movimento, deixando-me exposta.

Ele se deteve ali. Cada mão explorando e massageando uma parte da minha bunda. Seus dedos me buscando, puxando a calcinha para o lado e se aventurando por ali. Eu podia jurar que estava com o rosto vermelho e agradeci por não precisar olhá-lo. Era difícil, quase imoral, admitir que gostava de ser tocada naquela região. Um lugar ainda tão pouco explorado e que sempre era tratado em todos os romances como um tabu.

Mordi os lábios para não gemer, porém meu corpo tinha vontade própria. Alex não me tocava de fato, apenas chegava perto, sem se permitir avançar, ou apenas buscando uma forma de me fazer implorar. Eu jamais imploraria. Não?

Quando seu dedo passou por cima da entrada, tocando levemente, ele gemeu de uma forma animal, e meu corpo imediatamente correspondeu. Minha bunda empinou um pouco, como se fosse um convite. Envergonhada escondi meu rosto entre os cabelos, a testa colada na cama. Ele roçou outra vez, um toque quase irreal, logo em seguida, afastou-se.

Quase não consegui reprimir meu suspiro de decepção. Não tive nem tempo para deixá-lo escapar. Então senti aqueles mesmos dedos que seguravam minha calcinha retirando-a. Depois seus lábios acariciando minha bunda com beijos leves à medida que o pequeno tecido me deixava.

Eu o sentia respirar. Sentia seu hálito me aquecer ainda mais. Todo o meu corpo se arrepiou e eu não consegui deter o gemido quando sua língua pediu passagem, entre a minha carne, quase me tocando... ali.

Puta que pariu!

Como eu poderia ansiar tanto por algo como aquilo? Como eu poderia estar tão absurdamente excitada só de imaginar que seus lábios me tocariam naquele ponto? Minha respiração irregular entregou meu nervosismo e ansiedade quando Alex me tocou com mãos, lábios, língua e dentes.

Ele me abriu... sim ele me abriu mesmo. Puxou minha carne deixando-me exposta. Os polegares bem perto de onde eu miseravelmente queria ser tocada. Os lábios seguindo o caminho, deixando a língua e os dentes brincarem com o meu juízo.

Ele chegaria lá. Eu sabia. E queria. Porra, eu queria! Meu corpo parecia uma bomba, pronta para explodir, vendo a chama bem perto, aproximando-se para acioná-la. Cada centímetro vencido era como uma chuva de fogos de artifícios em mim. Então me vi me empinando, oferecendo-me.

Mordi o lençol sem conseguir me conter. Eu queria esfregar minhas pernas. Queria poder me tocar e encontrar alívio antes que precisasse me submeter. Porque aquela entrega me parecia algo alucinante, completamente desejável e, ao mesmo tempo, humilhante.

Não que considerasse uma humilhação ser beijada ali. Só... não sei. Era como quebrar as regras. Como se estivesse cometendo um ato ilícito. Como se precisasse me esgueirar para o escuro, longe de todos os olhares da sociedade. Por isso me senti uma hipócrita.

Era sexo. Sexo como todas as outras coisas que me permiti viver com Alex. Era apenas sexo, sem reservas ou pudores. E então me dei conta de que eu poderia gritar que queria sim. Eu queria ser beijada ali. Queria senti-lo naquele local e que se fodesse a sociedade e todos os que me apontariam como uma aberração.

Foi quando ele parou. Aguardei pelo que aconteceria, mas nada aconteceu. Nem suas mãos estavam mais em mim. Ansiosa demais, tentei me virar quando ele me segurou na cama sussurrando em meu ouvido.

– Shiiiu! Fique quieta.

Ele falava bem baixo. Não havia tesão em sua voz nem nada que pudesse me indicar que continuaríamos. Muito pelo contrário. Alex estava tenso e eu também fiquei.

– Tem alguém na porta – ele disse baixinho.

Levei uma fração de segundo para assimilar o perigo de que ele me alertava. Merda! Meu corpo inteiro enrijeceu. Nada em mim lembrava a garota a ponto de explodir de tanto prazer, segundos atrás. Meus olhos fixaram na porta, e o silêncio imperou no quarto ficando apenas o ruído baixo da TV, até ouvirmos a batida decidida.

– Alex? – era meu pai.

Puta. Merda!

Como assim era meu pai? Ele tinha descoberto que eu estava lá. Merda! Ele me mataria, mataria Alex, mataria todos naquela casa. Ele me pegaria, e não havia palavras nem argumentos que me livrassem daquilo. Que porra!

– Calma!

Alex tentava me levantar da cama. Eu estava tão nervosa que não reparei que ofegava, buscando o ar desesperadamente. Senti seus dedos em meus cabelos, mas eu não conseguia deixar de fitar a porta. Não conseguia deixar de imaginar a arma do meu pai atirando contra Alex. No escândalo, na loucura que seria e, principalmente, na vergonha que eu sentiria.

– Alex? – outra batida mais forte.

Merda! Merda! Merda!

Alex me levantou com cuidado. As mãos decididas em meus braços, mantendo-me firme. Ele também estava nervoso, mesmo assim conseguiu fechar meu robe, depois, levantando meu queixo encontrando meus olhos.

– O que quer fazer? – sussurrou para mim com determinação.

– Não posso, Alex – choraminguei tentando controlar a voz. – Não posso confrontar meu pai agora – ele me avaliou por um instante, depois concordou.

Segurando minha mão, ele me conduziu ao banheiro. Sem trocarmos uma palavra, nós nos beijamos rapidamente, então ele se foi. Fechando a porta e me deixando na escuridão. De repente, o espaço parecia pequeno demais. O silêncio do lado de fora só contribuía para aumentar meu desespero. Merda! Eu era muito covarde. Como pude me esconder e deixar que Alex o enfrentasse sozinho?

Como minhas pernas não me obedeciam, sentei contra a porta, aguardando o que aconteceria. Ouvi Alex desligar a TV. Vi quando a luz fraca conseguiu passar por baixo da porta e os passos do meu noivo.

– Peter? – ele disse fingindo surpresa.

– Está sozinho? – a voz do meu pai preencheu o ambiente.

– Claro! Com quem mais eu estaria?

Um pouco mais de silêncio. Meu pai não respondeu e eu ouvi apenas mais alguns passos me dando a ideia de que os dois estavam dentro do quarto.

– Aconteceu alguma coisa? – Alex falou com a voz calma. Como ele conseguia?

– Eu gostaria de continuar aquela conversa – desta vez, foi meu pai. Sua voz parecia desconfiada.

– Agora?

– Sim. Se estiver tudo bem para você – um pouco mais de silêncio, então ouvi Alex responder.

– Por mim tudo bem. Vamos descer.

– Por que não aqui? – claro que meu pai desconfiaria. Alex não conhecia o pai que eu tinha.

– Não sei. Talvez pelas coisas que aconteceram nas últimas horas.

– E o que aconteceu?

– É uma longa história, Peter, mas se quer mesmo conversar comigo sem sermos interrompidos, é melhor irmos para o escritório.

Houve mais silêncio, e depois o som de pés e da porta se fechando. Ainda fiquei sentada no chão, sem conseguir me mover ou acreditar que não fomos descobertos. Depois, o alívio me inundou, quase me sufocando. O que foi aquilo tudo?

Abri a porta do banheiro e me deixei cair na cama, rezando para que os dois não voltassem.


ALEX


– Não sei como fazer isso, Peter!

Encostei-me à janela deixando que meus braços suportassem o peso do meu corpo. Naquele momento, minha cabeça fervilhava. O que meu futuro sogro me pedia, além do que acabara de revelar, tinha me tirado o chão.

– Você é o único capaz de convencê-la.

Olhei para Peter. Nenhum vestígio daquele homem seguro e confiante. Diante de mim estava um pai sofrido e desesperado. E esse segredo... eu não conseguiria suportar tanto peso.

– Eu concordei com os argumentos da Charlotte. Não posso simplesmente voltar atrás. E eu acabei de concordar...

– É para o bem dela, Alex. Pense em como será quando ela descobrir que não pôde fazer nada. Que por causa de uma birra...

– Eu sei. Eu sei! – caminhei pelo curto espaço do escritório do meu pai.

Estava me sentindo sufocado com a revelação. Minha única vontade naquele momento, ao ver o sofrimento daquele homem e a enormidade da situação, era abraçar a mulher da minha vida e não a deixar sair dos meus braços nunca mais. Seria tão... difícil.

– Só você pode resolver isso – trocamos um olhar que resumia tudo.

Peter dependia de mim para amenizar seu sofrimento e eu sabia, embora preferisse não abusar da sua boa vontade, que todas as cartas estavam sobre a mesa e eu poderia utilizar a que melhor coubesse à situação. Eu sentia em cada cantinho da minha consciência que precisava mudar a opinião de Charlotte, ou, pelo menos, parte dela.

Rapidamente, um plano se formou em minha mente.

– Certo – puxei o ar com força tentando me concentrar. – Vou precisar de um tempo sozinho com Charlotte.

– Um tempo?

Ele me encarou com o olhar triste de quem entendia o que eu queria dizer nas entrelinhas. Por alguns segundos eu vi toda sua angústia através daquele olhar.

– Um tempo... E...

Não havia escolha. Teria que ser daquele jeito. Não apenas porque o fato de eu ceder suavizaria a dor da minha namorada e da sua família, mas principalmente e, neste ponto confesso todo o meu egoísmo, porque colocar em prática o que eu planejava amenizaria a minha própria dor. Descobrir o segredo que Peter tanto escondia tinha despertado meus temores mais íntimos.

– Preciso fazer com que ela veja que o casamento é a única solução, para isso preciso fazê-la entender o porquê – Peter não estava em posição de exigir nada, mesmo confiando que eu não abusaria da sua boa vontade.

– Por quê?

– Não vamos entrar neste mérito, Peter. A casa está repleta de pessoas cujo passatempo predileto é procurar formas de interferir em minha vida com Charlotte. Se você quer mesmo que eu a convença, tem que deixar que eu resolva à minha maneira – ele desviou o olhar e encarou a chuva fina que caía do lado de fora.

– Certo.

Ele estava me dando carta banca. Estava abrindo mão de tudo o que mais preservou na vida, simplesmente porque não podia fazer nada para mudar o destino. Pensar nisso fez meu coração afundar. Eu não sabia se estava preparado para encarar o que viria, só sabia que precisaria ser forte... por Charlotte.

– Vou precisar da sua ajuda – sim, Peter seria fundamental para o plano.

– O que precisa que eu faça?

– Apenas seja você mesmo – nós nos encaramos até que Peter compreendesse o meu pedido.

– Tudo bem, Alex – ele ergueu os ombros, como quem não teme a luta e me encarou. – Faça o que for necessário.

Ele saiu do escritório deixando-me sozinho. E foi naquele instante que me dei conta da grandiosidade do peso que eu estava assumindo. Puta merda! Aquilo era... aquilo era uma grande merda!

Pensei mil vezes no que eu deveria fazer a partir dali. O que poderia dizer a Charlotte, se eu conseguiria atingir meu objetivo a tempo, se ela entenderia os meus motivos para mentir. Eram muitas indagações e poucas respostas. Respirei com dificuldade, como se o mundo estivesse me sufocando.

Eu sabia que precisava seguir adiante com o combinado, assim como entendia que seria uma luta ferrenha, porém naquele momento eu não queria mais pensar no que viria pela frente. Naquele momento, o meu desespero era tanto que eu pensava apenas em estar nos braços dela, em encontrar uma maneira de fazer o mundo parar, um jeito de impedir que acontecesse, infelizmente eu sabia que era impossível.

Saí do escritório para uma casa escura e vazia. Todos dormiam. Eu não tinha condições de voltar ao quarto, por isso fui em direção à piscina, parando na marquise para me proteger da chuva. Meus pensamentos estavam todos nela.

Merda, Charlotte! Como fazer? Como isso foi acontecer? Por que agora? Por que justamente quando eu apenas desejava te fazer feliz?

Sem conseguir pensar, dei o primeiro passo para a chuva, depois outro e outro mais. Senti meu corpo começando a ficar molhado. Não entendia o motivo daquela reação, nem a minha necessidade de estar ali, no meio da chuva, permitindo que ela me banhasse e quem sabe “lavasse” minha tensão. Apenas sabia que alguma coisa teria que acontecer para me tirar daquela angústia mortal.

Eu tinha vontade de gritar, de quebrar alguma coisa. Queria correr até que meus pulmões não conseguissem mais segurar o ar, até minhas pernas me derrubarem, então eu apenas me virei em direção à casa e paralisei.

Ela estava lá. Charlotte estava parada exatamente onde eu estava pouco antes. A escuridão da casa não me permitia vê-la com todos os detalhes, mas eu podia ver seus braços na frente do corpo, como se estivesse se protegendo do frio. O robe leve jamais seria capaz de protegê-la.

E a necessidade que senti dela foi anormal. Respirei fundo, implorando. Suplicando, pedindo forças para seguir com o plano.

Como se pudesse sentir a necessidade que eu tinha dela naquele momento, vi a minha noiva dar um passo em minha direção. Ela caminhou na chuva, com passos firmes e decididos, sem se importar com o frio, com nada. Ela veio e, quando chegou, sem que eu precisasse pedir, envolveu-me em seus braços, elevou o corpo ficando na ponta dos pés e me beijou.

Ah, Charlotte!

Eu a amava tanto! Cerquei seu corpo com meus braços, apertando-a junto a mim. Queria nunca mais deixá-la partir, porém eu sabia que não seria desta forma.

– Alex! – sussurrou.

Disse como se quisesse me dizer que estava ali por mim, mesmo sem entender, sem saber o que me angustiava, ela estaria lá. Desci a testa encostando na dela sem conseguir dizer nada. As palavras embolavam em minha garganta formando um nó.

– Está tudo bem – ela afirmou enfiando os dedos delicados em meu cabelo.

– Está sim – eu me vi mentindo. Era a única forma de despistá-la, de não a envolver antes que fosse necessário. – Eu amo você, Charlotte! – e outra vez me vi impossibilitado de continuar. Agradeci à chuva que escorria pelo meu rosto. Ela riu baixinho.

– Eu também – seus dedos se fecharam mais fortes em meu cabelo. – Ele pegou muito pesado?

Cada palavra inocente dela era uma carícia em meu coração. Forcei um sorriso levantando o rosto para encará-la. A água escorria pelo seu rosto, ensopando seu cabelo, ainda assim ela era a criatura mais bonita que eu já tinha visto na face da Terra.

– Peter só se preocupa com você.

– É desnecessário – ela falava com suavidade, sem a birra infantil, apenas procurando me acalmar. Seus dedos não interrompiam a carícia em minha cabeça.

– Ele é pai. Um dia você vai entender – a veracidade das minhas palavras fez meu coração sangrar. Ela precisaria entender, um dia.

– Você precisa definir de que lado está, amor! – brincou com voz divertida. – Não pode tender para o lado dele todas as vezes que meu pai o intimidar. Nós somos uma equipe, esqueceu?

Meu Deus, Charlotte era uma menina e, ao mesmo tempo, conseguia ser tão mulher que me assustava. Ela estava tão perto, tão enroscada em mim, seus olhos fixos nos meus. E sabia que eu sofria, e eu sabia que isso a angustiava, mesmo assim ela estava ali, sorrindo e brincando, tentando amenizar a tensão.

Como fazer Charlotte entender que teríamos que esquecer a conversa que tivemos? Como convencê-la sem precisar contar toda a verdade? Dei um passo para trás. Ela entortou um pouco a cabeça para o lado, perscrutando-me.

– Case comigo, Charlotte! Não em um ano, mas amanhã, o mais rápido possível, só não me deixe voltar para casa sem você.

Charlotte me olhou com mais atenção. Seu rosto perdendo o brilho, o sorriso se desfazendo. Merda! Meu coração estava acelerado, e ela, com uma mão sobre o meu peito, não pôde deixar de perceber.

– Tem mais coisa do que a simples pressão do meu pai, não é? – meu corpo gelou e nada tinha a ver com a temperatura. – O que está acontecendo? – ela segurou meu rosto com suas mãos pequenas, procurando por meus olhos. – Por favor! Estou ficando assustada.

Sorri sentindo meu coração afundar no peito.

– Por quê? – sussurrei.

– Porque você está estranho.

– Estranho porque falei que a amo?

Era muita infantilidade tentar protelar a conversa? Sim. Era. Eu devo admitir que estava com medo de forçar demais.

– Não por dizer, mas pela maneira como está dizendo.

– E como estou dizendo?

– Como se estivesse sofrendo. Como se lutasse contra algo.

Encarei os olhos suplicantes naquele rosto angelical. Precisava dar o primeiro passo. Puxei Charlotte para mais um beijo intenso e rápido. Suas mãos acariciaram suavemente meu peito. Minha namorada se movimentou aproximando nossos corpos. Eu não podia deixar que seguíssemos por aquele caminho.

– Estou me sentindo inseguro – revelei desfazendo o beijo. – Sei que não deveria. Na verdade, entendi tudo o que conversamos e concordo com você. Eu a entendo... – engoli com dificuldade, pois Charlotte estava com uma expressão triste no rosto. O que partia o meu coração. – Amor, eu sei que está acontecendo rápido demais para você, mas tente ver o meu lado. Você é jovem ainda, eu nem tanto – ela sorriu. – Está apenas começando sua vida amorosa e eu venho esperando-a há muitos anos. Para você pode parecer muito cedo, para mim, cada segundo longe é como se estivesse perdendo um tempo precioso, perdendo coisas que quero viver com você, apenas com você.

– Um ano faria tanta diferença?

Odiei-me por passar por cima da sua vontade, por outro lado, eu sabia que era extremamente necessário.

– Um ano para você é uma eternidade para mim – Charlotte suspirou e deixou seu olhar cair.

– Você...

– Tantas coisas podem acontecer em um ano, um mês, um dia, uma hora... eu não quero perder nada do que podemos viver juntos.

– Nós precisamos de espaço. Precisamos nos adaptar a um casamento, nos conhecer melhor. Tenho medo! Casamento é uma coisa muito séria, não é algo que deva ser decidido rapidamente. Até pouco tempo atrás, nem passava pela sua cabeça transar comigo...

– Passava – ela sorriu e mordeu o lábio inferior. Acariciei seu rosto, fazendo-a me encarar.

– Você vai enjoar de mim. Não vai conseguir conviver com minhas besteiras e inseguranças...

– Eu amo você!

– Mas amor pode não ser o suficiente – sua voz fraquejou, despedaçando o meu coração. – Eu não sei como agir ao seu lado. E você? Vai se acostumar facilmente com outra pessoa em sua casa todos os dias? Nós vamos morar juntos, trabalhar juntos...

– Eu amo você!

– Alex! – soluçou e deitou a cabeça em meu peito. – Por favor! Eu estou com medo.

– Medo de casar comigo? – apertei minha namorada em meus braços, massageando a sua nuca. Era a minha vez de acalmá-la.

– Medo de acordar um dia e descobrir que você não me ama mais. De que minha TPM destrua o nosso relacionamento. De ser uma porcaria de esposa e nunca conseguir ser o bastante para você – ela chorava assustada. Apesar da chuva eu podia ver as suas lágrimas.

Suspirei. Eu amava Charlotte e não havia dúvidas. Queria poder atender a todos os seus desejos, queria protegê-la de toda dor, todo sofrimento e sabia que recuar, permitindo que ela aguardasse a faria sofrer no futuro.

– Você sempre será o bastante para mim, porque simplesmente passei a minha vida inteira te esperando. Se eu tivesse que me apaixonar, casar, ter filhos e os conflitos do casamento com outra pessoa, isso já teria acontecido, no entanto aqui estou, praticamente implorando para você casar comigo. Para ser minha esposa e a mãe dos meus filhos... Charlotte? – puxei seu rosto para que nossos olhos se encontrassem. – Nada vai conseguir diminuir nem acabar com meu amor. Case-se comigo e permita que eu possa reafirmar este sentimento todos os dias. Prometo que vou fazer o máximo possível para tornar a sua vida o romance mais bonito que alguém já viveu. Como os romances dos livros.

– Por que isso agora?

– Porque eu também estou com medo! – foi a minha vez de externar o que sentia.

– Medo de quê?

– De perder você – ficamos nos encarando, um buscando respostas no outro. – Tiffany incutiu em mim todos os temores capazes de enlouquecer um homem – revelei baixinho, sentindo-me envergonhado pelas minhas palavras. – Tenho medo de que um dia você acorde e descubra que seu colega de mestrado é mais interessante do que eu, ou que deveria viver novas experiências, ou que na verdade eu não era nada do que você esperava. Eu estou inseguro e com medo, Charlotte. Desesperado!

Passei a mão em meus cabelos e respirei fundo. O dia tinha sido difícil, a conversa estava sendo complicada e eu precisava chegar a um denominador comum para acalmar o coração de Peter.

– Só pense no assunto. Não precisa me responder agora – era necessário dar um passo para trás, só assim conseguiria dar dois para frente.

Ela engoliu com dificuldade, afirmando que sim com a cabeça. Pelo menos pensaria no assunto e, se Peter fizesse como combinamos, alcançaríamos o nosso objetivo. Era só uma questão de tempo. De pouco tempo. Assim eu esperava.

– Agora vamos sair dessa chuva – ela estava séria, pensativa, mas concordou sendo a primeira a caminhar.

Confesso que senti medo de perdê-la por precisar pressionar tanto. Tive medo de assustá-la demais e que ela decidisse fugir de mim. Mas seus dedos ainda estavam entrelaçados nos meus, mesmo que seus olhos estivessem distantes.

Ela caminhou do meu lado, entrando na casa, até que chegamos à minha porta. Só naquele instante nossos olhos se encontraram. Ela estava triste, confusa, e eu ansioso, desesperado.

Abri a porta sem saber se ela me acompanharia. Sem dizer uma palavra, minha noiva passou por mim e entrou em meu quarto. Suspirei e prometi a mim mesmo que assim que aquela porta se fechasse atrás de nós dois, eu esqueceria, e faria Charlotte esquecer, todos os problemas. Foram muitos e nós não precisávamos de mais. Então deixei para o dia seguinte o plano, a tristeza, a angústia, os medos... apenas me permiti amar aquela linda mulher.


CAPÍTULO 13


“Há mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar nossa vã filosofia.”

William Shakespeare


CHARLOTTE


O sol finalmente tinha voltado. Não da forma como ele costumava ser, mas, pelo menos, a chuva tinha cessado e com o ela o frio castigante. Embora a tempestade tivesse ido embora, parecia continuar dentro de mim. Eu estava inquieta. A noite anterior tinha me deixado angustiada e confusa.

Quando voltamos para o quarto, Alex tentou agir como se tudo estivesse bem, mas eu sabia que não estava. Era nítido em todos os seus gestos, em cada palavra, cada toque... eu jamais estranharia ser amada da maneira como ele me amou naquela noite, se não tivesse a certeza de que ele agia daquele jeito por estar tão apreensivo e angustiado quanto eu.

Não que tenha sido ruim. Não foi. Jamais seria. No entanto, sentir o medo que ele sentia, enquanto estava em seus braços, tendo a certeza de que ele me buscava como se algo fosse me tirar dali a qualquer instante, contribuiu para aumentar o meu desespero. E eu me entreguei como se não houvesse o amanhã.

Mas havia, só que Alex parecia não ver isso. Eu deixei o seu quarto com o céu ainda escuro. Preferia evitar o pânico de encontrar meu pai mais uma vez. Porém, sair e deixar meu noivo para trás foi mais difícil do que eu poderia imaginar. Nós voltaríamos para casa naquela manhã. Nós nos separaríamos.

Isso pode ser normal para muitos casais e deveria ser para nós dois também, mas não era. O fato de irmos cada um para a sua casa nos machucava muito mais do que podíamos prever. E a ideia do casamento martelava em minha cabeça.

Ele não tinha voltado a insistir. Na verdade, nem tocamos mais no assunto. No entanto, eu não podia ignorar a súplica existente em seu olhar, incutida em seus toques, em seus lábios. Respirei profundamente me forçando a continuar arrumando a mala.

– Você parece que está indo para um enterro – Miranda falou ao meu lado. Eu tinha me perdido tanto em pensamentos que até me esqueci da presença dela. – Vocês dois já tinham um relacionamento antes do feriado. As coisas só vão voltar ao normal.

Suspirei mais uma vez. Eu sabia que nada voltaria ao normal, a não ser que eu cedesse.

– O que você acha desse casamento? Digo... O que pensa sobre esta pressão toda para que aconteça rápido? – ela me olhou de uma forma divertida, fechou a mala, sentou-se na cama e sorriu.

– Casamento sempre será uma loucura – ela encarou a janela e fez uma expressão confusa. – Não sei se eu aceitaria algo tão rápido com o Patrício, mas o seu caso é muito diferente do meu. O padrinho vai realmente pegar no seu pé. Alex não parece ser alguém com tanta paciência, apesar de eu achar que para ficar com você ele vai realmente precisar disso – revirei os olhos e ela riu. – Também não sei se estou totalmente de acordo com você casar com o primeiro homem com quem foi para cama. Isso é... no mínimo estranho! – fez uma careta. – Entretanto, Charlotte – minha amiga levantou e me segurou pelos ombros. – Esse é o seu faz de conta. Se fosse comigo, estaria tudo errado, mas, como é com você, não poderia ser mais adequado. Casar hoje, amanhã ou em um ano não vai fazer diferença. Alex é quem você quer, e você é tudo o que ele mais sonhou. Ficar namorando só porque você acha estranho casar de repente vai ser uma tortura. Para os dois – ressaltou.

– Não sei, mas não posso simplesmente casar e ir morar com ele. Existem tantas coisas que ainda precisam acontecer, coisas às quais precisamos nos adaptar. Intimidades que não trocamos ainda.

– Eu sei. Existe um milhão de casos de pessoas que se conhecem em um dia e no outro já moram juntos. Não vai ser estranho. Veja bem, Charlotte, todo relacionamento se desgasta com o tempo. Hoje em dia se desgasta até mais rápido, pois não existe o mesmo comprometimento de antes, então, se é para desgastar, case antes que isso aconteça e aproveite a parte boa enquanto pode.

– Que coisa horrível, Miranda! Esse foi o pior conselho que já recebi até agora – ela riu, voltando a sentar-se na cama.

– Vai dar tudo certo, basta você querer. Só não case porque é o que todos querem. Não é justo com você.

– Alex está triste – e eu também, mas não queria colocar os meus sentimentos em jogo. – E meu pai acha que estou fazendo isso para desafiá-lo. Ninguém entende o meu lado.

– Porra, Alex tem trinta e cinco anos, garota. E nunca se envolveu sentimentalmente com alguém, então é normal ele estar triste por descobrir que a ama, querer casar com você e ter que encarar a sua recusa.

– Eu não estou recusando, estou só pedindo um tempo! – exaltei-me. – Até porque precisamos de tempo para organizar tudo, definir onde vamos morar, estabelecer algumas regras – ela ergueu uma sobrancelha desdenhando de todas as minhas justificativas. – Como eu posso me enfiar de cabeça em um casamento se até agora eu não soube ser nem uma namorada que valesse a pena? – ela ficou séria e eu notei que tinha falado demais.

– Não faça isso com você – disse com raiva. – Você é o maior prêmio desta história, e Alex tem que se esforçar muito para merecê-la. Ele tem que ser um bom namorado, noivo, marido, o que for! Você é incrível, Charlotte! É uma pessoa forte, determinada, gentil, carinhosa, educada, simples, humilde até demais para alguém em sua posição. Você tem uma alma pura, transparente, é definitivamente alguém que vale a pena. Talvez seja a única pessoa desta casa toda que valha a pena, e se ele não consegue entender isso é porque não a merece.

– A única pessoa? – brinquei para amenizar o clima. – E Patrício? – ela se jogou para trás caindo teatralmente sobre o colchão e encarou o teto.

– Patrício é... sinceramente, não sei se ele é realmente alguém que valha a pena.

– Como assim? Até alguns dias atrás ele era o príncipe encantado, o melhor homem da sua vida...

– Eu sei, eu sei. É que ele... como posso explicar? Patrício não parece querer levar a relação a sério.

– Então aquela conversa toda com o meu pai sobre ter passado a vida te esperando era tudo balela? – vi que minha amiga ficou um pouco triste e me senti péssima por ter abordado aquele assunto.

– Não sei se é, ou era. Eu pensei que estávamos vivendo algo legal.

– Eu também. Vocês vivem pelos cantos, aproveitando todos os momentos a sós – ela sorriu.

– Sexualmente somos perfeitos. Só que ele anda estranho. Eu fico tão irritada com algumas colocações que ele faz que às vezes tenho vontade de acertá-lo com um soco – ri alto.

– Não faça isso. O que ela anda dizendo para te irritar tanto assim?

– Ficar o tempo todo dizendo que Alex está louco, que se deixou enlaçar pela sua carinha de anjo e que agora ele está fodido, e isso tudo sem parecer se importar com como eu vou me sentir com o que ele está dizendo. Ele não percebe que sou eu ali e não um colega de bar. E ainda diz que jamais seria tão otário a ponto de casar com alguém só porque tirou a virgindade dela.

Não era para eu me deixar abalar, mas saber que alguém da família do Alex não estava totalmente de acordo com o casamento me deixava triste. Piorava muito quando minha virgindade era colocada como motivo para nossas decisões.

– Talvez você devesse realmente acertá-lo com um soco – Miranda me olhou e sorriu largamente.

– Vou pensar no assunto.


ALEX


Meus pais ficariam até depois do almoço, mas Peter tinha decidido ir logo pela manhã, pois teria compromissos à tarde. Eu ainda não sabia o que fazer. Não queria ficar depois da partida dela, nem queria sair sem ficar um pouco mais com a minha família. Mesmo assim levei meus pertences até o carro e deixei tudo pronto para quando tomasse a minha decisão.

Charlotte não tinha conversado nada comigo durante a madrugada. Ela simplesmente foi embora, como se aquele fosse um dia comum, como todos os outros, mas eu sabia que não era. Nunca mais seria. Parei do lado de fora, sentindo o sol, ainda fraco, aquecer-me. Aparentemente a chuva não nos castigaria mais.

– Já estamos indo.

Ouvi Anita muito perto e abri os olhos para encontrá-la. Não tínhamos nos falado direito desde o episódio no meu quarto, assim como não tínhamos ficado sozinhos desde então. Fiquei incomodado. Ela sorria naturalmente, sem demonstrar qualquer traço de sua loucura.

– Vejo você hoje? – olhei para ela sem entender. – Reunião de professores do último ano, Alex. Será hoje à tarde.

Eu havia esquecido completamente. Na verdade, não sabia como estava a minha situação com a faculdade. Apesar de eu ter pedido demissão, mas somente naquele dia saberia como seria o meu desligamento.

– Não sei ainda. Preciso conversar primeiro com o Carvalho, saber como poderemos definir a minha saída.

– Então é sério mesmo? Vai deixar a faculdade por causa da Charlotte?

– É o mais adequado.

– Realmente. Transar com uma aluna é algo grave. As pessoas pensam que a liberdade sexual derrubou todas as barreiras, mas algumas situações são imutáveis. Professor e aluno, por exemplo, continua sendo uma relação proibida independentemente da situação.

– Colegas de trabalho também – ela me olhou sem jeito, depois sorriu e passou uma mão no meu braço, demorando-se em meus músculos.

– Neste caso, já que você insiste em deixar o quadro de funcionários da UERJ... – deixou o restante da frase no ar.

– Não vai acontecer, Anita. Desista.

– Ah, Alex. Eu realmente não sou uma mulher de desistir. Vejo você em breve.

E ela partiu deixando a promessa de mais confusão.


CHARLOTTE


– Onde está a sua mala?

Meu pai me perguntou assim que eu cheguei ao carro. Ele não estava muito atento a mim, apenas se concentrava em organizar tudo para a nossa partida.

– Onde está Johnny?

Eu praticamente quicava angustiada com a possível reação que ele teria quando eu anunciasse que não iria em seu carro. Em minha cabeça, tudo já estava esquematizado, bastava convencê-lo. Eu diria que, já que estávamos noivos, eu poderia ir no carro de Alex, então eles partiriam na frente. Depois diria a Alex para irmos antes do almoço e para meu pai, que ficamos para o almoço, como ele tinha compromisso pela tarde, ganharíamos tempo. Seria perfeito!

– Não sei – resmunguei querendo ganhar a sua atenção.

– Acho que ele foi ajudar a professora Bezerra a colocar a mala no carro.

Miranda disse deixando a mala dela ao lado do carro. Antes de sair, ela me olhou e piscou. Nós duas havíamos bolado aquele plano, bastava agora colocá-lo em prática.

– Aonde você vai? – meu pai a chamou de volta, mas ela fingiu não ouvir, andando decidida em direção à casa. – E você, Lottie, onde está a sua mala?

– Ah... hum... – meu rosto esquentou consideravelmente. Eu não sabia como comunicar que iria com Alex.

– Algum problema? – ele parou tudo para me olhar com atenção.

– Não, é que... – ajustei mecanicamente os meus óculos, incapaz de manter as mãos quietas. – Eu pensei e gostaria de ficar mais um pouco. Eu e Lana mal conversamos sobre o livro e Dana ficou de me passar uma receita, então...

Eu era mesmo muito covarde. Por que simplesmente não dizia que ficaria para voltar com Alex? Por que eu deixava que meu pai me intimidasse tanto? Mesmo com toda revolta dentro de mim, eu não conseguia agir diferente. Estava acostumada a ter a minha vida guiada pelas decisões dos outros. Era uma merda mesmo!

– Não.

Assim. Simplesmente não e acabou. Ele nem esperou minha reação, nem aguardou pelos meus argumentos. Meu pai disse não e pronto. Ficou definido. Eu podia sentir a raiva crescendo dentro de mim e subindo pela minha garganta. O calor do meu rosto ardia minha pele. Olhei para os lados evitando um problema maior.

– Por que não?

– Porque não – ele continuou tentando arrumar uma forma de colocar tudo na mala do carro. E nem eram tantas coisas, mas Peter gostava de tudo milimetricamente em ordem.

– Pai!

– Olha, Charlotte – ele levantou me encarando daquele jeito que deixava claro quem tomava as decisões naquela família. – Você quis ser escritora, eu aceitei, quis um namorado e eu tive que aceitar, depois decidiu casar, e para mim esta foi a sua melhor decisão até agora, depois voltou atrás e resolveu esperar... quanto tempo mesmo? Ah, um ano! Um ano! Eu não vou te pegar pelo braço e arrastar para a igreja forçando este casamento, mas se você quer saber como é ser namorada de alguém, eu vou ajudá-la com isso. Então não tem essa de ficar para voltar mais tarde com o Alex.

– O quê? – arfei sem conseguir acreditar.

– Exatamente o que você ouviu. Estou fazendo a sua vontade. Na minha época...

– Não estamos na sua época – o movimento brusco me forçou a levantar os óculos para ajeitá-los melhor em meu nariz.

– Não importa. Minha época valeu muito mais do que a sua, então na minha casa, e com a minha família, será isso o que vai contar. Agora vá buscar a sua mala porque eu não posso me atrasar.

– Isso não é justo! – protestei me sentindo uma idiota. Uma criança de seis anos que precisava ser conduzida pelos pais.

– Sim, claro! É melhor começar a se adaptar, ou vou aproveitar que suas aulas estão acabando e levá-la para a Inglaterra, assim terei a certeza de que as minhas ordens não serão desobedecidas, mocinha. E você sabe que eu consigo enfiar você naquele avião, então, não me provoque mais do que já provocou nos últimos dias – ele voltou para pegar a mala de Miranda resmungando coisas como “era só o que me faltava” e “onde já se viu uma coisa como esta?”.

Senti muita raiva. Eu sabia que, se meu pai quisesse, realmente encontraria uma forma de me levar para Londres e só me deixar voltar um dia antes do casamento. Merda! Eu estava com uma imensa vontade de gritar e xingar... contive-me a duras penas. O que eu menos precisava naquele instante era de uma demonstração pura e viva da minha capacidade de ser infantil.

Por isso virei em direção à casa, decidida a pegar a porcaria da mala. Eu não engoliria aquela conversa com tanta facilidade, mas ali não era a hora, muito menos o lugar para iniciar uma briga com o meu pai. Isso só pioraria as coisas. Estava tão nervosa que quase ia passando por Alex sem notá-lo. Precisou que ele me segurasse pelo braço para me deter.

– Ei, o que houve? – olhei para cima encarando seus olhos azuis, de uma escuridão anormal, e de uma profundidade que facilmente me consumia. – Charlotte?

– Alex! – deixei o ar escapar dos meus pulmões e tentei me acalmar. – Desculpe! Eu não te vi.

– Deu para perceber. E o que aconteceu para que ficasse tão transtornada? – ele me encarava com preocupação, mas eu fiquei envergonhada. Era ridículo o que tinha acontecido. – O que foi amor? Você vai chorar?

Por que os homens sempre entram em pânico quando uma mulher ameaça chorar? Alex especialmente. Ele sempre se assustava quando eu chorava. Ficava sem saber o que fazer para evitar. Respirei fundo impedindo que as lágrimas caíssem e mexi nos meus óculos como uma distração.

– Meu pai, às vezes, me tira do sério.

Vi meu noivo relaxar completamente. Ele me olhou com conforto. Era como se estivesse me dizendo que tentou me avisar e que eu não quis saber.

– O que ele fez?

– Eu falei que poderia voltar com você mais tarde. O que tem de mal nisso? Nós somos noivos, não somos? Para que aceitar um passo tão importante quanto este se não posso nem ficar mais um pouco com você? Mas não. Ele tem que sustentar a sua posição de homem das cavernas e me impedir.

– Eu acho que os homens das cavernas aceitavam com mais facilidade os relacionamentos das filhas. Além do mais, bastava uma porrada na cabeça da escolhida e estava feito, eles estavam casados – ele sorriu despreocupado para mim e cruzou os braços no peito, recostando-se na parede. Revirei os olhos.

– Que seja, Alex. Você entendeu o que eu quis dizer – ele riu baixinho.

O silêncio que se seguiu após esta conversa me deixou incomodada. Alex me olhava com atenção, sem nada dizer. Eu precisava buscar minha mala, mas não queria me despedir. Dei um passo diminuindo a distância entre nós dois. Ele não se moveu, apenas aguardou.

– Você vai ficar?

– Só mais um pouco – sua calma e aceitação estavam me deixando louca.

– Por que você não conversa com meu pai e...

– Charlotte, eu não vou questionar o Peter sobre uma determinação dele. Não pedi você em casamento para tirar dele a autoridade de pai.

– Mas você é meu noivo! – eu odiava aquela resignação, a forma como Alex simplesmente aceitava.

– E você disse que não precisava de um segundo pai. Eu não vou exercer este papel, prefiro ser seu namorado. Não era o que você queria?

– É o que eu quero, o que não significa que eu tenha que viver um namoro do século dezoito.

– Para o seu pai significa sim e nós já sabíamos disso.

– Merda, Alex! Como você pode ser tão frouxo?

Ele riu. Puta que pariu! Alex riu. Achou graça daquela situação. Achou graça de sermos impedidos de ficar juntos. Eu juro que poderia matá-lo.

– Isso não é engraçado! É desesperador.

Ele continuou rindo e me puxou para seus braços. Desviei o rosto na hora em que me beijaria. Estava muito furiosa para beijá-lo. Estava mais do que furiosa, porque me dei conta de que Alex estava adorando aquilo tudo, simplesmente porque acreditava que assim eu cederia mais fácil.

Merda!

– Deixe de bobagem, Charlotte – mordiscou meu pescoço como reprimenda por eu não o deixar me beijar. – Pelo que conheço do seu pai, vai demorar um pouco até que possamos nos beijar com liberdade outra vez – gemi um protesto que me sufocava.

– E você está adorando isso – acusei empurrando-o pelo peito. Alex sorria como se aquele fosse o seu dia. – Não pense que conseguirá me convencer a aceitar...

– Eu não penso em nada, amor – voltou a tentar me beijar e eu recuei. – Aliás, eu penso em uma coisa. Penso muito em uma coisa.

Não sei por que, mas aquelas palavras fizeram minhas pernas fraquejarem e instantaneamente eu desisti de lutar. Seus olhos lindos estavam fixos em meus lábios. Involuntariamente passei a língua por cima, umedecendo-os e Alex mordeu o dele. Porra, como eu podia me render tão fácil?

– E no que você pensa tanto? – eu me odiei pela voz fraca que revelava o quanto eu estava entregue.

– Quando poderei ter você outra vez em minha cama.

Prendi o ar me dando conta do quanto eu ansiava pelo mesmo. Era o meu plano, poder ficar mais um pouco com ele, sem mais ninguém, como fazíamos quando ainda éramos apenas professor e aluna. Aparentemente Alex parecia querer cooperar para que tudo desse errado.

– Quando poderei te tocar outra vez sem medo de que alguém esteja olhando.

– Poderia ser hoje mesmo, mas... – desafiei meu noivo, encarando-o com a sobrancelha erguida.

– Mas você escolheu ser a minha namorada – ele rebateu sem se abalar. – Poderia ser diferente se...

Era realmente difícil lutar contra Alex. Ele sabia o que dizer, o que fazer, para vencer aquela guerra, enquanto eu só podia usar a minha decisão como arma. Todos estavam loucos. Não havia outra explicação. Ninguém em sã consciência casa em tão pouco tempo. Eu até esperava isso do meu pai, afinal de contas, toda a sua perseguição já deixava claro a sua insanidade, mas nunca de Alex.

Para falar a verdade eu nunca esperei que ele um dia me quisesse, quem dirá que desejasse com tanto afinco se casar comigo.

Enquanto eu pensava em tudo o que podia utilizar para conseguir persuadi-lo, senti seus lábios nos meus e então me esqueci de tudo. Não havia argumento que impedisse aquele beijo, nenhuma resistência, nenhuma barreira, porque eu já sentia a falta dele antes mesmo de viver a sua ausência. Só então me dei conta de que seria realmente uma tortura, e a ideia do casamento já não era mais tão estranha.

Ah, Alex! Por que tudo tem que ser tão complicado?

Quando éramos apenas nós dois, quando ninguém sabia o que fazíamos, era muito mais fácil. Definitivamente mais fácil. Porém, ali em seus braços, deixando-me levar pela delícia que era beijá-lo, eu entendia que nunca mais seria como antes.

– Case comigo – ele repetiu pela milionésima vez.

A voz rouca e sofrida, sem fôlego e em dor por ter que afastar os lábios dos meus. Antes que eu conseguisse parar para pensar em seu sofrimento, ele sorriu, quebrando todas as minhas dúvidas. Ele sorria daquela forma única, daquele jeito que conseguia me derreter. Seu sorriso era tão adequado aos seus olhos, era tão harmônico! Alex era a sensação de leveza, de simplicidade, de facilidade e eu me sentia flutuar em um céu azul e calmo, quando ele me olhava daquele jeito e sorria.

– Convença meu pai a me deixar ficar – seu sorriso se ampliou e ele me largou sem deixar de me olhar.

– É uma condição?

Eu sabia que aquele caminho era arriscado. Não poderia aceitar aquela loucura apenas para conseguir mais algumas horas ao seu lado. E se eu dissesse “sim”, não haveria mais volta. Nunca poderia iludi-lo a tal ponto e voltar atrás depois de conseguir o meu intento. Eu jamais jogaria tão sujo com Alex. Ele entendeu a minha resposta antes mesmo de eu dizê-la.

– Então quando você estiver pronta, conversaremos – respirei fundo me conformando com a situação. – Vamos, vou te ajudar com suas coisas – ele me conduziu pela porta da casa, a mão em minhas costas, mas sem se aproximar demais.

– Todos vocês são loucos – ajustei meus óculos tentando me adaptar à nova armação e me dando conta, pela primeira vez, de que preferia a antiga.

– Eu sei que estou – ele me olhou pelo canto dos olhos e ampliou o sorriso. – Você está realmente me enlouquecendo.

E seus dedos se cercaram da minha cintura levando-me para mais perto.


ALEX


Charlotte entrou no quarto, deixando a porta aberta em um convite explícito. Respirei fundo antes de entrar, sabendo que ali ela conseguiria ser muito mais persuasiva e eu era um fraco assumido.

Para ser sincero eu adorava ser o fraco naquela história se ela continuasse sendo a razão. Eu nunca cansaria de ceder aos encantos daquela menina.

Porém eu sabia que precisa arrumar motivos fortes para mantê-la afastada por um tempo. Fazia parte do plano e se eu queria que Charlotte aceitasse casar comigo o quanto antes, a distância era a minha melhor arma.

– Eu te vejo ainda hoje? – ela parou hesitante, ao lado da cama. A mala estava no chão, bem próxima ao pé da minha noiva. – Quer dizer, o feriado acabou e hoje é um dia normal para todos que trabalham, então acredito que funcione da mesma forma para você – deu de ombros. Imaginei se ela estava tentando não me pressionar.

– Eu queria mesmo conversar sobre isso com você, Charlotte – sentei na cama, dando dois tapinhas do lado para que ela fizesse o mesmo. – Hoje eu tenho duas reuniões importantes, uma relacionada à editora, inclusive Patrício está indo embora antes, para organizar tudo, e a outra é na faculdade, que vai me tomar a maior parte do tempo.

– Então você não irá me ver mais tarde – ela afirmou tentando esconder a decepção.

– Eu preciso cuidar de algumas coisas que vão demandar muito tempo. Não será fácil nem simples passar o cargo para Lana, também tenho compromissos agendados que precisam ser cumpridos.

– E onde exatamente você quer chegar, Alex? – ela me encarava já incomodada com a conversa. Puxei o ar decidido a dizer logo tudo de uma vez por todas.

– Na sua paciência – ela franziu o cenho, e eu alisei seu cabelo, consciente de que aquele afastamento seria terrível. – Preciso que você seja paciente comigo, Charlotte. Não será fácil ficar longe. Se seu pai não fosse tão intransigente, eu te levaria comigo, mas ele...

– Me levaria? – minha noiva ficou na defensiva.

– Vou precisar passar alguns dias em São Paulo – ela abriu a boca para responder, mas fechou logo em seguida, absorvendo o que eu dizia.

– Você vai viajar?

– Sim. Tenho compromissos importantes e você precisa estudar para as últimas provas...

– Quantos dias?

– Acredito que cinco, mas pode ser que eu precise ficar um pouco mais.

– Cinco dias? – ela praticamente gritou.

– Compromissos, Charlotte. Não tem como cancelar, nem eu quero fazer isso. É o meu trabalho.

– Quando você viaja?

– Amanhã – ela saiu e caminhou até a cama.

Não consegui evitar o sorriso, aproveitando que ela estava de costas para mim. Eu estava jogando da forma certa, usando as armas corretas e já me sentia vitorioso.

– Quase uma semana sem ver você – ela resmungou.

– Antes você não se incomodava em ficar alguns dias sem me ver. Quando Peter chegou na cidade...

– Era diferente, Alex – ela voltou a olhar para mim e eu tive que recompor minhas feições para não estragar tudo.

– Vem aqui – levantei a mão para ela, que obedeceu imediatamente. Coloquei minha noiva em meu colo. – Eu também vou sentir a sua falta – acariciei seu rosto com cuidado. – Está vendo? É por isso que eu quero tanto este casamento.

– Daria no mesmo – ela rebateu levantando do meu colo. – Primeiro: não estaríamos casados amanhã, então você viajaria sozinho da mesma forma. Segundo: eu preciso fazer as provas, ou seja, daria no mesmo.

Charlotte estava aborrecida, no entanto não foi como eu esperava. Ela compreendeu rápido demais, da mesma forma como também arrumou as desculpas exatas para rebater o meu argumento.

– Eu terei outras viagens e você continuará não podendo me acompanhar – ela mordeu as bochechas e desviou os olhos dos meus.

– Vou dar um jeito – ri. Charlotte era incrível!

– Ah, vai?

– Vou. Eu vou. Pode ter certeza. Pelo visto, se depender de você eu volto a ser virgem – ri sem vontade de rebater. Era melhor deixá-la com todos os seus planos. Os meus já me dariam trabalho suficiente. – Vai me ajudar com a mala? Vamos logo antes que meu pai fique louco de vez.

– Não – levantei puxando-a para mim. – Eu vou te beijar logo, porque isso sim pode enlouquecer o seu pai, então...

Colei meus lábios nos dela e não encontrei nenhuma resistência. Charlotte amoleceu em meus braços, a boca entregue ao beijo, aceitando minha ansiedade e retribuindo com toda a saudade que já previa sentir. Sua língua tocou a minha e eu gemi faminto pelo seu gosto. Sem me controlar, colei o corpo dela ao meu, aproveitando cada centímetro.

Minha mão alcançou sua nuca, prendendo-se aos fios sedosos e mantendo sua boca onde eu queria. Foi a vez de Charlotte gemer em meus lábios. Eu sentia meu corpo começar a reagir, o desejo fluindo em minhas veias. Suas mãos pequenas passearam pelas minhas costas com posse, como se quisesse levar daquele momento o máximo possível de recordações.

Charlotte ficou nas pontas dos pés, tentando igualar as nossas alturas e se prendeu em mim assim que sentiu meu pau pronto para satisfazê-la. Como uma gatinha manhosa, ela se enroscou em meu corpo, roçando levemente, o atrito de nossos jeans impedindo o contato e, ao mesmo tempo, possibilitando um roçar mais intenso.

Desci uma mão até a sua bunda e a puxei para que fosse mais concreto, fazendo-a sentir o quanto eu estava excitado. Minha mão estava exatamente no centro da sua bunda, espalmada, buscando o máximo dela. Os dedos apertando a carne macia e tocando os pontos protegidos, da maneira como eu sabia que a enlouqueceria.

E claro, enlouquecia-me na mesma proporção.

Eu realmente passava da medida quando percebia Charlotte tão entregue a ponto de esquecer onde estava e tudo o que poderia acontecer. Ela era exatamente assim, brincava com fogo, arriscava-se, e nunca de maneira intencional, era apenas a sua incapacidade de se conter, de impedir que o desejo ditasse seus passos e assumisse as rédeas da situação. Ela simplesmente fechava os olhos e se entregava.

Então cabia a mim tomar aquela decisão. Era inevitável parar. Era necessário. Charlotte gemeu desgostosa e eu me impedi de fazer o mesmo. Tirá-la dos meus braços foi uma tortura, no entanto, continuar era impossível.

– Perdeu a noção do perigo? – sussurrei enquanto a afastava, mantendo-a distante por um braço.

– Eu não me importo – ela tentou avançar outra vez e eu não permiti.

– Eu sei que não – sorri saboreando aquelas bochechas rosadas, o descer e subir dos seus seios demonstrando a respiração irregular. – Mas eu sim. Não quero que seu pai nos surpreenda em uma situação tão delicada.

– Pro inferno!

Charlotte se atirou em meus braços voltando a colar seus lábios nos meus. Aproveitei mais alguns segundos daquele sabor inconfundível e incomparável, antecipando a saudade que certamente sentiria, até que se tornou necessário afastá-la novamente.

– Alex! – ela gemeu em súplica.

– Não faça isso comigo, menina!

– Vá me ver hoje – suas palavras saíram com uma urgência que quase me fez desistir.

Ah, Charlotte, eu seria capaz de tudo para atender a um pedido seu, mas havia a minha promessa e a decisão de ajudar Peter em algo tão importante. Eu precisava me afastar.

– Não posso, amor.

Ela gemeu outra vez, mordendo os lábios com tristeza e angústia. Acariciei seu rosto, sem ousar me aproximar. Minha noiva passou a mão pelo cabelo, o rosto demonstrando sua apreensão. Ela puxou o ar com força e me encarou.

– Diga que isso não é um plano para me fazer aceitar, Alex. Jure que não está forçando a barra.

Senti meu rosto empalidecer. O que eu poderia dizer? Não tinha como contar a verdade, pelo menos não o motivo mais forte para eu ter topado participar daquele jogo.

– Eu não disse que facilitaria, Charlotte – tentei ser verdadeiro até onde poderia ser. Não era uma mentira, era apenas uma meia verdade. – Eu não estou fingindo um afastamento. Preciso mesmo trabalhar, dar o máximo possível para que esta transição não traga prejuízos para a empresa, além de me dedicar enquanto posso.

Ela voltou para os meus braços, agora sem o fogo de antes, havia apenas os seus medos e dúvidas. Charlotte deitou a cabeça em meu peito e eu afaguei seu cabelo.

– Vamos, seu pai deve estar irritado.

– Problema dele – rebateu ao afundar o rosto em meu peito. Ri constatando como ela, às vezes, parecia ser ainda mais jovem do que era.

– Não seja infantil, Charlotte.

– É só o que eu sei ser. E estou no meu direito.

– Está? – ela levantou o rosto, encarando-me de baixo.

– Estou. Vou passar uma semana sem você, então tenho direito de mandar qualquer um para o inferno – ri e beijei aquela menina que conseguia tirar todo o meu juízo, para o bem e para o mal.


CAPÍTULO 14


“Se você ama algo ou alguém, deixa que parta. Se for seu, voltará; se não, é porque jamais seria.”

William Shakespeare


CHARLOTTE


– Então, eu estava pensando em irmos todos juntos à igreja hoje à noite. O que me dizem?

Johnny abaixou a cabeça e virou o rosto em minha direção com um sorriso imenso. Depois colocou a língua para fora e rolou os olhos, fingindo que morria. Eu ri, escondendo do meu pai o que estava fazendo.

– Eu acho uma ótima ideia – minha mãe falou por nós todos.

Miranda continuou calada. Ela não tinha dito nada desde a hora em que Patrício entrou no carro e partiu, alguns minutos antes da gente. Pelo visto as coisas não estavam nada boas entre eles.

– Eu tenho uma aula importante no final da tarde – Johnny falou com toda seriedade que um rapaz responsável poderia incutir em sua voz. Meu pai o buscou pelo retrovisor.

– Uma aula no final da tarde?

– Sim, padrinho. Para fechar o semestre. E amanhã tenho duas provas – vi meu pai concordar e deixar para lá.

– E você, Charlotte?

Bom, eu não estava muito certa se queria ir à igreja. Primeiro, porque nos últimos tempos eu me sentia a pior de todas as pecadoras, mesmo tendo consciência de que sexo não era pecado. Segundo, porque meus pensamentos estavam todos em Alex e na falta que eu já sentia dele, além do medo de como seria essa semana afastados.

Olhando para o relacionamento de Miranda e Patrício, vendo o quanto eles estavam estranhos, mesmo depois daquela demonstração toda de amor eterno, eu me sentia temerosa. Será que Alex seria tão fugaz quanto o irmão? Pelo visto, Patrício estava assustado com a possibilidade de um relacionamento sério, principalmente depois do que eu e Alex assumimos.

– Charlotte?

– Ah, eu tenho duas provas amanhã também, pai. Poderíamos ir no final de semana.

– Alex gosta de ir à missa? Tem alguma religião?

Fiquei alguns minutos pensando no assunto. Eu não sabia a resposta. Aliás, eu pouco sabia da vida do meu noivo e pensar nisso me deixou incomodada. Eu desconhecia o que Alex gostava, a sua cor preferida, qual era a sua rotina, se ele tinha um grupo de amigos de infância, onde tinha estudado... Eu não sabia nada. E ele também não sabia nada a meu respeito. Mesmo assim, estávamos noivos.

Eu só podia estar louca.

– Não sei, pai – admiti.

– E Patrício, Miranda? – minha amiga parecia ter acabado de despertar de um sonho. Ela piscou, olhando-me sem entender. – Ele frequenta a igreja?

– Ah, não. Eu acho que não – disse mecanicamente.

– Você também tem prova amanhã? – meu pai perguntou com um pouco mais de interesse.

– Sim, padrinho – e ela respondeu sem emoção, o que me deixou bastante preocupada.

Olhei para o celular ansiosa por uma mensagem de Alex, algum indício de que quisesse conversar, qualquer coisa que me levasse a nossa bolha, mas o sinal estava horrível. Então acoplei os fones no monitor e me concentrei no filme que estava passando.


ALEX


Eu aguardava pelo Professor Carvalho na linha telefônica. Ele estava saindo de outra reunião e ainda estava se despedindo de alguns professores, então a sua secretária me deixou esperando. Depois de alguns minutos, ele me atendeu.

– Alex! – Ssua voz estava preocupada. – Pensei que não conseguiria conversar com você antes da reunião.

– Como vai, Arthur?

– Sentido com a mensagem que recebi. O que aconteceu?

– É uma situação um pouco delicada e eu gostaria de conversar pessoalmente sobre o assunto.

– Entendo. Então acho que vou aguardar até que você possa me explicar, só depois encaminharei seu pedido de exoneração.

– Mas, Arthur...

– Tenho que entender, Alex. Eu sei que a decisão final será sua, mas eu preciso ter a certeza de que realmente não há nada que possa fazer para impedi-lo. Fui informado na secretaria que João Pedro assumiu o trabalho final de Charlotte Middleton e que assinou a aprovação do projeto, sustentando a sua avaliação. Devo imaginar que este fato esteja diretamente ligado à sua solicitação de desligamento? – respirei fundo passando a mão no rosto para clarear as ideias.

– Sim. Está sim. Mesmo assim eu prefiro me justificar pessoalmente.

– Tudo bem. Encontro você hoje? Como ainda não foi exonerado, acredito que deva comparecer à reunião.

– Se você achar necessário... Só não poderei me prolongar, pois tenho outros compromissos agendados – ele riu um pouco.

– Claro. Gostaria de te pedir para agendar um dia para a nossa conversa.

– Faço isso assim que chegar.

– Vejo você mais tarde.

– Até lá.

Ele desligou e eu continuei onde estava, analisando toda a situação e de que forma poderia expô-la sem prejudicar Charlotte, ou a minha carreira. Aquele era mais um problema que eu precisava resolver, e o quanto antes, pois Anita com certeza tentaria estragar tudo.

– Você vem? – Lana colocou a cabeça para dentro do quarto, do jeito que fazia quando éramos crianças.

– Vou sim. Estava só organizando algumas coisas.

– E mandando mensagens para Charlotte. Ela mal foi embora e você já está ansioso para colocar suas mãos na garota – ri guardando o celular no bolso.

– Não, eu estava mesmo trabalhando. Resolvendo algumas coisas da faculdade. Tenho reunião no campus hoje.

– Ah! – ela me avaliou por um tempo. – Está tudo bem?

– Sim. Carvalho está um pouco relutante em me liberar, ele ainda não sabe os motivos, então preciso aguardar.

– Vai mesmo se demitir?

– Vou. Quer dizer... – saí de perto da janela sem saber ao certo o que eu sentia quando o assunto era parar de dar aulas. – É o mais certo a ser feito, não é?

– Não. Relacionamentos entre professores e alunos é mais comum do que você imagina. E Charlotte não é mais nenhuma menina indefesa. Ela sabia muito bem o que estava fazendo. Sem contar que vocês vão se casar.

– Anita vai fazer questão de deixar esta história o mais feio e sujo que puder.

– Ela pode tentar, mas não vai conseguir – eu não tinha tanta certeza a este respeito, por via das dúvidas pedi internamente para que fosse verdade. – Já falou com a Simone? – pisquei confuso com a mudança repentina de assunto.

– Sim. Ela confirmou as reuniões de hoje e a viagem de amanhã.

– E posso saber por que tantos dias em São Paulo? – Lana não estava mesmo disposta a facilitar para mim. Ela cruzou os braços na frente do corpo, demonstrando que não aceitaria qualquer resposta.

– Porque é necessário – ela fez um muxoxo, revirando os olhos. – Preciso realmente acompanhar a Cibele, não nos vemos desde o lançamento do livro dela e pouco conversamos desde então. Sem contar que o José Marcílio pediu uma reunião, e tem aquele encontro literário da Ammy Stuart com alguns dos nossos melhores autores...

– Que você combinou que a Catarina poderia acompanhar. Nós só faríamos parte do encontro do Rio.

– Sim, mas já que estarei por lá... – dei de ombros sem querer confessar que buscava motivos para ficar longe.

– Alex... – ela andou em minha direção parando à um passo de mim. – E Charlotte?

– O que tem ela?

– Vai ficar tanto tempo sem você?

– Uma semana, Lana! – ri desconfortável com a forma como ela me encarava.

– Sei – minha irmã entortou a boca, depois desistiu.

– Então, já que você está decidido...

– Podemos descer? Eu estou faminto – menti para tirá-la do meu encalço.

– Claro! – ela segurou em meu braço e me guiou para fora do quarto. – Mamãe disse que você está muito magro...

E começou a falar uma infinidade de assuntos, emendando um no outro, enquanto minha cabeça estava em um único lugar: Charlotte.


CHARLOTTE


Desliguei a luz do abajur e me acomodei melhor na cama. Não havia posição que me deixasse mais confortável. Alex não tinha ligado, apenas enviado uma mensagem avisando que precisaria deixar o celular mudo, pois entraria em reunião, caso eu precisasse, poderia entrar em contato com a Simone, a sua secretária, que ela daria um jeito de avisá-lo.

Lógico que eu não ligaria. Tinha consciência de que era absurdo ligar apenas para dizer que sentia falta dele, mas eu estava angustiada. Mensagens tornavam tudo tão frio e impessoal! Eu sabia que já havíamos nos comunicado daquela maneira, mas foi antes, não depois de... um calor familiar aqueceu o meu coração.

Porra, nós tínhamos transado! Não apenas uma vez, foram muitas vezes e cada uma delas de formas diferentes, despertando sentimentos estranhos e sensações desconhecidas. E foi incrível! Todas foram incríveis, e em todas Alex foi um homem diferente.

Mordi o lábio. Eu sentia a falta dele de todas as formas possíveis. Era péssimo voltar para a minha cama vazia depois de algumas noites na cama do meu noivo. Talvez Alex tivesse razão. Talvez o casamento fosse a única alternativa de aplacar todas as minhas vontades.

Como me casar, se eu nem sabia se ele acreditava em Deus? Se eu nem tinha ideia de para qual time ele torcia, qual era a sua comida predileta e quantas vezes na semana ele costumava visitar a mãe? Essas eram coisas que uma boa esposa deveria saber, não? Eram, no mínimo, coisas que uma mulher deveria saber a respeito do homem com quem se casaria.

Não que fosse mudar alguma coisa em nossas vidas, mas certamente acrescentaria. Eu não sabia nada sobre ele, e mesmo assim o amava com tamanha intensidade que estava à beira de me jogar naquela loucura de casamento só para poder estar ao seu lado sempre que tivesse vontade. Tantas e tantas vezes que Alex enjoaria de mim.

Alex enjoaria de mim.

Puta merda!

Quantos casais apaixonados você conheceu, que juraram amor eterno e se separaram dois meses depois por causa da incompatibilidade de gênios, objetivos, ideias e até mesmo agendas? Quantas vezes você testemunhou casais casados há muitos anos que mais pareciam dois estranhos do que pessoas que se amavam a ponto de se suportarem por tanto tempo?

Virei para o outro lado e puxei o cobertor até os ombros. Não era para ser assim. Não mesmo! Com certeza, meu pai estava enlouquecendo Alex, cobrando o casamento, fazendo ameaças e sabe Deus mais o que ele era capaz de fazer para garantir a minha virgindade até eu subir no altar.

Que tolo!

Ri sozinha. Se ele soubesse o que eu andava fazendo com o meu professor. Se imaginasse as coisas que Alex tinha me ensinado... outra vez o calor familiar voltou a me aquecer.

Na escuridão do quarto, a luz do meu celular chamou imediatamente a minha atenção. Quase pulei da cama, pegando o aparelho ansiosa para saber o que Alex havia enviado. Mas, para minha decepção, não havia mensagem do meu noivo e sim uma mensagem ridícula do Johnny.

“Aposto que pensou que era o seu professor kkkkk”.

Fechei os olhos contendo a minha raiva. Johnny era mesmo um cretino, um imbecil! Digitei imediatamente uma mensagem.

“Idiota!”

“Posso até imaginar o seu rosto ao ver a minha mensagem”.

“Por que você não vai para o inferno?”

Deixei o celular de lado e deitei novamente. Ainda vi a luz acender algumas vezes e tentei ignorá-la. Cansada de ficar apreensiva, já que Alex poderia realmente me enviar uma mensagem, peguei o aparelho outra vez. Três mensagens do Johnny. Revirei os olhos conferindo-as.

“Eu quero te contar uma coisa”. “Lottie, é sério!”. “Você ainda está aí? ”

Ri digitando uma mensagem.

“Não. Estou dormindo e você está me atrapalhando. Não quero saber da sua vida sexual. Boa noite!”

Ele demorou um pouco a responder, mas finalizou com um “boa noite, gostosa” que eu nem me dei ao trabalho de responder. Virei para o lado e me perdi em pensamentos com o meu futuro marido, preferindo ignorar por completo a luz que continuava acendendo alertando-me de novas mensagens.


ALEX


Entreguei minha habilitação à atendente, que sorriu para mim como se eu fosse algo comestível. Vi seu rosto corando à medida que ela tentava se concentrar no seu trabalho e ao mesmo tempo encontrar algo de interessante para falar comigo.

– Só esta bagagem, senhor?

– Sim.

Só porque ela estava visivelmente constrangida, continuei olhando-a fixamente, e me diverti vendo-a se atrapalhar com as mãos na hora de colocar a etiqueta na minha mala. Ela me olhou ligeiramente e sorriu, mordiscando o lábio inferior. Este gesto me fez lembrar de Charlotte e na minha frustração por não ter conseguido falar com ela antes da viagem.

– Destino São Paulo, aeroporto de Congonhas, confirma?

Arqueei a sobrancelha confirmando apenas com a cabeça. Ela sorriu demonstrando timidez e voltando sua atenção para a tela. Eu já tinha desistido de brincar com a garota, todos os meus pensamentos estavam voltados para Charlotte e a vontade que eu tinha de largar tudo para ficar apenas em seus braços.

– Embarque em trinta minutos. Mais alguma coisa? – seu olhar esperançoso me fez rir. Se fosse em outra época, no mínimo eu pegaria o telefone dela, e no máximo... Como eu disse: em outra época.

– Não.

– Boa viagem! – ela falou desanimada, entregando-me a minha liberação. Sorri educadamente.

– Obrigado!

Passei pelo portão de embarque sem querer aguardar pelo tempo que ainda me restava. Com o celular na mão, eu me forcei a não conferir a cada minuto se ela tinha enviado alguma mensagem. No que eu havia me transformado? Um adolescente apaixonado aos trinta e cinco anos.

– Relógio, corrente, cinto, a pasta...

O segurança à minha frente indicava tudo o que eu deveria colocar na bandeja e eu o fiz automaticamente, ficando longe do celular pela primeira vez desde que eu tinha acordado. A mulher do outro lado do detector de metais também me olhou com um pouco mais de atenção quando tive que levantar a camisa para ajustar o cinto.

Sorri ao pegar o celular. Era divertido observar quantas mulheres ficavam encantadas comigo durante o dia. Esta nada falou, nem tentou chamar a minha atenção, apenas observou o que eu fazia.

Caminhei até a sala de embarque, sentei em uma das cadeiras enquanto aguardava a chamada para o meu voo e peguei meu celular para ler as notícias do dia. Foi quando ela me ligou. Meu coração ainda teve tempo para atrasar alguns milésimos de segundos antes de bater aceleradamente. É, eu realmente era um adolescente apaixonado.

– Oi! – senti-me um idiota fazendo aquela voz melosa, mas era como eu estava me sentindo, então apenas agradeci por não ter ninguém ao lado.

– Bom dia! – sua voz de sono me fez ter vontade de abraçá-la. – Não vi sua mensagem ontem, desculpe. Onde você está?

– No aeroporto. Embarco em poucos minutos – ela soltou um gemido de desagrado e eu sorri. – Você tem prova hoje?

– Tenho sim. Duas – bocejou parecendo uma criança.

– E estudou? – ela riu baixinho.

– Sim, professor Frankli – eu podia ver Charlotte revirando os olhos para mim. – Na verdade, tenho que tomar um banho agora mesmo se não quiser me atrasar – sem perceber, umedeci o lábio inferior por causa da imagem de Charlotte tomando banho que se projetou em minha cabeça.

– Eu adoraria poder te ajudar – ouvi alguns barulhos que pareciam ser dela levantando da cama. Minha noiva riu baixinho e, quando falou novamente, sua voz ecoava de leve, dando a ideia de que ela já estava no banheiro.

– Seria um prazer. Aliás, já que está tão preocupado com os meus estudos, vou aproveitar para avisar que farei o meu dever de casa enquanto você estiver tão longe.

– Como assim? – ri observando uma fila se formar um pouco mais adiante para a entrada no avião.

– Esqueceu que quando começamos a... hum... nos relacionar, você me deu uma tarefa para casa?

Pensei no assunto, a princípio sem saber do que ela falava. Rapidamente entendi e... Puta que pariu! No mesmo momento, minha garganta inchou me impedindo de engolir direito e meu pau começou a reagir.

– Você vai... – tive cuidado em manter a voz baixa.

– Hum, hum – aquele som demonstrava o quanto ela era uma menina travessa, que faria qualquer coisa para tirar o meu juízo. Puxei o ar com força e de maneira ruidosa.

– Puta merda, Charlotte! Tem noção do que está fazendo comigo?

– Não. Mas tenho ideia do que pensar em você faz comigo.

As imagens daquela tarde em que Charlotte, ainda apenas minha aluna, aprendendo a conhecer o próprio corpo, masturbou-se para mim, em meu sofá, desfilavam em minha mente me fazendo perder completamente o foco. Agradeci pela calça jeans que impedia que meu pau tivesse maior liberdade para se expandir. Até o incômodo do aperto do material era bem-vindo para me distrair.

Olhei para frente me certificando de que ninguém prestava atenção em mim. Era justamente nessas horas que deslumbrar as mulheres não ajudava muito. Como a que estava na fila me encarando sem nenhum pudor e comentando com a amiga coisas que eu nem queria imaginar.

– Alex?

Pigarreei tentando melhorar a minha voz.

– Oi, amor – falei tão baixo que fiquei em dúvida se Charlotte tinha ouvido. – Eu realmente queria saber o que pensar em mim causa em você, só gostaria de estar presente para me certificar pessoalmente.

– Eu posso narrar para você – ela provocou e eu não pude evitar a onda de desejo que varreu o meu corpo.

– Menina! – adverti, embora deva confessar que estava gostando do que ela sugeria. – Tem muitas pessoas perto de mim.

– Eu sei.

Eu podia imaginar com perfeição aquele rosto lindo, corado, salientando suas sardas maravilhosas. Seus dentes mordendo o lábio inferior e seus olhos tímidos desviando dos meus, demonstrando o quanto ela estava sem graça, e, ao mesmo tempo, sem recuar nem um centímetro daquela decisão.

– Isso é provocação demais, Charlotte.

Inclinei-me para frente, apoiando os cotovelos nos joelhos. Minha mão correu minha nuca e eu estava completamente perdido entre aceitar aquele jogo ou impedi-la de continuar.

– Exatamente, professor Frankli.

Olhei outra vez para frente, conferindo o número de testemunhas possíveis. Meu sorriso foi inevitável. Eu estava excitado demais para voltar atrás.

– Tudo bem.

– Tudo bem? – ela falou surpresa e eu ri baixinho.

– Que foi? Tá com medo? Não tem ninguém te olhando, amor.

– Em compensação tem muitas pessoas perto de você – ela parecia achar engraçado, mas a sua voz entregava que também estava excitada com a nossa travessura.

– Eu sei – inverti nossas posições devolvendo a ela a mesma resposta que me deu. – Vai amarelar?

– Isso é provocação demais, professor.

– Exatamente, aluna.

Ela ficou calada. Respeitei o seu silêncio. Apesar da ansiedade que aquela brincadeira me causava, eu estava com receio do que poderia acontecer. Eu tinha consciência de que qualquer pessoa que ouvisse a nossa conversa poderia me processar por atentado ao pudor.

– Charlotte?

– Estou aqui.

Percebi a mudança em sua voz. Era sutil, porém impossível de ser ignorada. Sua respiração estava mais presente e rápida, a voz ligeiramente rouca, hesitante, mas decidida.

– E então?

– Onde quer que eu toque? – demorei dois segundos para digerir a pergunta.

Eu podia pensar em muitos lugares onde ela poderia se tocar exclusivamente para mim. Muitos lugares onde eu adoraria vê-la escorregando a mão, buscando o seu próprio prazer, só que jamais poderia dizer aquilo em público e em voz alta.

– Onde você está?

– Na minha cama.

– Eu não posso falar como quero. Vou acabar chamando atenção e a proposta foi você narrar o que faria e não obedecer ao meu comando – provoquei. Ela ficou mais um pouco em silêncio, até que o quebrou decidida.

– Esta noite eu dormi só de calcinha – começou deixando-me mudo só de imaginar seu corpo alvo e maravilhoso apenas com uma pequena peça. – E acordei pensando em você, em como me toca, me beija – ela falava com voz mansa, meiga e manhosa, tudo o que me deixava alucinado. – Você sabe como eu fico quando penso nessas coisas.

– Fale para mim.

– Molhada... e... quente.

Respirei fundo me ajeitando melhor na cadeira desconfortável. Eu estava tão duro que poderia ter um orgasmo se apenas passasse minha mão em meu pau. Pensar em Charlotte quente e molhada me fazia ter vontade de tocá-la. De deslizar minhas mãos pelo seu corpo delicioso.

– E você gosta disso – ela me provocou.

– Eu adoro!

Tentei não parecer tão desesperado, quando a verdade era que eu estava a ponto de desistir da viagem, arrombar a porta da casa dela e sequestrá-la.

– Então... o lençol fica roçando meus seios e eles estão... rígidos.

Percebi que ela tentava esconder a vontade de gemer e me peguei imaginando se ela estaria mesmo se tocando.

– E é bom? – eu precisava focar em algo, não deixar que aquela brincadeira me desestruturasse.

– Muito! – Charlotte gemeu e fiquei louco.

– Ah, amor! Vamos parar com esta brincadeira.

Ela gemeu com dengo, e em seguida me presenteou com um leve sussurro que escapava involuntariamente dos seus lábios. Porra, por que provoquei a menina? Eu sabia que Charlotte jamais recuaria, que seria capaz de tudo para me enlouquecer.

– Gosto de tocar os meus seios – ela continuou. – Se eu fechar os olhos consigo fingir que é você.

– Ah, Deus! E você faz isso com frequência? – como um miserável, eu me vi investir no jogo.

– Hum, hum!

Eu podia jurar que aquele som escapou dos seus dentes quando eles morderam seus lábios. Podia ver Charlotte de olhos fechados, os dedos finos e pequenos tocando os seios fartos e saborosos.

– Gosto de me masturbar pensando em você.

Puta. Que. Pariu!

– Ah, Charlotte! Vamos parar por aqui. Eu me rendo. Não tenho condições de seguir com a brincadeira.

– Não quer saber o que estou fazendo agora?

Olhei ao meu redor. Eu parecia um viciado ansioso por mais uma dose. Só mais uma. Sabia que não poderia ir até o final. Era perigoso demais. Mas eu podia dar mais um passo, não poderia? Só mais um.

– Quero – mantive os olhos fixos na fila que só aumentava.

– Meus dedos estão dentro da minha calcinha – oh, droga! – Alex!

Meu nome foi dito com uma reverência capaz de enlouquecer qualquer homem. Ela sussurrou “Alex”, não para que eu tivesse consciência da nossa conversa, e sim porque estava entregue demais para perceber o que estava dizendo.

– Amor, não faça isso comigo – supliquei desesperado.

Eu estava com uma puta ereção e nem poderia me masturbar para aliviar a tensão. Porra!

– Alex! – desta vez foi mais urgente e eu me vi colado ao telefone, aguardando por mais um pouco. Só mais um pouco.

– Estou aqui.

– Não – ela disse um pouco mais alto, me alarmando. – Você está aqui, entre as minhas pernas.

– Porra, Charlotte!

– Hum! – um gemido genuíno, de puro prazer. – Gosto de me acariciar imaginando ser a sua língua – droga! Eu não aguentava mais.

– Chega, Charlotte! – rosnei.

– Ah, Alex! Isso é... isso é... Oh, Deus!

Eu não conseguia desligar. Não conseguia me desvincular daquela loucura. Estava ali, ao telefone, ouvindo a minha namorada gozar enquanto chamava por mim, imaginando cada detalhe do que ela fazia. Meus dedos firmes em meu cabelo, na nuca, como se quisesse me lembrar de que eu não podia gemer, não podia participar, e aquilo era o inferno.

– Alex, eu... eu... – a fila começou a andar e eu não conseguia levantar daquela cadeira. – Oh, Alex!

Charlotte gemeu mais forte e ficou ofegante. Ela tinha gozado. Porra, ela tinha gozado para mim e eu estava fodido, porque nada mais ocupava os meus pensamentos. Eu precisava de uma boa foda. Precisa da minha noiva.

– Meu Deus, menina! – Falei ao me dar conta de que ela não emitia mais nenhum som.

A fila estava cada vez mais curta, mas eu não podia levantar sem denunciar a minha ereção. Principalmente por saber que muitos olhares femininos seriam lançados em minha direção.

– Já embarcou? – ela se espreguiçou e reiniciou a conversa como se nada tivesse acontecido.

– Não – somente seis pessoas aguardavam para embarcar e eu ainda não estava em condições de levantar.

– Então boa viagem, amor! Vou sentir a sua falta.

Fechei os olhos lutando para recuperar o controle do meu corpo.

– E eu a sua. Depois dessa, então... – ela riu do outro lado. O som infantil que eu tanto gostava. – Você é uma diabinha, Charlotte.

– Boa viagem!

– Boa prova!

Ela desligou no momento em que a última pessoa embarcou. A comissária me olhou curiosa e eu precisei levantar um dedo pedindo a ela um pouco mais de tempo. Aquilo era humilhante e frustrante.


CHARLOTTE


Desliguei o telefone, deixando-o na pia. Olhei minha imagem no espelho rindo livremente. Alex era bobo demais para acreditar que eu me masturbaria mesmo apenas para provocá-lo.

Não que eu não estivesse com vontade, mas a ideia de ter meus pais no quarto ao lado me travava completamente. Sem contar que era necessária muita coragem para um ato como este. Apesar de estar sozinha em meu quarto, eu poderia me deixar levar e alguém acabar me ouvindo.

Mas não tive como evitar a brincadeira. Não mesmo! Eu ainda não tinha certeza se ele havia planejado aquela viagem apenas para me convencer a casar, no entanto, se esta era a estratégia dele, eu precisava estar equipada com as armas certas, e sexo sempre seria a carta perfeita para vencer aquele jogo.

Então dei a Alex muito o que pensar. E com todos os motivos para abreviar aquela viagem.

Tirei a camisola e entrei para o banho, ainda rindo.

Dois podem jogar este jogo, Alex. Aguarde-me.


CAPÍTULO 15


“Se sempre contrariados foram todos os amantes sinceros, é que o próprio destino o determina desse modo. Que nos ensine, pois, a ser pacientes a nossa provação, já que é desdita fatal dos namorados, como os sonhos, pensamentos, suspiros, dores, lágrimas, do pobre amor são companheiros certos.”

William Shakespeare

 

CHARLOTTE


Desci as escadas ainda com o sorriso travesso nos lábios. O que Alex falaria se descobrisse que foi tudo uma brincadeira? Como ele reagiria ao saber que o deixei extremamente excitado, em um local público, apenas por um capricho, uma birra de menina mimada? Era impossível não rir.

Meu pai estava sentado à mesa, lendo o seu jornal matinal, como sempre fazia. Ele era um cara moderno, pelo menos no que dizia respeito à tecnologia. Usufruía de tudo o que era novidade deste ramo, mas nunca se acostumou a ler jornal pelo tablet, celular, ou qualquer outro dispositivo. Ele gostava mesmo era de folhear as páginas, dobrá-las para facilitar a leitura. Mais ou menos como um mantra, repetido todas as manhãs para se certificar de que tudo continuava como ele havia determinado.

Miranda segurava uma xícara de café e olhava através da porta da varanda. Os olhos perdidos em alguma coisa que não parecia ser muito agradável. Eu sabia que ela e Patrício não estavam em uma boa fase, o que machucava a minha amiga mais do que ela se permitia demonstrar.

Era péssimo assistir seu sofrimento sabendo que eu nada poderia fazer para mudar a sua situação. Principalmente porque Miranda nunca me permitiria ver o seu lado mais frágil. Ela era a descolada, a que assumia a queda, sem nunca permanecer no chão. Pelo visto tudo seria diferente daquela vez.

– Bom dia, meu anjo! – meu pai dobrou o jornal e o deixou sobre a mesa. – Preparada para a prova?

– Eu acho que sim – sorri, no entanto, minha atenção estava voltada para Miranda.

– Johnny vai com vocês hoje?

Servi café ao mesmo tempo que tentava tirar uma fatia do bolo de limão que parecia delicioso. Reparei que mesmo segurando uma xícara, Miranda não comia nem bebia nada.

– Hum, não sei, pai. Provavelmente não.

– E Alex? – puxei o ar com força. Eu sentia falta do meu professor.

– Viajou hoje cedo para São Paulo.

Vislumbrei uma insinuação de sorriso no rosto do meu pai. Lógico que ele ficaria feliz com o afastamento de Alex, seria muito mais fácil para ele lidar com um relacionamento à distância, mesmo que fosse por pouco tempo. Tentando disfarçar meu aborrecimento por tal constatação, servi-me de mais uma torrada banhada em geleia.

Alex tinha razão, eu precisava me exercitar. Nos últimos tempos, meu apetite estava devastador. Logo eu seria uma garota baixinha e redonda, enquanto meu noivo continuaria sendo o gato surfista, deliciosamente bronzeado e sarado. É, eu realmente deveria me exercitar mais.

– Miranda? – meu pai chamou a atenção da minha amiga, que pareceu ter acabado de acordar. Ela piscou e olhou para nós dois como se fôssemos dois ETs. – E Patrício?

Notei que sua pele morena ficou um tom mais claro. Eu sei que isso pode parecer impossível para muitas pessoas, mas acreditem, quando Miranda empalidece, eu noto, até porque não é algo que acontece com muita frequência.

– Eu realmente não sei, padrinho. Não costumo acompanhar a agenda diária do Patrício – confesso que minha boca abriu com sua resposta tão agressiva, porém meu pai apenas riu.

– Não sei qual das duas é a mais complicada – ele brincou.

– Ela – eu e Miranda falamos ao mesmo tempo, apontando uma para a outra. Depois nos encaramos e começamos a rir. Meu pai nos acompanhou, quebrando o clima.


***


– E ele disse o motivo de ter desmarcado?

Eu dirigia enquanto Miranda me contava o que estava acontecendo. Ela falou sobre o encontro marcado para o fim do dia que Patrício desmarcou logo cedo, pelo WhatsApp. Muita consideração!

Patrício era um babaca.

– Disse apenas que esqueceu de seu compromisso com alguns amigos – ri de maneira irônica.

– Ele é um imbecil.

– Exatamente!

Ela estava sorrindo quando a olhei rapidamente, porém eu sabia que colocar um sorriso imenso no rosto era sua melhor arma para ocultar seu aborrecimento.

– Nós podemos sair, jantar... sei lá! Qualquer coisa. O que acha?

– Não, Charlotte – suspirou desanimada. – Temos provas amanhã, vamos continuar focadas em não sermos reprovadas no último semestre – foi a minha vez de sorrir.

Justamente por não querer ser reprovada eu me envolvi nessa deliciosa loucura com o meu professor.

– Então podemos pedir comida japonesa e estirar cadernos e livros no chão. Johnny pode nos acompanhar, assim poderemos pelo menos rir das besteiras que ele, com certeza, vai dizer.

– E Alex? Não é estranho esta viagem tão repentina?

– Não. E eu não quero pensar nisso minutos antes de encarar duas provas decisivas.

– Nunca serão decisivas para você, Srta. Eu Sou Uma Nerd.

– Vá se foder – ela riu e relaxou no banco.


ALEX


– Então, eu estava pensando em...

José Marcílio falava sem parar, sugerindo ações, tentando encontrar uma forma de conseguir mais destaque. Ele realmente precisava contratar um agente e se dedicar exclusivamente aos livros. O cara era bom, mas queria abraçar o mundo e, definitivamente, isso era um tiro no pé para qualquer autor.

Enquanto ele falava, eu tentava me concentrar, contudo minha mente era traiçoeira e em quase todo o momento eu me pegava pensando em Charlotte e na sua... na sua traquinagem do dia anterior.

Já estávamos separados por tempo demais. Pelo menos tempo demais para um homem apaixonado como eu. E eu estava morto de saudade e desejo daquela pele alva, cheia de pequenas sardas. Daquele sorriso travesso, o corpo pequeno e delicioso. Da sua determinação, do seu fogo...

– O que me diz?

José me puxou de volta à realidade. Por poucos segundos me vi perdido, sem saber do que falávamos. Diante dos seus olhos ansiosos por uma resposta, eu não tinha outra saída, precisava da desculpa tradicional e perfeita.

– Vou te colocar em contato direto com a Catarina ela, com certeza, saberá a melhor forma de resolvermos isso.

– Perfeito!

Ele sorriu satisfeito e eu me senti aliviado. Era uma droga não me concentrar no trabalho simplesmente porque não conseguia ficar longe da fedelha da minha noiva, principalmente depois da sua façanha.

– Vamos nos falando então. Qualquer dúvida, você tem os meus contatos – chamei o garçom, indicando, com um gesto, que queria a conta. Fui prontamente atendido.

– Certo. Vejo você na bienal do livro de São Paulo?

Hum, a bienal. Faltava pouco tempo. Eu precisava realmente me concentrar no trabalho. Precisava passar minha agenda para Lamara, organizar tudo para que nada fosse esquecido no processo de mudança de cargo, redefinir as minhas atividades, dar continuidade ao meu projeto, no entanto todos os meus pensamentos estavam em um único lugar: Rio de Janeiro. Mais precisamente, Charlotte Middleton.

– Com certeza. Será um evento e tanto. Teremos nossos melhores autores em nosso estande.

– E eu estou entre eles – José Marcílio riu um pouco sem graça por ter se colocado entre os melhores. Ele não estava sendo arrogante, escrever era algo que realmente sabia fazer.

Paguei a conta e nos despedimos. Eu ainda tinha mais um compromisso, um encontro com Cibele Babosa, uma autora nova e esplêndida. Sua escrita sutil e clássica nos arremetia aos bons tempos literários.

Como ainda tinha tempo, preferi voltar ao hotel. Eu havia falado rapidamente com Charlotte no início da manhã, mas ela estava com pressa, por causa das provas e eu preferi não provocá-la, apesar de saber que seria bem merecido.

Porra! Eu estava ávido por aquela menina. Estava ansioso demais, entregue demais. E foi justamente por me sentir assim que preferi me afastar. Foi um tiro no pé. Lana tinha razão, Catarina poderia cuidar de tudo, a minha presença era desnecessária, então eu permanecia em São Paulo, sozinho, tentando concluir as atividades que defini para minha estadia e pensando nela como se não me restasse outra opção.

Assim que cheguei a minha suíte peguei o computador decidido a ligar para Charlotte. Reverenciei o Skype por me permitir vê-la e não apenas ouvi-la, como vínhamos fazendo. Se tudo o que eu imaginava conhecer de Charlotte estivesse correto, àquela hora ela estava em casa estudando ou escrevendo.

Sorri ao me pegar ansiando para que ela estivesse pensando em mim, da mesma forma e com a mesma intensidade com que pensei nela durante todo o meu dia. Realmente eu estava me comportando como um adolescente.

A ligação encerrou sem que ela me atendesse, o que me deixou profundamente decepcionado. Poderia ligar, enviar uma mensagem ou até mesmo chamá-la pelo facetime, mas não era o que eu queria. Era uma droga ficar segurando o celular, sem conseguir me movimentar direito e me contentar em vê-la em uma tela pequena.

E por que droga ela não estava na frente do computador como deveria estar?

Senti meu coração apertado com todas as possibilidades que, impossíveis de serem freadas, formavam-se em minha cabeça. Merda! Eu não podia ser tão inseguro. Não deveria, eu era um homem adulto e maduro, porém era inevitável, por todos os motivos justificáveis existente no mundo.

Acessei minha conta de e-mail e tratei de colocar a cabeça no trabalho. Duas aprovações de capas, várias mensagens de autores, o contrato para a Feira de Frankfurt, o parecer de Catarina, um e-mail de Patrício, outro de João Pedro e muitos, muitos mesmo, de Lamara.

Suspirei.

Hora de ser adulto, Alex. Vá trabalhar!


CHARLOTTE


Minha mãe ficou radiante com a minha disposição para fazer compras, apesar de não precisar realmente de nada. Não entendia o que acontecia com as mulheres para desejarem sempre mais, mesmo já tendo mais do que o suficiente. Miranda e Mary eram exatamente assim. Viviam a filosofia: se tem dinheiro, gaste-o.

No entanto, eu não estava em posição de me negar. Precisa recuperar o ânimo de Miranda, fazê-la esquecer por algumas horas o seu problema com o meu futuro cunhado. O babaca desmarcara outra vez, com outra desculpa esfarrapada. Idiota!

A minha tentativa de animá-la me rendeu dor nos pés, um cansaço absurdo e, principalmente, uma tarde inteira sem notícias do Alex. Aliás, eu evitei falar dele durante todo o nosso período juntas, já que uma coisa leva a outra.

Dois dias sem o meu professor. Era tempo demais!

Tomei um banho, coloquei uma camisa imensa e peguei o computador apenas para não me sentir muito culpada por não dar a devida atenção ao meu livro. Eu precisava escrever, porém não conseguia.

Deitei na cama apoiando o computador entre minha barriga e minhas pernas. Antes conferi o celular e fiquei decepcionada ao constatar que não havia mensagens dele. Alex estava estranho, distante, um tanto quanto frio, o que me fazia temer pelo nosso relacionamento.

Quem sabe, longe do calor dos nossos sentimentos, ele tivesse repensado e desistido de casar. Um incômodo me deixou enjoada e eu sabia que esta sensação não tinha relação nenhuma com o tanto de sushi, nigiri e gunkan que ingeri no jantar.

Eu estava incomodada porque não queria que ele desistisse de mim. Eu não queria casar tão rapidamente, o que não significava que não queria casar com Alex. Eu queria, e muito, só que no tempo certo. A ideia de que ele poderia desistir me deixava tão atordoada que me levava a pensar que eu deveria concordar com toda aquela loucura.

Uma pequena bolinha piscando no canto da tela chamou a minha atenção. Era do Skype, indicando uma chamada perdida. Quase ninguém conversava comigo pelo Skype, no geral era sempre Miranda quando estava com preguiça de caminhar até o meu quarto, mas, desde a invenção do WhatsApp, ela havia aposentado o outro recurso.

Meu pai também me ligava quando estava fora do país, o que não correspondia à ocasião.

Olhei intrigada para o ícone e cliquei. Fiquei surpresa ao ver que havia uma ligação perdida do Alex. Tão surpresa que imediatamente retornei à ligação. Em poucos sinais sonoros eu pude ouvir a voz do meu noivo antes mesmo que a sua imagem aparecesse em minha tela.

Puxei o ar, ansiando pelo seu rosto, mesmo que fosse por uma tela de computador.

– Oi! – ele disse sem muita emoção. Meu coração acelerou.

– Oi – sussurrei de volta. – Um minuto, vou pegar meu fone.

– Ok! Já está deitada?

Debrucei-me sobre o criado-mudo e puxei o headfone. Quando retornei à posição inicial, pude vê-lo. Não compreendia o que estava sentindo. Era uma emoção misturada com saudade e ao mesmo tempo uma calmaria, como se eu estivesse de volta à minha casa, um lugar comum e familiar. Seus olhos azuis me encaravam sem deixar transparecer nada.

– Estou. Você consegue me ver? O quarto está um pouco escuro.

– Perfeitamente, Charlotte! Posso ver todas as pintinhas do seu rosto.

Aquele sorriso bizarro, repuxado apenas para um lado dos seus lábios, apresentou-se tirando o meu ar. Mordi o lábio inferior me sentindo envergonhada e precisei recorrer ao meu tique nervoso, ajeitar os óculos, para não corar absurdamente.

– Você sabe que gosto delas – sua voz ficou um pouco mais apaziguadora, eu podia até me arriscar a dizer que havia um tom de saudade no seu timbre.

– Você gosta de tudo em mim, Alex – arrisquei sorrindo de leve. Ele retribui o sorriso.

– Esta é a mais pura verdade. O que fez o dia todo?

– Pensei em você – menti.

Ele respirou fundo, passou a mão pelo cabelo, depois puxou a gravata que só então me dei conta de que estava usando.

– Vai sair, ou está chegando? – minha voz vacilou.

Tive medo de Alex solto na noite tão atrativa de São Paulo. Tudo bem que era infantilidade, afinal de contas eu já tivera todas as provas do seu amor por mim, mesmo assim vacilei e temi. Não havia como impedir este sentimento. Ele estava distante e frio.

– Estou chegando – disse ao se desfazer da gravata. – Onde estava quando te liguei?

Onde estava a esta hora? Tive vontade de rebater, rapidamente me contive. Não seria nada bom ser infantil com ele em outro estado.

– Acompanhei Miranda e minha mãe em uma tarde de tortura – ele arqueou a sobrancelha. – Compras – Alex sorriu, relaxando completamente.

– Não tem prova amanhã? –espreguicei-me sentindo a deliciosa sensação de estar em minha cama, com o meu noivo, mesmo que à distância.

– Não. Tenho uma reunião de equipe para finalizarmos um trabalho que precisamos entregar na próxima semana. Também tenho uma aula de reposição, só para cumprir a grade.

– Você parece cansada –observou com atenção enquanto falava.

– Estou com saudade –comovi-me com a enorme verdade daquelas palavras. Falar em voz alta como estava me sentindo amplificava a sensação. Meus olhos ficaram marejados.

– Eu também.

– Precisa mesmo continuar aí? Digo... não tem como antecipar a sua volta?

Percebi o quanto Alex relutava contra a própria vontade e isso me deixou um pouco mais feliz. Talvez a distância que eu imaginava nos separar não fosse tão grande assim.

– Preciso sim – ele desviou o olhar como se estivesse me escondendo algo.

– Trabalhou muito hoje? – sua resposta foi apenas um aceno de cabeça. – Está cansado?

– Acabei de chegar de um jantar longo, mas interessante e agradável.

– Foi? – por que eu estava tão intrigada?

– Hum, hum! – sua mão passou pelo pescoço e ele voltou a me encarar. – Você sempre dorme com roupas largas? – seu sorriso debochado estava outra vez em seus lábios.

– Só quando não tenho a quem impressionar – ele riu.

– E, quando tem, normalmente não usa nada – provocou. – Espero ser o único a ser impressionado.

– Espero ser a única a não usar nada em sua cama, professor.

Ouvi sua respiração ficar um pouco mais pesada. Mordi os lábios sentindo o clima mudar repentinamente. Eu podia vislumbrar o escurecer das suas pupilas, e sua língua umedecer levemente o lábio inferior. Merda! Eu o queria em minha cama naquele exato momento. Ajustei os óculos me sentindo ridícula por não saber lidar com tanto desejo.

– O que foi isso? – ele sorriu me tirando do devaneio.

– Isso o quê?

– Essa eletricidade capaz de ultrapassar os estados.

Sua voz rouca repercutiu em minha pele, percorrendo meu corpo e se concentrando exatamente no centro entre as minhas pernas. Movimentei-me levemente incapaz de conter a ansiedade que ameaçava me dominar.

– Se estivéssemos em mundos diferentes, seria do mesmo jeito, Alex.

Ele fechou os olhos por alguns segundos, suspirando. Quando os abriu, eu me senti atraída por aquela tela, como se eu fosse capaz de ultrapassá-la apenas para alcançá-lo.

– Estou ávido por você, menina – revelou me pegando de surpresa.

Ah, Alex! Se você imaginasse como estou neste momento...

– Não tem nenhuma brincadeira para hoje? –aproximou-se da tela do computador sem desfazer o nosso contato visual.

– Brincadeira? – minha boca ficou seca e meu coração acelerado. Ele sorriu de maneira sacana, revelando o que realmente desejava dizer. – Ah!

– Não acho que seria apropriado – percebi minha voz fraca e mansa.

– Por que não?

– Porque meus pais estão acordados – ele riu.

– Isso não a impediu de me provocar há dois dias.

– Não – e temi por ter mentido. – Não me impediu.

– E então?

Ele me aguardou, cruzando as mãos na frente do corpo, e apoiando os cotovelos no que imaginei ser uma mesa. Olhei para a porta e depois de volta para a tela do computador.

– Isso não deveria acontecer, professor. Todos os dias temos notícias de imagens vazadas na internet.

– Só aconteceria se eu ou você estivéssemos gravando, o que não é o caso.

– Existem pessoas que invadem os computadores de outras e conseguem gravar pela webcam.

– Vai brincar ou não? – rebateu impaciente.

Olhei outra vez para a porta. Existia em mim uma mistura de receio, medo, desejo e ansiedade. Brincar com Alex era algo que realmente mexia comigo. Saber que pequenos gestos ou palavras poderiam levar aquele homem tão perfeito à loucura me causava um frisson que repercutia em meu sexo.

– Só um minuto.

Deixei o computador sobre a cama e levantei para conferir a casa. Abri a porta me deparando com um corredor escuro e o silêncio. Provavelmente todos estavam dormindo, então fechei, trancando-a e liguei o som, colocando uma música suave, mantendo o volume baixo para não chamar a atenção de ninguém.

Minha intenção era abafar qualquer gemido ou palavra dita por nós dois no calor da nossa “brincadeira”. Antes de subir na cama novamente, respirei fundo, tomando coragem para continuar. Meu sorriso era um indicador de que eu não recuaria. Brincaria com Alex, faria o que fosse possível para mostrar a ele que o seu lugar era ali, comigo, para sempre.

Acomodei-me no colchão e coloquei o computador no colo. Não sabia o que faríamos, nem como, mas tinha uma vaga ideia de onde chegaríamos.

– Pensei que você não voltaria mais – ele disse baixinho.

Notei três botões desabotoados na sua camisa, dando-me uma visão, uma pequena parcela do que era o seu corpo. E era meu. Todo meu. Puxei o ar e rocei uma perna na outra, tentando controlar o desejo que me impelia a avançar.

– O senhor está muito ansioso, professor.

Ajustei minha coluna colocando um travesseiro na parte de trás. Ele riu e sacudiu a cabeça negando.

– Não quero você sentada com o computador no colo. Quero ver o seu corpo. Todo – esta última palavra fez o centro do meu corpo vibrar.

– Quer que eu tire a roupa? – ele acenou com a cabeça e ampliou o sorriso. – Quer que eu fique nua? Aqui?

– Você está repetitiva.

– Porque não consigo encontrar motivos para fazer isso, professor Frankli – ele riu um pouco mais.

– Para me agradar, aluna.

– E o que você vai fazer para me agradar? – arqueou a sobrancelha me encarando com uma expressão divertida.

– Quer que eu tire a roupa? Aqui? – brincou comigo.

– Exatamente – mordi o lábio, desejosa.

Como eu o queria!

– E o que vou ganhar com isso?

– Bom, professor... acho que chegamos a um impasse – ele coçou a cabeça e desceu seus dedos, que me faziam lembrar de muitos momentos indecorosos, até chegar ao queixo.

– Vamos fazer o seguinte: você faz um pequeno espetáculo para mim e depois eu faço um para você – ri debochada.

– Um espetáculo? Quer dizer eu dançando para você enquanto tiro a roupa? – ele concordou com aquele sorriso presunçoso que tanto me tirava do eixo. – Alex, definitivamente você não me conhece – ri sem graça. – Uma pessoa praticamente sem coordenação motora não pode se arriscar a fazer algo assim – foi a sua vez de rir.

– Você consegue.

– Definitivamente, não.

Foi péssimo ver o desapontamento em seu olhar, mas o que eu poderia fazer? Dançar não era muito a minha praia. Piorava e muito quando eu sabia que seria o centro da atenção dele e que precisaria tentar ser sensual. Só de pensar, meu rosto esquentava consideravelmente.

Retirei os óculos, limpei as lentes evitando olhá-lo enquanto me sentisse tão mal por me negar a atender um pedido dele. Quando voltei a enxergar normalmente ele me encarava com atenção.

– Sabe que é extremamente excitante imaginar você só com esses óculos? – engoli em seco.

– Só... com os óculos? – mais uma vez ele concordou apenas com um aceno de cabeça. – Taí uma fantasia que eu posso realizar, professor – vi o brilho voltar aos seus olhos e me animei. – Preparado?

– Sempre, Charlotte! – ele se recostou na cadeira.

Mordi o lábio pensando em fazer daquele momento algo especial. Como eu faria? Não seria suficiente somente tirar a roupa e mostrar o meu corpo. Seria sem graça. Mas...

– Deixa eu posicionar melhor o computador.

Levantei levando a máquina para a minha escrivaninha. Não dava para colocar o headfone e fazer o que eu pretendia. Por isso voltei para a tela, ao fundo dava para ver uma boa parte do meu quarto.

– Vou ter que tirar os fones, então comporte-se – seus olhos se estreitaram e ele umedeceu o lábio.

Aquilo foi sexy. Muito sexy!

Eu estava ciente de que a música ao fundo podia ser ouvida por Alex, mas ela era um adicional, e contribuiria para o meu desempenho. Não dançaria. Não, não correria este risco. Jamais me arriscaria a cair na frente do homem da minha vida enquanto tentava seduzi-lo. Seria patético demais.

No entanto, tirar a roupa não exige muito equilíbrio. Não muito. Apenas o suficiente para não me atrapalhar com as calças. Bom, eu não estava com calças, apenas uma camisa grande e folgada, uma calcinha que poderia facilmente ser descartada e os óculos.

Era impossível apaziguar minhas células. Elas vibravam e se debatiam freneticamente no meu interior. Meu sangue corria com mais força, meu coração estava acelerado e a expectativa era enorme. Eu estava ofegante, com as mãos suadas e presa àquele olhar cheio de promessas que eu sabia que tão cedo não seriam cumpridas.

– Estou aguardando – ele disse.

Sua voz ecoou pelo quarto, nada que chamasse atenção das outras pessoas da casa. Baixei o olhar, sorrindo levemente, depois levei o dedo indicador aos lábios, fazendo biquinho para pedir silêncio. Eu me sentia ridícula na tentativa de seduzir alguém, não levava jeito para isso, porém, como não poderia voltar atrás, encarei como mais uma travessura, só que dessa vez com plateia.

Alex apoiou o rosto nas mãos e os cotovelos na mesa e ficou me aguardando. Aproveitei o ritmo de Dark Horse, sem me atrever a fazer movimentos bruscos. Os olhos dele me desconcertavam. Alex estava muito atento e eu envergonhada.

Virei de costas e arrisquei um olhar discreto por cima dos ombros, apenas para confirmar se ele ainda me olhava com a mesma intensidade. Ao constatar que sim, sorri, baixando o olhar e, tomando coragem, segurei na barra da camisa puxando-a em um ritmo lento, até que estivesse fora do meu corpo.

Mais uma vez olhei para trás e o encontrei petrificado me olhando como se pudesse me alcançar a qualquer momento. Quando nossos olhos se encontraram, ele sorriu daquela forma desconcertante. Um sorriso cheio de malícia, que escorregava em seu rosto de maneira indecorosa e que causava tumulto entre as minhas células.

Como se apenas o seu sorriso não fosse o suficiente, seus olhos profundos estavam em fendas, tornando sua expressão incrivelmente sexy e, para finalizar, com um gesto de mão, pediu-me para virar de frente, o que obedeci prontamente.

Com o cabelo repartido, caindo de forma a cobrir meus seios, virei em sua direção. Depois de conectar o nosso olhar, bem lentamente, coloquei o cabelo para trás, revelando o objeto de seu interesse. Alex respirou fundo e arqueou o corpo, recostando-se na cadeira.

Lógico que seus olhos desviaram dos meus e foram diretamente para os meus seios, o que me fez sorrir um pouco, além de morder o lábio em um misto de satisfação e vergonha. Eu me sentia quente sob aquele olhar. Era como se o meu corpo fosse a oitava maravilha do mundo, como se não existisse nada mais perfeito. Não era somente um olhar de cobiça, mas também havia admiração. Um olhar que dizia muito mais do que qualquer palavra, e eu entendia tudo o que ele queria dizer.

E foi por isso, exatamente por isso que, sem hesitar, deslizei a calcinha pelos quadris até que ela estivesse no chão, onde, com uma delicadeza que até então eu desconhecia, consegui retirar os meus pés e afastá-la para o lado.

Ele me lambeu com os olhos, passando por cada parte, cada detalhe, até que estivessem de volta aos meus olhos. Um sorriso travesso brincou em meus lábios e foi correspondido com o dele.

– Cumpri a minha parte da promessa, professor – ele arqueou a sobrancelha, sem parecer disposto a recuar.

– Ok!

– Com direito a strip tease – ressaltei e ele deu uma risadinha que mexeu comigo, repercutindo no centro entre as minhas pernas.

– Com tudo o que você quiser – levantou e ajeitou o computador para que eu pudesse ter uma melhor visão do quarto.

Peguei o computador e pulei de volta para a cama. Antes, tomei o cuidado de me cobrir, mesmo que parcialmente, com um lençol fino. Vi Alex sair de cena, ajustei o headfone e aguardei.

Foi quando uma música agitada, estilo balada, alcançou os meus ouvidos. Achei estranho e até engraçado. Alex voltou para o centro do quarto. Ele sorria e movimentava o corpo conforme a música. Não estava nem um pouco incomodado ou preocupado com a minha presença. Ele simplesmente queria fazer aquilo.

Fiquei encantada com a facilidade e naturalidade dos seus movimentos. Seu corpo seguia o ritmo com harmonia e sensualidade. Ele olhava provocantemente para a tela, deixando-me ainda mais sem ar. Eu estava paralisada, presa àquela imagem maravilhosa do meu professor dançando como se nada mais importasse.

Muito à vontade, ele retirou os sapatos e as meias, sem precisar de nenhum floreio. Parecia fazer algo da sua rotina, algo que já estivesse tão acostumado a fazer que fluía naturalmente. Movimentando-se em uma dança sensual, soltou a camisa da calça, ficando mais despojado. Depois abriu o frigobar e se serviu de uma bebida. Imaginei ser uísque, mas pelo ângulo não dava para saber ao certo. Voltando para perto da tela, ele bebeu um gole mantendo os olhos nos meus e até aquele mínimo movimento me deixou ansiosa.

Seus olhos azuis estavam incrivelmente selvagens. Alex sabia que estava mexendo comigo e demonstrava sentir muito prazer em fazer tal coisa. Meu sexo correspondia a cada balanço dos seus quadris, como se estes movimentos fossem em mim, como se eu pudesse senti-lo roçando meu corpo e me levando naquela dança erótica.

Senti vontade de me tocar, de pressionar meu sexo apenas para que o latejar cessasse, mas eu não podia. Primeiro eu me encontrava tão conectada aos seus movimentos que me sentia impossibilitada de reagir sem que ele me ordenasse, e segundo porque eu me sentia constrangida por desejar meu professor de forma tão avassaladora vendo-o dançar para mim. Sim, lógico, ele tiraria a roupa e tudo o mais, porém, até aquele momento, era somente uma dança e eu já estava hiperventilando.

Alex girou o corpo com graciosidade, ficando de costas e, pelos seus movimentos, imaginei que estava desabotoando cada botão da camisa de maneira tão lenta que me deixou impaciente. Apesar de estar adorando ver a sua bunda mexendo de um lado para o outro, eu queria ver a sua pele, a sua carne, seu peitoral definido e bronzeado. Era quase uma necessidade animal, irracional e irrefreável.

Depois do que me pareceu um ano de tortura, ele se virou de frente para a tela, revelando a camisa aberta, sem se importar comigo, voltou a pegar o copo, bebeu mais um pouco da sua bebida e continuou dançando, rebolando os quadris e acabando com o meu juízo.

Quando finalmente resolveu se despir, olhou-me com uma força que me prendeu sem me dar qualquer chance de escapar. Eu tinha consciência de que a minha cara devia estar ridícula, afinal de contas eu estava praticamente babando, arqueada sobre a tela do computador assistindo à sua performance.

Ele retirou a camisa bem lentamente, passando pelos ombros largos e descendo pelos braços fortes que eu tanto ansiava que estivessem ao meu redor. Porra, eu o queria! Estava enlouquecendo. Nunca imaginei que uma simples brincadeira poderia tirar o meu juízo daquela maneira.

Eu queria que Alex me envolvesse em seus braços e me levasse naquela dança cheia de luxúria. Queria poder tocá-lo enquanto ele rebolava, sentir seus lábios em minha pele enquanto ele roçava em mim insinuando o que eu tanto almejava. Droga!

Seu sorriso sacana estava lá apenas para comprovar sua capacidade de me enlouquecer. Desabotoando os punhos, muito naturalmente, deixou a camisa caída ao chão e voltou a beber acompanhando o ritmo da música sensual e envolvente. Alex se mexia me deixando literalmente com água na boca.

Seu tórax definido, contraindo-se a cada movimento me dava vontade de lambê-lo e eu sabia que este pensamento me deixava mais corada do que eu já estava, só de me imaginar passando a língua naquela barriga enquanto ele me segurava pelos cabelos e me guiava na direção ao objeto do meu desejo.

E só de me imaginar de joelhos diante dele, com ele a minha frente, me segurando pelos cabelos e me mostrando o caminho da perdição, meu sexo ficou tão molhado que tive medo de ter um orgasmo sem sequer me tocar.

Ah, eu o receberia em minha boca sem contestar! Acataria a qualquer ordem, apenas para sentir o seu gosto mais uma vez.

Sem pensar no que estava fazendo, umedeci o lábio e depois o mordi com força, como se tal gesto fosse capaz de impedir o meu corpo de reagir de maneira tão absurda. Alex sorriu, deixando-me ciente de que ele sabia o efeito que causava em mim e o quanto isso o agradava.

Ele abriu o botão da calça, sem desviar os olhos da tela e, enquanto descia o zíper, fez o mesmo que eu, umedeceu o lábio e o mordeu. Porra! Meu último fio de sanidade foi por água abaixo. Impulsivamente arqueei ainda mais o corpo e aguardei na expectativa de vê-lo mais plenamente. Sem conseguir frear qualquer movimento meu, deixei que uma mão vagasse pela minha pele, tocando-me devagar e com leveza, o que atiçava ainda mais o meu desejo.

Ele desceu a peça, ficando apenas de cueca e seu corpo esplendoroso preencheu a minha mente de imagens indecorosas. Eu queria muitas coisas, tantas que era impossível organizar as ideias, definir uma prioridade, estabelecer qualquer limite.

Sua ereção ganhou a minha atenção como se fosse um troféu, o prêmio maior. Ele brincou um pouco, alisando o tecido da cueca por cima do sexo rígido e meus olhos acompanharam cada movimento com tanta cobiça que me assustou.

Fechei os olhos e descobri que nem assim eu seria capaz de refrear o meu desejo. Não era mais algo formulado pela visão, era algo físico, algo que estava dentro de mim, que partia de dentro para fora e me dominava a cada segundo. Rocei uma perna na outra querendo encontrar qualquer espécie de alívio, no entanto meu corpo estava em chamas e mais nada poderia ser feito que não fosse satisfazê-lo.

Alex brincou com a cueca, abaixando-a ligeiramente, dando-me um vislumbre do local em que a pele bronzeada e exposta cedia lugar para a pele branquinha, reservada para mim. Era justamente ali que eu queria que meus dedos e língua estivessem. Queria percorrer aquela linha apenas para provar que tal intimidade pertencia a mim e a mais ninguém.

Suas mãos seguravam cada lado da cueca baixando-a lentamente. Sua ereção começou a se libertar e a cada centímetro revelado tornava-se mais difícil respirar. Até que Alex desistiu de me matar em doses homeopáticas e se livrou de uma vez por todas do pedaço de pano que me impedia de vê-lo completamente.

Como se soubesse que naquele ponto eu nada mais era, que todas as minhas forças haviam se esgotado e que eu estava ciente de que de nada adiantaria negar ou fugir, sua mão segurou seu pênis e o manipulou. Foi lindo! Lindo e sexy!

Alex estava nu, com seu pau na mão em movimentos de masturbação lentos e calculados e, mesmo assim, ainda movimentava o corpo naquela dança que derretia meu cérebro, jogando os quadris de um lado para o outro lascivamente. Não me contive e deixei que meus dedos encontrassem o centro entre as minhas pernas.

Foi muito, muito mais forte do que eu. Juro! Nunca, em nenhum estágio de consciência, eu me masturbaria em frente a uma câmera somente porque um homem se revelou para mim. Mas, porra, não era qualquer homem, era Alex, aquele ser incomum, tão perfeito que me fazia imaginar ser um sonho tão sensual que me impelia a reagir a seus movimentos, e, como se nada mais fosse suficiente para explicar, tão forte em mim que, mesmo sem precisar de palavras, guiava-me para atender a todos os seus desejos.

Era o que ele queria e, definitivamente, era o que eu ansiava.

– Ah, Alex! – gemi sem me importar com mais nada.

De olhos fechados, deixei-me cair no colchão. Minhas mãos, as duas, estavam em meu sexo, tocando-me, possuindo-me. Eu queria tanto e tudo ao mesmo tempo. Queria ter a sua língua me explorando, sua pele me aquecendo, seu membro me tomando e, no entanto, eu estava ali, gemendo sem pudor, sentindo meus dedos como se fossem os dedos dele.

Não havia mais volta, nem tempo. Minha pele esquentou de tal forma que me imaginei pegando fogo. As chamas me lambiam espalhando prazer, fazendo-me explodir. Meu quadril arqueava e meus dedos se aprofundavam em minha carne enquanto eu remexia os quadris em busca de alívio.

Até que o encontrei.

Explodi em um orgasmo tão intenso que por alguns segundos perdi a noção da realidade. Meu êxtase me atingiu com tamanha força que me fez esquecer o quarto, meus pais, o computador e até mesmo o meu professor do outro lado da tela. Eu simplesmente me tornei apenas prazer e me desfiz nele.

Com um sorriso glorioso nos lábios fui voltando à realidade e... Puta merda, o que eu fiz? Meu corpo já estava quente, mas as minhas bochechas estavam em chamas. Sem graça olhei timidamente para a tela do computador desejando que por algum milagre a bateria tivesse acabado e que Alex não tivesse me assistido fazer aquilo, mas ele continuava lá, agora sentado, os olhos fixos na tela e o pau ainda na mão, seguindo o mesmo ritmo, um leve subir e descer.

Ele me olhou e sorriu. Não aquele sorriso sacana, mas um sorriso de satisfação que me fez esquecer a vergonha de segundos antes. Seus olhos quentes aprovavam a minha reação enquanto seu corpo aproveitava o espetáculo.

– Porra, Charlotte! Você é mesmo muito intensa – disse com a voz rouca, carregada de desejo.

Involuntariamente me espreguicei na cama, deixando o meu corpo mais à mostra, ele umedeceu o lábio e continuou se masturbando, lento e constante. Ele estava sentado, ainda assim eu tinha uma visão ampla do seu pênis duro. As pernas abertas me permitiam ver ser saco, um pouco mais recolhido por causa do tesão, e aquela imagem era um incentivo, uma força extra para me atiçar.

Como podia?

– Precisa de ajuda? – ronronei sabendo que poderia desestabilizá-lo. Alex estava por um fio.

Sem nenhum pudor, retirei o lençol, descobrindo meu corpo inteiramente para a sua visão. Alex deixou de sorrir e assumiu uma expressão mais dura, mais intensa e incrivelmente sensual. Ele estava louco de desejo, assim como eu estive momentos antes. Sorri e deslizei minha mão até meus seios, brincando com minha carne, provocando-o.

– Fica quieta, menina! – rosnou em advertência fazendo meu corpo vibrar.

– Goze para mim, Alex – supliquei quase num sussurro.

E ele explodiu.

Jogando a cabeça para trás, o corpo arqueando em direção a sua mão, com os quadris movimentando-se mais bruscamente, Alex se permitiu gozar, jorrando seu gozo em sua mão e deixando-o escorrer pelo abdome. Era uma visão e tanto. Eu o ouvia gemer alto, sem se importar com mais nada, e seu saco se contraindo, seu pau lubrificado e em sua mão, que o segurava com força. Foi uma delícia!

Alex era uma maravilhoso e eu não tinha nenhuma dúvida a este respeito.

Faltava apenas saber quando ele finalmente me daria o prazer de tê-lo de verdade, mais uma vez e repetidas vezes.


CAPÍTULO 16


“Meus olhos viraram pintores, e com isso esboçaram a beleza de tuas formas nas telas do meu coração.”

William Shakespeare


ALEX


Ela estava deitada, parcialmente coberta pelo lençol que revelava seus braços. O colo, salpicado por pintinhas que roubavam a minha atenção, estava exposto e a imagem muito me agradava.

Charlotte, com os cabelos claros jogados sobre o travesseiro, fazendo um leque de fios sedosos e lisos, encarava-me com seus olhos de um azul límpido, tão perfeito que me faziam querer admirá-los por horas a fio. Seu rosto de traços infantis estava relaxado. Ela sorria saciada e aos poucos se entregava ao sono.

– Amor, desligue o computador e tire-o da cama – ela sorriu de olhos fechados.

– Já quer se livrar de mim?

– Não. Só estou com medo de você pegar no sono.

– Seria bom dormir com você, mesmo que separados por um computador.

– Estamos ligados por um computador – ela sorriu ainda mais e se espreguiçou.

Eu amava quando Charlotte ficava daquela forma, tão manhosa que parecia uma gatinha buscando carinho. Ela abriu os olhos e se arrumou na cama, deixando os dedos correrem pelos fios espalhados pelo travesseiro.

– Se você dormir com o computador na cama, pode acontecer uma tragédia – ela riu baixinho. – É sério, Charlotte – vi minha noiva suspirar e levantar-se e apoiando a cabeça na mão.

– Não quero ficar sem você.

E eu não queria ficar sem ela.

– Mas você está com sono.

– E você pelo visto está ansioso para se livrar de mim – Charlotte se jogou no colchão desviando o olhar do meu. Suspirei. Ela realmente sabia ser infantil quando queria.

– Eu acabei de dedicar todo o meu tempo livre a você, além de todo o meu prazer, é claro – vi quando ela sorriu, ainda assim sem me olhar. Ela encarava o teto. – Com quem vai se reunir amanhã?

– Algumas colegas.

– Só mulheres?

– Está com ciúmes, professor Frankli?

– Estou apenas cuidando do que é meu – ela riu e a noite ficou muito mais leve.

Charlotte era linda de diversas maneiras. Era linda quando estava concentrada, linda quando tentava disfarçar o seu nervosismo ajeitando os óculos, linda quando ficava excitada, linda quando ficava aborrecida, mas não existia momento mais bonito daquela garota do que quando ela ria baixinho e daquele jeito infantil. Era como se o mundo ganhasse novas cores.

A ansiedade vibrava na ponta dos meus dedos, tamanha era minha vontade de afagar aquelas bochechas esticadas pelo largo sorriso. Porra, eu sentia falta dela!

– Somente garotas. Vamos fazer uma festa do pijama – umedeceu o lábio e voltou a sorrir.

– Eu prefiro uma festa só com você e de preferência sem pijama – provoquei.

– O senhor não está aqui, professor, e algo me diz que, mesmo quando estiver, uma festa com apenas nós dois, em que nenhuma peça de roupa esteja envolvida, será uma situação impossível.

– Existe uma forma de torná-la absolutamente possível – Charlotte estava de lado, e mesmo no escuro eu pude vê-la revirar os olhos.

– Acho que chegou a hora de dar boa noite – anunciou sem se mover um centímetro.

– Só por que eu disse que o casamento resolveria o nosso problema?

– Não. Porque você com certeza está cansado e não está conseguindo raciocinar direito – foi a minha vez de rir. Charlotte se virou para a tela e voltou a me olhar. – Vou sentir saudade – revelou com uma voz mansa que repercutiu em meu corpo.

– Eu também.

Continuamos nos olhando sem coragem para pôr fim naquela conversa. Eu não estava preparado para assistir a sua imagem desaparecer, no entanto sabia que era necessário. Era isso ou correr o risco de Charlotte incendiar a cama por ter deixado o computador ligado e em cima dela a noite toda.

– Durma bem... Descanse bastante... Sonhe comigo... Eu amo você!

– Eu quero dormir pouco, ficar cansada, ter você em minha cama e me certificar a cada segundo da veracidade deste amor – ela disse com certa birra e no final bocejou revelando o seu desgaste.

– Tudo no seu tempo, Charlotte. Agora coloque o computador na escrivaninha.

– Você é um chato, mandão!

– Quero me certificar de que o computador esteja fora da cama, então levante este corpo delicioso e faça o que eu estou mandando.

– Se eu não obedecer, você promete que me dá uns tapas na bunda?

Seu sorriso travesso causou uma reação absurda em meu corpo, pois, assim que ela sugeriu a ideia, eu me vi em muitas situações que gostaria de dividir com a minha garota. Caralho, Charlotte sabia ser quente!

– Não, mas se você não obedecer, eu juro que passo mais tempo do que o necessário aqui em São Paulo.

– Chato!

Mesmo contrariada, ela levantou. Propositalmente, ou esta foi a forma que eu encontrei para justificar a sua atitude, Charlotte deixou o lençol deslizar pelo seu corpo e caminhou nua, com o computador na mão, até a escrivaninha que ficava próxima da cama e o depositou lá. Ela sorriu ao morder o lábio e se abaixou para me olhar nos olhos.

– Boa noite, meu professor – sussurrou me acendendo totalmente.

– Boa noite, minha aluna.

Com o mesmo sorriso, ela desfez a ligação, e eu ainda fiquei um tempo encarando a tela escura, fascinado com a ousadia daquela menina e com a sua capacidade de me enlouquecer.

Olhei a coberta em meu corpo revelando minha ereção. Sem pensar, deixei que minha mão vagasse para o meu pau, acariciando-o. Em minha mente, todas as ideias que apenas Charlotte conseguia incutir em mim, o seu sorriso sensual, seu jeito inocente e, ao mesmo tempo, sexy, seu corpo impecável nu, à mostra, seus seios firmes, sua pele alva...

– É companheiro, pelo visto teremos mais um round.


CHARLOTTE


Precisei de todo o meu esforço para fingir estar calma e tranquila, porém dentro de mim existia um poço de tristeza e saudade. Eu não queria demonstrar o que estava sentindo, principalmente para Miranda em sua fase “foda-se o Patrício”. A revolta dela estava atingindo todos os níveis e ângulos da nossa vida, manter Alex longe da sua mira de ataque era a melhor estratégia.

– A Margarete é muito louca – ela riu ao falar, enquanto caminhávamos pelo corredor da faculdade. – Se ela ficar vacilando com o Fábio, eu serei a primeira da fila.

Não sei por que não senti muita firmeza nas suas palavras. Miranda tentava ser forte, só que eu sabia que toda e qualquer atitude dela naquele momento era apenas sua forma de se defender da dor que sentia.

– O Fábio é um nerd, do tipo que você sempre descartou – passamos em frente à sala onde eu tinha aulas com Alex e meu coração disparou.

Três dias sem o meu noivo, já estávamos caminhando para o quarto e ele ainda não tinha confirmado quando conseguiria voltar.

– Sério? Não acredito que já descartei o Fábio algum dia da minha vida.

– E o Patrício? Alguma novidade?

– Hum... – torceu a boca antes de falar. – Ele mandou algumas mensagens, como eu estou ignorando-o não li nenhuma delas.

– Como você quer saber o que ele pretende com tudo isso se nem lê as mensagens dele? – ri desgostosa com o rumo daquele relacionamento.

– Para mim já deu, Charlotte. Patrício teve todas as chances. Se ele quer assim, então que seja. Exatamente aquela história do “band– aid”. – O celular dela começou a tocar. Minha amiga tirou o aparelho do bolso de trás da calça, olhou o visor e não atendeu. Riu na tentativa de esconder sua ansiedade.

– E ele já ligou outras vezes, mas eu não atendi.

– Era o Patrício?

– Era – ela continuou andando como se não estivesse nem um pouco abalada.

– Por que não atendeu?

– Para quê? Para ouvir mais uma das suas desculpas esfarrapadas? Quando ele quer desmarcar, manda mensagens e quando quer ter acesso livre a tudo isso aqui – mostrou o próprio corpo com a mão – pode ligar? Nem morta!

O telefone dela voltou a tocar.

– Isso é ridículo, mas se vocês querem assim...

Parei de falar quando meus olhos avistaram aquela figura imensa, encostada em um carro verde tão grande e familiar quanto ele. Patrício estava no estacionamento da faculdade, ele ainda insistiu na ligação, então virou em nossa direção e desligou o aparelho. Cruzou os braços no peito, estava usando óculos escuros e roupas elegantes, apesar de simples. Todo o seu corpo indicava o quanto estava tenso. Olhei para Miranda, que sorria e acenava para dois rapazes que estavam do outro lado.

– Miranda?

– Hum?

– É para manter a política do “band-aid”?

– Sempre. É muito mais fácil.

– Então eu acho que você está com um problemão.

Ela virou rapidamente para mim e depois para onde eu estava olhando e interrompeu os seus passos.

– Puta merda!

– É. Puta merda! E aí?

– Será que ele já me viu?

– Ah! Com certeza?!

Aquele era um problema que apenas ela poderia resolver, por isso parei de andar, deixando um espaço confortável para que ela pudesse decidir.

– O que faço?

Por um segundo Miranda deixou de ser aquela garota segura, independente, senhora de si, passando a ser apenas a menina apaixonada, que estava sofrendo com o afastamento e não sabia o que fazer para reverter a situação.

– Você tem duas escolhas: vai até ele e resolve de uma vez ou vai embora e deixa tudo como está.

Ela me olhou, respirou fundo, endireitou a coluna e tomou a decisão.

– Você tem razão. Já que ele está aqui não custa nada conversar, não é?

– É sim. Boa sorte!

Ela fez uma careta e saiu em direção ao namorado... ou ex-namorado.

Virei em direção ao outro prédio onde eu tinha deixado o carro quando fui interceptada por mãos fortes.

– Aonde vai com tanta pressa?

Henrique conseguiu me segurar antes que eu sumisse do campo de visão do meu cunhado. Ele mantinha as mãos em meus ombros e me olhava com atenção. Sorri sem graça, com medo de Patrício interpretar tudo errado e acabar causando um problema no meu relacionamento. A julgar pelo seu comportamento imaturo com Miranda, eu nem sabia o que poderia esperar dele.

– Oi! – ajeitei meus óculos apenas por não saber o que fazer com a mão.

– Já está indo para casa?

Rapidamente ele conseguiu retirar meus cadernos dos meus braços e, juntando com os livros que ele já carregava, equilibrou tudo em apenas um braço.

– Já... já sim. Não precisa...

Olhei para trás enquanto tentava não chamar atenção, no entanto algo me dizia que Patrício já tinha nos visto e formulado toda uma teoria conspiratória. Henrique não se importou com a minha tentativa de impedi-lo e começou a me acompanhar pelo estacionamento. Uma mão, claro, conduzia-me pelo ombro, colando nossos corpos.

Porra!

– Ansiosa para acabar?

– Você nem imagina o quanto – e eu queria dizer muito mais do que isso.

Ele era um cara legal, bonito, educado, amigo, o que não significava que podia simplesmente se apossar dos meus cadernos e passar o braço pelos meus ombros como se eu fosse a sua garota. Era ridículo!

– Está bem quente hoje – falei encontrando a desculpa perfeita para me esquivar dele, mesmo que meu colega ainda carregasse os meus cadernos.

– Não muito – ele riu sem graça. – Mas eu imagino que para você qualquer sol um pouco mais forte seja uma tortura.

– E é – olhei para os lados procurando por Patrício, mas ele não estava mais lá.

Merda!

– Ansiosa para a formatura? – sorri mantendo uma distância segura.

– Não propriamente ansiosa para a formatura, mas, sim, para finalizar esta etapa da minha vida.

E ele nem imaginava que etapa que estava louca para deixar para trás e a qual eu não via a hora de começar.

– O que fez no feriado?

Engoli em seco sem saber até que ponto poderia revelar. Se bem que... Alex e eu estávamos noivos, logo o nosso relacionamento não deveria ser um segredo, afinal de contas ele nem pretendia continuar trabalhando na faculdade, porém era estranho e complicado explicar um relacionamento que nunca existiu para nenhuma das pessoas que conviviam comigo.

– Fomos para Petrópolis com uns amigos do meu pai.

– Ah! – ele me encarou como se estivesse buscando o que falar.

Era notável que Henrique estava desconfortável ou, pelo menos, que não estava muito à vontade para me dizer o que gostaria e este detalhe acabou me deixando um pouco mais tensa.

– Tenho que ir. Obrigada por me acompanhar.

Estendi a mão para pegar meus cadernos, no entanto Henrique não se moveu nem um centímetro e não parecia disposto a me liberar.

– Hum... Charlotte... eu...

Ele olhou para os lados e a sua respiração ficou irregular. Eu não fazia ideia do que estava acontecendo com Henrique, mas imaginei se ele estava se sentindo mal, sei lá, uma dor de barriga repentina, qualquer coisa constrangedora que o fizesse sofrer para revelar, só podia ser isso, pois ele estava estranho, fazia caretas esquisitas e se preocupava o tempo todo com o local em que estávamos.

– O que foi? Você está bem?

– Sim, estou – limpou a testa com a mão livre e me encarou. Ele estava mesmo se comportando de forma estranha. – Eu estive pensando, formatura é um acontecimento especial, então imaginei se você gostaria de sair... digo, jantar, qualquer noite dessas... apenas para comemorarmos o fim desta etapa, como você mesma falou.

– Jantar? – ele acenou com a cabeça confirmando. Porra! – Eu e... você?

Meu embaraço foi tão perceptível que precisei tirar os óculos, limpar as lentes na minha camisa nada apropriada para isso e me conformar em enxergar de uma forma mais embaçada.

– Hum... sim. Quer dizer... se você quiser convidar mais alguém... é só um jantar para comemorarmos – ele deixou o olhar cair fazendo com que eu me sentisse péssima.

– Vamos ver como será a semana, Henrique. O semestre ainda não acabou e nós temos muitos compromissos, então...

– Certo – ele me passou os cadernos e se afastou um pouco. – Vamos aguardar então.

Entrei rapidamente no carro me amaldiçoando por não ter evitado aquela situação. Como pude ser tão burra? Por que nunca imaginei que o que eu acreditava ser uma paquera sem incentivos poderia se tornar um amor unilateral? Que droga!


ALEX


– Tudo pronto. O que você pretende fazer?

Catarina me encarava aguardando minha decisão. Saíamos da livraria onde o evento havia acontecido e eu me sentia indeciso se deveria propor algum programa para a noite com a Ammy Stuart ou se simplesmente jantava e voltava para o hotel. Na verdade, eu estava louco para voltar ao Rio de Janeiro, ansioso para tocar outra vez a minha namorada e retomar as nossas vidas.

Respirei fundo tendo a certeza de que ter Charlotte em meus braços era uma realidade muito distante. Infelizmente teria que ser assim.

– Podemos jantar em algum lugar – sugeri sem muita vontade.

– Depois poderíamos assistir a uma peça, ou vice-versa, vai depender do que tem em mente.

Olhei para a minha gerente de eventos e ela retribuiu o olhar com muita ansiedade. Eu poderia até jurar que havia mais do que ansiedade naquele olhar.

Tudo bem, eu confesso que flertar com Catarina sempre foi um passatempo divertido, no entanto nunca passamos do simples flertar. Naquela noite, porém, não estava nem um pouco interessado em brincar com a garota. Estar cansado nem era o meu maior empecilho naquele momento, e sim o fato de não querer imaginar que Charlotte poderia fazer a mesma coisa.

Este único pensamento me travou completamente. Não, minha Charlotte jamais permitiria que outro homem tivesse uma relação no limite da intimidade, como foi a minha com a Catarina. Puta que pariu! Ela não deixaria que isso acontecesse. Ela sequer tem alguém que possa brincar desse jeito com ela.

Porra, ela tem sim! Primeiro Johnny, que poderia até ser considerado um irmão, mas estava sempre a chamando de gostosa e insinuando que havia algo entre eles. Senti meu sangue ferver e precisei respirar fundo para impedir o rumo destes pensamentos. Não, Johnny não era uma ameaça e não havia maldade na brincadeira deles.

E o Henrique?

Merda, Henrique sim poderia ser uma ameaça. Ele foi alguém aprovado sem precisar de nenhum esforço, alguém que conseguiu um convite mesmo sem a permissão de Charlotte. E eles eram amigos, não é? Eram próximos. Quantas vezes os vi juntos? O que conversavam quando ninguém estava prestando atenção?

Puta. Que. Pariu!

É muita ingenuidade acreditar que pelo fato de ser homem todas as atitudes do meu passado eram justificáveis, principalmente quando existia um passado para ela também. Tudo bem que não era um passado muito expressivo, até porque a garota nunca tinha sequer beijado.

Um sorriso presunçoso se apossou dos meus lábios. Foi inevitável. Eu era o primeiro em tudo com aquela menina e isso ninguém poderia mudar. O que não eliminava a chance de ela ter brincadeiras apimentadas com outros rapazes.

Claro que não. Charlotte, apesar da sua incontestável inexperiência, era bem espertinha para uma virgem completa. Ela era rápida nas provocações, sabia o que dizer, como tentar, como agir, como instigar um homem, e isso ninguém aprendia nos livros.

– Alex!

Pisquei soltando o ar. Os pensamentos pesados me dominavam impedindo-me de respirar corretamente. Passei a mão pelos cabelos e sequei minha testa. Merda! O que eu poderia fazer?

– Podemos apenas jantar. Estou exausto!

Meu mau humor não passou despercebido. Ela me encarou meio chocada com a falta de alguma piada ou sugestão mais ousada. Procurei não me importar, nem mudar nada, apesar de me sentir culpado. No momento, eu só imaginava que aquela seria a atitude que eu gostaria que Charlotte tivesse caso o idiota do Henrique resolvesse se aproximar mais.

– Veja uma reserva em um lugar bom, qualquer coisa que mostre à Ammy o quanto ela é valiosa para a editora. Eu ainda preciso dar alguns telefonemas, então... você sabe o que fazer – sorri de leve, apenas para deixar o clima mais ameno.

– Tiffany está na cidade – informou sem nenhum receio. – Ela me pediu para avisar sobre a nossa programação para esta noite.

– Tiffany?

O que aquela louca fazia ali? Porra, não tinha como ficar pior.

– Sim. Ela chegou hoje, mas não quis comparecer ao evento, já que não era autora convidada. Sabe como é, Tiffany tem um ego imenso e jamais aceitaria ser apenas mais uma tiete da Ammy Stuart – desta vez, sorri de verdade. A antipatia entre as duas mulheres nunca foi um segredo.

– E o que ela faz aqui?

– Entrevista para uma rede de televisão. Não estava sabendo? – vasculhei minha mente em busca da informação, mas nada me lembrava daquele compromisso.

– Estava agendado?

– Não. Pelo que sei foi algo de última hora. Uma pauta pertinente e um bom trabalho de assessoria. Em todo caso, será uma ótima exposição para a editora.

– Será sim. Você acha que devemos convidá-la para o jantar? – Catarina sorriu amplamente.

– Não – meu sorriso refletiu o dela. – Mas seria comprar uma briga imensa e desnecessária com uma grande escritora.

– Você tem razão. Então faça a reserva, convide os demais autores, vamos fazer este jantar o menos reservado possível.

– Você é quem manda, Alex!


CHARLOTTE


Alex ligou quando eu estava no banho, depois, quando retornei, ele não me atendeu. No meu WhatsApp, havia apenas uma mensagem avisando que precisaria participar de um jantar importante e que, assim que retornasse ao hotel, ele me ligaria.

Logo em seguida, Miranda chegou em casa. Eu esperava que ela chegasse radiante, já que esteve com Patrício por tempo demais para quem apenas pretendia terminar o relacionamento. Mas não foi o que aconteceu. Minha amiga chegou arrasada. Tão arrasada que simplesmente me esqueci de tudo para socorrê-la.

Graças a Deus, meu pai e minha mãe não tinham chegado ainda, e Johnny havia prometido aparecer para o jantar, então a casa era apenas nossa. Miranda não agiu como eu esperava. Ela não tentou ser forte, não fez questão de disfarçar, nem mentiu sobre os fatos. Minha amiga abriu o coração e deixou que seu verdadeiro eu se apresentasse.

– Foi melhor assim, Charlotte – afirmou controlando os soluços e enxugando as lágrimas que caíam livremente. – Não havia como dar certo. Estamos em fases diferentes então o melhor a fazer era terminar.

– Eu sinto muito, Miranda. Nem sei o que te dizer. Só de imaginar você chorando na frente daquele babaca – ela fez um muxoxo que chamou a minha atenção.

– E você acha que eu dei esse gostinho a ele? – riu sem vontade. – Eu não! Quando ele disse que precisava de espaço eu simplesmente concordei, disse que era exatamente o que eu pensava, despedi-me e tratei de ficar bem longe dele.

– Como assim? E o que fez este tempo todo?

– Andei. Caminhei, chorei, tomei um pote de sorvete de chocolate...

Suas expressões indicavam que ficaria tudo bem, o que me deixou mais tranquila. No entanto, ainda havia um problema: Alex. Claro que meu noivo não seria um problema para a minha amiga, mas sim a convivência dela com a família dele. Era tudo uma droga! Eu tinha que ser madura e entender que todos os relacionamentos podem passar pelo mesmo problema e que não devemos nos impedir de viver por medo do que poderá acontecer no futuro.

Bom... eu queria acreditar nisso.

– E agora? Quer dizer... o que você pretende fazer daqui para frente? Você estava bem envolvida.

– Agora é seguir em frente, Charlotte – ela olhou para a varanda do nosso apartamento. – Eu sei que vou chorar por mais algum tempo, mas não vou morrer porque o Patrício resolveu curtir a vida dele, mesmo depois de tantas promessas.

– Porra, nem me fale nessas promessas! Já imaginou como meu pai vai reagir? – ela jogou o cabelo para trás do ombro e se inclinou para apoiar o rosto nas mãos.

– Não vou ser uma cretina como meu ex-namorado conseguiu ser. Não preciso do padrinho pegando no seu pé ou criando confusão com a sua futura família. Vou assumir a culpa sozinha e encarnar o meu melhor estilo volúvel.

– Isso não é justo, Miranda. Se for apenas para me livrar de um problema...

– Injustiça é você e Alex não terem paz. Você conhece o padrinho, sabe que essa merda toda vai respingar em vocês dois, então aguentar a cara feia dele por dois ou três dias não vai fazer mal a ninguém.

– Tem certeza?

– Tenho.

Ela me olhou pelo canto dos olhos tentando não demonstrar preocupação. Miranda tinha razão. Se papai, com todos os seus pensamentos do século dezoito, soubesse que Patrício foi capaz de terminar depois de ter feito toda aquela encenação, poderia muito bem colocar obstáculos no meu namoro com Alex.

– Bom... rei morto, rei posto. Vamos começar a arquitetar nossa próxima saída.

– Próxima... saída? – o que ela estava aprontando? Pior. O que ela pensava que poderia aprontar e me incluir?

– Alex está viajando e nem sabe quando volta. E nós temos que festejar o fim da faculdade, mas de uma forma só nossa – piscou brincalhona.

– Sei não, Miranda!

– Você não vai me abandonar em uma hora como esta, não é?

Aquele olhar pidão, associado à umidade do choro recente, além do sorriso que eu sabia não ser tão verdadeiro, conseguiu me desarmar. Eu não tinha como negar qualquer ajuda a minha amiga.

– Tá legal, mas só depois da última prova.

– Combinado.

E ela se atirou em meus braços como uma criança feliz.


ALEX


Eu apenas sorria quando alguém falava comigo, mas a verdade era que estar em um local público, ao lado de Tiffany, estava me deixando cada vez mais incomodado. Catarina ficou meio surpresa com o anúncio do meu noivado. Eu não pretendia abrir a minha vida, porém me vi obrigado a exaltar a minha noiva, como uma forma de desestimular qualquer uma das mulheres presentes.

– E estamos fechando um contrato para publicar o livro dela – finalizei a minha explicação em inglês para que Ammy conseguisse acompanhar a conversa.

– Ela é uma novata? – a surpresa na voz da minha funcionária não passou despercebida. Tiffany sorriu e disfarçou levando a sua taça à boca.

– Sim, apesar de ser estreante, seu material é fabuloso. Posso dizer que teremos um livro com qualidade suficiente para disputar mercado com autores internacionais – olhei para Ammy e ela fez uma careta em tom de brincadeira. – Vamos ter duas estrelas de romances eróticos em nossa editora – simulei um brinde com a minha escritora estrangeira e ela sorriu satisfeita.

– Então Charlotte escreve romances eróticos? Hum! Alex Frankli seduzido por textos mais “calientes” – Catarina brincou, mas eu pude perceber a sua decepção.

– Não pelo texto e sim pela escritora. Charlotte é uma mulher incrível.

– Ele é professor dela. A típica fantasia de romance entre professor e aluna – Tiffany falou tentando parecer divertida e provocante, no entanto eu fiquei muito aborrecido com tal comentário.

– Amor. Não fantasia – corrigi sem deixar que os demais percebessem o meu aborrecimento. – Eu me apaixonei e estou certo de que este é um feito que todos deveriam ter direito. Nunca estive tão seguro a respeito de uma escolha.

– E quando teremos o casório? – Catarina voltou para a conversa recuperando o ânimo de antes.

– Em breve. Pode ficar tranquila que você será convidada – pisquei brincando e Tiffany se mexeu incomodada.

– Será uma grande festa? – Tiffany perguntou com interesse, como se quisesse ganhar a minha atenção.

– Ainda não conversamos sobre isso, mas, a julgar pelos meus futuros sogros, não acredito que seja um evento que passará despercebido.

– Outro detalhe importante – Tiffany falou ganhando a atenção dos demais ocupantes da mesa. – A garota é milionária – outra vez usou um tom sarcástico, fazendo com que todos rissem e brincassem com a situação.

– Isso ajuda realmente – Catarina piscou para mim e sorriu ao beber o seu vinho.

Eu não poderia deixar Tiffany estragar a minha noite. Não seria nada legal ser indelicado com os outros apenas porque ela resolveu destilar o seu veneno, então optei por encarar tudo como uma brincadeira.

– Como eu disse: Charlotte é uma mulher incrível! – levantei minha taça propondo um brinde. – E se for para eu casar, que seja com a melhor.

E assim consegui a tacada certa no ego da Tiffany. Não fazia parte da minha personalidade atitudes como esta, no entanto ela pediu por isso.

Após o jantar, enquanto me despedia de todos e auxiliava as mulheres nos devidos transportes para os hotéis em que estavam hospedadas, não me importei com o fato de Tiffany ter saído um pouco antes, peguei-me ansioso para saber o que aquele final de noite me traria de novidade com a minha menina.

Mesmo estando uma noite agradável e as ruas movimentadas, preferi acionar um táxi, afinal de contas nunca era bom facilitar em São Paulo, apesar de muitos casais caminharem tranquilamente sem se preocuparem com as estatísticas. Segui o caminho curto pensando no saldo da noite, satisfeito por não ter deixado Tiffany estragá-la, e com muito do que foi o evento da tarde na cabeça. Estávamos no topo do mundo literário, com os melhores autores, com grandes promessas e tudo parecia caminhar na direção de dias ainda melhores.

E eu não via a hora de me lançar neste meio como autor, não mais como editor-chefe. Se é que meus textos tinham qualidade o suficiente para serem inseridos no meio de tantas promessas. A julgar pelo meu entusiasmo, daria certo. Naquele exato momento eu tinha muita vontade de escrever, de contar de uma maneira íntima, típica dos autores, os segredos que permeavam a minha mente, o amor que circulava em minhas veias e a forma magnífica como tudo se transformava a minha frente.

Entrei no hotel sem me importar muito em observar o local. Estava ansioso. Precisava saber como estava Charlotte, decidir até quando aquela tortura seria necessária, e passar uma boa parte da noite debruçado sobre o notebook escrevendo a minha trama.

Só não contava com aquele problema à minha porta. Encostada como se soubesse que logo me encontraria, segurando uma garrafa de champanhe e duas taças, estava Tiffany. Descalça, cabelos soltos e um vestido casual lhe davam uma imagem sedutora. Eu fiquei imediatamente tenso.

O que ela fazia ali?

E mais importante: o que pretendia me aguardando?

Como não havia uma forma diferente de descobrir caminhei lentamente em sua direção, preparado para qualquer batalha que tivesse que travar, mesmo que fosse contra mim mesmo.


CAPÍTULO 17


“Se amor é cego, nunca acerta o alvo.”

William Shakespeare


ALEX


– Tiffany? Como...

– Também estou hospedada aqui. Uma feliz coincidência, não?

Ela sorria e me olhava com malícia.

– Posso ganhar dois minutos da atenção do meu melhor editor?

– Com champanhe? Acho melhor não.

Tiffany fez biquinho e depois sorriu debochada.

– Não vou atacá-lo, Alex, apesar de achar que você muitas vezes pede por isso. Será apenas uma conversa informal sobre negócios.

– Lamara conversa sobre negócios com você, eu apenas...

– Dois minutos, Alex. Juro que não vou tentar nada. Não mereço a sua confiança?

Respirei fundo. Não. Definitivamente Tiffany não merecia a minha confiança, mas o que eu poderia fazer? Olhei para os lados com medo de estarmos sendo observados.

Este era o grande problema em estar apaixonado. Você nunca se sente seguro o suficiente para fazer coisas que sabe que não prejudicarão em nada o relacionamento, mas que, com certeza, caso se tornem de conhecimento público, podem se transformar num problema de grandes proporções. Aquele era um caso típico. Eu saberia conduzir Tiffany perfeitamente bem. Poderia recebê-la em meu quarto e, caso ela passasse dos limites, poderia facilmente repreendê-la e me livrar dela.

Mas, se por um acaso Charlotte imaginasse que Tiffany teve acesso ao meu quarto... se sonhasse que eu havia permitido que ela entrasse com champanhe e taças na mão, meu Deus! Seria o fim do mundo. A terceira guerra mundial.

– Por que não vamos ao bar? – ela riu da minha precaução.

– Alex, olha só no que você se tornou. Vamos lá, estou te dando a minha palavra de que não vou tentar nada.

– Essa situação não é legal, Tiffany. Pense bem: você gostaria que seu noivo soubesse que você recebeu outro homem em seu quarto de hotel?

– Sinceramente? Acho que você está muito cheio de dedos, preocupando-se com situações que não querem dizer nada. Além do mais, considerando-se o fato de Charlotte não ter como saber que eu estive por alguns minutos em seu quarto, ela mesma não está tendo o mesmo cuidado que você.

– Como assim?

Tiffany recuou ligeiramente evitando me olhar. Vi o seu rosto ficando vermelho e me perguntei se aquilo não era mais uma das suas armações para me ter de volta.

– Deixe pra lá. Eu queria conversar sobre uma proposta nova que recebi hoje. Seria uma conversa informal, apenas debater o assunto com alguém em quem eu confio, mas vamos deixar para outro momento.

Bastou sua maneira de se justificar para que eu entendesse que realmente havia algo para ser dito. Poderia até ser mais uma das suas tramoias, no entanto eu conhecia Tiffany o suficiente para saber que ela não estava jogando.

– O que foi, Tiffany?

Segurei em seu braço impedindo-a de evitar os meus olhos. Ela ficou assustada. Por um segundo pensei que se negaria a continuar, então Tiffany baixou os olhos e concordou, suspirando forte.

– Não faz o meu estilo esse tipo de situação, Alex. Fica parecendo que estou desesperada para arrumar uma encrenca entre você e Charlotte e não é nada disso, apesar de ainda ter esperança de que um dia você caia em si.

– Fale logo – rosnei.

– Podemos entrar agora? Não estou muito confortável conversando aqui na porta.

Não tive outra escolha. Era pegar ou largar, e eu queria realmente saber o que Tiffany tinha para me contar. Por isso abri a porta e deixei que ela entrasse. Não consegui ignorar a apreensão que se estabeleceu em meu corpo, mesmo assim dei andamento ao que já havia começado.

Tiffany entrou e não perdeu tempo admirando o quarto. Ela deixou a garrafa e as taças sobre a pequena mesa que ficava em frente ao móvel onde eu tinha deixado o meu computador, andou até a janela e espiou a paisagem do lado de fora. Eu queria ficar mais relaxado, mas não conseguia.

– O que você quer me dizer?

– Certo, Alex. Antes quero dizer que apenas ouvi o que Patrício contou a Lana ontem, quando eu passei na editora para conversar sobre um novo livro. Por isso não tenho como afirmar nada e nem acusar Charlotte.

– Tudo bem, Tiffany. Conte logo.

– Pelo que entendi Patrício estava fazendo chacota, entrou na sala contando que encontrou com Charlotte na faculdade e que ela estava acompanhada de um rapaz.

– E o que há de tão absurdo nisso? Charlotte é jovem, está em uma faculdade, tem amigos e...

– De uma maneira muito íntima – seus olhos atentos estavam fixos nos meus. – De uma maneira que te tiraria do foco, segundo Patrício fez questão de salientar.

De maneira muito íntima.

Eu não deveria me importar. Como homem maduro, vivido e experiente, saber que minha noiva tinha uma amizade com um outro garoto não deveria me deixar tão temeroso, até porque eu mesmo me dava o direito de ter amigas. Mesmo assim... porra! Eu estava muito puto.

Não queria dominar a vida de Charlotte, muito menos controlar os seus passos e amizades. Não era a favor de um relacionamento sem confiança e, com certeza, eu não era o tipo de cara que se consumia por causa de uma fofoca contada em segunda via, no entanto não tenho como negar que fiquei muito abalado. O que era uma grande merda!

Respirei fundo disposto a não levar aquilo adiante. Se eu tivesse que dizer qualquer coisa seria a Charlotte e não a Tiffany. Aliás, eu não precisava ter nenhuma reação que demonstrasse a minha insegurança infantil na frente da mulher cujo maior desejo era me ver longe da minha noiva.

Mesmo abalado e me sentindo estranhamente confuso, sorri e tentei parecer não me importar com o que ela tinha acabado de dizer.

– Tenho certeza de que não deve ser nem setenta por cento do que Patrício disse. Meu irmão tende a aumentar a proporção dos fatos, colocando sempre mais tempero do que deve em cada situação.

– Com certeza – ela continuou me olhando atentamente.

Decidido a colocar uma pedra no assunto, abri o champanhe e servi as nossas taças levando uma até Tiffany. Vi seus olhos brilharem.

– E, então, o que pretendia me contar quando a encontrei na porta do meu quarto?

E com isso consegui desviar a sua atenção, e qualquer tentativa de me fazer afundar ainda mais naquele sentimento pobre de posse que tentava me consumir, porém, mesmo mudando o assunto e o clima ao nosso redor, por dentro eu estava cada vez mais agitado, ansioso para descobrir com quem Charlotte estava e averiguar mais a fundo aquela fofoca.


CHARLOTTE


– Então podemos entender Platão, quando ele diz que o amor é a busca da beleza, uma vez que o mesmo ressalta que a matéria seria apenas o primeiro patamar. Desta forma, o amor não se torna prisioneiro do físico, e volto a dizer que o filósofo não excluiu, em suas conclusões, o amor carnal, apenas que ele afirmou que este nos leva a patamares mais elevados.

O slide finalizou a apresentação, e todos aplaudiram. Quando as luzes do auditório acenderam, o meu rosto estava tão quente que pensei que a última pessoa da última fileira poderia constatar o meu embaraço por falar em público.

Tirei os óculos, limpei as lentes na camisa e recoloquei no rosto, sem me esforçar para focar em nada.

A apresentação foi interessante. Discutimos diversos pontos filosóficos sobre o amor, implementamos com literaturas atuais, mesclamos com as descrições mais antigas e discutimos a banalização do amor nos tempos modernos. Eu me sentia pronta para debater por horas a fio, no entanto a vergonha jamais permitiria que eu defendesse todos os meus pontos de vista com pessoas que não faziam parte do meu meio social, que por sinal era bastante restrito.

Johnny estava na primeira fileira, apesar de não ser uma matéria do curso dele. O meu amigo adorava presenciar meus desastres e embaraços nas apresentações e ria sem demonstrar nenhum dó de mim.

– Muito bem, Srta. Middleton – o professor Tavares conferiu suas anotações sem me olhar diretamente. – Ficou bastante interessante. Toda a equipe está de parabéns – Miranda deu um pulinho de alegria. Aquela era a matéria que ela precisava de mais pontos. – Poderíamos discutir alguns detalhes, infelizmente... – ele conferiu o horário – ... preciso atravessar o campus para outra aula, então... – ele levantou fazendo com que muitos o imitassem – ... na próxima semana entrego o resultado final. Parabéns mais uma vez.

Recolhi meu material e tratei de descer os cinco degraus correndo e, para variar, tropecei. Se não fosse pelo colega da frente, com certeza, eu teria me esparramado todinha no chão. Johnny correu para me acudir e imediatamente começou a rir.

– Ajudaria se você amarrasse os cadarços –repreendeu-me tomando para si meus livros.

– Não vi que estavam desamarrados.

– Claro! Você sempre tenta justificar o fato de não saber amarrar os próprios cadarços – ele me provocou e eu tive vontade de arrebentar aquela boca grande com um soco.

– Eu sei amarrar meus cadarços – Miranda riu e me auxiliou enquanto eu me embaralhava ao tentar fazer um laço decente. – E vá a merda!

– Com certeza seu noivo adoraria conhecer esse seu lado desbocado.

– Ele conhece – encarei o meu amigo e abri um sorriso amplo. – E adora!

Ele riu alto, abraçando-me para sair do auditório.

– Ele já deixou de ser professor? – Johnny perguntou enquanto caminhávamos em direção à lanchonete.

– Ainda não. Conversamos pouco desde que voltamos do rancho.

– E... – ele desconversou tirando as mãos de mim e colocando-as no bolso da calça. Aquele não era o jeito do meu amigo. – Aquelas duas loucas continuam tentando atrapalhar vocês?

– A professora Bezerra provavelmente vai tentar nos prejudicar de alguma forma e Tiffany só apareceria se Alex estivesse na cidade, afinal de contas a ligação dela é com ele e não comigo.

– Eu teria medo dessas duas tão quietinhas – Miranda disse se aproximando mais de nós dois. – Pelo que já demonstraram, o silêncio é sempre suspeito.

– Para com isso, Miranda! Não fica colocando mais minhocas na cabeça da Charlotte – Johnny repreendeu minha amiga de uma forma estranha, o que despertou imediatamente a minha atenção.

– Não estou envenenando o relacionamento dela e sim estou alertando-a para o que pode vir daquelas duas. Eu, sinceramente, não me surpreenderia com mais nada.

Estremeci. Eu já tinha vivido experiências suficientes tanto com Anita quanto com Tiffany para saber que não estávamos em um momento de paz. Depois de elas terem coragem de invadir o quarto do Alex, eu poderia esperar por qualquer coisa.

Era uma droga que Alex estivesse tão longe.

– Não quero pensar nisso. Quero estar bem e feliz quando Alex voltar, e nós estaremos fortes quando qualquer uma delas resolver aprontar outra vez.

– É assim que se fala, gatinha! – Johnny beliscou a minha cintura e voltou a me abraçar.

– Pois eu pensaria. Sabe Deus que tipo de loucura elas estão aprontando.

– Miranda! – Johnny a repreendeu pela segunda vez, o que me deixou um pouco mais cismada.

– Vocês estão escondendo alguma coisa de mim? – Miranda riu, mas Johnny ficou sério.

– Não! Está louca? – minha amiga respondeu rapidamente e, pela forma como o fez, tive certeza de que ela não me escondia nada. Já Johnny...

Olhei para o meu amigo aguardando sua resposta. Ele puxou o ar com força, coçou a cabeça e depois riu sem graça.

– Não seria propriamente esconder, uma vez que tentei te contar e você se recusou a ouvir, então... – deu de ombros.

– Você está sabendo de alguma coisa? Está sabendo de algo que elas aprontaram e não me contou nada?

– Não é nada disso, Charlotte. Foi só uma coisa que aconteceu que não envolve nem você nem Alex.

– Não estou entendendo – rebati confusa.

– Claro que não está entendendo. Onde já viu Jonathan falar algo que faça sentido? Se não envolve nem Alex nem Charlotte por que puxou essa conversa seu idiota? Não está vendo que deixou a garota agitada?

Ele riu alto, desdenhando do aborrecimento de Miranda, que ficou ainda mais indignada.

– Vamos, Charlotte. Johnny quer apenas te aborrecer.

– Não é nada disso – ele continuou rindo. – Vamos deixar este assunto para depois. O que vamos fazer amanhã?

– Amanhã? – fiquei confusa com a mudança de tópico tão subitamente.

– Última prova, Charlotte! – meu amigo brincou animado. – Temos que festejar. É a formatura das minhas duas garotas.

– Primeiro: não somos as suas garotas – corrigi-o enquanto sentávamos à mesa disposta na área da lanchonete. Mirada riu da minha coragem. – Segundo: ainda estaremos em avaliação na próxima semana.

– Um trabalho para ser entregue, apenas isso – Miranda me corrigiu acomodando a bolsa ao seu lado. – E ele já está pronto, precisamos somente imprimir, encadernar e entregar.

– Antes de tudo precisamos do aval dos demais membros da equipe.

– Que nem vão cogitar ir contra qualquer coisa que você tenha feito – ela foi firme.

Era verdade, eu fiz o trabalho, com pouca participação dos demais, que fique esclarecida a minha situação, e era certo que ninguém ousaria contestar uma vírgula daquele texto. Também era verdade que eu não estava muito animada para baladas, mesmo sabendo que a minha melhor amiga precisava disso. Não era muito animador ficar tanto tempo sem Alex e ter que aturar dois loucos que nem Miranda e Johnny.

– Vamos, Charlotte! – ela me olhou daquela forma que sempre me olhava quando queria me convencer a fazer algo. Ou seja, eu estava ferrada.

– Vou pensar – mas eu já não tinha mais como fugir. – Eu quero um suco de laranja, Johnny.

– Eu quero uma Coca-Cola – Miranda falou já completamente animada.

Saquei meu iPhone, disposta a checar as minhas mensagens, mas não havia nada importante. Era frustrante! Mesmo assim era melhor dar atenção à internet do que começar a me massacrar com a ideia de enfrentar uma noitada como a que eu sabia que Johnny e Miranda desejavam. Por isso abri um site de notícias e comecei a ler algumas aleatoriamente.

– Acho que vou querer uma fatia de torta de chocolate – minha amiga falou tentando ganhar a minha atenção. – Quer dividir comigo?

– Não – nem me dei ao trabalho de olhar para ela.

– Charlotte! Amigas unidas engordam unidas, esqueceu? – ri. Miranda era mesmo muito louca.

– Tudo bem, escolha um prestígio, ou casadinho. Nada de chocolate puro – ela revirou os olhos e levantou para avisar a Johnny o nosso acréscimo ao pedido.

E foi quando eu vi a manchete.

“Alex Frankli, figura de destaque no meio literário, curte a noite paulista ao lado de importante autora nacional”.

Que porra era aquela?!

Minhas mãos tremeram e suaram, minha cabeça deu um nó, minha garganta ficou seca e minha barriga doeu. Puta merda! Mesmo sofrendo todos os tipos de reações negativas, meus dedos clicaram na notícia e rapidamente eu estava com uma foto imensa onde podia ver perfeitamente bem o meu noivo em um restaurante, com várias pessoas, dentre elas, Tiffany, sentada ao seu lado.

Ao lado de Tiffany.

Puta. Que. Pariu.

– Pedi casadinho. Hum! Está com uma cara maravilhosa. É bem como a madrinha diz: nada como um pouco de chocolate para alegrar a vida.

Miranda sentou agitadamente do meu lado, no entanto meus olhos não deixaram aquela matéria. Eu olhava e olhava a foto tentando entender. O que Tiffany fazia lá? Por que Alex não me contou que ela também estaria naquela viagem? E por que ele sorria para ela daquela forma?

– Porra! A noite paulista, apesar de não estar quente, teve muitos momentos interessantes, como o grande evento literário com a escritora internacional Ammy Stuart, que obteve tanto sucesso que mereceu uma estirada em um dos melhores restaurantes da região. Pelo visto, Alex Frankli, um dos solteiros mais cobiçados do país, festejou de várias maneiras o sucesso cada vez mais ascendente da sua editora. Ele não apenas estava bastante animado durante o jantar, mas testemunhas afirmam que o editor foi visto entrando no mesmo hotel em que a sua escritora Tiffany estava hospedada. Há quem diga que a noite foi longa para os dois...

Só então me dei conta de que as palavras não estavam apenas em minha mente, mas também na voz da minha amiga, que lia espantada ao meu lado. Fechei os olhos sentindo meu corpo inteiro tremer.

– O que foi? – Johnny se aproximou, sentando de frente para mim.

– Eu sabia que aquela cretina não ficaria tão quietinha – resmungou Miranda.

– Do que estão falando? – meu amigo insistiu.

– Pelo que dizem Alex passou a noite com Tiffany – ela falou sem se importar comigo.

– Ele o quê? – a voz dele saiu um pouco mais alta.

– Eu preciso ir – levantei decidida a sair dali de qualquer jeito.

– Espere! – Johnny levantou tentando me impedir. – Para onde você vai? O que vai fazer?

– Não sei.

E eu não sabia mesmo, só não podia ficar ali ouvindo eles discutirem o assunto como se eu não estivesse presente. Não podia decidir sobre o que pensar quando duas pessoas faziam todo o tipo de julgamento. Eu precisava ficar sozinha e só assim poderia tomar uma decisão.


ALEX


Um dia eu cheguei a acreditar que a minha vida seguiria o curso normal. Que manteria a minha posição social e financeira, que um dia decidiria que alguma pessoa seria a mais correta para estar ao meu lado, que teríamos filhos e que eu nunca ficaria insatisfeito com a rotina. Seria uma vida tranquila, segura e correta.

Ledo engano.

Eu aprendi com uma pirralha que não havia como ter o controle de tudo. Charlotte me mostrou que nunca haveria uma rotina, que eu nunca saberia o que esperar, que eu não escolheria uma pessoa, eu seria simplesmente intimado pelo meu coração e que as palavras tranquilidade e segurança não fariam mais parte do meu dicionário.

Eu ainda estava puto da vida com aquela história e foi justamente por isso que evitei ligar para ela naquela manhã, tão pouco me atrevi a tentar contato durante a madrugada. Era necessário digerir a notícia para que esta não nos causasse um problema maior do que deveria.

E eu ainda me sentia um miserável por estar com ciúmes.

– E o garoto não era estranho. Eu tenho certeza de que já o vi antes.

Lógico que abordei Patrício. Eu sabia que não precisaria nem perguntar sobre o assunto, bastava uma ligação com qualquer desculpa e ele me contaria tudo. Foi o que aconteceu.

– Se ele estuda na faculdade e você namora com uma garota que também estuda lá, não seria nada estranho se já o tivesse visto antes – ele ficou quieto, acho que pensando no que eu tinha falado.

– Eu... – pigarreou, demonstrando insegurança, o que ganhou rapidamente a minha atenção. – Pode ser – que estranho. – E Charlotte ficou toda desconfiada. Eu sempre achei que aquela diabinha não era fácil.

– Não fale besteira, Paty!

– Paty é o caralho!

– Idiota! Charlotte pode ter quantos amigos quiser – e eu não estava tão seguro sobre isso. – Ela tinha uma vida antes de mim.

– Tinha? Eu pensei que a diaba tivesse fugido de um convento.

– Quer deixar de ser imbecil?

– Você enganou todo mundo com aquela conversa de virgindade? Calma, calma! Não me diga que ela te enganou com essa história? – e ele deu uma risada estrondosa que me deixou ainda mais irritado.

– Você tem ou não a programação oficial de lançamentos para a bienal de São Paulo?

– Eu tenho, seu idiota. Deixamos alguns espaços para encaixar os nossos principais autores, mas só vamos poder encaixá-los quando estivermos mais próximos da data.

– Certo. Eu quero apenas dar uma olhada para ter uma ideia do que posso conversar com a Cibele.

– E a conversa com a Charlotte. Vai deixar a garota dando mole por aí?

– Por que você não cuida da sua vida com Miranda? Aliás, é com ela realmente que você tem que se preocupar, afinal de contas, todo mundo sabe que Miranda não é nada fácil de conter.

Outra vez ele fez silêncio, por tempo até demais. Era a segunda vez que eu tocava no nome de Miranda e ele simplesmente se calava. Alguma coisa estava errada. Ele levou mais algum tempo em silêncio e eu não sei por que, não quis falar, nem desligar, apenas aguardei por Patrício.

– Nós demos um tempo – baixou o tom de voz.

Levei alguns segundos para assimilar o que ele dizia e de que forma aquilo poderia refletir em mim. Que droga! Mais um problema para a minha já nada calma vida ao lado de Charlotte.

– O que aconteceu? – tentei não sair acusando meu irmão de ser um irresponsável nem nada parecido.

– Não sei, Alex.

– Mas você...

– Eu sei! Droga, eu sei! Acho que surtei com essa história de compromisso. Você me conhece. Sabe que moro com nossos pais até hoje simplesmente porque não quero ter mais obrigações do que já tenho no trabalho. Eu sou um cara da vida, Alex. Não estou pronto para casar, ter filhos, mulher cobrando a cada segundo.

– Você é um imbecil – falei sem demonstrar a minha frustração. – E quem disse que você tinha que se casar com ela?

– E não era onde íamos parar? Miranda queria me ver todos os dias, queria saber o que eu tinha feito e o que pretendia fazer.

– É o que todos os namorados fazem, Patrício. Não é possível que depois de tantas namoradas você ainda não tenha aprendido.

– Não eram bem namoradas, Alex. Eram... amigas mais íntimas.

– Ah, claro! – revirei os olhos e respirei profundamente para não ser a minha vez de surtar. – Eu pensei que você gostasse dela, mas, já que não é bem assim, eu só vou pedir para conversar com Peter e...

– Eu gosto dela. Quer dizer... gosto, mas não para casar. Quer dizer... não sei. Porra, eu não sei. Miranda é uma mulher que consegue me enlouquecer. Quando estamos juntos é sempre muito bom. Muito bom! Mas ela nunca demonstra o que está sentindo, parece que é apenas uma diversão, sei lá. Eu pensei que assim seria ótimo, já que eu também não queria me amarrar, então ela começou a ficar na minha cola e, quando eu pensava que estava bom, ela se afastava, não se importava.

– Se você não quer compromisso, por que quer que ela se importe?

– Ah, droga! Eu não sei! Não sei! Só sei dizer que me incomoda quando ela está demais em minha vida, por outro lado, me incomoda quando está de menos também.

– Demais, de menos, é tudo muito confuso, Patrício.

– Se é. Decidimos dar um tempo e você precisava ver a banca que ela colocou. Disse que não era para eu me preocupar com Peter porque ela sempre sabia como esclarecer dúvidas sobre os namorados. Dá para acreditar? Como se fosse uma rotina ela apresentar namorados para o padrinho.

Dei uma risada curta. Patrício não fazia ideia do que Miranda era capaz de fazer, e Peter definitivamente não conhecia a afilhada.

Meu celular vibrou avisando a chegada de um e-mail. Olhei para o visor e vi que era de Charlotte. Eu não sabia se ficava feliz ou não. Ainda não tinha digerido a ideia de ela cheia de intimidades com outro cara.

– Preciso desligar. Não esqueça de me mandar a programação.

– Já vou providenciar.

Desliguei rapidamente e abri minha conta para verificar o e-mail da minha noiva. E perdi o chão quando cliquei no link que constava solitário na mensagem.

– Alex Frankli, figura de destaque no meio literário, curte a noite paulista ao lado de importante autora nacional – li alto o título da matéria. – Puta que pariu! Como... merda!

Disquei o número dela na esperança de que, pelo menos, ainda quisesse conversar comigo. Ela não atendeu, e eu fui interrompido por Catarina, que entrava na sala de reuniões do nosso pequeno escritório em São Paulo.

– Cibele ligou. Parece que está presa no trânsito – ela parou tão logo notou a minha cara. – Algum problema?

– Você viu isso? – mostrei a matéria.

– Oh, droga! Eles estão te ligando a quem: Tiffany ou Ammy?

– Tiffany. E agora eu estou com um problema sem tamanho.

– Isso é muito ruim, Alex. O que podemos fazer? Será que eles vão importunar a sua noiva? Coitada!

– Não. Nós nem tivemos tempo de tornar o relacionamento público. Ficamos noivos no feriado e eu tive que viajar.

– Menos mal – ela pareceu aliviada.

– Não é não. Charlotte e Tiffany possuem uma espécie de... disputa. Sei lá. Mais da parte de Tiffany do que de Charlotte.

E me perguntei se o meu desespero estava tão grande a ponto de me fazer desabafar com uma funcionária, que dias antes flertava livremente comigo.

E Charlotte não atendeu a ligação.

– Vou precisar da sua ajuda.

Ela me olhou com um misto de atenção e traquinagem, e sorriu de uma forma esplêndida.


CHARLOTTE


Abri a porta de casa sentindo ainda todo o meu corpo tremer. Minha pele estava úmida, muito provavelmente efeito da adrenalina. Meus óculos estavam com as extremidades embaçadas. Respirei fundo, rezando para que meus pais não estivessem em casa.

Para meu infortúnio, eles estavam.

A sala vazia não era nenhum indício de que eu estava sozinha, pois a música clássica, baixa e suave, preenchia o silêncio. Era uma música triste e me lembrava alguma situação angustiante, da qual eu não conseguia me recordar. Ou era o meu estado de espírito que dificultava tudo.

Precisei pôr meu celular no silencioso para não cair na tentação de atender as chamadas insistentes do meu noivo. Não que eu não quisesse falar com ele, eu era infantil, mas não chegava a este ponto, sabia que a conversa seria inevitável. Como eu estava muito nervosa e aborrecida, atendê-lo no ápice da minha irritação não me ajudaria em nada.

Por isso optei por enviar a matéria, só para que ele soubesse que eu já sabia. Sim, eu fiz de propósito. E sim, eu quis torturar Alex. Ele merecia sentir um pouco do que eu sentia naquele momento.

Comecei a subir as escadas. Minha intenção era me trancar no quarto e resolver o mais rápido possível aquela situação. Meus planos foram interrompidos quando captei uma conversa. Era a voz do meu pai e vinha do escritório dele, que fica logo após a escada que levava ao andar superior.

Claro que era normal meu pai trabalhar em casa, especialmente depois da promessa dele de que não facilitaria o meu relacionamento. O que chamou a minha atenção foi o tom de voz que ele usava. Parecia sofrer, ou implorar.

Por instinto desci os poucos degraus que já tinha subido e tomando o cuidado de manter os passos leves, fui até a porta. Ele estava sem a gravata, a camisa social estava aberta e desabotoada nos pulsos. Meu pai caminhava de um lado para o outro com o celular na mão. Não olhava para nada especificamente e para tudo ao mesmo tempo.

– É o que estou te falando, não há nada que possamos fazer. Já tentamos de tudo – passou a mão livre na testa e fechou os olhos. – Sim, nós testamos. É justamente por isso que preciso da sua ajuda. Não, ela não sabe – falou com um pouco mais de impaciência. – Eu até estou disposto a tentar, mas ela não quer mais, disse que precisávamos aceitar e... – foi quando ele me viu parada à porta.

Por alguns segundos meu pai pareceu uma criança pega pelos pais durante uma traquinagem. Ele me olhou assustado, sem saber o que deveria fazer, então voltou a caminhar pelo escritório falando rápido demais.

– Falo com você mais tarde, agora preciso atender uma pessoa. Certo. Obrigado.

Ele desligou e me encarou, depois, como se estivesse recompondo a máscara, sorriu. Meu pai escondia alguma coisa e eu precisava saber o que era.

– Como foi hoje?

– Com quem estava falando? – ele suspirou e sentou no sofá.

– Quer dizer que agora nossos papéis se inverteram? Eu tenho que te dar satisfações, Charlotte?

Cruzou os braços na frente do peito e me encarou. Lógico que fiquei sem graça, era o meu pai falando comigo como se eu fosse uma criança ainda. Meu celular voltou a vibrar lembrando-me de um problema maior.

– Que seja, pai! Eu tenho mesmo que subir.

– Problemas?

Ele ficou alerta, voltando seu foco para mim. Eu estava ciente desta façanha, no entanto estava mais focada em conversar com Alex. Eu poderia sondar sobre aquela conversa depois.

– Não, só preciso revisar um trabalho que tenho que entregar amanhã.

– Último dia?

– Sim – respondi já saindo do escritório e voltando para a escada.

– Tem alguma programação para amanhã? – ele me acompanhou até a porta, sem deixar o escritório.

– Tenho. Parece que Miranda e Johnny querem sair para dançar – ele me encarou sem nada dizer. – Preciso... – indiquei o andar de cima e, com um gesto de mão, meu pai me liberou.

Subi os degraus correndo e, assim que cheguei ao meu quarto, tranquei a porta, joguei os livros na cama, liguei o som e iniciei uma chamada pelo FaceTime. Não sem antes pensar uma última vez na conversa do meu pai. Tinha algo de muito errado naquilo tudo.


CAPÍTULO 18


“Oh, tende cuidado com o ciúme. É um monstro de olhos verdes, que zomba da carne de que se alimenta”.

William Shakespeare


CHARLOTTE


– Charlotte? – A voz exasperada de Alex não deveria ser uma surpresa para mim, mas foi.

– Oi – não havia como ser calorosa. Eu estava triste e decepcionada com ele. – Desculpe não atender, eu estava dirigindo, e... – puxei o ar desviando os olhos da tela. Se precisávamos ter aquela conversa, era imprescindível que eu fosse madura. – Também precisava esfriar a cabeça antes de falar com você.

– Droga, Charlotte! Tem noção de como me deixou?

– Faço uma ideia. Deve ter sido algo bem parecido com a forma como eu fiquei.

– Não aconteceu nada – respondeu de imediato e exaurido. – Que merda!

A imagem de Alex na minha pequena tela era a de um homem cansado e confuso. Ele estava realmente nervoso e tentava se conter, o que me fazia sentir mais raiva. Ok, pode ser infantil da minha parte, só que o fato de ele estar nervoso me parecia culpa e mais nada. E, se ele se sentia culpado, era porque algo havia acontecido.

– Por que não me disse que ela estaria aí? Por que mentiu?

– Primeiro: eu não menti. Não tenho motivos para fazer isso e você sabe muito bem – recuei com a sua postura firme e raivosa. – Segundo: eu não sabia que Tiffany estaria aqui em São Paulo. Ontem, depois do evento, fui informado de que ela participaria do jantar. Ela veio a trabalho. Eu não sabia.

– Como o editor-chefe não sabe que a sua autora preferida está na mesma cidade que ele e, ainda por cima, a trabalho? – Alex limpou o suor da testa com a mão livre e me encarou com firmeza.

– Foi um convite de última hora, para cobrir um buraco em uma pauta. Provavelmente Lana ou Patrício ficaram sabendo a tempo.

– Lana ou Patrício? E não te falaram nada?

– Não. Eu estava ocupado, Charlotte. Não imaginei que uma fofoca de tabloide poderia me gerar tantos problemas – sua paciência, pelo visto, já tinha ido embora.

– Fofoca de tabloide? É isso mesmo o que você acha que é?

– É o que eu sei que é. Tiffany pode ter armado para ficar no mesmo hotel que eu, ou pode ter ficado lá por ser o seu hotel preferido. Eu não sei, e realmente não me importa. Não acha que já sou crescidinho demais para ficar neste joguinho? Se eu tivesse interesse em Tiffany, ou em qualquer outra mulher, não estaria me desdobrando para te convencer a casar comigo.

Certo. Esse foi o seu tiro certeiro. Alex poderia ter razão, mas o meu lado infantil me fazia querer confrontá-lo, afinal de contas, por que justamente Tiffany estava do seu lado no restaurante? E como ela poderia saber o hotel em que ele estava se ele mesmo não fornecesse a informação?

Merda! Eu estava parecendo uma maluca vivendo a teoria da conspiração. Claro que eu deveria confiar nele, Alex era o homem da minha vida, mas... droga! Qual mulher seria capaz de me julgar pela minha insegurança? É difícil ser jovem, inexperiente, apaixonada e noiva de um homem como o meu professor.

Sentir ciúme me deixava raivosa e, ao mesmo tempo, envergonhada. Uma coisa era defender o meu território, ou ter provas de que não havia fidelidade por parte do companheiro, e outra é simplesmente surtar ao extremo todas as vezes que há uma sutil possibilidade de que alguma coisa tenha acontecido. No entanto, serei franca, apesar de tudo, não havia motivos para duvidar de Alex, e, se um dia eu o tivesse, seria a minha maior decepção.

– Eu fiquei desesperado quando não consegui falar com você, Charlotte – acusou sem me deixar reagir. – Você não pode simplesmente atirar este problema em meu colo e desaparecer.

– Eu estava dirigindo. Acredite em mim: foi melhor assim.

– Não, não foi. Deveria ter colocado seus pensamentos em ordem primeiro para depois podermos conversar civilizadamente, não deveria ter simplesmente jogado a bomba para cima de mim e desaparecido, eu estou trabalhando! Não posso ser atropelado dessa forma, eu...

Merda!

– Olha, Alex...

– E ainda tem o problema do garoto da sua faculdade, Patrício me enchendo a paciência com esta história.

Merda dez mil vezes.

Retirei os óculos, passei as costas da mão no rosto e recoloquei a armação, desejando morrer em vez de ter que me desdobrar em explicações.

– Era o Henrique.

Vi o rosto lindo do meu noivo se contorcer de raiva e angústia.

– Claro! Como poderia ser outro que não o Henrique?

– Alex...

– O garotinho que é simplesmente a sua cara metade.

– O quê?

– Sim, Charlotte. Ele é o cara correto para você. É tão rico quanto você, tem a mesma idade, vive as mesmas coisas e ganhou o aval dos seus pais sem precisar de nenhum esforço.

Revirei os olhos. Quem estava sendo infantil agora?

– Você está sendo absurdo, Alex!

– Eu sei – rosnou e desviou o olhar. – É uma merda estar longe e saber que outro cara fica te rodeando, levando os seus livros, acompanhando você até o carro...

Arqueei uma sobrancelha, encarando-o. Era exatamente como eu me sentia, não falei em voz alta. Alex entendeu o que estava implícito na minha expressão.

– Porra! Desculpe, Charlotte! Não tenho este direito. Estamos os dois na mesma situação e eu não tenho o direito de fazer você entender os meus medos quando eles refletem os seus.

– Isso tudo é uma droga – suspirei resignada. – Eu sinto a sua falta, Alex.

E todo o gelo e tensão se desfez em segundos. Pensar na falta que ele me fazia me desarmou completamente, deixando-me melosa e com vontade de chorar. Alex me olhou com carinho, demonstrando o mesmo sentimento. Como eu queria tocá-lo naquele momento! Como eu precisava sentir os seus braços em minha volta me devolvendo a segurança que havia se perdido!

– Menina! Como consegue fazer isso?

– Isso o quê?

Alex mordeu o lábio e sorriu torto. Um calor latejante começou a se instalar em meu corpo, subindo pelo meu pescoço e se alojando em minhas bochechas. Meus pensamentos não eram nada decentes, então me vi arfando, e não sabia explicar tal reação.

– Você faz o meu mundo ficar de cabeça para baixo, Charlotte. Bagunça a minha vida, tira toda a minha paciência, me deixa louco, sem saber o que posso fazer e então, de repente, com poucas palavras me devolve a calma, muda o rumo dos meus pensamentos.

– Eu pensei que você fizesse isso comigo.

Direcionei meus olhos para os meus pés. Eu não sabia muito bem como reagir quando Alex ficava daquele jeito meloso. Era gostoso, mas me desconcertava.

– Alex?

Uma voz feminina me alertou, fazendo com que minha atenção voltasse para a minúscula tela do celular. Alex estava acompanhado? Meu coração acelerou e minhas mãos ficaram suadas. Respirei fundo tentando manter o equilíbrio.

– Sim, Catarina?

– Consegui a...

– Um minuto – ele a interrompeu, voltando a olhar para mim. – Venha conhecer Charlotte.

Não sei por quê, mas, quando ele chamou a tal mulher para me conhecer, minha primeira preocupação foi o meu cabelo. Arrumei-o rapidamente, ajeitei os óculos, limpei meu rosto com a mão sentindo-me mais nervosa do que deveria.

Quando a mulher entrou em meu campo de visão, linda e sorridente, demonstrando uma elegância que eu com certeza não tinha, senti tudo em mim desanimar. Seu sorriso perfeito, com dentes retos e proporcionais em lábios carnudos, fez-me esmaecer. Por que tinha que ser tão bonita?

– Charlotte! Alex só fala de você.

Ela disse animada. Até demais para o meu gosto. Alex sorriu e seu sorriso chegava aos olhos, brilhantes e honestos. Relaxei um pouco e sorri de volta.

– Oi.

– Vou tentar liberá-lo o mais rápido possível, porque este chefe aqui está insuportável longe da noiva – gracejou fazendo-me rir um pouco. – Seja bem-vinda a esta casa, Charlotte! Será um prazer trabalhar com os seus livros.

– Obrigada, Catarina!

Ela saiu do meu campo de visão e Alex voltou a me olhar sorrindo. Ele era tão lindo!

– Vejo você em breve, amor – praticamente sussurrou, como uma promessa que jamais seria levada pelo vento.

– Ansiosa.

– Eu também. Preciso ir.

– Certo – ele deixou a tela descer como se fosse desligar. – Alex?

Chamei mais alto e ele retornou ao celular. As sobrancelhas unidas como se tivesse medo do que viria daquela vez. Quase ri do seu desespero, no entanto consegui apenas sorrir docemente.

– Eu amo você!

Ele sorriu esplendorosamente e amoleceu o meu coração.


***


– E então ele se recusou a fazer qualquer comentário a respeito da prova.

Johnny conversava com meu pai enquanto eu, Miranda e minha mãe, apenas acompanhávamos a conversa, rindo discretamente das bobagens que ele dizia e das caretas do Peter, quando meu amigo passava dos limites. Às vezes, Miranda trocava um olhar cúmplice comigo, principalmente quando a conversa era sobre algum garoto que ela achava interessante, mas nada falava.

– Afinal de contas, ele tinha ou não passado o assunto para a turma?

Minha mãe se intrometeu como se estivesse realmente interessada. Acho que fez isso porque eu e Miranda rimos da cara do Johnny quando percebemos que realmente não fazia ideia do que cairia naquela prova.

– Claro que não, madrinha! Se ele tivesse dado o assunto, com certeza eu saberia.

Foi aí que rimos mais ainda. Claro que ele não saberia, a menos que a sua turma fosse formada apenas por freiras idosas, no mais, ele conseguiria desviar a atenção por qualquer outro motivo, e o professor levaria todo o período falando para o nada.

– Então por que não leva o caso para a coordenação? – sugeri apenas para provocá-lo um pouco e Miranda riu empolgada.

– Você sabe que não posso sofrer uma perseguição faltando um semestre para terminar o meu curso.

– Mas... – meu pai tentou argumentar.

– Ele ainda será meu professor por um semestre inteiro, padrinho. Não posso arriscar.

– Tudo bem!

Meu pai deu de ombro, levando um pouco de comida à boca. Foi neste momento que meu celular vibrou entre as minhas pernas. Eu não desgrudava dele desde o dia anterior, quando Alex e eu quase brigamos, o que graças a Deus não aconteceu, e, fora uma mensagem dizendo que ele estava pensando em mim, eu não sabia mais nada dele desde então.

Peguei o aparelho e não consegui disfarçar minha decepção assim que meus olhos avistaram o indicador de mensagem. Era de Miranda.

“Sabia que abriram um motel aqui bem pertinho de casa? ”

Tive vontade de rir alto. Miranda ou estava louca ou brincando. Para que porcaria eu precisava de um motel perto de casa? Eu nunca nem tinha colocado os pés em um motel, então aquela informação era desnecessária e sem cabimento. Se bem que, levando-se em conta o estado de espírito da minha amiga desde que ela e Patrício resolveram terminar, eu poderia pensar que era o caso da primeira opção: ela definitivamente estava louca.

Só poderia estar, não havia outra explicação. No auge de uma decepção amorosa, ela conseguia pensar em motel, apesar de ainda não ter surgido um novo cara, nem o desejo, mas o motel ela já sabia qual seria? Revirei os olhos teatralmente, pois queria que ela entendesse o que eu estava pensando. Minha amiga riu.

– Para onde vocês pretendem ir mesmo?

Meu pai já havia feito aquela pergunta pelo menos umas mil vezes, provavelmente querendo ter a certeza de que estávamos falando a verdade. O que ele imaginava eu não fazia a menor ideia, mas me perguntei se ele acreditava que Johnny seria capaz de nos levar para uma orgia, ou para um clube de mulheres, e este último pensamento quase me fez gargalhar.

– Uma boate nova. Não fica muito longe – Johnny se apressou a responder como se fosse a primeira vez que estivesse fazendo isso.

– E o senhor provavelmente sabe o endereço, já contratou um segurança e até instruiu o garçom para não nos fornecer bebidas livremente.

– Charlotte! – minha mãe me repreendeu enquanto eu sustentava o olhar do meu pai.

– Eu posso impedi-la de sair, mocinha.

– Não, não pode. Eu tenho vinte e um anos, estou prestes a completar vinte e dois. Sou maior de idade e, de acordo com o saldo das minhas contas bancárias, posso me considerar independente financeiramente.

– Charlotte! – minha mãe tentou pela segunda vez, sem conseguir muito.

– O que está pensando...

– A ideia de me presentear com ações das suas empresas, com certeza não partiu de mim, no entanto, já que aconteceu, elas me pertencem, então, sou legalmente independente.

– Não me desafie, Charlotte!

Meu pai estava passando do estágio vermelho para roxo e eu podia jurar que dali para um infarto era questão de tempo, por isso recuei. Na verdade, desafiar o meu pai não era a minha intenção, só não consegui aguentar a minha indignação pelo fato de ele continuar controlando tudo ao nosso redor.

– Pelo amor de Deus, é só uma saída! O que há de mau ou errado nisso? Não pode confiar na gente uma única noite?

– Escuta aqui, mocinha...

– Pai! Eu não o estou desafiando, estou apenas pedindo para você relaxar, o senhor vai acabar morrendo antes do tempo e sabe Deus o que será da sua família se isso acontecer.

Foi aí que aconteceu.

Ele mudou do roxo para o branco pálido em poucos segundos. Seus olhos, antes quase fechados em fendas, abriram-se em uma surpresa nada agradável. E então ele trocou um olhar cheio de significados com a minha mãe, que, mesmo tentando disfarçar, estava com as mãos trêmulas e os lábios roxos. Aquilo tudo era estranho demais, e ficou ainda pior quando ele tentou dizer algo e nada saía.

O desconforto na mesa foi sentido por todos, que sustentavam o silêncio, quebrado apenas pela campainha. Odete, uma das funcionárias que serviam exclusivamente aos meus pais sempre que eles estavam em casa, apressou-se a atender a porta. E qual não foi a minha surpresa ao ver o meu noivo entrando e ocupando cada espaço da minha mente, ofuscando qualquer problema ou sentimento.

Ele entrou um pouco sem graça, seus olhos logo alcançaram a mesa, mas não se demoraram, pois, quando encontraram os meus, foi como se uma faísca acendesse todo o fogo reprimido.

– Alex!

Levantei sem me preocupar em ser educada e corri para os braços daquele que eu desejava durante dias a fio. A saudade rasgava a minha carne e me torturava. Ele deixou o paletó que segurava nos braços cair no chão e me alcançou logo em seguida. Não houve tempo para pensar em pudor ou em qualquer regra descabida do meu pai. Nós nos beijamos. Sim, nós nos beijamos longa, demorada e apaixonadamente.

Suas mãos se apossaram das minhas costas e me colaram a ele, deixando-me sentir toda a extensão da sua saudade. Gemi baixinho, não me importando se aquilo agrediria os valores morais do meu pai.

Para minha tristeza não estava nos planos do meu noivo ultrapassar os limites impostos por Peter e, tão logo ele percebeu que estávamos em uma zona perigosa, tratou de desfazer o beijo e se afastar, mantendo uma distância aceitável. Seus olhos continuaram presos aos meus e ele sorriu. Ah, ele sorriu! Aquele puxar lateral dos lábios, que fazia o meu mundo girar em outro eixo. Tive vontade de beijá-lo outra vez, porém suas mãos firmes me mantiveram no lugar.

– Saudade de você! – sussurrou, ainda sem quebrar o encanto. Tentei avançar e fui impedida novamente por braços que nos separavam.

– Eu... – olhei para suas mãos me segurando de forma a me impedir de distraí-lo um pouco mais. – Eu também, Alex. Nem acredito que está aqui.

– Alex! – meu pai chamou já de pé ao lado da mesa de jantar. – Enfim você voltou! Venha, junte-se a nós. Sra. Odete, por favor, traga mais um...

– Não será necessário – Alex o interrompeu. Ele colocou uma mão em minha cintura e me conduziu de volta para o interior do apartamento, juntando-se aos demais. – Eu jantei no aeroporto. Como vai Peter? Mary, Miranda, Johnny...

Minha mãe sorriu amplamente para o meu noivo e o meu pai parecia mais aliviado com a sua chegada, o que me deixou profundamente irritada. Miranda sorriu para mim, e havia um certo desapontamento em seu olhar. E Johnny, bom... Johnny sempre seria Johnny.

– Sentiu o cheiro da fuga? – meu amigo brincou ao apertar a mão do meu noivo, que não entendeu nada. – Charlotte estava esperançosa com o vale night, agora você chegou e...

– Ah! – Alex levou a mão ao cabelo, passando os dedos pelos fios lisos e macios. Senti minha própria mão coçar de ansiedade, eu queria poder acariciá-lo daquela forma. – Vocês iam sair? – Ele me olhou rapidamente e depois para Peter, que deu de ombros e sorriu, como se quisesse dizer “a noiva é sua, o problema é seu”. Tive vontade de mostrar a língua para ele.

– Nós só íamos festejar o fim da faculdade – comecei timidamente.

– Sim, íamos nos acabar na pista de dança. Curtir as loucuras da noite – Johnny atiçou e Miranda deu uma risada alta.

– Pare de provocar o Alex – minha mãe saiu em meu socorro impedindo meus amigos de continuarem com a brincadeira. – Eles só pretendiam conhecer uma boate nova. Peter já verificou o local e não é nada que possa nos assustar.

Porra! Por que meus pais sempre faziam questão de demonstrar para as pessoas mais importantes da minha vida o quanto eu era uma menina mimada e controlada por eles? Dava para ser menos humilhante?

– E o que será que não passa pelo controle do Dr. Peter? – ironizei fazendo o meu pai se incomodar.

– Sente-se, Alex. Coma pelo menos a sobremesa, um sorvete de coco queimado que vai te deixar maravilhado – minha mãe tentou suavizar a situação.

Alex me conduziu até a minha cadeira e sentou-se ao meu lado. Era estranho como ele ficava esquisito ali. Não sei dizer ao certo o que estava me incomodando. Podia ser o fato de eu nunca ter precisado vivenciar algo do tipo, nunca apresentei ninguém ao meu pai, nem sequer tive um namorado para poder pensar neste assunto. O fato era que Alex estava lá, sentado ao meu lado, participando das loucuras da minha família e completamente destoado dela.

– Como foi a viagem, Alex? – meu pai puxou conversa enquanto Odete retirava os pratos.

– Cansativa, mas interessante.

– Sim, nós vimos as fotos do jantar – Miranda provocou e recebeu um olhar meu que poderia fuzilá-la.

– Como vai Patrício, Miranda? – a forma ácida como Alex a abordou me fez estremecer. Parecia que ele queria realmente feri-la, o que me deixou muito incomodada.

– Ele é seu irmão, então você deveria saber – ela rebateu na defensiva.

– Estávamos pensando em uma boate aqui perto, mas se você estiver cansado... – comecei, porém Johnny me interrompeu.

– Ah, não, Charlotte! Estava tudo certo para irmos. Alex não vai se importar se você for, não é mesmo, professor?

– Bom, eu...

– Que bobagem, Jonathan! Alex é o noivo da Charlotte, e tem o direito de não querer sua noiva se divertindo sozinha em boates – meu pai e toda a sua antiguidade resolveu me ferrar ainda mais. – Você e esses pensamentos modernos. Onde já se viu uma moça noiva saindo sozinha para se divertir?

– Tudo bem, eu não havia programado nada para esta noite – Alex respondeu meio pensativo.

Odete se aproximou, colocando a sobremesa na frente de cada um dos ocupantes daquela mesa.

– Alex, de verdade, se você estiver cansado eu posso ficar. Não precisa me acompanhar só porque Johnny é um idiota e o meu pai um ultrapassado.

– Charlotte! – minha mãe me repreendeu novamente, mas Alex sorriu lindamente para mim.

– Não tem problema, Charlotte. Você terminou a faculdade, precisamos mesmo comemorar.

– E é mais um para fazer todas as vontades dela – Johnny brincou, meu pai riu e eu fiquei furiosa.

– Que droga! Por que não vai encher o saco de outro? – explodi e ele riu ainda mais alto.

– Tudo bem, Charlotte! – mais uma vez Alex se manteve tranquilo demonstrando maturidade suficiente para conviver com Johnny. – Johnny só está tentando te irritar – sem que eu esperasse, ele segurou meu rosto e me deu um beijo doce nos lábios. Toda a minha atenção se voltou para aquele beijo. – Então a que horas pretendem sair? – pegou um pouco do seu sorvete e o levou a boca. Um espetáculo digno de aplausos. Como eu sentia falta daqueles lábios!

Fiquei perdida em meus próprios pensamentos. Eu queria sair para dançar? Bom... até meia hora atrás, sim. Eu queria qualquer coisa que pudesse alegrar a noite dos meus amigos, mas naquele momento, com Alex do meu lado, sentindo a saudade que me machucava, a vontade imensa de tocá-lo, de sentir as suas mãos e de ser dele mais uma vez, minha vontade de sair com os meus amigos havia evaporado.

– Charlotte? – Alex pegou em meu ombro, fazendo-me piscar atordoada. – O que foi? – riu baixinho.

– Nada – olhei ao redor e vi que meu pai e Johnny conversavam enquanto Miranda tomava o seu sorvete, tão perdida em pensamentos quanto eu. Minha mãe olhava todos e ninguém ao mesmo tempo.

– Não vai tomar o seu sorvete?

– Não – voltei a encarar os seus lábios bem na hora em que meu noivo limpava uma sobra de sorvete com a língua. Uma delícia! – Estou sem fome – sentia-me completamente sem ânimo.

– De quanto tempo você precisa, Charlotte? – Johnny me chamou e eu me senti ainda mais atordoada.

– Eu só vou trocar de roupa e me maquiar – Miranda respondeu já levantando.

– Hum! Eu só vou trocar de roupa.

– Não vai se maquiar? – minha mãe se intrometeu. – Nada disso. Não pode sair para um encontro com o rosto lavado. Vamos, eu vou te ajudar – ela disse cheia de entusiasmo e eu revirei os olhos. Minha mãe adorava me fazer de Barbie.


ALEX


Charlotte subiu e eu permaneci com Johnny e Peter. Eles continuaram com a sobremesa, jogando conversa fora. Tudo parecia acontecer dentro da normalidade, Johnny implicava com Charlotte, e Miranda comigo. Que cretina!

– Aceita um café? – a empregada me perguntou após oferecer aos outros dois.

– Não, obrigado!

– Sair para dançar com esta meninada não deve ser uma tarefa fácil – Peter disse chamando a minha atenção. – Se você não fosse dirigir, eu lhe ofereceria uma bebida, como vai conduzir o carro, prefiro não incentivar – ele riu de leve e eu o acompanhei.

– Eu costumava frequentar umas boates. Existem algumas ótimas aqui no Rio de Janeiro – Johnny arqueou uma sobrancelha, como se fosse esquisito eu gostar do mesmo ambiente que ele. Nós não já havíamos nos encontrado algumas vezes? Então por que a surpresa?

– Charlotte nunca me pareceu uma garota que gostasse deste tipo de agitação. Eu sempre achei que ela simplesmente seguia os outros dois – Peter afirmou pensativo.

– E é exatamente o que ela faz, padrinho. Não é muito a vibe da Charlotte frequentar uma boate – Peter sorriu satisfeito. – Ela não gosta muito de lugares públicos. Um restaurante ainda é aceitável, mas bares, boates, shows, nada disso enche os olhos da pequena Charlotte.

– Ela é mais velha do que você – rebati sem me importar com Peter. Johnny realmente extrapolava os limites com a proteção que tinha pela amiga. Peter riu alto e deu um tapinha nas costas dele.

– Jonathan sempre esquece este detalhe. Eu gosto, isso me ajuda a cuidar melhor das meninas – e ele nem fazia ideia do que estava falando.

– Exatamente – Johnny respondeu levantando. – Eu preciso fazer algumas ligações. Com licença.

Acompanhamos o garoto saindo da sala, já falando com algum amigo ao celular. Assim que ele sumiu de vista, Peter se voltou para mim. Sua expressão séria me fez ter medo do que diria.

– Algum avanço? – ele foi direto. Eu neguei com a cabeça. – Estamos em uma situação crítica.

– Ela piorou?

– Consideravelmente – suspirou deixando-se abater. – O tempo está cada vez mais curto.

Encostei-me na cadeira sentindo o peso do problema que ele atirava em meu colo. O que mais eu poderia fazer? Até então eu sabia apenas que era da minha vontade que o casamento ocorresse logo. Aliás, se Peter não fosse tão antiquado, eu poderia facilmente convencer Charlotte a morar comigo. Faríamos uma cerimônia pequena, sem precisar de papéis ou compromissos que colocariam mais peso do que o necessário naquela relação.

No entanto não era o que poderíamos fazer, e eu não tinha outra saída a não ser encontrar uma forma de convencê-la a se casar imediatamente. Claro que eu poderia simplesmente deixar acontecer, esperar que ela se sentisse segura ou mesmo aceitar que ela ainda não estava pronta, infelizmente eu me conhecia muito bem e tinha a certeza de que, quando tudo acontecesse, eu me consumiria em culpa por ter deixado de lutar para dar a Mary a felicidade de vê-la casada e feliz.

– Eu não sei o que fazer, Peter. Tenho conversado com ela, estou apostando todas as minhas fichas neste plano, mas Charlotte teima em continuar com esta postura, como uma birra. Como se precisasse manter a sua posição apenas para mostrar que está no controle da própria vida – ele fez uma careta e concordou.

– Provavelmente trata-se disso mesmo. Eu sempre fui rígido demais, o que nunca a impediu de fazer o que queria, você deve saber disso – sorri um pouco, concordando com o meu futuro sogro. – Droga, Alex! Não posso passar por cima do juramento que fiz a Mary. Não posso contar a Charlotte o que está realmente acontecendo. Também não acho justo que ela se case apenas por isso. Teria que ser pela sua própria vontade.

– E será, só que talvez não tão rápido quanto você precisa.

– Ou no tempo que ainda nos resta – ele completou pensativo. – Aí não faria mais sentido – mais uma vez concordei e um nó se formou em minha garganta.

Eu queria tanto que fosse mais fácil. Mais simples, pelo menos.

– Acho que preciso de uma bebida – ele disse levantando. Eu também precisava, mas não podia. – Não pode ser mais uma disputa de ego, Alex. Charlotte não pode mais acreditar que o casamento é uma imposição minha. Ela tem que acreditar que a urgência é uma necessidade sua.

Porra!

Olhei para Peter ciente de que meus olhos estavam esbugalhados. Eu não podia fazer aquilo. Não podia forçar Charlotte a fazer a minha vontade, a seguir os meus comandos. Porém entendi o que ele queria dizer. Enquanto minha noiva acreditasse que eu queria casar por causa da exigência de Peter, ela reagiria contra, por outro lado, se ela acreditasse que a urgência era uma necessidade minha, talvez assim acabasse concordando. O que não deixava de ser uma grande merda.

Ele caminhou até o bar, do outro lado da sala, e se serviu de um pouco de uísque. Depois fez um gesto para que eu o seguisse. Sentamos no sofá que ficava próximo à entrada para a varanda. Apesar do ambiente climatizado, estava quente, ou eu estava sufocando com a pressão em minha mente.

– Eu posso ser mais liberal com ela – ele começou.

– E eu vou fazer o quê? Todos os meus argumentos são baseados na sua perseguição, Peter. O que vou dizer a Charlotte? Não podemos inverter os papéis justo agora – ele olhou para fora do apartamento e depois voltou a me olhar.

– Minha filha gosta de você, Alex. Se ela acreditar que está sendo infantil e que pode te perder por causa disso, talvez concorde mais rápido.

– Eu não vou fazer isso. Não vou forçar a barra demais com ela. Já pensou se a corda arrebenta para o meu lado? Se ela resolve pôr um fim à nossa relação por não aguentar a perseguição? Ela não precisa de outro Peter em sua vida.

Certo. Desta vez peguei pesado e vi isso muito bem refletido no olhar que ele me lançou.

– São palavras dela, acredite... quando tentei pagar pelos óculos novos – ele relaxou e o efeito foi o mesmo em meu corpo.

– Tudo bem. Não sei mais o que tentar. Posso trancafiá-la em casa, proibir o namoro, impor o casamento...

– Vamos esperar mais um pouco, Peter. Só mais um pouco.

– Mais um pouco para o quê? – Johnny entrou na sala sem se importar em seu educado.

– Vocês não estão atrasados? – Peter o questionou sem se abalar ou perder a postura superior. – Não acho que sair a uma hora destas seja adequado para...

– Estamos prontas – Miranda desceu rapidamente as escadas com um sorriso imenso nos lábios.

– Imaginamos que aprontaria algo do tipo, Peter – a voz da minha noiva capturou toda a minha atenção.

Olhei para as escadas e a vi. Linda! Usava um vestido claro. A parte de cima parecia um corpete e este detalhe desenhava a sua cintura e empinava os seus seios de uma forma apetitosa. Da cintura descia uma saia solta que acabava cedo demais e dançava de acordo com os movimentos daquele corpo esplêndido. Ela usava uma espécie de casaco, mas que parecia ser apenas mangas soltas, presas às costas. Eu já tinha visto peças como aquela, no entanto nunca me dei ao trabalho de entendê-las melhor. O fato era que ficava deslumbrante em Charlotte, e os cabelos presos em um rabo de cavalo aprumado, deixando seu pescoço exposto estavam me tentando de uma maneira absurda.

Ela me olhou e sorriu delicadamente, desviando os olhos e se permitindo corar, o que mexeu diretamente com a minha libido. Seus passos lentos e calculados foram uma tortura para a urgência que se apossou de mim. Sem que pudesse me controlar, levantei-me para aguardá-la no pé da escada. Ela voltou a me olhar e, sorrindo, saltou os três últimos degraus, atirando-se diretamente em meus braços. Rimos juntos.

– Você nunca vai deixar de ser uma menina, Charlotte – brinquei ao levantá-la para beijar seus lábios.

– Nunca. É assim que você me ama.

E era assim que eu sempre a amaria.


CAPÍTULO 19


“Não chame o meu amor de Idolatria. Nem de Ídolo realce a quem eu amo. Pois todo o meu cantar a um só se alia. E de uma só maneira eu o proclamo.”

William Shakespeare

 

ALEX


Não precisei nem pensar no assunto para entender que Miranda e Johnny iriam juntos no carro dele, enquanto eu e Charlotte partiríamos, muito provavelmente segundo os planos dela, em meu carro, para outro destino.

Precisei de todo o meu autocontrole para não ceder antes mesmo de ser tentado.

Charlotte estava linda. Deslumbrante. Ela sorria e, vez ou outra, olhava-me com aquele encanto que sugava de mim toda a minha vontade. Quando ela me dominava daquela forma eu sabia que a seguiria para qualquer lugar, quebraria qualquer regra, apenas para satisfazê-la.

Abri a porta do carro dando-lhe passagem. Ela sorriu docemente, permitindo que seu rosto corasse e acentuasse suas pintinhas maravilhosas. Sua franja, até então arrumada para o lado desceu em seu rosto, no mesmo instante em que minha noiva baixava o olhar como uma submissão, eu instantaneamente senti algo latejando em minha virilha.

Eu estava sedento dela.

Fechei a porta e rapidamente entrei no carro, deixando antes o paletó no banco de trás. Na ânsia de vê-la, nem mesmo a minha mala eu havia deixado em casa. Paguei o táxi já com a chave do carro na mão. Nem entrei em casa, apenas peguei meu carro e fui encontrá-la.

– Alex...

Ela começou e eu já sabia o que seria. Olhei pelo retrovisor vendo Johnny e Miranda sumirem de vista. Respirei fundo buscando forças para negar.

– Vai ser uma noite interessante – interrompi-a, precisava arrumar uma forma de fazê-la desistir. – Eu estou mesmo precisando relaxar um pouco, conversar sobre assuntos não relacionados ao trabalho.

– Então... – ela virou um pouco para mim. – Eu estava pensando em não irmos à boate. É muito barulhento, você não vai conseguir descansar.

– E o que quer fazer? Miranda e Johnny já foram – dei partida decidido a segui-los.

– Pensei em ficarmos um pouco na sua casa – mordi o lábio contendo a vontade de acatar sua sugestão.

– Minha casa está uma bagunça, amor. Ficou muitos dias fechada sem contar que, quando estou fora, a faxineira não vai – era a desculpa perfeita.

– Eu não me importo – ela disse calmamente embora eu soubesse que Charlotte explodiria a qualquer momento.

– Mas eu me importo – peguei sua mão levando-a aos lábios para depositar um beijo leve. – E ficar em casa não será uma comemoração. Precisamos festejar. Aliás, teremos um mês de festa – ela revirou os olhos já incomodada.

– Se formos para a sua casa, faremos a maior e melhor comemoração de todas.

Ok, ela me ganhou com esta. As palavras de Charlotte fizeram meu pau vibrar. Minha ereção começava a me incomodar.

– Não posso nem imaginar você deitada em lençóis sujos – dei mais um beijo em sua mão e a deixei sobre a coxa roliça e maravilhosa da minha noiva.

– Podemos trocá-los – suspirei.

– Minha casa não, Charlotte. Miranda e Johnny estão esperando por nós dois.

– Na verdade, não estão – ela sorriu travessa. Minha noiva era uma diabinha.

– Então você tramou pelas minhas costas? E Johnny aceitou? Ele tinha ficado todo ofendido porque eu cheguei.

– Pode deixar que com ele eu me resolvo depois.

– Charlotte, seu pai confiou que eu...

– Nem quero ouvir o que você vai dizer, Alex. Eu estou morta de saudade. Não posso acreditar que você vai continuar justificando a perseguição do meu pai com a sua necessidade em fazer as vontades dele, e...

– Ei! – segurei outra vez a sua mão apertando levemente os seus dedos. – Eu também estou com saudade, mas minha casa está suja. Não posso te levar para lá. Eu não me sentiria bem. Além do mais, eu quero realmente festejar esta noite com você. Gostei da ideia. Vamos ficar um pouco com os seus amigos. Imagino que Miranda esteja precisando de você.

– Patrício te contou? – imediatamente ela esqueceu o nosso impasse, voltando-se para o problema da amiga.

– Ele conversou comigo. Terminaram, não foi? Eu nunca levei muita fé neste relacionamento.

– Por quê? O que Patrício fazia de tão ruim assim para que você não acreditasse neles dois?

– A questão não é o que Patrício fazia e sim o que Miranda consegue ser.

– Alex!

Droga!

– Não sei, Charlotte.

Gemi sabendo que meu problema agora era maior do que o anterior. Estava quase concordando em irmos para a minha casa, pelo menos assim eu conseguiria fazer minha noiva esquecer meu comentário infeliz.

– Você não pode falar assim da minha amiga. O que aconteceu para que você tenha esta restrição em relação a ela?

– Nada. Eu apenas nunca achei que eles dariam certo. Como se não houvesse química, sei lá.

– Pois eu não acho. Muito pelo contrário. Patrício agiu como um idiota com toda aquela declaração de amor, aquela história de mulher da vida dele.

– Amor, eu realmente não quero brigar por causa dos dois. Patrício está confuso e Miranda... Bom... não sei como Miranda está. Ela me pareceu um pouco perdida, então imaginei que você quisesse ficar ao lado dela.

– E quero mesmo – ela se voltou para a frente pensativa, não aborrecida.

– Então? Vamos encontrá-los. Vai ser divertido!

– Tudo bem, Alex – suspirou resignada.

Seria um problema conseguir manter Charlotte distante o suficiente para convencê-la.


CHARLOTTE


Como previsto, a boate estava lotada, barulhenta, fervilhando hormônios que impulsionavam as pessoas umas para as outras como se o mundo fosse acabar no dia seguinte. Alex não parecia confortável, mesmo assim ele dançou e se esforçou bastante, sem reclamar em momento algum.

Johnny e Miranda facilitaram bastante, dando-nos espaço. Com isso ganhamos um tempo para nós dois e namoramos muito, matamos saudades dos beijos e carinhos, além de curtir a noite de forma diferente da que estávamos acostumados.

– Vamos ficar lá no fundo – ele sussurrou em meu ouvido. O corpo todo colado ao meu em uma dança sensual e discreta ao mesmo tempo. – Tem uma área reservada, uma parte mais escura – e eu me peguei imaginando se tinha como ficar mais escuro, ou se havia realmente algum lugar reservado naquele calabouço lotado de pessoas que dançavam e paqueravam na mesma medida.

– Um lugar onde poderei conseguir mais do que alguns beijos e esfregar de corpos? – ele riu buscando meus lábios.

– Vamos.

Começou a me guiar, abrindo espaço entre pessoas coladas. Imaginei se Miranda e Johnny conseguiriam nos encontrar naquele “mar de corpos suados” e quase tive certeza de que não. Minha amiga devia estar dando a si mesma a oportunidade de ser feliz, buscando em outros lábios o sabor que tinha perdido. Miranda nunca se entregaria. Sorri satisfeita.

Alex me levou para uma área realmente mais reservada e, pelo que vi, apenas pessoas com pulseiras como as nossas, que até o momento eu acreditava ser somente mais um acessório colorido e brilhante daquela festa louca, poderiam ficar naquele espaço. O local era mais refrigerado, tinha sofás, mesas e garçons, apesar de lotado, estava menos do que na pista.

– Miranda e Johnny vão saber que estamos aqui?

– Muito provavelmente – ele disse ainda grudado as minhas costas. – Eles devem imaginar que eu não suportaria muito tempo naquela confusão – e riu de uma maneira deliciosa. – O que gostaria de fazer?

– Você não vai querer satisfazer o meu desejo – ele gemeu e mordeu meu lóbulo.

– Eu quero. E muito! – salientou sem deixar de me provocar. – Mas por ora vamos aproveitar para namorar.

– Namorar?

Virei em sua direção quando chegamos ao fundo do espaço, ele me encostou na parede. O ambiente escuro não me permitia enxergar seus olhos, mas eu podia jurar que estavam intensos e profundos, em seu azul perfeito. Alex colou o corpo ao meu, sem buscar pelos meus lábios. Senti que estava esquentando, apesar da refrigeração reforçada.

Meus saltos altos ajudavam a diminuir a diferença de altura entre nós dois, mas principalmente, permitiam que nossos corpos se encaixassem quase perfeitamente. Sim, eu podia senti-lo, e posso dizer com precisão que Alex estava com tanta saudade quanto eu.

– Namorar, Charlotte! – sussurrou em meu ouvido, mantendo os lábios em minha pele. Sua respiração fazia meus pelos arrepiarem. – Dar uns amassos sem avançar muito –imprensou-me contra a parede sem se importar se estávamos sendo observados. E quem se importava?

Muito lentamente ele roçou o corpo no meu. Suavemente, como uma dança lenta e sensual. Um braço estava apoiado na parede atrás de mim e o outro acariciava o contorno do meu corpo, subindo e descendo a mão pela minha silhueta, atiçando fogo por onde passava.

Levei minhas mãos aos seus cabelos e, saudosamente, enrosquei os dedos nos fios lisos e sedosos. Por que eu adorava tanto tê-lo em minhas mãos? Não importava. O fato era que ter Alex junto a mim, da forma que fosse, era uma sensação impossível de ser descrita.

Suas mãos subiram dos meus quadris até meus braços e depois, lentamente, enquanto ele ainda brincava em meu pescoço com seus lábios e língua, senti seus dedos longos tocarem, discretamente, é válido ressaltar, a lateral do meu seio.

Porra!

Depois de passar por experiências, mesmo que poucas, nunca antes imaginadas, para depois sofrer com a ausência dos seus toques, tê-lo tão próximo, e tão longe ao mesmo tempo, fazia o meu corpo entrar em ebulição. A mínima sugestão de toque, a leve lembrança do que ele poderia fazer comigo, povoou minha mente de imagens e desejos indecorosos. Meu coração acelerou, minha respiração ficou pesada, minha cabeça completamente atordoada, minha boca seca e minha calcinha... dá para imaginar.

– Alex! – estremeci.

Ele sabia exatamente o que estava fazendo comigo e gostava de me deixar daquele jeito. As pernas bambas imploravam por atenção. Mais precisamente, o centro entre elas. Infelizmente não havia o que ser feito. Estávamos em público, seria abusar demais.

– Sinto sua falta, minha menina – ele gemeu e arrastou os lábios até encontrarem os meus.

Nossa!

Aqueles lábios...

Beijar Alex não era apenas sentir o sabor dos seus lábios, a doce sensação de ter a sua língua buscando pela minha, muito menos a reconfortante ideia de que aquele beijo era o símbolo do nosso amor. Beijar Alex era uma experiência à parte. Era algo que conseguia mexer com todos os meus nervos, causava um carnaval entre as minhas células e, com outras ações do corpo dele, como aquele roçar constante e lento, seguindo o ritmo que dominava o ambiente, geralmente causava uma explosão, ou, falando em uma linguagem mais popular, levava-me a um orgasmo fulminante.

Quando eu estava presa pelos lábios do Alex, nada mais contava, apenas eu, ele e o nosso desejo, ou o meu, que sempre falava mais alto. Por isso mesmo, sem pensar no assunto, suspendi a perna na dele, roçando o calcanhar, até que minha coxa estivesse em sua cintura. Ah, Alex gostou daquilo! Sim, ele gostou.

Em poucos segundos sua mão estava em minha coxa, a leve pressão da sua ereção entre as minhas pernas roubaram de mim qualquer resquício de juízo, então, sem conseguir controlar qualquer reação, deixei que minhas mãos o puxassem para mais perto, se é que era possível, e me agarrei àquele homem desfrutando de cada investida.

E, como não podia deixar de ser, Alex retribuiu. Seu beijo ficou mais intenso, suas mãos mais urgentes, suas roçadas mais fortes e eu me vi mergulhando naquele mundo tão nosso, em uma viagem sem volta. Foi quando ele se afastou.

O ar faltou, minha cabeça girou, minhas pernas fraquejaram e eu fui tomada por um frio decidido a gelar o meu corpo todo.

– Alex?!

– Ah, menina! – ele gemeu pouco antes de se afastar mais.

– Não faça isso comigo – supliquei. Eu precisava de mais. Muito mais.

– Não faça você isso comigo – replicou sorrindo e, apesar da escuridão, eu pude ver a amplidão do seu sorriso maroto. – Eu estou morto de saudade, Charlotte.

– Uma pena a sua casa estar suja – ele grunhiu e se afastou entrando em um facho de luz que coloria a boate.

– Vou buscar alguma coisa para beber.

Mesmo cambaleando e com o corpo formigando de desejo, consegui dar alguns passos e sentar na poltrona mais próxima. Olhei ao redor e muitos casais estavam em situações parecidas com a nossa, segundos antes. Sorri. Se eu estava incomodada com a calcinha molhada imagine Alex com aquela calça que mal conseguia conter a sua ereção.

Ele voltou com duas bebidas, uma colorida, ou eram os flashes de luz que dançavam pelo salão, e outra que parecia ser uísque. A colorida era para mim!

– Coquetel – disse ao segurar minha mão e me levantar.

– Pensei que você não iria beber.

– Preciso de alguma coisa para distrair a minha mente.

Ele sentou onde eu estava e me colocou em seu colo. A mão livre brincou discretamente com as minhas coxas. Senti minha pele arrepiando. Aquela noite seria uma tortura. Não havia maneira de convencer Alex a me levar para a sua casa, por mais que eu o estivesse tentando, mas eu precisava dele como nunca havia precisado antes. Depois de tantos dias separados, de toda aquela tensão por causa da manchete nos jornais, de Tiffany fazendo de tudo para conseguir nos separar, eu queria apenas ser amada por aquele homem para me certificar de que tudo ficaria bem.

– E então, como está se sentindo agora que é uma mulher formada?

Foi então que uma ideia me ocorreu. Eu nem imaginava como conseguiria fazer aquela proposta, porém não via outra alternativa, era isso ou ter que esperar até que Alex não tivesse mais desculpas. Meu rosto esquentou consideravelmente. Puxei o ar. O ambiente escuro seria meu aliado.

Inclinei-me em sua direção e beijei seus lábios, utilizando a outra mão para acariciar seu peito. Alex aceitou o beijo lento e tornou tudo muito mais luxurioso. Ele apertou minhas coxas, depois deixou que a mão adentrasse entre as pernas, roçando a ponta dos dedos em minha pele e me deixando ainda mais ansiosa.

– Eu tive uma ideia – falei o mais baixo que pude, tentando fazê-lo me escutar no meio de tanto barulho.

– E não respondeu a minha pergunta – ele brincou apoiando meu corpo com a mão que ainda segurava o copo. – Que ideia teve?

Aproveitei o interesse do meu noivo para utilizar tudo o que tinha para persuadi-lo. Ainda não estava certa se eu faria uma proposta decente, ou... sei lá, se era correto eu ser a pessoa a convidá-lo. Estava ciente de que minha mente estava funcionando de acordo com a do meu pai, com pensamentos retrógrados e machistas, mas, verdade seja dita, eu não era uma pessoa “para frente” como Miranda.

Aliás, eu não era tipo nenhum de pessoa quando o assunto era namoro, ou relacionamento. Não conhecia as regras da vida real, não sabia o que valia e não valia no jogo da sedução. Apenas fantasiava com situações românticas em que o parceiro, sempre apaixonado, compreendia tudo e achava incrível. Bom, aquele poderia não ser o caso do Alex.

Mais um ponto negativo. Pensar sobre isso me fez enxergar, mais uma vez, que mal nos conhecíamos, como podíamos desejar o casamento?

– E então? – ele se afastou, buscando meus olhos. – Qual foi a sua ideia, maluquinha? – a mão que estava entre minhas pernas, em uma carícia sensual e ousada, foi para o meu cabelo, ajeitando os fios que se soltaram enquanto dançávamos.

– Eu pensei... – pisquei algumas vezes. Se não estivesse tão escuro, com certeza, os olhos dele me hipnotizariam e impediriam de falar. – Pensei em... um... motel?

Ok! Minha insegurança e nervosismo fizeram eu me sentir tão infantil e ridícula que quase retirei o convite, mas não o fiz, simplesmente porque notei a expressão séria do meu noivo. Ele me encarou de um jeito diferente, estranho, ouso dizer, depois bebeu mais um pouco do seu uísque, desviando o olhar.

Eu não sabia o que fazer ou dizer. Não conseguia tomar uma atitude, levantar, beber o meu coquetel... nada. Eu, sentada no colo do Alex, aguardei. E cada segundo era como uma faca cortando o meu coração.

– Um motel? – seu jeito ainda frio me deixava tensa.

– Sim... – comecei. – Sua casa está suja e você não quer me levar para lá, então... Miranda me contou que inauguraram um motel perto da minha casa.

– Miranda? – e riu sem vontade alguma. – Eu deveria imaginar.

– Alex, qual é o problema! É só um motel. Todos os casais vão a motéis.

– Nem todos.

– Posso apostar que você conhece vários motéis da cidade.

Não sei por que senti tanta raiva. Alex adorava culpar Miranda por todos os males que atingiam a sociedade, e aquilo me incomodava profundamente. Somado a tudo havia a sua visível recusa de me levar para um motel. O que havia de errado nisso? E era verdade que ele, com certeza, conhecia os principais motéis do Rio de Janeiro.

Indignada, tentei levantar do seu colo, no entanto, como era de imaginar, ele me deteve, segurando-me até que eu entendesse que não poderia sair de lá.

– Nunca associei motéis a amor, Charlotte. Este é o problema – tentei me acalmar para escutá-lo. – Sim, eu conheço muitos motéis, já fui com algumas mulheres, mas normalmente, quando havia intimidade, ou um pouco mais de amizade, eu preferia a minha casa. Motel sempre foi a minha falta de opção.

– O que não quer dizer nada para mim. E daí se você não pensa que pode levar a pessoa que ama a um motel? Este é um pensamento machista e absurdo, Alex Frankli! Todos os casais vão a motéis, os que se amam e os que não se amam, porque a ideia não é o amor e sim transar, entendeu? – ele apertou os lábios com força, o que me fez acreditar que era para se impedir de rir da minha cara.

– Você é muito persuasiva, Charlotte – aquele sorriso debochado brincou em seus lábios. – Eu... não me sentiria bem levando você para uma cama de motel.

– Que não seja em uma cama. Droga! Qual é o seu problema? Você...

E então me dei conta. Alex havia me pedido em casamento depois de ter tirado a minha virgindade, tinha sofrido a pressão do meu pai e então caiu na real. Ele não queria aquilo. Não queria namorar uma garotinha, não queria casar nem se prender a ninguém, apenas estava se sentindo obrigado a agir assim e, sendo ele um homem com tanto caráter, jamais fugiria do seu compromisso.

Aquele era o Alex que eu conhecia. E aquele era o momento mais doloroso do meu dia.

Ele não me queria.

Não era porque tinha trabalho para fazer, nem porque precisava viajar, não porque estava com a casa suja e muito menos porque não concordava em me levar a um motel... ele não me queria. Não a ponto de fazer aquilo por mim.

Envergonhada, deixei meu olhar cair para minhas mãos. Droga! Eu era uma garota que poderia encantar um homem como Alex, só que era apenas encanto. Não era um amor capaz de fazê-lo aceitar, de maneira satisfatória e feliz, mudar tudo a seu redor. E o que eu poderia cobrar dele? Nada. Desde o início, eu forcei a barra, eu criei as situações e fui fundo em minhas ideias. Eu fiz as coisas acontecerem e era a única culpada por tudo estar como estava.

– Charlotte?

Ouvi alguém me chamando. A voz estava muito próxima e não foi fácil reconhecê-la, por causa do barulho. Olhei para trás e dei de cara com Patrício. Ele caminhava em minha direção e me olhava como se quisesse dizer “peguei você!”. Não entendi de imediato o que ele pretendia com aquilo tudo e piorou quando percebi que estava de mãos dadas com uma garota tão magra e alta que me fez imaginar como seria possível. Ela estava incrivelmente maquiada, os cabelos jogados para o lado e modelados para permanecerem assim, e vestia uma roupa que mais parecia ter saído de uma revista de modas.

Patrício. Garota nova. Miranda. Todos no mesmo ambiente. Puta que pariu!

– Alex! – ele exclamou surpreso ao se aproximar da gente. – Não sabia que tinha voltado – e me lançou um olhar estranho. Um pouco de decepção e um pouco de alívio. Sei lá!

– Cheguei faz poucas horas. E aí, tudo bem? – meu noivo apertou a mão do irmão e aguardou que ele apresentasse a garota. Meu futuro cunhado nem se deu ao trabalho.

– Deu tudo certo? Como foi...

– Amanhã conversamos sobre trabalho, Patrício – Alex o cortou passando uma mão em minha cintura para me puxar para mais perto. Meu coração afundou.

Ele não me desejava. Merda! Por que não? Antes não podíamos encostar um no outro e agora ele buscava desculpas para não precisar transar comigo. Desviei o olhar novamente e foi neste momento que vi Miranda entrando na ala em que estávamos.

Puta. Merda!


ALEX


Charlotte se movimentou, incomodada, e precisei segurá-la mais firme para que a maluca não tentasse fugir de mim mais uma vez. Eu não queria magoá-la, mas pensar em levá-la a um motel me incomodava. Não como eu tinha dito. Claro que se não houvesse opção eu levaria minha noiva para onde quer que fosse, desde que pudesse ficar com ela.

Porém a ideia era não deixar Charlotte acreditar que teríamos um namoro normal, no qual tudo seria fácil de conseguir, então levá-la para um motel seria ceder e permitir que ela continuasse se negando a casar. Eu precisava disso e Peter mais do que nunca.

– Lana sabe que você voltou? – Patrício continuou conversando sem se preocupar com a garota que estava com ele. Mais um problema.

Eu tinha certeza de que meu irmão não ficaria sozinho, e, principalmente, que voltaria a sua vida sem regras e sem compromissos, só não pensei que seria naquela noite e na mesma boate que Miranda. Além do mais, Charlotte estava incomodada com a presença da garota.

– Não. Tínhamos combinado que eu voltaria amanhã, mas consegui resolver tudo e adiantei minha volta – Charlotte virou em minha direção e me encarou. Ela estava realmente incomodada. – O que foi?

– Solte-me – disse sem pestanejar.

– Charlotte...

– Alex, por favor! – e olhou discretamente para o local onde os seguranças faziam o controle das pessoas que entravam.

Miranda estava conversando com um rapaz e era só o que eu conseguia ver, pois uma nuvem de fumaça ocupou o espaço que nos separava. Respirei fundo analisando todas as possibilidades. Patrício não seria problema, afinal de contas foi ele quem colocou um fim no relacionamento, já a amiga da minha noiva... Eu podia ter uma ideia do que Miranda seria capaz de fazer caso encontrasse meu irmão com uma garota. Pensando nisso, soltei Charlotte.

Ela levantou, ajeitando o vestido e procurando pela amiga através da cortina de fumaça.

– E você, Charlotte? Pensei que estivesse com seus amigos. Ou “amigo” – Patrício provocou.

– Não devo satisfações a você, Patrício – minha noiva rebateu pegando-nos de surpresa. Meu irmão riu alto e abraçou a garota que estava com ele.

Ela era tão magra!

– E da próxima vez que quiser criar problemas no meu relacionamento com o seu irmão, encontre alguém mais interessante do que o Henrique. Ele sequer faz sombra a alguém como Alex – falou olhando diretamente para o meu irmão que parou de rir ficando sem graça. – E não me compare a você. Eu sou leal.

Tive que sorrir. Charlotte era mesmo incrível!

No entanto, não tive tempo de acrescentar nada. No momento que Patrício encarou minha noiva, a nuvem de fumaça se dispersou revelando Miranda e o rapaz em um beijo tão escandaloso que foi capaz de nos roubar a fala.

– Mas que porra! – Patrício grunhiu sem desgrudar os olhos do casal. Charlotte estremeceu intuindo o que havia acontecido, virando-se para constatar.

– Oh, merda! – ela disse assim que Patrício passou por ela como um raio.

– Patrício?

Gritei, mas meu irmão continuou marchando em direção a Miranda. A garota, a magricela, o seguiu de perto, sem entender o que estava acontecendo. Eu e Charlotte tivemos que fazer a mesma coisa.

– Patrício, espere! – tentei contê-lo, mas foi em vão. Ele já estava perto demais.

– Sua cretina!

Ele gritou a plenos pulmões, despertando a atenção de muitos que estavam por ali. Coloquei-me entre ele e Miranda, que assustada desfez o beijo e tentava entender o que acontecia. O rapaz, obviamente, colocou Miranda atrás dele, protegendo-a.

– Então era isso que você queria? Ficar livre para poder “galinhar” por aí? Eu deveria suspeitar – ele bradou descontrolado.

– Ei! Não fale assim com ela. Você também não ficou para trás – Charlotte se meteu com tanta fúria que me espantou.

– Patrício, o quê... – Miranda tentou, mas foi impedida.

– Qual é o seu problema? – o rapaz que estava com ela se meteu para defendê-la.

– Cale a boca, seu idiota! Que o assunto aqui não é com você.

– O quê? – Miranda gritou se colocando na frente. – O que você quer, Patrício?

– O que eu quero? Eu quero é me certificar de que fiz a coisa certa. Descartei o que só me traria desgosto – e ele foi acertado por um tapa tão forte, que nem mesmo o barulho da briga e da música impediram que todos ouvissem.

Só que quem deu o tapa não foi Miranda, apesar de ela estar realmente predisposta a fazê-lo. Quem bateu em meu irmão foi Charlotte. Puta que pariu!

– Charlotte! – gritei puxando-a para mim. Era melhor afastá-la, antes que Patrício revidasse e eu fosse forçado a dar uma surra em meu irmão.

– Seu imbecil! – Miranda gritou sendo puxada para trás pelo rapaz que estava com ela.

– Qual é o problema aqui, Patrício? – a magrela finalmente reagiu. Ela parecia mais estar entediada do que aborrecida pelo que presenciava.

– O problema é essa... vagabunda.

– O quê? – Charlotte gritou ao mesmo tempo que Miranda.

Então toda confusão começou.

Porra! Eu consegui segurar minha noiva, mas não a tempo de ver o rapaz que estava com Miranda acertar um soco em meu irmão, enquanto a amiga da minha noiva avançava para acertá-lo ela mesma. A magricela, que estava no meio de tudo, não conseguiu evitar as porradas que levou e logo a briga era, de um lado, a troca de socos entre Patrício e o rapaz, do outro, uma chuva de tapas e puxões de cabelos entre Miranda e a garota que estava com o meu irmão.

Um verdadeiro inferno!


CAPÍTULO 20


“Quando não houver nada a perder, arrisque tudo.”

William Shakespeare


ALEX


– Você é uma cretina!

Patrício gritou, já do lado de fora da boate, com a camisa enrolada em pedaços de gelo que Johnny conseguiu para ajudá-lo.

Lógico que fomos todos expulsos. Exceto Johnny, que só soube o que aconteceu porque viu Miranda ser arrastada para fora enquanto ainda gritava e tentava atingir Patrício. Uma cena patética.

– E você um palhaço! – ela grunhiu enquanto Charlotte a ajudava a arrumar o cabelo que estava pior do que um ninho de gato. – Idiota! – sua voz chorosa indicava que a briga seguia outro rumo. – Um troglodita! Eu agradeço por ter me livrado de você.

– Calma, Miranda – minha noiva tentava consolar a amiga. Ela também estava magoada com o meu irmão e não conseguia nem olhá-lo.

Só quando fomos para o estacionamento é que nos demos conta de que a magricela havia desaparecido. Graças a Deus! Miranda tinha praticamente destruído a garota. Já o rapaz que estava com a amiga da minha noiva ainda queria briga, porém foi contido pelos seguranças e mandado embora com os amigos, que se juntaram para alimentar a confusão.

– Ai! – Miranda gemeu quando Charlotte tentou limpar suas lágrimas. – Aquela coisinha me infectou com suas unhas postiças – Charlotte riu e Miranda também, apesar do choro.

– Deixa eu ver – examinou com cuidado. – Ela te arranhou aqui.

– Ai! Vou morrer. Com certeza aquela cadela me transmitiu raiva – Miranda choramingou e Charlotte riu novamente.

Olhei para Patrício verificando como ele estava. Não tão mal quanto o outro cara, um olho estava inchado e o lábio partido. Ele não conseguiria voltar sozinho para casa. Olhei rapidamente para Charlotte ciente de que o fato de levar meu irmão não iria deixá-la nada satisfeita.

– Se você não tivesse agindo como...

– Cale a boca, Patrício! – Charlotte grunhiu e eu tive que me colocar entre os dois.

– Já chega! Fique calado, Patrício. Miranda estava seguindo com a vida dela, assim como você com a sua, agora chega de confusão. Vamos! Eu vou te levar para casa – Charlotte me encarou e rapidamente desviou o olhar, desgostosa com a minha sugestão.

– Vou pegar um táxi. Não vim de carro porque queria beber.

– Certo. Johnny pode levar as meninas?

– Claro! – imediatamente ele começou a conduzir Miranda para o carro.

– Babaca! – ela jogou os cabelos para trás, ao passar pelo meu irmão, que apenas a olhou sem revidar.

Charlotte hesitou um pouco, em seguida começou a acompanhar os amigos.

– O carro está ali. Vá abrindo – dei a ordem a meu irmão e corri atrás da minha noiva. – Charlotte?

Ela virou sem muita vontade me encarando sem aquele brilho de mais cedo. Charlotte estava realmente aborrecida com aquela confusão. Assim que a encontrei, abracei-a tentando demonstrar que também não estava feliz com aquele desfecho.

– Desculpe por isso. Não foi assim que imaginei a nossa noite – beijei o alto da sua cabeça e me dei conta de que ela não retribuía ao abraço. – Não fique aborrecida comigo – supliquei segurando seu queixo e levantando seu rosto para encontrar o seu olhar.

– É melhor você cuidar do seu irmão antes que ele crie mais confusão – continuou fria, sem muita emoção.

– Charlotte, eu não tenho culpa das babaquices do Patrício – ela piscou algumas vezes se dando conta do que estava fazendo.

– Eu sei – desviou o olhar e se afastou um pouco. – Na verdade, você não tem culpa de nada, Alex, e é horrível saber que está se cobrando tanto.

O quê? Do que ela estava falando?

– Não estou entendendo – passei a mão no cabelo cansado de toda aquela confusão.

– Olha, está tarde e eu preciso cuidar de Miranda, então vá para casa e leve Patrício. Depois conversaremos melhor – ela estava mesmo me dispensando?

– Amor – diminuí a distância entre nós e a segurei rapidamente antes que ela recuasse. – Eu te amo!

Porque eu sabia que era isso o que ela precisava ouvir. Charlotte era insegura demais para aceitar qualquer situação sem questionar o real motivo do meu interesse por ela, e tudo o que eu menos precisava naquele momento era da sua insegurança.

Busquei seus lábios e ela não me impediu, apenas se entregou, deixando-me saboreá-la de acordo com a minha fome. E eu não poderia aplacá-la, porque a minha necessidade daquela menina ia muito além da vontade de beijá-la, para minha tristeza não poderíamos ir tão longe.

Ela se afastou, ofegando, e descansou a cabeça em meu peito. Ah, eu adorava aquela garota! Afaguei seus cabelos, bagunçando seu rabo de cavalo, ela não se importou.

– Vejo você amanhã.

Afirmei antes que ela começasse a imaginar coisas demais, como eu sabia que ela era capaz, e me afastei para finalmente poder dar o sermão que estava contido em minha garganta para o meu irmão.

Ele teria muito o que ouvir.


CHARLOTTE


Eu estava sentada em minha cama, as pernas cruzadas, pés descalços, usando um short jeans curto e solto e uma regata rosa. Não estava com vontade de arrumar o cabelo, mas me dei ao trabalho de fazer uma trança deixando-a caída de lado. Pelo menos assim minha mãe não reclamaria do meu desleixo com a minha aparência.

Eu não queria sair. Não queria sequer levantar daquela cama e já era quase hora do almoço. Claro que Miranda já havia feito a sua visita habitual, tinha chorado e se lamentado pela noite anterior, e não deixou de falar do Patrício. Falar muito dele. Ela estava em uma fase onde o amor e o ódio lutavam entre si com as mesmas armas e forças. Complicado!

Assim que cansou, minha amiga decidiu que merecia uma aula de pilates e, mesmo sendo sábado, foi em busca do que queria.

Eu queria fazer o mesmo. Não o pilates, mas ter a coragem de sair em busca do que eu queria. Só que não era tão fácil. Alex precisava de espaço, e eu de entender aquela confusão toda que se formava em minha cabeça.

Ele não tinha ligado, nem enviado nenhuma mensagem. Eu também não, mas esta é só mais uma parte das minhas birras infantis. Ele não procura, eu não procuro. Quanta maturidade!

Conferi mais uma vez o celular apenas para me sentir ainda mais frustrada.

Na noite anterior, quando chegamos, não percebemos que meus pais não estavam em casa. Na verdade, eu só descobri quando estranhei minha mãe me deixar dormir até tão tarde, então saí em busca deles.

– Resolveram adiantar a viagem, Srta. Charlotte – Odete me avisou assim que cruzei a sala em busca de informações. – Recebi o recado na portaria e logo cedo o Sr. Middleton ligou querendo notícias de vocês. Ele avisou que voltarão hoje.

– E viajaram assim? Não avisaram antes, não estavam planejando...

– O seu pai disse que teriam que viajar hoje pela manhã, mas preferiram sair mais cedo para voltar o quanto antes.

Dei de ombros resolvendo voltar à minha cama. E desde então eu estava lá. Já tinha tomado banho, ouvido música, comido besteira e ficado um bom tempo olhando para as paredes. Nem um bom livro me animava.

Uma batida na porta despertou a minha atenção. Provavelmente Odete fora me avisar que o almoço seria servido. Era o que ela fazia quando os meus pais estavam em casa e, como ninguém sabia que eles não estariam, ela ficou e fez o seu serviço.

– Já estou descendo, Odete – minha voz não saiu forte nem animada.

– Posso entrar – a porta abriu minimamente, dando passagem para aquela voz melosa que sempre me dominava e me levava para a direção que quisesse.

– Alex! – o nome dele escapou de minha boca em um misto de animação, surpresa e espanto. – Entre, claro!

Imediatamente passei as mãos nos cabelos, desejando ter tido mais vontade para me arrumar naquela manhã. Tirei e coloquei meus óculos, indecisa sobre usá-los ou não. Lógico que usaria, ou eu estava cogitando não enxergar cada detalhe daquele lindo rosto?

Ele abriu a porta, mas não entrou. Seus olhos vasculharam o quarto primeiro, conferindo o seu conteúdo, até que me avistaram e se demoraram em mim. Droga! Eu estava horrorosa, desleixada... a Sra. Middleton jamais aprovaria aquela forma de me apresentar ao meu noivo. Não, minha mãe nunca me perdoaria.

Alex me olhou fixamente. A princípio apenas encarava meus olhos, em seguida conferiu meu corpo, meu traje, meu cabelo... Que meleca! Então ele sorriu. Sim, foi um daqueles sorrisos que ele sabia que me dominavam e mesmo assim ele sorriu. E o brilho de admiração e amor que iluminou cada traço daquele rosto perfeito afastou de mim todas as inseguranças e medos da noite anterior.

Puta merda! Como ele conseguia?

– Oi! – deu o primeiro passo em minha direção.

– Oi.

Tentei parecer normal, mas me senti uma idiota com aquele sorriso imenso e bobo no rosto, e a pele do rosto quente, certamente rosada, entregando a reação do meu corpo, o que era, no mínimo, humilhante.

Ele se aproximou da cama e hesitou, mordendo o lábio de forma a me tirar o juízo. Nossa! Eu o queria.

– Seu pai ligou – avisou com certo receio.

– Ligou?

– Disse que precisou viajar mais cedo e me convidou para almoçar aqui... – olhou-me com mais atenção. – Com você – completou.

Ah, claro! Lógico que meu pai utilizaria Alex para ampliar a sua rede de domínio sobre a minha vida, e era mais lógico ainda entender que meu noivo não se fez de rogado ao aceitar tal condição. Estreitei os olhos enquanto tudo passava a fazer mais sentido para mim.

– Então ele resolve viajar mais cedo e, ao invés de me avisar, pessoalmente, por telefone ou até mesmo mensagem, ele prefere ligar para você e pedir que venha almoçar comigo?

– Charlotte! – Alex gemeu fazendo uma careta de desagrado. Ele parecia cansado.

– Não é estranho que o meu pai, que até poucos dias atrás, não queria nem pensar em me ver com um homem, qualquer que fosse o homem, agora seja completamente a favor do nosso casamento e até mesmo confia a minha “pureza” – acrescentei as aspas com as mãos – a você? – ele riu me encarando. – Não é estranho que não se dê ao trabalho de me avisar, mas...

– Não. Não é estranho – sua firmeza me calou. – Peter sabe que eu sou confiável.

E sorriu com aquela safadeza que quase me tomou o ar. Minha pele toda ficou arrepiada, principalmente porque ele desceu os olhos até encontrar minhas pernas expostas dobradas sobre a cama.

– É. Você parece ser – tentei ser sarcástica e desafiadora, embora tudo em mim já ansiasse por ele.

– E eu sou.

Alex se inclinou sobre mim, as mãos espalmadas em meu colchão, um joelho apoiado na cama e os lábios bem próximos dos meus. Oh, Deus! Ele me calou sem ao menos tapar a minha boca. Eu não tinha respostas, nem perguntas, nem questionamentos, nem nada. Em um segundo, todos os meus pensamentos se evaporaram e eu me tornei uma garota totalmente entregue.

Seus dentes capturaram meu lábio inferior. Uma leve pressão que conseguia repercutir no centro entre as minhas pernas. Quando ele puxou, bem devagar, meu lábio, eu... puta merda! O estremecimento chegou muito perto de me atirar naquele poço sem fim. Porque naquele instante, como se houvesse uma ligação direta entre meus lábios, minha mente e meu centro de prazer, eu senti o repuxar bem ali, naquele pontinho, exatamente na linha tênue que decidiria se eu cairia ou não no precipício.

Arfei!

– Puta que pariu!

Ele proferiu baixinho, e foi como se estivesse se libertando das amarras que o impediam de satisfazer as suas necessidades. No instante seguinte, ele me beijava e havia tanta paixão em seus lábios que eu me entreguei sem medo.

Alex me empurrou de encontro a cama, imediatamente minhas pernas estavam descruzadas e ele estava entre elas. Uma ferocidade nos consumia fazendo com que cada toque aumentasse a nossa ansiedade. Seu corpo colado ao meu se esfregava em mim como se implorasse para que nossas roupas se pulverizassem, para que assim então, finalmente, ele pudesse estar onde sempre desejou estar, dentro de mim.

Eu ouvia seus gemidos e o farfalhar dos lençóis protestando sob nossos corpos, assim como sentia a sua mão invadir minha camisa, apertar minha carne, buscando pelos meus seios. Porra, sentir sua mão em minha pele nua era como encontrar água depois de uma longa caminhada pelo deserto. Meu corpo todo vibrava, acelerado em uma corrida desenfreada na busca pela satisfação.

Ele levantou minha camisa até que o sutiã ficasse à mostra e, em seguida, com dedos afoitos, puxou-o para o lado e me apertou em sua mão. Meu corpo inteiro arqueou com o contato. Ele aprofundou o beijo, ainda gemendo e me apertou com mais vontade, encostando a palma no bico rijo. Uma sensação maravilhosa!

– Alex! – gemi baixinho. Era um pedido, uma súplica. Eu queria mais, queria tudo.

Seus dedos brincaram com o bico do meu seio enquanto ele desfazia o beijo e atacava com a mesma fome meu pescoço, ombros e colo, até que encontrou meu seio e o colocou na boca, chupando-o com ferocidade.

– Ah, Deus! Alex!

Eu não sabia se alguém conseguiria ouvir meus gemidos. Havia o risco, porém minha mente não encontrava nenhum motivo para parar.

Minhas mãos já estavam dentro da camisa dele, vasculhando aqueles músculos perfeitos, sentindo o contato pele com pele que tanto me satisfazia. Eu queria mais, então, forçando meu corpo contra o dele em um roçar delicioso, segurei o cós da sua calça jeans e a forcei para baixo, indicando o que queria e a minha urgência.

Ele se esfregou com mais força e correu a mão até sua calça para abrir o botão e libertar seu corpo também sedento de desejo. Mas em vez de forçar sua calça, ele correu a mão até o meu short e, afoitamente, lutou contra o botão duplo e praticamente escondido.

Que merda!

Era um daqueles shorts que possuía uma tira com dois botões que praticamente prendiam o short do lado do corpo e, depois de abertos, ainda havia mais dois botões escondidos que liberavam o zíper. Ou seja, era um verdadeiro cinturão de castidade.

Ele forçou, esticou, puxou, mas estávamos muito afoitos. Ele não queria desistir do que já tínhamos conseguido, como libertar meus seios para o seu bel prazer, então, enquanto lutava contra o meu short, ele mordiscava, chupava desajeitadamente, levando-me quase ao êxtase.

Em contrapartida, eu já estava bem avançada. Com a calça aberta, enfiei a mão por dentro da sua cueca e segurei seu pau sentindo-o latejar em minha mão. Quanta saudade daquela sensação!

– Ah, Charlotte! – ele rosnou em meu seio, mordendo-o com mais força.

Aquilo seria rápido. Nós sabíamos que depois de tanto tempo apenas desejando e imaginando, brincando com nossa sanidade mental, quando conseguíssemos ficar juntos seria realmente de enlouquecer.

Seu membro já estava molhado, liberando aos poucos seu sêmen e tornando o meu trabalho mais fácil. Massageei-o como pude, tendo em vista que nossos corpos não se desgrudavam e que ele não parava de se roçar em mim, cada vez com mais intensidade e rapidez.

Então ele desistiu de lutar contra a peça que se recusava a cooperar. Havia tanto fogo em cada gesto seu, tanta urgência que entendi o que ele queria sem que precisasse me dizer. Não dava para fazer como queríamos, mas também não era possível voltar atrás.

Assim, sua mão escorregou para dentro do meu short, lutando contra o espaço limitado, a posição que não favorecia sua própria necessidade, até que encontrou meu sexo, já absurdamente molhado e pronto para explodir. Seus dedos rapidamente agiram.

Dar uns amassos em Alex enquanto eu ainda era virgem era uma coisa. Dar uns amassos em Alex não sendo mais virgem, sem a necessidade de alguns cuidados, era algo extraordinário.

Eu senti seu dedo do meio afundar em mim com tanta vontade que quase gritei de prazer. Minha cabeça foi jogada para trás à medida que eu o sentia se afundando em minha carne e ao mesmo tempo esfregando a palma em meu clitóris. Meu corpo inteiro enlouqueceu, entrou em combustão, evaporou e se espalhou pelo universo.

Eu me tornei cada estrelinha existente no céu. Eu era todos os pontos e, ao mesmo tempo, era um único corpo. E o orgasmo me levou ao limite da existência roubando de mim cada sopro, cada sonho, necessidade e ansiedade. Eu não era mais nada e era tudo.

Com a mente voltando aos poucos, senti o pulsar forte do sexo de Alex que ainda estava em minha mão. Com o prazer eu o havia apertado com mais força, levando-o ao êxtase sem ao menos ter tido intenção. Bom... pelo menos não conscientemente.

Alex gemeu com o rosto entre os meus seios e se contorceu permitindo-se gozar. O líquido quente e espesso lambuzou minha mão e escorreu para a minha barriga. Eu não me importei. Alex respirava com dificuldade e gemia com a mão ainda enfiada entre as minhas pernas, então... do que eu poderia reclamar?

Ele foi relaxando e desfazendo a carícia. Seu dedo abandonou minha carne, a pressão da palma da sua mão desapareceu, sua respiração começou a normalizar e seu corpo afastou um pouco do meu. Sem conseguir conter a falta que tudo isso me fazia, aconcheguei-me a ele, que me recebeu com carinho, abraçando-me e se posicionando melhor na cama, deitando-se de costas.

– Precisamos arrumar essa bagunça – olhou preocupado para a porta. Imediatamente começou a se recompor, sem abandonar a cama ou a mim.

– Você fez a bagunça. Você limpa.

Ele sorriu e beijou de leve meus lábios. Pelo ardor que eu sentia no rosto e a barba por fazer de Alex, eu pude constatar que tínhamos feito um estrago bem maior do que o meu corpo melado pelo prazer do meu noivo. Com certeza meus lábios estavam inchados e vermelhos, assim como uma boa parte do contorno da minha boca. Provavelmente meu pescoço e busto estariam repletos de manchas vermelhas que demorariam algum tempo para desaparecer o que nos entregaria certamente, caso alguém resolvesse aparecer.

– Vou buscar papel no banheiro.

Ele pulou da cama e entrou em meu banheiro com tanta familiaridade que eu me perguntei se seria tão ruim dividir a minha vida com aquele homem.

Não. Não seria.

Alex voltou para o quarto quando eu estava justamente organizando tais pensamentos, e sonhando com momentos melhores do que aquele, sem o medo de sermos flagrados ou a necessidade tão urgente que sentimos por estarmos há tantos dias um sem o outro.

Pensando por este lado não estarmos casados também tinha a sua vantagem. Era gostoso o medo de sermos descobertos. Mordi o lábio e me espreguicei na cama, deliciada com a sensação de termos feito algo tão gostoso. A urgência de minutos antes também não existiria, já que casados, e com toda a liberdade de um casal que mora na mesma casa, teríamos sexo sempre que quiséssemos.

– O que está pensando? – Alex sentou na cama e começou a limpar a minha barriga. – Às vezes, você me deixa confuso, Charlotte – riu.

– Por que confuso?

– Porque eu deixo você no quarto, com cara de quem foi muito bem fodida, demoro dois segundos e a encontro com cara de quem esperava mais – foi a minha vez de sorrir.

– Primeiro: teoricamente eu não fui fodida, professor Frankli – vi a boca do meu noivo abrir levemente em um protesto mudo. – Segundo: sim, eu adorei. Foi maravilhoso! – ele tentou falar, mas o impedi. – Terceiro: apesar de ter sido maravilhoso, eu quero mais, sim. Sempre vou querer mais – brinquei ganhando aquele sorriso que esticava seus lábios apenas para um lado e deixava o meu professor ainda mais sexy. – Só que agora eu quero de verdade. Quero sentir você dentro de mim, Alex.

Meu rosto já estava vermelho e quente, então corar um pouco mais pela minha ousadia não seria tão desvantajoso. Os olhos de Alex se inflamaram e ele mais uma vez se inclinou sobre mim, buscando meus lábios.

– Primeiro – brincou mordiscando minha boca. – Você foi fodida, Charlotte, e não importa se pelos meus dedos ou por meu pau – porra! Alex sendo tão safado acabava comigo. Tive vontade de me contorcer. – Segundo: eu também adorei, porque gosto da sua mão quente, afobada e ousada em meu pau – nossa! Tudo começava a esquentar em mim. – Terceiro: eu também quero estar dentro de você. A intenção era esta, infelizmente sua roupa não ajudou muito – ele se afastou, voltando a deitar na cama.

– Se eu soubesse que receberia uma visita tão ilustre, teria providenciado algo mais fácil, como um lençol apenas – ele riu me puxando para perto e capturando meus lábios.

Foi um beijo mais calmo. Ainda existia desejo, saudade, tesão, tudo mais contido, sem pressa, sem urgência, apenas provando e saboreando o roçar de nossas línguas. E foi tão gostoso!

– Quero fazer amor com você – sussurrei assim que ele afastou a boca da minha.

– Tenho certeza de que quer – brincou apertando minha cintura e voltando a unir nossos lábios.

– Então... – avancei deixando subentendido o meu convite.

– Aqui? Agora?

– A ideia não era essa? – permaneci avançando, tocando-o, atiçando a sua pele.

– Não – riu se afastando. – A ideia era almoçarmos juntos, passar a tarde namorando no sofá e depois receber seus pais como eles merecem. Eu jamais planejaria desrespeitar a casa dos seus pais.

– Alex, você não cansa de ser frouxo? – riu com vontade. – Que droga! Esquece meu pai e toda a pressão que ele faz e apenas me tome. Porque é isso o que eu quero. Quero ser fodida. Aqui. Nesta cama. Agora. E que se foda o restante.

– Que boca suja, Charlotte!

Ele não estava aborrecido. Nem podia. Vários palavrões e palavras impróprias escaparam dos seus lábios enquanto seu dedo se afundava em mim e sua língua brincava com meus seios. Alex era um falso puritano.

– Você pode falar essas coisas, mas eu não?

– Exatamente – o azul dos seus olhos fixou nos meus.

– Por quê?

– Porque eu sou homem.

Por um instante acreditei naquela idiotice. Por um segundo me senti espantada por Alex ser um machista, um conservador. Logo em seguida, eu me dei conta de que só podia ser uma brincadeira, e ele riu, debochando de mim, fazendo com que eu me sentisse envergonhada por ter pensado tais coisas, mesmo sem verbalizá-las.

– Vá se foder, Alex – empurrei-o enquanto ele me abraçava e ria.

– Não, Charlotte! –repreendeu-me. – Palavrões só quando eu estiver te fodendo.

Seus dedos se afundaram em minha nuca, segurando meus cabelos com força, puxando-me para um beijo cheio de paixão e luxúria. Senti meu corpo inteiro reagir. O fogo voltando às veias, o latejar no centro das pernas, a respiração que parecia querer explodir os pulmões.

Foi quando ele desacelerou e se afastou. Eu avancei e ele me impediu de continuar.

– O que foi?

– É melhor não arriscarmos – a voz rouca e a pupila dilatada denunciavam o quanto ele também queria continuar.

– Alex...

– Não vamos arriscar, Charlotte. Seu pai pode chegar, a empregada pode nos entregar...

– Que se dane!

Eu sabia que não avançaríamos e senti raiva. Chegava a ser ultrajante ficar na abstinência de sexo depois de finalmente ter perdido a virgindade. A frustração me invadiu de maneira avassaladora.

– Merda! – dei um soco na cama, demonstrando a minha indignação.

– Calma, menina estressada – brincou tentando me animar. – Vamos ter todo o tempo do mundo. Logo, logo seu pai viaja outra vez e eu sequestro você por um final de semana inteiro.

– Você quer mesmo me alegrar com apenas uma suposição? – ele revirou os olhos. – Ele está viajando agora. Nós podemos ir para a sua casa e depois inventamos uma desculpa. Podemos dizer que resolvemos tomar sorvete depois do almoço ou caminhar na praia.

Pela cara de Alex, eu sabia que nada do que eu sugerisse seria levado a sério. Era mesmo uma droga! Por que ele estava tão decidido a não transar comigo? Por que Alex arrumava desculpas sempre que avançávamos mais um pouco. Meu Deus, eu nem virgem era mais! Por que aquele celibato fora de hora?

– Vamos almoçar, eu estou com fome – levantou da cama. Olhei para Alex sem acreditar. – É sério, amor! Hoje acordei muito cedo depois de passar boa parte da noite conversando com Patrício. Tive duas reuniões cansativas e acabei de gastar o que restava da minha energia. Preciso comer.

– Tá. Vamos comer.

Levantei sem muita empolgação. Eu queria ficar na cama e tentar ao máximo persuadi-lo. Transar com Alex tinha se tornado uma obsessão. Principalmente quando todas aquelas ideias ganhavam força em minha mente, ultrapassando todos os obstáculos que ele erguia quando estávamos juntos, certificando-me de que seu amor era real.

Eu me sentia frustrada.

Calcei as sandálias que estavam ao lado da cama, arrumei minhas roupas e passei as mãos nos cabelos, desfazendo a trança apenas para refazê-la outra vez.

– E Miranda, como está? – perguntou ao me dar passagem na porta.

– Um pouco abalada – meus pensamentos se voltaram para a minha amiga e o seu problema. – Eu não entendo o Patrício.

– Eu também não. Só sei dizer que ontem ele ficou mortificado quando viu Miranda com outro homem. Meu irmão nunca foi ciumento, nem gostou de cenas, muito menos se deu ao trabalho de se expor por causa de uma mulher.

– Ele é um cretino machista.

Descemos as escadas, Alex um pouco atrás e eu evitando olhá-lo diretamente.

– Não, ele não é. Patrício está apaixonado – não sei por que, mas me pareceu que Alex não gostou de admitir aquela parte.

– Não parece. Nunca vi um homem apaixonado acabar com uma relação que tinha tudo para dar certo.

– Eu não sei, Charlotte. Não me sinto confortável para conversar sobre a vida do meu irmão. Não que eu não confie em você, mas veja a nossa situação, ele é meu irmão e Miranda é com uma irmã para você. Nós dois temos lados para defender, então seria melhor não conversarmos ou nos envolvermos tanto.

– Eu já estou completamente envolvida – chegamos à sala e Odete estava terminando de colocar a mesa. – Não ignoro os problemas dos meus amigos – Alex me segurou pelo cotovelo, girando-me até que ficássemos de frente um para o outro.

– Não é disso que estou falando. Eu admiro a sua lealdade, a forma como você luta pelos que ama. Só que eu também sou assim, se ficarmos discutindo para provar os nossos pontos de vista, vamos acabar brigando e essa briga não é nossa.

Entendi o que ele havia falado, apesar de achar que seria impossível não estarmos outra vez em situações como a da noite anterior. Alex estava sério, encarando-me, aguardando meu sinal de que adotaríamos aquela postura. Tudo bem. Eu tinha mesmo que concordar.

– Certo. Não vamos conversar sobre esse assunto.

Ele me beijou com candura e brincou com minha trança.

– Tenho uma proposta para você – sua voz voltou a assumir um tom mais divertido.

– Uma proposta? – seu sorriso ficou imenso ao entender o caminho que meus pensamentos me levavam.

Uma proposta poderia ser um monte de coisa, mas algo dentro de mim só conseguia pensar nas mais libidinosas, impróprias e indecorosas.

– Sim. Antes desfaça esta cara de frustração e vamos almoçar.

– Isso não é justo – protestei. – Você sabe o quanto sou ansiosa. Vou morrer até o fim do almoço se precisar aguardar tanto para saber – ele me abraçou, rindo e me conduzindo para a sala de jantar.

– Vai ter que esperar. Seja uma boa moça e não coma demais por causa da ansiedade, isso pode se tornar um transtorno.

– Alex! Eu vou engolir o almoço. E nada de sobremesa – meu noivo riu ainda mais e o som do seu riso era música para os meus ouvidos.

– Posso repetir pelo menos?

– Não! – bradei sentando em uma das cadeiras e já começando a me servir.

A porta da sala abriu revelando Miranda e Johnny. Não sei se fiquei animada ou decepcionada com a chegada dos dois. A presença deles poderia atrapalhar a proposta que Alex queria me fazer.

– Ninguém espera mais os donos da casa – Johnny brincou correndo para o lavabo.

Miranda jogou a mochila no sofá e deu uma olhada estranha para Alex, depois foi também para o lavabo. Eu não sabia o que poderia esperar daquele almoço.


CAPÍTULO 21


“Amor não teme o tempo, muito embora seu alfanje não poupe a mocidade; Amor não se transforma de hora em hora, antes se afirma para a eternidade. Se isso é falso, e que é falso alguém provou, eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.”

William Shakespeare


CHARLOTTE


Almoçar naquele clima foi quase insuportável. Johnny, por incrível que pareça, não tornou tudo mais difícil. Ele conversou com Alex, sem perguntar por Patrício ou fazer qualquer comentário sobre a noite anterior. Imaginei que entendeu o quanto magoaria Miranda e, como um bom amigo, preferiu não tocar no assunto.

Alex se mostrou mais acessível para com o meu amigo, respondendo cada vez que questionado e debatendo livremente sobre times de futebol, jogos olímpicos ou qualquer outro assunto levantado. De tempos em tempos, ele segurava a minha mão ou acariciava o meu rosto, o que me acalmava.

O que me incomodava mesmo e, pelo visto fazia com que todos sentados à mesa agissem como se estivessem pisando em ovos, era o fato de Miranda ter permanecido calada, remexendo na comida sem real interesse. Ela havia lançado um olhar de fúria para Alex, quando se sentou à mesa, e ignorou deliberadamente seu cumprimento, mas isso foi tudo. Minha amiga estava triste, o que me entristecia também, além de aumentar a raiva que eu sentia pelo meu futuro cunhado.

Contudo, Alex tinha razão. Não poderíamos deixar que aquela confusão nos afetasse. Eu amava a minha amiga, queria o melhor para ela, só não destruiria meu relacionamento porque ela e Patrício destruíram o deles.

– Todos os sábados eu encontro alguns amigos no fim da tarde para uma partida de futebol. É em um campo alugado, na altura da Penha. Não é nada profissional e é bem divertido, apesar de que eu sou um verdadeiro jogador – revirei os olhos enquanto meu amigo ria. – É sério! Charlotte sabe que eu jogo bem – Johnny brincou. – Quando quiser aparecer, vai ser bem bacana.

– Legal! – Alex respondeu de maneira jovial demais, o que me fez rir. – Eu encontro um grupo de amigos uma vez por mês para jogarmos basquete. Você curte?

– Não – Johnny fez uma careta. – Não entendo nada de basquete, mas valeu mesmo assim.

Miranda permanecia calada e parecia não ouvir nada do que dizíamos. Eu queria encontrar um assunto que pudesse interessá-la, mas nada me vinha à cabeça. Além do mais, ela começou a receber mensagens, e toda a sua atenção, que antes não estava em nada, voltou-se para o celular.

Ela parecia enfurecida, indignada, como se as mensagens a aborrecessem mais do que qualquer outra coisa naquela mesa. Eu não tive tempo de perguntar o que estava ocorrendo, pois quando pensei em arrumar algum jeito de ganhar a sua atenção sem que os outros percebessem, a porta de casa se abriu e meu pai entrou segurando minha mãe pela cintura.

Eles levavam apenas uma pequena mala de mão e vestiam roupas informais, o que não era habitual, já que viajaram a trabalho. Minha mãe parecia cansada. Esgotada para ser mais precisa. E meu pai a segurava como se ela precisasse do seu apoio para se manter de pé. Porém, ao notar a nossa presença, ela sorriu e pareceu ganhar mais energia.

– Vamos, Peter! Eu já estou melhor. Deixe-me abraçar as minhas meninas – reclamou, mesmo assim meu pai não a deixou, acompanhando-a até que estivesse próxima o suficiente para nos abraçar.

Só então notei que Alex havia levantado, parecia preocupado e se postou ao lado deles dois como se estivesse pronto para socorrer a minha mãe a qualquer momento. Não deveria ser estranho, uma vez que eu sabia que meu noivo era realmente um cavalheiro. Ele nunca permaneceria sentado apenas vendo uma situação como aquela, no entanto me pareceu estranho que ele tivesse percebido o mesmo que eu tendo tão pouco tempo de convivência com aqueles dois.

Minha mãe me abraçou com força. Ela estava fria, apesar de o dia estar quente.

– Que roupas são essas, Charlotte? Meu Deus! Será que não aprendeu nada do que eu te ensinei? E esses cabelos? –largou-me para abraçar Miranda, que ficou extremamente inquieta. – Como foi ontem, minha querida? Pelo visto nenhuma das duas aprendeu a se vestir adequadamente à mesa. Veja só você ainda trajando roupas de ginástica – minha amiga sorriu desanimada e nada respondeu. – Johnny, espero que tenha cuidado bem dessas meninas.

– Claro que sim, madrinha! – meu amigo abraçou minha mãe com delicadeza, o que também era estranho.

– Alex, como está? – deu dois beijos no rosto do meu noivo, que a amparou como se ela precisasse disso. – E seus pais?

– Estamos todos bem, Mary. Como foi de viagem? – ele olhou para meu pai como se dividissem um segredo.

– Deu tudo certo. Peter nunca erra – ela disse um pouco sem graça, mas sem perder a postura.

– E exatamente o que vocês foram fazer? Aliás, para onde mesmo vocês foram? – comecei a perguntar achando tudo muito estranho.

– São Paulo – meu pai respondeu. – E fomos tratar de negócios. Assuntos entediantes e complicados até mesmo para uma cabeça cheia de engrenagens como a sua, Charlotte – estreitei os olhos. Por que meu pai me achava tão incapaz? – Como foi ontem? Cuidou bem da minha filha? – deu um tapinha no ombro do meu noivo que sorriu sem graça.

– Foi uma noite tranquila – e foi a sua vez de trocar um olhar confidente comigo.

– Terminem de almoçar – minha mãe os cortou. – Eu e Peter já comemos no jatinho. Vou subir e descansar um pouco, vejo vocês mais tarde.

– Eu vou te acompanhar – meu pai segurou novamente na cintura da minha mãe, auxiliando-a.

– Eles estão estranhos – pensei alto demais e notei o olhar de Alex em mim.

– Saíram bem cedo e Mary deve estar esgotada.

– Deve ser isso mesmo – concordei voltando a sentar para finalizar o almoço.

– Com licença, já terminei, eu não estou com fome. Vou para o meu quarto.

Miranda simplesmente se retirou sem se importar com qualquer questionamento meu. Ela subiu as escadas tão rápido que ultrapassou os meus pais. Consegui ouvir um resmungo de Peter e uma das suas desculpas esfarrapadas.

– Essa sim está estranha – Johnny falou assim que nossa amiga sumiu das nossas vistas.

– É um momento complicado. Talvez se Patrício tivesse sumido da vida dela, a esta altura Miranda já estivesse refeita. Enquanto ele continuar achando que tem direito de cobrar alguma coisa, a situação só vai piorar – expliquei.

– Ele não vai mais aparecer – Alex se manifestou. – Quer dizer... vai ser complicado impedir que eles se encontrem, pois é inevitável que as nossas famílias se reúnam, mas Patrício vai deixar Miranda em paz.

– Seria ótimo se fosse verdade – quase rosnei com meus argumentos formados. – Quem você acha que estava enviando aquelas mensagens? Viu como Miranda ficou aborrecida? Tenho certeza de que seu irmão está aprontando outra vez.

Alex soltou o ar dos pulmões e se encostou na cadeira, os olhos grandes, fixos em mim, como se não acreditasse em minha teoria.

– Se for verdade, eu lavo as minhas mãos. Eles dois são maiores de idade, não posso ficar pajeando meu irmão, tenho coisas mais importantes para fazer.

– Pois eu não lavo as minhas. Não quero Patrício rondando a minha amiga, fazendo um escândalo em cada lugar que se encontrarem...

– Charlotte, nós já conversamos sobre isso.

– Não tem nada a ver com nós dois, Alex, e sim com a minha lealdade à minha amiga.

– Bom, eu vou embora – Johnny levantou. No rosto tinha uma expressão divertida. – O que posso dizer é que esses dois ainda vão dar muito o que falar, então economizem nas brigas. Já fui! Diga ao padrinho que encontro vocês amanhã na igreja.

Droga! Igreja significa ouvir sermão, comungar e, consequentemente, confessar-me, coisa que eu evitava a todo custo.


ALEX


Conversar com Charlotte sobre os problemas do meu irmão com a amiga dela se tornou um campo minado, por isso mesmo seria melhor evitar a todo custo. Graças a Deus eu tinha planos que atrairiam a sua atenção com muita facilidade, inclusive evitando que minha noiva continuasse pensando na situação da mãe dela, como eu havia percebido.

Charlotte não era tão boba a ponto de ver tantos indícios e deixar passar. Certamente ela já imaginava que alguma coisa estava errada com a mãe dela. Seria muita ingenuidade acreditar que um problema como aquele passaria despercebido aos olhos da minha noiva. Quando Charlotte juntasse dois mais dois, não haveria mais nada a esconder.

– Ainda quer saber qual será a minha proposta?

Rapidamente suas feições mudaram de aborrecida para ansiosa. Os olhos dela brilharam e seus lábios rosados se abriram levemente em expectativa.

– Porque eu estava pensando em qual será a sobremesa.

– Sem sobremesa – levantou rapidamente segurando a minha mão. – Vamos. Onde quer me contar? Podemos ir ao meu quarto e...

– Aqui na sala mesmo. Preciso do seu notebook – suas sobrancelhas se uniram enquanto ela me observava sem entender. Vamos sentar bem ali, naquele sofá – e ela não conseguiu esconder o seu desânimo.

– Vou buscar o notebook.

Fui para a sala e estudei o melhor ângulo para fazermos aquilo. Precisávamos de uma visão mais ampla do ambiente, principalmente das escadas, mas que também nos deixasse confortáveis.

Charlotte desceu pouco tempo depois. Segurava o computador, mas parecia absorta em sua conversa com o pai, que a acompanhava. Peter estava tranquilo, tinha trocado de roupa e parecia se divertir com o que a filha dizia, já ela aparentava estranhar alguma coisa e argumentava enquanto ele só sorria e afagava suas costas.

– Vou verificar algumas coisas no escritório – falou um pouco mais alto e diretamente para mim. – Preciso ler alguns contratos e avaliações. Deixei algumas planilhas acumuladas, pretendo passar boa parte da tarde trabalhando. Se precisarem de mim, estarei logo aqui.

Concordei com um aceno de mão e o vi entrar no local que deduzi ser o seu escritório. Charlotte veio em minha direção, estava perdida em pensamentos e parecia tentar entender alguma coisa. Era isso, ela começava a juntar os pontos. Eu precisava agir.

– Venha aqui.

Segurei em sua mão e sentei no sofá puxando-a para que sentasse de costas para mim, de forma que eu pudesse abraçá-la pelas costas e visualizar a tela do computador.

– Vamos fazer uma pesquisa

– A sua proposta é essa? Pesquisar na internet? – ri da sua ansiedade. Seria bom deixá-la ainda mais ansiosa.

– Tenha calma, Charlotte. Deixe eu digitar o endereço do site.

Sem nada acrescentar, comecei a digitar o endereço da loja que eu costumava comprar alguns “acessórios” para as minhas brincadeiras. Fiz questão de fazer tudo sem muita pressa, deixando Charlotte absorver cada informação fornecida e, à medida que a imagem abria na tela, eu a sentia enrijecer.

– Pronto. Vamos fazer compras.

– Com... compras? Mas isso é...

– Uma loja, amor. Tenha em mente que não podemos chamar atenção. Assim... – movi o computador em seu colo deixando a tela o mais protegida possível. – Pronto, agora podemos começar a comprar.

– Mas... – ela virou um pouco para me olhar. Tentei ficar o mais sereno possível, embora a minha vontade fosse de rir da cara dela. Charlotte ficava realmente deliciosa quando seu corpo lutava entre a surpresa e a excitação. – O que você... – engoliu em seco. – O que você está planejando?

– Vamos olhar as novidades – dei um beijo rápido em seus lábios. – Preciso repor alguns produtos que gosto muito.

– Repor? E de que forma eles acabaram? – ri. Ela era muito engraçada com toda aquela confusão.

– Alguns perderam a validade – pisquei ainda sorrindo. Ela pareceu ficar perdida enquanto me olhava, depois puxou o ar com força e virou para frente. – E alguns eu quero testar com você – sussurrei em sua orelha sentindo seu corpo retesar.

– O que tem em mente, professor Frankli?

– Hum! Veja isso – apontei para a tela mantendo minha voz baixa. – Um vibrador para uso do casal. Uso simultâneo? Interessante – e era mesmo.

Nunca tinha visto um daqueles. As imagens, desenhos na verdade, deixavam o produto ainda mais instigante. Encaixava na mulher, estimulando seus pontos internos, ao mesmo tempo uma parte ficava fora, estimulando o seu clitóris e, convenientemente, estimulando o pênis durante a penetração.

A reação de Charlotte foi a melhor parte. Senti seu maxilar travar, enquanto ela engolia ruidosamente. Pelo contato entre nossos rostos eu podia jurar que ela corava deliciosamente e, por Deus, eu mataria para ter acesso a seus pensamentos. Daria o mundo para assistir de camarote tudo o que aquela cabeça engenhosa, capaz de imaginar as cenas mais quentes possíveis, estava projetando.

Sem conseguir me conter, beijei seu rosto e aspirei seu cheiro. Porra, eu estava morto de saudade daquela garota.

– Vamos comprar? – não ignorei minha voz rouca de desejo, nem quis disfarçá-la.

– Mas... olha só o preço, Alex? Não é muito caro para um... – ela se deteve, sem coragem para pronunciar a palavra.

– Vibrador – sussurrei, mordendo sua orelha. Charlotte estremeceu. Ótimo! – Você vai gostar – segurei a sua mão fazendo-a clicar no botão para comprar. – O que me faz pensar se não seria bom comprar para você outra coisinha que vende neste site.

Ela hesitou ainda com a mão sob a minha. Eu podia sentir a tensão e o tesão que minha noiva emanava e estava adorando tudo aquilo. Levei sua mão até o botão que eu precisava e aguardei enquanto a página abria. Charlotte respirou alto e depois prendeu a respiração.

– E então, o que me diz?

– Mas isso é... – sua cabeça pendeu para o lado enquanto ela analisava as imagens diante dela. – Tem certeza que... mas... – ri me deliciando com a sua confusão.

– Isso é um consolo, ou vibrador, ou pênis de borracha – e pude vislumbrar sua orelha ficando vermelha com tanta intensidade que quase ri.

– Mas é para...

– Exatamente.

– Sozinha? Quer dizer... quando eu estiver praticando os meus exercícios de casa... porra, Alex! – ela retirou a mão e se abraçou.

– Sozinha, se você quiser, desde que não escolha algo que desvalorize o meu material.

Ri um pouco pensando se Charlotte escolheria um estilo não tão normal para os nossos padrões, algo mais longo e grosso, ou até mesmo se ela teria coragem de escolher alguma coisa. E foi então que me vi ansiando para que ela escolhesse, para que ela me mostrasse até onde iria a sua ousadia.

– Escolha. Tem vários tipos, tamanhos, cores...

– Alex! – ela suspirou desviando o rosto.

– É definitivamente melhor do que o dedo, Charlotte.

– Porra! – rosnou ao sentir meu braço segurando-a pela cintura, puxando-a para mais perto. – Eu não... não sei qual escolher.

– O que você quiser, continue olhando para a tela ou alguém pode aparecer e desconfiar – ela, muito vagarosamente virou o rosto de volta para a tela. – Agora escolha o que mais te agrada. O que prefere, algo mais realista ou esses mais fininhos que possuem esta parte estimulante – ri sentindo-me um bobo. – Realmente não estou muito familiarizado com esses artefatos, mas estou curioso. O que você deseja, meu amor?

– Eu desejo você. O corpo inteiro e não apenas uma parte, apesar desta ser muito importante e fundamental – ela olhava a tela atentamente. Muitos pênis, de diversas cores e tamanhos se exibiam na tela do computador. – Eu desejo sentir o seu corpo sobre o meu enquanto esta parte mais importante faz o trabalho dela.

Beijei seu pescoço e ela se encolheu, gemendo baixinho.

– Eu também prefiro estar em cima de você, enquanto a minha parte mais importante faz o trabalho dela, embora no momento esteja ansioso só de imaginar você com um desses.

– Você quer me ver usando... – engoliu com dificuldade – ... isso?

– Eu posso usar isso em você.

– Alex...

– Posso usar isso e o meu pau, é só você deixar – mordi o lábio desejando ver a expressão no rosto da minha noiva com uma sugestão tão picante.

– Estamos falando de anal?

– Fale baixo, Charlotte – ela riu.

– Não estou muito certa sobre este ponto – conteve um pouco mais a voz.

– Comprar um consolo?

– Não – e ficou em silêncio enquanto aguardava que eu entendesse o seu recado. E eu entendi.

– Primeiro: eu sei que você quer. Segundo: eu sei que você vai adorar. Terceiro: eu sei que eu vou adorar.

– Mas eu não...

– Você. Vai. Adorar – beijei seu pescoço enquanto dividia as palavras com bastante ênfase.

– Deus! – ela estremeceu e eu tive vontade de tomá-la ali mesmo, naquele sofá, e que Peter, Mary e Miranda fossem às favas.

– Amor, vamos fazer assim – forcei um pouco o meu corpo para frente e pedi para abrir mais uma aba, digitando o site de uma grande livraria.

– Vamos comprar livros?

– Não. Vamos criar um álibi. Caso alguém chegue podemos fechar rapidamente a aba do sex shop e fingir estarmos olhando as novidades no mundo literário.

– Ah! – outra vez sua cabeça pendeu para o lado. – Você é um estrategista, Alex.

– Sou precavido, apenas isso. Agora... – voltei à página inicial. – Vamos escolher logo qual vai ser.

– Escolha um para mim.

Não era o que eu queria, porém seria exigir demais dela aquela decisão, então, talvez como uma forma inconsciente de defender a minha dignidade, escolhi um que em nada se parecia com um pênis, rosa, longo e fino, que vibrava e girava para atingir todos os pontos sensíveis daquela vagina maravilhosa. Porra! Como eu queria poder assistir Charlotte usando um daqueles.

– Rosa?

Foi a minha vez de ficar sem graça, pois a semelhança da cor realmente influenciou na minha escolha, além de despertar o que havia de mais feroz em mim.

– Para uma garotinha travessa – brinquei segurando o seu rosto para um beijo rápido. – Vamos olhar mais algumas coisas.

– Aquele gel que esquenta tudo – ela disse um pouco mais animada. – E o que esfria.

– Certo. Vamos para esta seção. E depois vamos dar uma olhada nos anéis penianos.

– Anéis penianos?

– Ah, amor, você vai adorar os anéis penianos!


CHARLOTTE


– Alex, eu estava pensando em...

Meu pai entrou na sala nos pegando de surpresa. Lógico que eu fiquei exaltada imediatamente, mas Alex... Alex nem parecia que estava comprando putaria com a filhinha do papai. Jesus Cristo! Minha mão tremia tanto que precisei da ajuda do meu namorado para trocar as abas.

– Estou interrompendo alguma coisa?

– Não – Alex falou naturalmente. – Estamos olhando livros. Eu estava sugerindo alguns para Charlotte.

– Ah, sim. Se existe uma coisa neste mundo que Charlotte gosta, é comprar livros. Temos inúmeros em todas as nossas casas.

– Pai!

Tentei fazê-lo parar de falar de mim e dizer logo o que estava querendo, afinal de contas, era uma droga estar com a calcinha molhada, excitada, com o meu pai sorrindo como se eu ainda fosse a sua garotinha.

– O que o senhor queria dizer mesmo?

– Bom, eu estava pensando que seria ótimo se nos acompanhasse à missa dominical, amanhã bem cedo, assim conheceria o padre Messias. Ele nos acompanha desde que chegamos ao Brasil, e é o conselheiro de Charlotte. Eu faço questão que ele realize a cerimônia de casamento de vocês dois.

– Pai! – realmente fiquei irritada. – Nós ainda não decidimos nada. Por favor, não faça esta pressão.

– Que pressão? Cedo ou tarde Alex vai precisar conhecer o padre Messias, então por que não amanhã? Tem algum problema para você, Alex?

– Tem – respondi antes que meu namorado aceitasse a proposta do meu pai. – Ele joga basquete com alguns amigos aos domingos, pai.

– Charlotte... – Alex me interrompeu. – Vai ser ótimo acompanhá-los à missa.

– Não, não vai – ele retirou o computador do meu colo e fechou a tela. – Você pode conhecer o padre Messias em outro momento.

– Vai ser bom se ele tiver tempo para conhecê-lo, Charlotte.

– Alex, você não precisa fazer isso.

– Mas eu quero – meu namorado rebateu, e alisando uma mecha de cabelo meu, sorriu daquela forma desconcertante. – E o basquete é na próxima semana – piscou fazendo-me sorrir também.

– Então nos encontramos amanhã. Eu vou verificar como Mary está, comportem-se.

– Acho que não estou convidado para o jantar – Alex brincou em minha orelha assim que meu pai subiu as escadas.

– Não seja tolo!

Mas eu sabia que ele tinha razão. Meu pai jamais aprovaria que meu namorado ficasse em minha casa por tanto tempo, principalmente sem a sua supervisão. Era de se esperar, mesmo assim fiquei decepcionada.

– Nós poderíamos ir ao cinema e depois jantar fora – Alex respirou fundo e se endireitou no sofá, foi o suficiente para eu saber que ele recusaria o convite.

– Tenho muito trabalho hoje, Charlotte.

– Vai ser assim? – virei para encará-lo.

– Assim como?

– Você. Vai ficar se esquivando de mim o tempo todo. Vai fazer isso por um ano inteiro? – ele sorriu sem graça e me beijou rapidamente.

– Deixe de bobagens. É invenção da sua cabeça, amor.

Cruzei os braços, estreitando os olhos sem acreditar no tamanho da sua cara de pau. Será que Alex achava que eu era tão idiota? Foram muitas desculpas, muitos momentos perdidos e eu tinha certeza de que não seria desse jeito se eu tivesse aceitado o casamento.

– O que foi? – voltou a se encostar ao sofá, olhando-me com receio.

– Fico imaginando o que passa em sua cabeça para estar com uma menina tão burra! Uma idiota que cai em todas as suas desculpas esfarrapadas. Eu sei o que está fazendo, então por que não abre logo o jogo comigo, Alex?

Meu namorado levantou o corpo, apoiando os cotovelos nos joelhos e, após passar longos minutos encarando as próprias mãos, o que parecia uma eternidade, voltou-se para mim e começou.

– Tudo bem, Charlotte. Você não é burra nem idiota e eu sei muito bem disso – coçou a cabeça e fez uma careta. – Eu não me sinto confortável. É isso o que está acontecendo.

– Como assim? O que está tentando dizer? Somos namorados!

– Noivos.

– Noivos. Certo. Melhor ainda. Somos noivos! O que mais você queria? Todos os casais transam e, pelo que me lembro, isso não foi problema quando você me comeu no chão daquela cabana.

– Deus, Charlotte! – seu tom de censura fez meu rosto arder, mesmo assim não recuei.

– O que mudou? Só porque meu pai está na jogada agora?

– É. Porque o seu pai está na jogada agora. Merda, Charlotte! Você não sabe como eu me sinto.

– Mas eu sei como eu me sinto sendo rejeitada pelo homem que há poucos dias não tinha hora nem momento para me levar para cama. Se eu soubesse que seria assim após perder a virgindade, teria me mantido virgem, pelo menos eu teria muito mais de você.

Ele riu, balançando a cabeça, bagunçando o cabelo com ambas as mãos. Eu adorava aquilo.

– Eu não poderia manter você virgem por muito mais tempo. Costumo perder a cabeça quando estamos sozinhos – seus olhos de um azul profundo me prenderam no lugar, sugando-me para dentro do seu mundo. E havia fogo ali. Muito fogo.

– Estamos sozinhos agora – desafiei, mas ele me respondeu com uma careta de desagrado.

– O problema é esse, amor. Nunca estamos sozinhos. Eu sinto os olhos do seu pai em mim a cada instante que toco em você, e isso é... frustrante! É péssimo! Pesa em minha consciência.

– Por quê?

– Ora, Charlotte, você sabe muito bem por quê. Ele quer que você case virgem. Eu fui a pessoa que ganhou a confiança dele, e já entrei nessa mentindo. Nem quero imaginar como seria se ele... se ele desconfiasse de algo.

– Você. É. Frouxo! – quase gritei. Eu estava com tanta raiva. – E se é para pensar assim então vamos pôr um ponto final em tudo.

Os olhos de Alex ficaram imensos. Ele me encarou sem acreditar no que eu tinha acabado de dizer. Eu mesma não conseguia acreditar. Nem era o que eu queria. Nunca foi.

– Vamos voltar a ficar escondidos – tentei corrigir, apesar de a merda já ter sido feita. – Droga, Alex! Não entende o quanto é frustrante para mim também?

– Não sou eu quem está se negando a resolver a situação.

– E quem está? Eu?

Merda! Eu estava. Eu estava porque a solução era o casamento. Pelo menos na cabeça louca dele e do meu pai.

– Não é justo usar o sexo para me convencer, Alex. Eu não vou casar apenas para conseguir transar com você.

– Não é justo comigo também – ele rebateu com fúria, porém contida, o que me fez recuar. – Droga! – rosnou levantando para encarar o lado de fora através da varanda.

– Desculpe! – tentei evitar o pior. – Eu já disse tudo o que pensava e não sei mais o que dizer para te convencer de que me casaria com você quantas vezes fossem possíveis, só que não assim, não sob pressão e não tão rápido.

– Eu acho... – virou em minha direção. As mãos nos bolsos e os olhos sem o brilho habitual – ... eu acho que o que sinto por você supera qualquer coisa. O amor que eu sinto faz com que qualquer outra coisa seja apenas um detalhe. Eu quero você como minha esposa! Quero não me sentir cobrado todas as vezes que dormirmos juntos, não me sentir pressionado. Sabe o que eu penso quando você age assim? Eu penso que não sou quem você quer. Porque eu tenho certeza, e você tem tantos “mas” que coloca a certeza em último lugar.

– Você não pode dizer isso – minhas palavras quase não saíram. Estavam presas pelo choro contido. Eu não queria machucá-lo. – Eu te amo, Alex! Não agora, não porque quase te perdi, nem porque ficamos em uma situação que me forçou a entender o que eu sentia. Eu te amei primeiro, lembra? Antes de tudo acontecer. Antes de entender ou aceitar que existiria um “depois”. Eu já te amava!

– Eu também. Eu te amei quando você me forçou a levá-la para a minha casa, bêbada, e me pediu para fazer amor com você. Eu já te amava, só não sabia como fazer o “depois” acontecer.

Mordi o lábio contendo as lágrimas. Eu não sabia mais se eram de emoção ou de arrependimento por não conseguir dar aquele passo.

– Eu espero um ano, Charlotte, só que, assim como eu, você também vai precisar ter paciência – gemi baixinho. Era a declaração de que não teríamos os nossos momentos.

– Você não vai transar comigo, não é? Não até me convencer a fazer como você quer.

– Por Deus, Charlotte! Eu... eu não sei como será, só não quero que seja com o seu pai nos observando por cima dos nossos próprios ombros. Vamos respeitar a vontade dele e fazer do seu jeito.

– O jeito dele é sem sexo – minha amargura estava presente em minhas palavras.

– Então que seja – sua expressão dura e carrancuda deixava claro que o assunto estava encerrado.

Escondi o rosto entre as mãos e respirei repetidas vezes até que toda a minha raiva estivesse contida. Então levantei e ajustei o short e a camiseta. Depois dei as costas e fui em direção à escada.

– O que vai fazer? – ele disse entre assustado e surpreso.

– Vou buscar o xadrez, já passou da hora de entender como aquilo funciona.

Alex riu baixinho, e eu não evitei bater o pé nos degraus a cada passada.

 

 


CONTINUA