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Adam estava amarrando sua gravata quando Langford entrou no cômodo para que os três pudessem tomar cerveja em uma taverna antes de voltar para casa.
— Contou para ele? — Langford perguntou enquanto se apoiava em uma parede, observando.
Adam o ignorou.
— Contou o quê? — Brentworth questionou.
— Ele já está de olho em uma mulher. Comprou joias para ela.
Brentworth virou a cabeça e olhou para Adam. Uma de suas sobrancelhas se ergueu.
— A Temporada ainda está no começo. Duvido que já tenha visto todas as possibilidades.
— Essa não vai aos bailes e festas — Langford explicou. — Não está entre as possibilidades jovens de que fala.
— Agora me intrigou — Brentworth disse. — Quem é, Stratton?
Adam vestiu seu colete e sua sobrecasaca.
— Se não contar, eu conto — Langford ameaçou. — Por motivos que só ele sabe, decidiu cortejar Lady Clara Cheswick.
— A irmã de Marwood? Ou, para ser exato, a irmã mais velha de Marwood? Você tomou uma pancada na cabeça enquanto estava na França, Stratton? Soube que a mais nova é única, mas Lady Clara, mesmo quando era jovem, havia poucos que a recomendavam por ser espirituosa.
— Espirituosa demais — Langford completou.
— Eu gosto — Adam revelou. — Homens que temem isso em uma mulher são covardes.
— Bom, suponho que ela também seja bem bonita — Brentworth concedeu.
— Que seja — Langford disse.
— E soube que ela herdou uma boa fortuna do pai — Brentworth complementou sem cerimônia.
— Stratton é o último homem que precisa de uma fortuna, boa ou ruim — Langford comentou. — Além disso, não acha o interesse dele em uma mulher daquela família, mesmo que seja muito bonita e que tenha espírito e uma boa fortuna, altamente suspeito?
— Acho, de fato. O que está tramando, Stratton?
Terminando de se vestir, Adam encarou-os.
— O que pensam que estou tramando?
— Vamos jogar esse jogo, então? Langford e eu vamos pensar nesse assunto no caminho da taverna. Ouso dizer que vamos descobrir tudo em cinco minutos de esforço.
Dez minutos mais tarde, sentados na taverna, Brentworth falou de novo.
— Concluí que há três motivos possíveis para essa corte peculiar.
— Três? Você pensa rápido.
— Pare com isso — Langford disse, direto. — Todo esse mistério pode impressionar mulheres e homens estúpidos, mas nós o conhecemos. Lembre-se disso.
Adam bebeu sua cerveja.
— Motivo um — Brentworth anunciou. — A grande fortuna dela é melhor do que sabemos e, de alguma forma, engrandece a sua de maneiras que desconhecemos.
Adam o deixou falar.
— Motivo dois: ela é muito bonita de um jeito único. É possível, suponho, que seu jeito único seja mais atraente para você do que para mim.
— É isso, Stratton? — Langford perguntou, incrédulo. — Não sei... Os olhos dela são brilhantes e provocadores, é verdade, mas a boca é muito grande e... Acho que alguns homens podem achá-la... — As palavras dele sumiram.
— Motivo três. — Brentworth se inclinou na direção de Adam, do outro lado da mesa. — Persegui-la, de alguma forma, ajudou você a voltar. Ela é um meio para um fim.
Adam ficou tentado a parabenizar Brentworth. Ele sempre tivera uma mente afiada, que estava disposta a considerar alternativas que outros, como Langford, não conseguiam pensar. Naquele momento, Langford parecia envergonhado por Brentworth ter insinuado que o interesse de Adam em Lady Clara não era pelo menos dois terços romântico, nem especialmente honroso.
Langford ficou olhando de Adam para Brentworth, e de volta para Adam, como se esperasse uma briga, ou pior. Todo o seu corpo ficou tenso, pronto para impedir socos, caso acontecesse.
— Vejo que tem uma opinião muito apurada de mim — Adam iniciou. — Mais do que eu tenho com a maioria dos homens. No entanto, no fim, você tem uma causa, e homens com causas fazem escolhas por diferentes motivos do resto de nós.
— Minha causa não exige Lady Clara. Eu acho a senhorita intrigante e longe de ser entediante. Ela precisa ser um pouco domada, isso é verdade, mas faz parte da diversão. Quanto aos olhos e à boca dela, Langford pode achar que são defeitos, mas ambas as características me seduzem a fantasias de prazer. Ouso dizer que teria conspirado para tê-la, independente da família dela.
— Ah, parece que está mentindo — Langford disse.
— Fico aliviado de ouvir isso. Aquela conversa da senhorita me deixou pensando que pretendia se casar. É uma sedução que você não tem com que se preocupar.
— Eu definitivamente planejo uma sedução. — Planejava mesmo. Ela nunca aceitaria aquela proposta. Ele soube disso ao fazê-la. Mas permitia-lhe ter desculpa para segui-la, entretanto, e ter um motivo para futuras conversas e visitas.
Langford ficou apenas esfregando as mãos. Agora eles abordaram um de seus assuntos preferidos. Mestre naquilo, nunca falhava em dar um conselho excelente. Aguardava um pedido agora.
Brentworth, sempre mais cético e prático, espreitou, crítico novamente.
— Espero que não esteja pensando em forçar o irmão a duelar a fim de proteger a honra dela. Não vai dar certo. Ela não é uma garota, e possivelmente não é inocente, e o jovem Theo nunca seria tão audacioso.
— Não tenho interesse em duelar com o irmão, ainda mais pela honra dela. Estou apostando que ele não dê muita atenção a ela.
— Que bom.
— Viu algum progresso? — Langford perguntou. — Ela não é conhecida por cair facilmente nas adulações dos homens ou tratar admiradores com gentileza.
— As coisas estão progredindo depressa.
— O que isso significa? Fale claramente, homem. Já a beijou? Se não, aquelas joias são otimistas demais.
— Ele não vai lhe contar — Brentworth disse, impaciente. — Nunca contou suas conquistas anteriores, e duvido que isso tenha mudado. Olhe para ele, divertindo-se e presunçoso com nossas perguntas. A menos que o flagre, pouco será revelado.
Langford deu risada.
— Stratton, permita-me lhe pagar outra rodada.
— Quando eu tiver algo realmente interessante para relatar, você será o primeiro a saber. Eu incluiria Brentworth, mas ele é muito superior a isso agora.
— Não sou tão superior quanto sou grato por isso. Temi que tivesse intenções reais. Afinal, o próprio pai dela não a achava adequada para um duque — Brentworth falou de maneira direta, como se compartilhasse um conhecimento comum.
— O que quer dizer? — Adam perguntou.
Brentworth deu de ombros.
— O velho me abordou desinteressadamente sobre isso há uns três anos. Senti que ele tinha uma obrigação paterna de tentar casá-la e me viu como possibilidade, mas nada do que ele dizia encorajaria um homem a se unir. Era um pouco como alguém tentar lhe vender um cavalo, mas mencionar todos os defeitos de sua postura e comportamento.
— Não que ele precisasse fazer isso — Langford disse. — Ela não era um cavalo novo no pasto, afinal de contas.
— Nem pareceu que minha falta de entusiasmo o incomodou. Ele pareceu entender e até concordar.
— Talvez aquela mãe dele o tenha obrigado e, depois de cumprir seu dever, ficou grato pelo resultado — Adam disse.
— Lady Clara era a preferida dele, e eles eram muito próximos.
— Você mencionou a viúva — Langford falou.
— Que forma de arruinar um bom dia. É melhor se cuidar com aquela ali, Stratton. Se ela perceber suas intenções, pode lhe castrar.
— Não acho que Lady Clara se confesse com a avó. Ela zela muito por sua independência para pedir conselho ou interferência. No entanto, agradeço seu alerta. Quanto às minhas intenções, a chegada da família dela em Londres é uma complicação. É difícil fazer progresso na sala de estar deles com a viúva observando.
— Precisa encontrar maneiras de vê-la sozinha, quer dizer.
Os olhos de Langford brilharam.
— Permita-me compartilhar as cinco melhores maneiras de fazer isso, devido à minha experiência.
Langford continuava a ser eloquente sobre as estratégias. Adam não era muito orgulhoso, então prestou atenção. Até Brentworth escutou. Todo homem tinha um talento especial, e só um tolo negaria o dom que Langford tinha.
lara comeu sua refeição metodicamente e ignorou o silêncio que recaiu sobre a sala de jantar. Ela se recusava a se conscientizar com o cerne daquela ausência de som. Como o olho da tempestade, o silêncio de sua avó anunciava o caos que estava por vir.
— Você não vai. — O comando profundo e direto cortou a paz. — Vai permanecer aqui, onde é sua casa. Onde qualquer mulher solteira pertence. Com sua família.
Clara parou de comer, por respeito.
— É — Theo concordou. — Eu a proíbo. Vai trazer escândalo para esta família.
— Não sou uma menina, Theo. Nem uma criança. Há mulheres que vivem sozinhas. É ridículo uma mulher adulta permanecer na casa de sua família se tem meios de se estabelecer na própria casa — falou diretamente para o irmão e olhou para ele também. — E você não pode me proibir. Não sou sua dependente, nem estou sob sua custódia.
Um trovão pareceu ribombar através da mesa. Do canto do olho, Clara viu sua avó se endireitar de forma tão rígida que cresceu quase três centímetros.
— Por que traria escândalo? — Emilia perguntou. — Não entendo.
— E não deveria — Vovó rebateu. — Por favor, deixe-nos, Emilia. Tenho muito a dizer à sua irmã, e não é apropriado que ouça.
Emilia olhou desanimada para seu jantar semiacabado. Com beicinho, levantou-se da cadeira e deixou a sala de jantar.
— A senhora poderia tê-la deixado comer primeiro — Clara disse.
— Você poderia ter anunciado suas intenções em outro lugar, mas não o fez. Disse-as aqui, agora, e não vou permitir que sua ideia imprudente sobreviva mais um minuto.
— Eu amo a senhora, Vovó, e a respeito. No entanto, já me decidi.
— É mesmo? Eu, seu irmão e sua irmã seremos sujeitos às fofocas que irão denegrir nossa família por causa de tal atitude?
— Fofocas — Theo ecoou, franzindo o cenho. — Teremos sorte se for só isso.
— Não consigo imaginar por que alguém iria fofocar — Clara mentiu. Ela sabia muito bem que as pessoas sempre fofocavam se tivessem oportunidade. — Qual é a pior coisa que poderiam dizer? Que estamos distantes? Nosso comportamento provará o contrário. Que sou rebelde? Ouso dizer que isso já foi tão falado que está chato.
A avó dela a olhou desafiadoramente com tanta indignidade que aqueles olhos azul-claros quase ficaram da cor do aço.
— Dirão que seu pai foi tolo em lhe deixar uma fortuna, principalmente.
— Um tolo — Theo soltou, seu franzido profundo revelando que concordava nesse ponto.
— Fique quieto, Theo — Vovó ordenou. — Dirão que, se viver assim, nenhum homem irá querer se casar com você porque o fato de morar sozinha coloca sua virtude em dúvida. Não finja estar chocada, minha jovem. Sabe tão bem quanto eu que, quando uma mulher solteira sai da casa de sua família, a pergunta sempre é por que ela precisou fazê-lo? O que ela quer fazer na própria casa que não pode ser no lar de sua família?
— Talvez apenas queira viver a vida que escolher, e não de acordo com os planos de outra pessoa — Clara disse. — Esse é meu único motivo. Tenho certeza de que sabe disso. O que outros podem perguntar ou dizer não é significativo. Agora, vou me mudar em dois dias. Pode tentar me intimidar para que eu mude de ideia, mas não o farei.
— Eu disse que proíbo. — Theo bateu a mão na mesa da forma que seu pai costumava fazer.
— Oh, Theo, pare com esse drama — Clara ralhou. — Você tem preocupação suficiente com as novas funções. Não precisa criar problemas comigo.
Sua avó parecia prestes a explodir. Em sua fúria, havia uma boa dose de confusão e surpresa.
— Garota teimosa e negligente. Se fizer isso, ninguém vai recebê-la. Ninguém vai convidá-la para bailes e festas. Vai ficar sozinha na casa para a qual quer fugir. Será uma forasteira, uma...
— Está me ameaçando, Vovó? Listando as punições que a senhora mesma irá aplicar em mim por desobedecer suas ordens? — Clara mal conseguia se controlar. — Por isso ele me deixou aquela propriedade, para que eu não ficasse debaixo da sua asa para sempre. Nunca percebeu isso? — Ela se levantou. — Como expliquei, daqui a dois dias, partirei. Ambos estão convidados a me visitar se quiserem, ou não, se preferirem tratar isso como uma ofensa.
Ela manteve a compostura até estar fora do cômodo. Porém, seus sentimentos ficavam mais intensos conforme ela corria pelas escadas. Finalmente em seu quarto, jogou-se na cama e olhou para as cortinas azuis enquanto dúvidas sobre sua decisão a atingiam.
Será que ela estava sendo muito ousada? Negligente? Não tinha se importado em morar com eles antes, mas agora cada hipótese em relação ao seu comportamento esperado havia se tornado uma irritação. Enquanto seu pai estava vivo, ele servia como um escudo. Se Vovó começasse uma campanha para ela encontrar um marido, e nenhum dos homens a atraísse, ele avisaria à mãe que não se importava se ela nunca se casasse. Isso terminaria a conversa, pelo menos por um tempo.
Ele batalhava por ela de muitas formas, em questões importantes e aquelas nem tanto. Como ela sentia falta dele agora. O luto não mais era novidade, mas a dor ainda era primitiva quando pensava nele, principalmente quando se sentia sozinha daquele jeito. Queria poder ir até ele e deixá-lo confortar sua infelicidade. Provavelmente, ele sugeriria cavalgar, para o parque ou além disso, e deixar a interferência estarrecedora de sua avó para trás.
Será que as pessoas questionariam por que ela quis ir embora? Achava difícil acreditar. Todos conheciam sua avó. Todos viram a força de seu poder e as maneiras que a sociedade lhe permitia administrar livremente em vez de arriscar ser o objeto de suas manipulações sociais. Um baluarte, Stratton a havia chamado. Aquela palavra não bastava. Alguns homens conseguiam enfrentar o poder da viúva. Quase nenhuma mulher ousava tentar.
Será que ela usaria aquela influência contra a própria neta agora? Clara ficou preocupada.
— Está dormindo? — A voz baixa de Emilia veio da porta.
Clara se sentou.
— Não. Só estou contemplando meu futuro.
Emilia se aproximou e se sentou na cama.
— Entendo por que quer isso. Eu iria com você, se pudesse. Não odeio a Vovó, nem desgosto dela, mas ela pode ser a governanta mais estrita que se pode imaginar, e ninguém nunca se liberta dela da forma como o faz um governante de verdade. Talvez seja por isso que as garotas se casam. Para se livrar das mães e avós.
— Não ouse se casar por esse motivo. Prometa-me. Demore o quanto quiser para escolher com cuidado, mesmo que signifique sofrer a intromissão dela.
— Ela me assusta às vezes. Não sou tão forte quanto você.
— Ela também me assustava quando eu tinha a sua idade. Bastante. Ainda me assusta de vez em quando. Não sou tão corajosa como aparento, Emilia. Com o tempo, no entanto, aprendi a não ceder tão rapidamente, só isso.
Emilia traçou o desenho na colcha debaixo delas.
— Dois dias, você disse. Presumo que não irá comigo à costureira na sexta.
Clara passou o braço em volta dos ombros de Emilia.
— Claro que irei com você. Vamos nos divertir. E lembrei Vovó sobre você frequentar pequenas festas ontem, e ela concordou, então acho que não vai perder tudo.
A expressão de Emilia suavizou.
— Que bom que fez isso antes daquele anúncio no jantar de hoje.
— Isso se chama estratégia, Emilia. Gosto de pensar que tenho talento para isso.
— Mas ela pode mudar de ideia.
— Acho que não. Sabe, se for àquelas festas, ela também precisará ir. Acredito que ela esteja se coçando para fazê-lo.
Emilia descansou a cabeça no ombro de Clara.
— Obrigada. Não preciso de um grande baile toda noite, mas algumas festas seriam boas.
Clara tinha certeza de que sua avó ficaria feliz em acompanhar Emilia a uma ou duas festas. Se ela permanecesse fora da sociedade por um ano inteiro, a sociedade poderia esquecer seu poder, afinal.
Adam entregou seu cartão ao criado da casa em Park Lane. Sem parar, o homem se virou e liderou o caminho pelas extensões da mansão construída pelo falecido Duque de Brentworth.
O atual o cumprimentou quando ele entrou na biblioteca. Tão grande quanto um salão de baile, o cômodo tinha mais de dez metros de altura a fim de acomodar um piso de galeria que decorava as laterais. Estantes de madeira cobriam todas as paredes, cheias de volumes de coleção ao longo dos séculos.
— Você parece bem pequeno aqui dentro — Adam disse. — Presumo que qualquer homem pareceria.
Brentworth esticou as pernas, encontrando algum conforto para sua altura na cadeira estofada onde estava sentado.
— Implora para mais vinte corpos, não é? Talvez eu comece a alugar a biblioteca para que seja preenchida.
— Será a melhor de Londres, se o fizer. Há boatos de que irão construir uma universidade aqui. Você pode oferecer uso público para os alunos também.
— Que ideia esplêndida. Vou pensar nisso. Agora, talvez, possa me dizer o que o traz aqui. Estou grato pela companhia, mas suponho que haja um motivo para tal.
Adam havia pensado em como abordar o motivo. Ele pensara por dias se deveria levar o assunto a Brentworth. A conversa deles na taverna havia decidido a questão para ele, mas isso não facilitava a situação.
— Sinto muito não ter estado aqui quando você herdou tudo — ele disse.
Langford tinha recebido sua herança primeiro que os dois. Depois foi Adam. Brentworth foi o último, meros dois anos atrás.
— Sei que seu pai estava doente há muito tempo.
— Você soube de muita coisa enquanto estava na França. Sim, foi muito tempo. Um período difícil. Ele passava a maior parte do tempo aqui. — Acenou com a mão, apontando para a biblioteca magnífica. — Lendo. Recebendo visitas. Ele e eu tínhamos muitas conversas longas, então criamos algumas boas lembranças. E ele faleceu em paz. Comparado a você, suponho que eu tenha sido abençoado.
Adam não fazia ideia se isso era verdade. Ele não testemunhara um declínio longo. Nem tivera conversas longas. Se tivesse, pensou no que teria sido dito. Confissões? Arrependimentos? Últimas lições sobre responsabilidade? Uma boa parte de sua raiva depois da morte de seu pai foi por causa do próprio pai. Terminar tudo abruptamente antes do tempo o havia tornado um egoísta.
— Ele disse alguma coisa sobre o meu pai? — Não havia forma boa de perguntar, então simplesmente falou.
— Estava esperando essa pergunta. Tinha começado a pensar que nunca me perguntaria.
— Não pensei que tivesse algo a dizer até recentemente.
— O que o fez mudar de ideia?
— Nossa conversa na taverna. Sua surpresa e interesse na minha perseguição à Lady Clara foi diferente de Langford. Mais complicado.
— Pensei se eu havia incentivado sua atenção sem ter pretendido. Bom, então eu estava certo sobre isso. — Brentworth se levantou. Passou os dedos pelo cabelo, depois balançou a cabeça. — Não lhe faria um favor satisfazendo sua curiosidade. Não haverá nada de bom. — Sem estar feliz, Brentworth olhou para a porta. — Preciso de ar fresco. Vou ao jardim. Siga-me se insistir em me interrogar.
Não foi um convite, mas Adam o seguiu.
No jardim, Brentworth finalmente parou sua passada determinada e assumiu uma expressão rígida e inflexível que faria ingênuos o temerem.
— Ele estava doente. Muito doente, devo enfatizar. Em certo momento, as coisas ditas eram velhas lembranças, e talvez não houvesse exatidão nos fatos.
— Entendo. O que ele disse?
Brentworth lhe lançou um olhar.
— Você não faz ideia? Acho improvável.
— Não importa o que sei. Preciso descobrir o que outros sabiam e disseram, e por quê. Coloque-se em meu lugar, e vai entender o motivo.
A expressão de Brentworth suavizou. Ele desviou o olhar. Seu olhar supervisionou o jardim perfeitamente cuidado que cobria dois acres. Era uma raridade em Londres, ocupando um espaço na propriedade que, se fosse construída outra casa, traria milhões. O falecido duque fora um homem de gosto refinado e educado, como provado pela biblioteca e aquele jardim, e uma coleção de arte das mais finas da Inglaterra.
— Ele sentia um pouco de culpa pela morte de seu pai. A covardia o assombrava, porque ele não tinha contestado boatos ou, no mínimo, exigido uma investigação justa. Ele já estava doente na época, claro, mas...
— Dentre todos, ele não poderia ser culpado.
— É. Bem, ele me contou que acreditava que, se tivesse havido uma investigação verdadeira e justa, teria sido descoberto que seu pai nunca forneceu apoio a Napoleão quando ele deixou Elba. Nunca ajudara com seu novo exército. Foram palavras dele, Stratton. Eu fiquei atônito. Nossa geração soubera de rumores sobre deslealdade, mas isso foi específico, e sei que estava entre alguns dos mais velhos.
Os mais velhos, o que significavam os mais poderosos. Aqueles do governo. Aqueles que poderiam arruinar um homem com uma erguida de sobrancelha. Adam também ficou atônito. Havia especulado a quais acusações de deslealdade ele se referia, mas nunca esperara que fossem tão condenatórias.
— Quem o acusou de fazer isso? Que prova eles ofereceram?
— Ele não disse, e não o pressionei. Pelo menos quanto a quem fez as acusações. Ele disse que o Conde de Marwood continuou colocando fogo. Presumiu que fosse por causa da velha animosidade entre suas famílias. Então pode ver por que achei seu interesse em Lady Clara peculiar ou...
Ele não precisou completar a frase. Adam sabia o resto. Peculiar ou um ato de vingança. Um caminho discreto para um grande objetivo.
Era tudo que isso era? Ele mesmo não sabia, mas achava que não. Havia maneiras melhores de conseguir uma vingança. Ele passara anos pontuando-as. E não fingia desejo em relação à Lady Clara. Ele a quis desde o dia na colina.
Ainda nem tinha certeza de que o pai de Lady Clara fora o criador daqueles boatos. Mesmo essa nova prova de que ele os encorajou não provava que tinha sido ele. Apesar de tudo, não poderia negar que foi mais do que desejo que havia iniciado a perseguição a ela. Permanecer na atenção dela lhe permitia uma chance de descobrir o que ela sabia, no mínimo, sobre os assuntos que ele agora conversava com o amigo.
E, sim, seduzi-la também, de certa forma, puniria os antigos pecados do falecido conde, e talvez os mais recentes, ele tinha que admitir. Não poderia negar que haveria satisfação naquilo mesmo que quisesse uma coisa mais significativa.
Se isso o tornava um canalha da forma que Brentworth pensou, que fosse. Já havia passado do tempo de o filho cumprir as obrigações do pai, independente do que aquele pai tinha feito.
— Tem alguma teoria sobre como a suposta deslealdade aconteceu? — perguntou a Brentworth, já que ele precisava esclarecer as acusações se fosse um dia terminar isso.
Seu amigo balançou a cabeça, mas sua expressão refletiu seu pensamento profundo.
— Nunca pensei nisso. No entanto, se o fizer agora... presumo que fosse dinheiro. Dinheiro enviado à França para financiar o novo exército. Não a Napoleão diretamente, seria meu palpite. Seria difícil e arriscado. No entanto, para os apoiadores dele. Não teria sido difícil de chegar a eles.
— Tenho verificado os registros da propriedade e não encontrei um desembolso enorme de dinheiro na época.
Brentworth lhe lançou um olhar duro.
— Então foi procurar? Acho que minhas revelações de hoje não são novidade para você.
— Confirmam conclusões que eu havia tirado. Ele não poderia ser desleal em pessoa, nem o era em suas palavras. O que sobrou além do dinheiro?
— Não muito, presumo. — Brentworth apertou firme o ombro dele. — Desculpe por ter pouca informação para você. Talvez, conforme siga em frente, não deva se concentrar no que foi dito na época, mas por que foi dito. O boato se firmou por um motivo, apesar de não ser verdade.
Adam aceitou o conselho. Claro que tanto ele quanto Brentworth sabiam do maior motivo para os boatos terem prosperado. Ela morava na França agora, enquanto seu filho tentava limpar o bom nome do marido.
s braços de Clara se revoltaram com o peso da cadeira. Do outro lado do estofado, a expressão de sua dama de companhia estava vermelha de força.
— Isso não poderia esperar até a senhorita contratar alguns homens fortes? — Jocelyn perguntou com uma voz estrangulada.
Elas andavam lentamente na mesma direção, finalmente colocando a cadeira no lugar que Clara havia escolhido. Jocelyn pegou seu lenço e secou o rosto, depois estendeu o braço e fez o mesmo com Clara.
— A senhorita estará acabada quando sair para encontrar sua irmã.
— Estou sem paciência para ver se minhas ideias sobre este cômodo vão funcionar, e essa cadeira ficava interferindo na forma como eu queria ver o espaço. Começo a pensar que terei bastante espaço para um divã extra. Assim que movermos esta outra cadeira. — Ela foi até a segunda cadeira e se abaixou para erguê-la.
— Sou uma dama de companhia, madame. Não costumo carregar móveis.
— Até contratar mais criados, você é uma criada da casa, Jocelyn. Se pôde fazer nosso jantar ontem à noite, pode me ajudar com isso agora. Também não é um trabalho para o qual nasci.
— É pesada demais para nós. Por favor, espere até ter um ou dois homens para fazer isso.
Isso poderia ser dali a uma semana. Foram distribuídas notificações para alguns criados, mas levaria tempo para receber as respostas e completar as entrevistas.
Clara decidiu se mudar mesmo da Casa Gifford. Na manhã do dia anterior, os criados haviam colocado seus baús na carruagem da cidade e ela foi embora. Ninguém se despediu dela. A viúva e Theo permaneceram em seus quartos, e até Emilia foi proibida de descer.
Clara não se importou nem um pouco. Um pouco de nostalgia recaiu sobre ela conforme partia, mais devido às lembranças carinhosas do tempo passado na casa com o pai. Uma vez que a carruagem andava pela cidade, no entanto, a empolgação a tomou.
Ela e Jocelyn debateram sobre quais criados contratar o caminho inteiro até Bedford Square. Uma cozinheira e um cocheiro, e uma governanta e uma arrumadeira. Jocelyn insistiu que também seria necessário um criado homem, para servir como mordomo e cocheiro, mas Clara não tinha certeza. Enquanto era de bom tamanho para seus propósitos, a casa não era uma casa grande na cidade como em Mayfair. Nem ela queria a presença masculina ali o tempo todo, interferindo nos objetivos femininos de seu novo lar. Não havia espaço para um criado, de qualquer forma. O cocheiro precisaria se alojar nas proximidades.
Com quatro quartos no piso superior e mais quatro no sótão para os criados, aquela casa não poderia ficar maior. Os quartos eram diferentes dos que ela tinha na Casa Gifford. Não tinha muito espaço ali. Não havia sala de estar e uma pequena biblioteca particular. Nenhum quarto de vestir enorme e guarda-roupa separado. Ali ela usava apenas um quarto e um quarto anexo para se vestir, onde também guardava suas roupas. A biblioteca tinha um bom tamanho, no entanto, assim como a sala de jantar. Não havia sala de estar igual, mas, em vez disso, havia uma sala com sofás que também servia para tomar café da manhã.
Bom, ela era só uma mulher. De quanto espaço precisava? E os aposentos comuns serviriam bem para seus outros planos.
Jocelyn finalmente se aproximou da cadeira. Com um gemido pesado, fingiu tentar erguer de lado, só para soltar e arfar.
— Temo ter usado toda a minha força na última cadeira.
Clara estava prestes a repreendê-la quando houve uma batida à porta da frente.
— Vá e veja quem é, por favor, enquanto se recupera de sua fraqueza repentina.
— Damas de companhia não atendem à porta, madame.
— Oh, pelo amor de Deus. — Clara marchou para fora da biblioteca para atender ela mesma.
Abriu o trinco, esperando encontrar um vizinho ou um comerciante. Em vez disso, viu o Duque de Stratton.
— Oh. O senhor. — A recepção decepcionada saiu antes que ela pudesse evitar. Culpou a surpresa em vê-lo em sua porta. E, para seu desânimo, uma pontada de alegria a tomou inesperadamente. — Como me encontrou?
— Langford, o irmão dele e eu fizemos uma visita à sua família, e descobrimos, por seu irmão, que a senhorita não morava mais lá. — Ele olhou a fachada. — Sempre achei Bedford Square de um design atraente, com casas mais adequadas em tamanho e escala. É bem longe de Mayfair, entretanto.
— O senhor explicou como descobriu que eu não estava na Casa Gifford, mas não como descobriu que eu estava aqui.
— Se me convidar para entrar, em vez de esperar que eu converse na soleira, vou lhe contar.
Ela abriu mais a porta.
— Claro. Por favor, entre.
Ele o fez, provando imediatamente que a altura mais modesta de casas em Bedford Square fazia homens como Stratton parecerem maiores. Ele dominava o pequeno espaço de recepção, e ela liderou o caminho à biblioteca mais para dar a si mesma mais espaço. Encontrou-a vazia. Jocelyn havia aproveitado para desaparecer.
Ele analisou à sua volta, como se verificasse se serviria. Para ele ou para ela, ela não sabia. Ela não se sentou porque não queria que ele ficasse. Tinha coisas para fazer, e sua chegada prometia apenas problema. Quase nunca ficava nervosa, mas, cada vez mais, aquele homem a fazia pular por dentro. Lembranças lamentáveis de permitir seu abraço afetavam até a conversa mais simples entre eles.
— Vai explicar agora? Como me encontrou?
— Muitos cocheiros não se opõem a gratificações em troca de uma ajuda.
— Em outras palavras, o senhor subornou o criado de meu irmão.
— Acredito que seu irmão teria me contado de graça, mas não quis causar um problema entre vocês dois. — Ele verificou o aposento de novo. — É uma biblioteca bonita.
— Obrigada. Gosto dela. Tenho algumas mudanças a fazer e estava tentando fazer isso quando chegou. Na verdade, o senhor pode ajudar.
— Ficaria feliz em fazê-lo.
Ela apontou para a segunda cadeira, depois para o novo lugar onde queria que ficasse.
— Preciso daquilo movido para lá. Minha dama e eu conseguimos mover a primeira, mas ela se rebelou ao erguer a segunda.
— Ela mostrou mais senso do que a senhorita. Não deveria carregar móveis. — Com dois passos, ele encarou a cadeira e moveu-a para onde ela lhe disse.
Ela deveria agradecê-lo e ser mais educada. Só que a ajuda dele foi acompanhada de uma careta, então ela pensou que isso anulava suas obrigações. Mas não. Queria poder fingir que ele não a perturbava. Mas ele o fazia. Suficiente para ela ter dificuldade em manter seu desdém frio e pensamento claro a fim de encontrar uma forma de fazê-lo ir embora.
— Obrigada.
Ele reconheceu o agradecimento com um assentimento antes de andar pela biblioteca e olhar pelas janelas francesas.
— A senhorita comprou isso, presumo.
— Por que pensa assim?
— A mobília é muito elegante para uma casa como a que a senhorita deixou. Ninguém arriscaria deixar essas cortinas sob os cuidados do inquilino. Elas não são práticas, mas mostram o gosto de uma mulher negada à indulgência de seu guarda-roupa por um tempo.
Sua interpretação sobre as cortinas foi correta. Ela tinha saboreado a oportunidade de escolher o tecido, cortar e consultar sobre o estilo.
— Os móveis também demonstram que a senhorita os tem há um tempo, mesmo que somente agora tenha se mudado.
— Não sei por que está desperdiçando seus talentos esplêndidos em percepções comigo e minha casa modesta, Duque.
— Estou pensando em por que comprou esta casa se não pretendia morar nela. É simplesmente curiosidade minha, nada mais.
Não tão simples, pelo olhar que ele lhe dava.
Ela realmente não deveria. De verdade, não deveria. Mas...
— O senhor me descobriu. Eu precisava de um lugar secreto para encontrar meu amante.
— Ah. Bom, não podemos ter isso agora. — Ele andou de volta para ela, com toda a atenção nela. — Vou colocar um guarda na porta a fim de desencorajar tais visitas. Se nenhum amante chegar, chego à conclusão de que falou do futuro, e de mim.
Ele estava perto demais agora, olhando para baixo de uma maneira que não era bom para sua compostura. Ela estava determinada, porém, a não ser tola da forma que foi no parque.
— É chocante o senhor dizer isso. É ruim o suficiente o senhor fazer suposições em relação a um casamento. É bem pior insinuar o que acabou de dizer.
— Se preferir se casar com um amante, a oferta ainda permanece. No entanto, se é contra isso, como diz, vou lhe fornecer seu desejo.
Ela nunca se viu sem palavras, mas se via agora porque não conseguia criar uma boa resposta. Como ela havia permitido que ele a encurralasse entre duas opções que consistiam na mesma coisa, só que uma era honrável e a outra não? Não ajudava o fato de os olhos dele estarem brilhando quando ele adicionou a parte de fornecer seu desejo. Não conseguiu ignorar o duplo sentido, nem a maneira como um arrepio inútil tomou seu corpo.
Ele parecia se divertir com o dilema dela.
— Esta casa será conveniente em ambos os casos.
— Não seria apropriado o senhor me visitar com frequência, se é isso que quer dizer — ela balbuciou. Sentiu como se uma nuvem tivesse ocupado sua mente.
Ele se esticou e, suavemente, acariciou seus lábios. Só então ela percebeu que eles estavam trêmulos. Estava sendo uma idiota de novo, mas não conseguia evitar, principalmente quando aquele toque macio tinha sido muito bom e feito seu rosto e pescoço formigarem.
— Serei muito discreto. Não haverá escândalo. No entanto, gosto da ideia de visitá-la aqui, onde a viúva e seu irmão não podem interferir.
Interferir no quê? Ela não fazia ideia se havia dito ou pensado.
— Nisso. — Ele se inclinou até seus lábios encontrarem os dela.
Aquele beijo a atordoou da melhor forma. Pequenas sensações maravilhosas se multiplicaram enquanto as observações vagas flutuavam em sua mente nebulosa. Maravilhou-se com a maciez surpreendente dos lábios dele, e como ele mal pressionou a boca, mas mordiscava e fazia movimentos que aumentavam o encanto.
Percebeu quando ele pegou sua cabeça e a segurou para sua exploração. Ela gostou muito quando aquelas mãos desceram e a abraçaram até ela estar pressionada no corpo dele e sentir sua tensão. Depois ela estava aceitando beijos no pescoço, no peito e carinhos pelo corpo.
Ele pretende me seduzir. Ela não sabia como aquele pensamento emergiu, mas estava em sua mente enquanto Stratton a fascinava cada vez mais com o prazer. Stratton. O Duque de Stratton. Um pouco da nebulosidade se dispersou enquanto aquele nome se fixava em sua mente.
Só então, quando um pouco de racionalidade tentou assumir, ele intensificou suas táticas e escorregou a língua para dentro da boca dela.
Ela gostou. Não mentiu para si mesma. Isso mexeu com ela mais profundamente e deu sinais de intimidades futuras. No entanto, também a assustou tanto que sua mente realmente se encontrou. O Duque de Stratton está tentando me seduzir. Ela virou a cabeça. Pressionada em seu abraço, firme. Saiu de seus braços e se virou para se recompor.
Escutou a respiração dele, e a própria, e soube que havia permitido que ocorresse muita coisa. Aquele homem já era impossível. Não pensava que ele melhoraria agora.
— O senhor deveria ir — ela disse.
— Não.
Não? De repente, ela se sentiu ela mesma de novo.
Virou-se para encará-lo.
Um erro. Ele estava ali ardente, seu olhar nela, sua mandíbula e sua boca firmes. Ele parecia perigoso, sensual e lindo demais para suportar.
Passou tempo demais entre eles no silêncio. Tanto que ela perdeu o chão e ele o ganhou, tanto que ela podia detestar a família dele, mas não o detestava nem um pouco, e tanto que havia começado algo ali que ele pretendia terminar.
— O senhor deve ir — ela disse firmemente.
— Por quê?
Oh, ele era ousado.
— Porque eu também devo. Vou encontrar minha irmã na costureira, e preciso sair. — Passou por ele e foi até a porta. Entrou no espaço de recepção e gritou para as escadas a fim de pedir que Jocelyn trouxesse sua pelica.
— Pelo menos a senhorita não mora sozinha aqui — ele disse, seguindo-a.
— Claro que não. Haverá mais criados em breve. Os avisos foram publicados. Espero contratar um exército. Em uma semana, ouso dizer, estarei tropeçando neles.
— Presumo que isso signifique que ainda não tenha um cocheiro. Estou com minha carruagem aqui. Vou levá-la até sua irmã.
Ela tinha planejado alugar uma carruagem.
— Vou permitir porque estou atrasada. Entretanto, se tentar me tocar, vou furá-lo com um grampo.
Jocelyn desceu e lhe entregou a pelica. Ela a vestiu, colocou sua boina e permitiu que o duque a escoltasse para sua carruagem. Só porque era mais conveniente, disse a si mesma. Não tinha nada a ver com a névoa sensual que ainda ameaçava tomá-la.
— Essa cor deve ser perfeita — Clara disse, dando um tapinha em uma pasta de moda em um cômodo de consulta na loja Madame Tissot. — Não é nem tão escuro quanto o outro cinza. Mais acinzentado, mas ainda suave.
— Nem tão monótono e velho, você quer dizer. — A empolgação de Emilia em relação às compras de alguns vestidos tinha sido quase arruinada pelas exigências de sua avó. Roxo escuro ou cinza haviam sido a ordem.
Emilia desabafou assim que Clara entrou na loja e quase caiu em lágrimas.
— Tenho certeza de que Vovó não quer que pareça uma velha — Clara disse. — Vamos encontrar um tecido adorável parecido com este nessa cor. Este é quase prata. Talvez também consigamos encontrar um que tenha até um pouco de lavanda. Tenho certeza de que Madame Tissot terá algumas ideias.
— Eu deveria encomendar uma boa musselina. Precisa ser cinza também?
— Não vejo por que não possa usar branco, ou creme, em uma musselina. Não é cor de festividade, e você ainda é uma menina.
— Estou tão feliz por Vovó não ter vindo. E sim, você. Agora poderíamos fazer com que ele saísse. — Ela inclinou a cabeça em direção à porta, além da recepção.
Clara olhou naquela direção, embora não pudesse ver através da porta. Sabia a quem Emilia se referia. Stratton insistira em esperar para levá-la de volta quando terminassem.
Emilia considerou três amostras, incapaz de decidir o modelo do vestido de musselina.
— Não quero parecer muito criança, mas temo que Vovó nunca vá me permitir usar este a menos que seja refeito. — Ela apontou para um vestido com um decote que mostrava mais do colo do que uma garota de luto deveria revelar.
— Um dos novos modelos até o pescoço deve dar um jeito nisso — Clara disse. Ela olhou para sua própria pasta de amostras; nenhuma tinha sido pintada de branco. Uma, porém, tinha uma cor parecida com um azul pastel. — Olhe este, Emilia. A cor é praticamente azul, com um toque de roxo. Eu iria querer a cor neste outro modelo aqui, mas penso se ainda passaria uma imagem respeitável da filha de um homem enterrado há apenas seis meses.
— Estou desanimada e não consigo ajudá-la. Talvez ele consiga.
Ela, de novo, inclinou a cabeça para a porta.
— O que ele saberia sobre isso?
— Ele saberia o que a mãe dele fez, não? E, se duques não erguerem as sobrancelhas, por que outra pessoa o faria? — Emilia disse. — Não que você se importe muito com isso.
Ela não se importava com sobrancelhas, mas se importava, sim, em ser vista como alguém que não respeitava o pai. Em um impulso, ela se levantou e abriu a porta.
Stratton havia ficado confortável no salão de recepção. Pernas estendidas, pés e braços cruzados, e as abas abaixadas escondiam seus olhos das quinquilharias femininas que o rodeavam. Clara não sabia se ele estava dormindo ou não até ela ver o pequeno brilho debaixo da aba.
Ele se endireitou e se levantou.
— Terminaram?
— Dificilmente. O senhor realmente deveria sair e fazer suas coisas. Ainda pode demorar um tempo.
— Não me importo. Além disso, conforme a tarde se transforma em noite, a senhorita não deveria atravessar a cidade sozinha mesmo em uma carruagem alugada.
Se aquele homem soubesse a frequência com que ela fazia coisas sozinha pela cidade em todas as horas, provavelmente ficaria mais aborrecido.
— Se vai ficar aqui, pode nos ajudar. Emilia e eu apreciaríamos a opinião de um cavalheiro sobre algumas coisas. — Ela segurou a porta aberta.
Ele a seguiu para dentro do cômodo, e absorveu tudo com um de seus olhares analisadores antes de olhá-la com uma expressão zombeteira.
— Este é o vestido que Emilia quer — Clara disse, empurrando o modelo na direção dele em uma mesa. — Se for em musselina creme e ela usar uma estola, acha que seria censurável? Faz seis meses, então...
— Não haverá brilho ou cintilância no tecido, e sem outros enfeites além de talvez esse bordado aqui. Pode ver que é mais discreto — Emilia se apressou em dizer.
— Não posso imaginar que alguém censuraria. Você é uma jovem inocente. Fiquei surpreso em vê-la de preto quando Langford e eu visitamos. Branco parece mais apropriado para mim.
O rosto de Emilia se iluminou.
— Oh, fico muito feliz que ache isso. — Ela pulou e foi procurar Madame Tissot, para tirar suas medidas.
Ele voltou a atenção a Clara.
— Também pode sair do preto agora?
— Talvez um pouco. Minha avó quer que escolhamos apenas roxo escuro ou cinza. Eu estava pensando, no entanto, que esta cor faria jus também. — Ela deu um tapinha no lilás pastel. — Embora eu ache que haja um pouco mais de rosa nele, e nunca daria certo.
— Não vejo rosa, mas um roxo azulado.
— Eu também. E não será escuro, mas mais claro.
Ele pegou o modelo.
— É este vestido?
— Deus, não. Esse é muito... — Divertido, ela quase disse. Estiloso. — É este modelo.
Ele deu de ombros.
— Prefiro o outro, mas entendo o problema. Este também deve ficar atraente na senhorita. Onde vai usá-lo?
— Emilia e eu vamos aceitar alguns convites para reuniões discretas e pequenas. Festas de jardim e afins. Talvez um jantar dado pelos amigos da família. Ela está perdendo o que deveria ter sido sua primeira Temporada e está sentindo mais agora que está na cidade e todos os amigos estão lhe contando sobre os bailes.
— Então a senhorita será sua acompanhante.
— Suponho que sim, se conseguirmos fugir da companhia da minha avó.
— E quem será o seu acompanhante?
Ela riu.
— Sou muito velha para ter um acompanhante. Talvez o senhor se esqueça disso.
O olhar dele passou por ela da cabeça ao quadril.
— Eu gostaria de vê-la em algo além do preto, sei disso.
Não uso preto quando estou em casa e não planejo sair. Visite-me um dia desses e... Ela flagrou o pensamento e o interrompeu, abismada consigo mesma por sequer contemplar tal coisa.
— Talvez nós duas participemos de um desses eventos discretos, e o senhor também.
— Terei que me certificar de participar.
Uma das costureiras de Madame Tissot entrou e convidou Clara para segui-la para que ela também pudesse ser medida. Conforme saiu, olhou para trás e viu Stratton pegando e folheando a pasta de modelos.
Antes de terminar com a costureira, Clara encomendou muitos outros vestidos por impulso. Sua conversa com Stratton a lembrara que teria oportunidades para usar um guarda-roupa maior nas semanas seguintes. Nenhuma das mulheres que visitariam sua casa para a reunião sobre o Parnassus ficaria chocada se ela adicionasse mais cor. Althea a incentivava a fazê-lo há semanas.
Também prometeu pagar a Madame Tissot uma taxa extra se fosse dada prioridade ao pedido inteiro. Madame ficou mais que feliz em agendar isso por meros trinta por cento extras. A costureira iria começar a trabalhar imediatamente, e dois dos vestidos deveriam ficar prontos em uma semana.
Dois homens aguardavam na recepção quando ela e Emilia saíram dos cômodos dos fundos. O cocheiro principal de Theo estava sentado, conversando com o duque.
— Que gentileza do duque ajudá-lo a passar o tempo, Simmons — Clara disse enquanto ambos os homens se levantavam de repente. — Mas os senhores se conheceram antes e tiveram outra conversa, não é?
Simmons, um homem atarracado com um pouco de cabelo grisalho em volta de uma coroa careca, se encolheu com o tom dela. Ela lançou um olhar severo para avisá-lo de que não apreciou o fato de ele ter dado seu endereço pelo dinheiro do duque. O cocheiro tratou de se ocupar, pegando a bolsa de Emilia e escoltando-a para descer as escadas. Clara e o duque os seguiram e observaram Emilia ir embora.
Haviam ficado tanto tempo na costureira que o pôr do sol estava começando. Clara olhou para a carruagem do duque. Seu senso alertou cuidado.
— Acho que vou alugar uma carruagem. O senhor realmente não deveria ter ficado, principalmente já que foi tudo por nada.
— Teme minha companhia por causa daquele beijo, Lady Clara?
— Talvez um pouco.
— Provavelmente isso é sábio, embora não ache que a senhorita se assuste facilmente. Certamente não penso que permite que o medo governe suas escolhas e ações. Nem acredito que seja eu que teme, nem um pouco.
Oh, o olhar que ele lhe deu. Tão consciente. Tão entendedor. Ele também poderia ter dito A senhorita teme a si mesma comigo, o que é diferente.
Que homem presunçoso e impossível. Como ela havia se esquecido disso? No momento, em pé ao lado da rua, parecia incompreensível para ela ter permitido aqueles beijos em sua biblioteca mais cedo. Sua empatia em relação ao pai dele provavelmente alterou seu julgamento, e agora ele a usava contra ela. Os motivos dele podiam ainda estar obscuros, mas não as intenções.
Medo de si mesma? Nem um pouco. Medo dele? Nada disso. Ela não era uma menina apavorada, ingênua demais para ver o que aquele homem queria. Tinha repelido sua cota de seduções no dia, e elas foram mais ardilosas do que a falta de sutileza dele. Ela havia aproveitado sua cota de beijos sem se transformar em uma tola.
Foi até a carruagem dele.
— Direto para minha casa, por favor. Sem desvios e sem atrasos, se não se importa.
Lady Clara não estava aproveitando nada do passeio de carruagem. Estava sentada tão rígida que ia muito da esquerda para a direita com o balanço na superfície irregular. Não havia se mexido nem um pouco desde que se ajeitou na almofada diante dele.
Ele estava esperando que ela tirasse aquele grampo e o apontasse para ele. Não duvidava que o fizesse. Imaginar isso levou-o a outras imagens.
— Seu irmão disse que seu pai a ensinou a cavalgar e atirar — ele disse. — Parece que a senhorita era muito próxima dele. Era a favorita?
A expressão dura dela suavizou imediatamente, tanto que ele quase se arrependeu da pergunta.
— Suspeito que sim. Não, isso não é justo. Sei que eu era. Ele amava a nós todos, no entanto, independente do que Theo possa pensar... Eu vim de uma parte da vida de meu pai, e Theo e Emilia de uma parte mais tardia, só isso. Pelo menos é o que penso.
— Ele a satisfazia mais depois dessa primeira parte ter acabado?
— Ele não me satisfazia. Que palavra. Nós aproveitávamos a companhia um do outro. Combinávamos como roupas preferidas.
Satisfazer era exatamente a palavra certa, de tudo que ele vira e ouvira. O falecido conde tratava aquela filha como um filho. Permitiu que permanecesse solteira e providenciou os meios para ela se tornar independente.
Provavelmente ele se abrira para ela.
— Mulheres na sua situação, às vezes, pensam que é injusto não poderem ter herança — ele disse.
— Não pensei isso, embora uma vez ele tenha me dito que pensava assim. Acho que ele realmente quis dizer que se arrependia de eu não ter sido um filho. Francamente me dizia muito isso, e não me magoava. Homens como ele se casam para gerar herdeiros, não filhas. Ele sentia essa obrigação profunda, assim como todos.
— Então ele se casou novamente?
— Suponho que foi um dos motivos.
O principal motivo, provavelmente. Adam imaginou o conde. Podia vê-lo com a bem jovem Lady Clara, explicando para uma criança por que estava querendo outra esposa, dizendo que ela não deveria ficar deslocada e à mercê de um estranho em seu lar. Não gostava do conde e tinha bons motivos para ser desconfiado e bravo com o homem, mas a forma como ele cuidava daquela filha sugeria que ele não era totalmente ruim.
— Sabia que essa ideia de nossas famílias encontrarem a paz foi dele?
Isso a divertiu.
— Tenho bastante certeza de que não foi.
— Sua avó disse no primeiro dia em que visitei. Seu pai lhe deu instruções para fazê-lo.
Ela ergueu uma sobrancelha.
— Não faz sentido. Se ele queria tal paz, poderia ter cuidado disso ele mesmo.
— Talvez pensasse que uma nova geração representaria uma página nova e em branco. Pode ter presumido que eu nunca teria confiado nele ou escutado tal plano se viesse de seus lábios. Acho estranho ele não ter lhe contado sobre essa ideia, já que a senhorita era tão próxima.
Ela pensou sobre isso, e não ficou feliz.
— Ele mal mencionava sua família na minha presença, como eu disse.
— Nem para sua avó? Se eles armaram isso juntos, a senhorita deve tê-los ouvido.
Ela franziu o cenho.
— Mesmo assim, não o fiz — ela murmurou, como se, em sua mente, também achasse isso estranho.
— Quando suas novas roupas ficarão prontas? — Ele mudou de assunto para que não cedesse ao impulso de beijar aquela testa franzida.
Ela esqueceu os pensamentos que suas perguntas a fizeram ter.
— Disse a eles para fazerem os da minha irmã primeiro.
— Então a senhorita está condenada ao preto mais um mês? Não é justo.
— Se eu quisesse meramente um pouco de cor, poderia usar o que tem em meu guarda-roupa. Deixei roupas usadas em Londres e agora as mudei para Bedford Square.
— Tem um traje de cavalgar entre elas?
— Tenho, mas não trouxe meu cavalo para a cidade e não deveria pegar emprestado um de meu irmão agora. Nem usaria azul-claro no parque, onde qualquer um pode me ver.
Ele a viu em seu traje azul-claro, corada por galopar no vento.
— Tenho um cavalo que a senhorita pode pegar emprestado.
Os olhos dela se iluminaram por um instante antes de controlar sua empolgação.
— Não acho que seria apropriado usar seu cavalo.
— Há uma regra sobre propriedade quanto a isso? Parecida com o quanto uma mulher dança com um homem que não é seu pretendido?
Um sorriso tentou aparecer. Ela se conteve. Pelo menos o franzido havia sumido.
— Escute meu plano, e recuse se quiser. No domingo, vou trazer um cavalo para sua casa — ele começou. — Pode usar o traje azul-claro porque estaremos fora da cidade antes que alguém acorde. Em vez do parque, vamos cavalgar no campo. Vou pedir para minha cozinheira preparar uma cesta.
Ela só olhou para ele.
— A senhorita sabe que sente falta de cavalgar — ele disse. — Nem vamos precisar andar com o conjunto elegante em um parque. Podemos galopar, se quisermos.
Ela vacilou visivelmente.
A carruagem parou naquele momento. Tinham chegado em Bedford Square.
Ele a ajudou a sair da carruagem.
— Vou chegar às dez no domingo — ele informou.
Ela não disse nada. Já que não era uma mulher que continha sua língua quando discordava, ele decidiu que significava que ela consentia.
lara foi dormir no sábado rezando um pouco para que chovesse na manhã seguinte. Quando acordou e viu um dia gloriosamente lindo, no entanto, recebeu o tempo com mais entusiasmo do que esperava. Culpava o tempo que fazia que não cavalgava. Qualquer amazona iria querer estar em uma sela em um dia como aquele.
Jocelyn ajudou-a a se vestir e apenas ergueu uma sobrancelha quando Clara pediu o traje azul. Decidiu que era permitida uma sobrancelha quando a mulher fora sua dama de companhia por quase dez anos e agora desempenhava múltiplas tarefas com apenas algumas reclamações sobre não ser o tipo de coisa que damas de companhia fazem.
Jocelyn, então, ajudou-a a vestir o traje, depois arrumou seu cabelo e colocou um pequeno chapéu em sua cabeça. Ela o fixou com dois grampos, depois organizou sua bolsa.
Às dez, ela estava pronta, em pé ao lado da janela da biblioteca para ver se Stratton iria aparecer. Não havia realmente aceitado o convite. Ele poderia ter concluído que ir à cidade com um cavalo extra seria inútil.
Exatamente às dez, ela o viu virar a rua com seu cavalo branco. Um lindo cavalo castanho andava atrás dele.
Jocelyn até cumpriu a tarefa de atender à porta quando ele bateu. Levou Stratton à biblioteca, onde Clara ainda se regalava com aquele cavalo castanho magnífico. Era um castrado, e suas linhas longilíneas sugeriam sangue árabe.
— Não tinha certeza se o senhor viria. Não respondi ao seu convite.
— Concluí que, enquanto consegue resistir à minha companhia, não renunciaria a uma boa cavalgada.
— O senhor está certo. — Ela arrumou seu traje. — Em um dia tão lindo, negar isso a mim seria um pecado.
— Não podemos deixar que aconteça isso. Pecados por omissão são os piores. Toda a culpa e nenhuma diversão.
— Nenhum pecado é o melhor tipo. — Ela confiou que ele entendeu o que estava dizendo. Não haverá nenhum tipo de pecado hoje.
Não que ela não confiasse nele. Simplesmente não queria passar o dia explicando como aqueles beijos foram um erro e que ela só concordou com o passeio porque ele a seduziu com um cavalo lindo e um dia mais lindo ainda.
Ela reparou, ao passar por Jocelyn, que agora suas duas sobrancelhas estavam erguidas.
Stratton ajudou-a a subir na sela.
— O nome dele é Galahad. Não é acostumado com sela lateral, mas estou certo de que consegue lidar com ele. Mas talvez ele exija uma mão firme.
Ele deu um tapinha no pescoço do cavalo, depois montou no outro.
Ela e Galahad se familiarizaram quando seguiram ao sul para o rio. O cavalo resistia e precisava mesmo de uma mão firme. Agradou-a o fato de Stratton ter levado Galahad e não outro cavalo entediante e seguro, sem personalidade.
Poucas pessoas estavam nas ruas àquela hora de um domingo. Os sinos altos da igreja tocavam pela cidade silenciosa, assim como os cascos do cavalo. Eles passearam por uma Londres raramente vista.
Assim que cruzaram a Ponte de Vauxhall, o campo apareceu. A estrada ao longo do rio se alongava aberta e livre. A bagunça de carruagens e carroças não a poluía na manhã de domingo. Ela deu permissão para Galahad trotar, depois o incentivou ao galope.
Eles correram pela estrada com Stratton logo atrás. Ela levantou o rosto para o vento e o sol e gostou de como o cavalo debaixo dela conseguiu ir mais rápido. Fazia semanas que não cavalgava tão bem e rápido.
Algumas carroças serpenteavam perto de um cruzamento à frente, e ela puxou as rédeas para trazer Galahad para trás para uma caminhada. O cavalo de Stratton parou ao lado do dela.
— Foi glorioso — ela disse. — Preciso tentar trazer meu próprio cavalo Thunder para a cidade e acomodá-lo perto de Bedford Square. Então posso cavalgar toda manhã de domingo.
— O que interferiria? Parece um plano simples para mim.
— Theo pode dizer que Thunder não é meu, mas dele. O que, legalmente falando, é verdade.
— Claro que ele não seria tão grosseiro para recusar lhe dar o cavalo que a senhorita montou por anos.
— Oh, consigo lidar com Theo. Mas se minha avó disser para ele recusar, provavelmente vai obedecê-la.
— Ela é apenas uma mulher temível.
— Que palavra estranha o senhor escolheu. Meu irmão está tentando ser independente, mas é difícil quando se depara com tal desencorajamento.
— Mas a senhorita não fica intimidada.
— Vou confessar que, quando a desafio, ainda tremo depois de todos esses anos. No entanto, tremi por tanto tempo que não me rendo mais. Demorou muito para encontrar a coragem. Em alguns anos, espero que meu irmão encontre também.
— Ou não. Não brinquei naquele dia em que nos conhecemos quando me referi à influência dela. Ela ainda tem o poder de afastar as pessoas. Talvez a senhorita consiga desafiá-la porque não se importa tanto com tais coisas. Seu irmão, entretanto, provavelmente se importa.
Será que era de lá que vinha sua coragem? Uma decisão de que ela não seria dominada pelos tipos de chicotes sociais que Vovó usava? Os chicotes haviam estalado muito alto naquele jantar quando ela anunciou que iria se mudar.
E se Vovó cumprisse suas ameaças? Clara não se achava uma escrava da sociedade, mas não gostaria que nunca mais fosse recebida ou que os convites parassem de chegar.
— Vamos até Richmond Hill — Stratton sugeriu, apontando para a rodovia principal a sudeste. — As paisagens são muito bonitas, e podemos dividir o conteúdo desta cesta enquanto as apreciamos.
Richmond Hill era um lugar popular, mas ainda estava muito cedo para ter atraído outros àquela altura. Galoparam de novo, por quilômetros, e chegaram ao pico da colina quase uma hora depois.
Stratton a tirou da sela.
— Vamos ter companhia em breve em um dia como este. Vamos além daquelas árvores ali, então talvez possamos aproveitar a vista do Tâmisa sem crianças correndo para lá e para cá à nossa frente.
Levaram os cavalos para longe do sol e por uma sombra fria de árvores até saírem por uma faixa de grama alta na beirada do pico da colina. Stratton amarrou os cavalos a um galho robusto, depois pegou uma cesta de sua sela.
Clara admirou a vista que se alongava abaixo dela. A caminhada até um terraço serpenteava colina abaixo, de onde visitantes podiam admirar as paisagens. Alguns barcos de lazer haviam se aventurado pelo Tâmisa, que se curvava abaixo. Um navio vazio lentamente seguia para Londres.
Quando voltou a atenção para Stratton, viu que ele havia estendido um cobertor grosso no chão. Estava irregular em alguns lugares por causa da grama e parecia muito com um colchão de penas recentemente enchido e afofado.
Ela olhou para o cobertor, para ele, e para o vinho que saía da cesta. Reparou como as árvores os protegiam de olhares assim como de crianças barulhentas. Não que houvesse algum deles naquele momento ali em cima. Com exceção dos pássaros cantando e de sua própria respiração, ela não conseguia ouvir nenhum som.
Ela e o duque estavam completamente sozinhos. Ele a observou absorver os arredores e o isolamento. O truque era impedi-la de marchar até o cavalo imediatamente. Ele tirou a rolha do vinho e serviu em duas taças de cristal. Estendeu uma a ela.
— Há água também, se quiser.
Após uma longa pausa, ela foi até ele e pegou o vinho.
— O que mais há na cesta?
Ele se sentou e vasculhou.
— Frango assado, queijo, pão, bolos e morangos. E isto. — Ele segurou um ramo de açafrão e narciso.
Ela o pegou e cheirou profundamente, depois sentou-se, ajustando-se para encarar a paisagem, não ele.
— Só vou ficar por causa da beleza e da paz. No entanto, se não tivermos companhia logo, vou precisar ir embora, então não desembrulhe toda essa comida.
— Ficarei feliz por apenas dez minutos. Por causa da paz, como a senhorita disse. — E porque ele poderia olhar para ela enquanto ela observava o rio. Ela era linda com qualquer roupa, até de preto, mas esse traje azul-claro avivava sua beleza. A cor combinava com seus olhos, e o contraste com seu cabelo castanho tornava sua aparência extremamente intensa.
— Acho que um pintor ficaria feliz em tê-la como modelo neste momento, Lady Clara.
Aqueles olhos azuis se viraram para ele.
— Por quê?
— As cores e a luz realçam sua beleza natural, e a senhorita, em troca, melhora a beleza da natureza. Seria uma pintura linda sem qualquer licença artística.
Ela corou e voltou a olhar para o rio. Ele sentiu que a adulação a confundia, como se não estivesse acostumada a elogios e não soubesse como reagir.
— Antes, quando falamos sobre minha avó, pensei que pareceu que o senhor tinha sido uma das vítimas dela — ela disse. — Foi?
— Não. Ela não coloca seu poder contra homens, muito menos aqueles que serão duques.
— Então foi sua mãe? Sei que Vovó não gostava de nada ou ninguém francês, mas isso não era incomum durante a guerra. Sei que ela disse coisas na época, mas não acredito que suas palavras tinham muito peso.
Ele debateu se evitaria ou não essa conversa. Ela o olhou de forma tão sincera, entretanto, que ele se viu explicando.
— As palavras que a senhorita ouviu não são o que importa, mas outras ditas há muito tempo. A viúva não aprovava o casamento de meu pai. Não era da conta dela, mas, na época, ela se via como árbitra da sociedade. E, então, quando minha mãe se mudou para a cidade, a viúva deixou claro que aquela duquesa francesa não deveria ser aceita. A sociedade obedeceu porque era fácil cumprir a ordem da viúva em relação a uma estranha. A campanha foi muito eficiente, e também muito cruel.
Ela baixou a cabeça e fechou os olhos.
— Deve ter sido muito difícil para sua mãe. Ela não tinha amigos em quem confiar aqui. Nenhum círculo onde se sentia bem-vinda.
— É verdade que a fez muito infeliz. Também não ajudou a encorajar nossos pais a serem mais amigáveis.
A solidariedade dela, como no parque, tocou-o. Era bom que ela soubesse o quanto foram difíceis aqueles anos para uma mulher que ela nunca conhecera.
— Então, depois de muitos anos disso, a viúva de repente ergueu sua mão pesada. Talvez tenha se entediado com o jogo. Chegaram convites depois disso, embora, com a guerra, pouquíssimas mulheres a considerassem amiga íntima.
— Estou aliviada em saber que o pior passou, no entanto. Não entendo por que sua mãe, sendo francesa, deveria ter causado tanta mágoa. Ela não era a única imigrante francesa na Inglaterra.
— Ela não era da aristocracia. Provavelmente isso seja parte do problema.
— Por favor, não me diga que ela era irmã de um revolucionário.
— O pai dela era um cientista e nada político. Mas eles pertenciam à classe intelectual burguesa, que sempre era associada a problemas. Então suponho que sempre houvesse aqueles que duvidassem de sua empatia.
Ela franziu o cenho.
— Depois de saber dessa história, estou ainda mais confusa quanto ao motivo de o senhor ter concordado em se reunir com minha família, concordar com um plano para enterrar a espada por meio de um casamento. Penso que preferiria ver minha avó miserável e preocupada, em vez de satisfeita. — O olhar dela se concentrou na paisagem, depois ela se virou diretamente para ele. — Eu não faço parte da sua conspiração, faço?
— Que conspiração poderia ser?
— Não disfarce. O plano era o senhor se casar com Emilia, mas, em vez disso, concentrou suas astúcias em mim. Apenas isso deixaria minha avó apoplética e poderia ser uma vingança pelo que fez à sua mãe.
— Não busco vingança para minha mãe. Nem consigo imaginar por que minha proposta à senhorita em vez de sua irmã importaria para sua avó. O mesmo objetivo é alcançado com qualquer uma de vocês, não é?
Ele se esticou e brincou com uma mecha de cabelo caída da aba do chapéu dela. Um rubor subiu pelo pescoço até o rosto dela. Mas ela não afastou sua mão.
— Minha qualidade mais notável é minha fortuna, eu presumo.
— Uma boa fortuna tem o poder de ofuscar até o mais puro caráter e os olhos mais arrebatadores. No entanto, eu não tenho necessidade de outra fortuna. Essa é a minha qualidade mais notável. Quanto à senhorita, além de seus olhos e sua boca sedutora, sua personalidade despreocupada e seu autoconhecimento me favorecem. De fato, admiro todas essas características que, provavelmente, deixam sua família desesperada e fazem-na chamar de megera.
— Pretendo repreender Theo por isso. Foi muito desleal.
— Ele a fez parecer interessante, não desagradável, como ele pretendia. Eu não iria querer uma mulher dócil, assim como a senhorita não iria querer cavalgar na égua mansa que o cavalariço tentou enviar hoje, em vez de Galahad. — Ele viu um grampo e o tirou. Depois outro. Fincou os dois no chão ao lado do cobertor. — Privei-a de suas armas.
— Guardo um na bolsa.
A bolsa estava fora do alcance dela. Ele tirou seu chapéu e o jogou naquela direção.
Segurou-lhe a nuca e a inclinou na direção dele.
— Acredite em mim quando digo que a desejei desde o dia em que me censurou como invasor. É conveniente que a senhorita me deseje também.
Como ela chegara ali, deitada de costas, com o duque cobrindo-a? Aquele pensamento formigou a mente de Clara quando os beijos possessivos deixaram sua boca e passaram para seu pescoço e colo.
O cabelo macio passou por seu rosto. O peso masculino preenchia os braços dela. As sensações corriam por seu corpo com uma frequência crescente. Ela abriu os olhos um pouco e viu o céu azul acima, depois olhou para baixo onde os beijos agora circulavam seus seios. Ele a fez desejar que o tecido de seu traje não a protegesse tanto dos efeitos completos que ele provocava. A perplexidade sobre a reação dela tinha há muito tempo se transformado em desejo por mais.
Ele provocou um prazer maravilhoso nela. Um prazer perigoso. Ela não prestava atenção a nenhum alerta que sua mente tentava apresentar. Queria mais disso, o suficiente para guardar por meses ou anos, o suficiente para sustentar suas lembranças dos dias em que não se sentia mais tão jovem.
É conveniente que a senhorita me deseje também. Oh, sim, sim. Ela desejava agora. Aquele era o nome do abismo do prazer, de mais atrevido que ela esperava que ele fosse, da urgência em seu sangue.
Ela passou a mão pelos ombros dele, sentindo seu corpo, depois desceu por suas costas. Os músculos dele sob sua palma excitaram-na ainda mais. Aqueles beijos queimavam suas roupas agora, provocando-a até ela arquear para ele.
O carinho dele subiu por seu corpo até se aproximar de seu seio. Ela pensou que pudesse morrer com aquela tortura deliciosa que ele criou ali. Tocou-a como se soubesse exatamente como levá-la ainda mais à loucura.
Logo, ela não conseguia controlar suas reações. Imaginou-o arrancando as roupas dela, cobrindo-a completamente e atendendo à necessidade que pulsava e chamava agora, que entoava pedidos urgentes em sua mente.
Ele não fez nada disso. Para sua decepção extrema, até parou os melhores carinhos e, logo, tirou a mão de seu seio. Ela queria gritar.
— A senhorita é muito provocante para aguentar — ele murmurou antes de beijar seu pescoço delicadamente. — Sua excitação incendeia mais ainda a minha. Porém — beijou de novo —, não estamos mais sozinhos.
Então ela os ouviu. Havia outros na colina. Não muitos, e não muito perto, mas ela compreendeu o que teria sido visto naquele cobertor logo, se Stratton não tivesse se controlado mais do que ela.
Ela se sentou de repente, depois se levantou atrapalhada e colocou o chapéu. Stratton lhe entregou os grampos para que ela pudesse enfiá-los na cabeça.
Quando ela terminou, ele estava com a cesta e o cobertor prontos para ir. Ele olhou para os arbustos, depois foi até ela, pegou sua cabeça firmemente e deu um último e ardente beijo. E ela adorou, cada segundo dele, mas... que Deus a ajudasse, o que ela tinha feito?
Stratton soltou os cavalos. O mundo se tornou real demais. Ela achou esquisito ainda estar com ele, e pior ainda ele erguê-la para subir na sela.
Evitou qualquer outra intimidade na volta à cidade. Cavalgou bruscamente, galopando quando podia. Não queria conversar com ele. Conversar casualmente seria impossível. O que ela poderia dizer depois do que acontecera?
Para sua surpresa, ele a alcançou e pegou a rédea de Galahad enquanto andavam até a ponte. Stratton segurou firmemente o cavalo.
— A senhorita está envergonhada. Não fique.
— Não estou envergonhada. Estou... assustada. — Parecia a melhor palavra para a confusão de sentimentos dentro dela. — Não deveria ter... Nós não deveríamos ter...
— Eu quero a senhorita, e a senhorita me quer. Claro que deveríamos ter.
— Eu não quero... — Ela parou com a mentira antes de terminar. Oh, que mentira. Mesmo agora, com todas as suas suspeitas reavivadas, ela o queria. Só de olhar para ele fazia seu corpo traí-la em centenas de maneiras. Não seja covarde, ela se repreendeu. Não finja. Ele já sabe a verdade. — Eu não deveria querer o senhor — ela disse firmemente.
Ela puxou as rédeas e libertou Galahad da mão dele. Trotou, cruzando a ponte, e foi para Bedford Square. Ao longo do caminho, o resto da névoa sensual se foi, deixando o mundo bem nítido.
Seus pensamentos não abandonavam o homem cavalgando ao seu lado. Só que, em vez de seu corpo suspirar com prazer, sua mente agora insistia em listar os muitos motivos pelos quais ela não deveria querê-lo. Não apenas a antiga animosidade o tornava um tipo de fruto proibido. Outras considerações se forçavam a entrar em sua mente mais diretamente do que no passado. Ele poderia ter voltado por vingança, os boatos diziam. Contra quem? Por qual motivo? Pensou no quanto Vovó queria fazer as pazes com ele, e no quanto Theo estava com medo. Seria possível que pensassem que o perigo vinha, não daquela velha briga, mas de algo mais recente? Será que Statton queria vingança contra eles?
Ela queria rejeitar essa hipótese porque mudava o motivo de ele segui-la. Transformava aqueles beijos em algo não romântico e calculado. Havia todo tipo de vingança, afinal. Todo tipo de formas de vencer o inimigo. Nem todas exigiam pistolas ou espadas.
Ela olhou para ele por cima do ombro. Ele estava muito lindo em cima de seu garanhão. Muito confiante também, como se soubesse que iria ganhar a batalha. Se era isso, ela era o prêmio. Um deles não estava atormentado pelas dúvidas sobre o que aconteceu naquela colina.
A senhorita me quer, e eu quero a senhorita. Ela não podia discordar disso. Mas um ato poderia ser motivado pelo desejo e também por outras coisas muito menos honráveis.
Assim que chegaram em Bedford Square, ela desceu de sua sela, sem se importar no quanto parecia estabanada. Pegou as rédeas e as colocou nas mãos de Stratton.
— Obrigada. No entanto, não posso fazer isso de novo. Não posso fazer isso de novo. Por favor, não me visite no futuro.
decisão de Clara de ele não a visitar de novo irritou Adam profundamente por dois dias. Não apenas seu desejo se frustrou, mas também sua convicção de que ele estava progredindo na busca por toda a verdade sobre seu pai.
Na terceira manhã depois da cavalgada, teve uma ideia de como ter a companhia dela de novo. Combinou de encontrar Langford e Brentworth mais tarde naquele dia.
A garrafa de vinho do porto que eles dividiram estava na metade antes de Adam propor a Langford que desse uma festa de jardim na casa dele. Estavam sentados em um salão de jogos no White’s, perdendo dinheiro uns para os outros naquela noite chuvosa, fazendo as piores apostas em coisas ridículas.
— Então, pensei que você quisesse nos reunir pela amizade, em vez disso, tinha motivos ocultos. Devo dizer, o mais direto que posso sendo educado, que, se precisa de uma festa de jardim, deve dá-la você mesmo, Stratton.
— Ele não pode — Brentworth disse depois de virar o copo. — Se ele der a festa, não poderá passar o tempo todo flertando com Lady Clara.
— Não tenho motivo oculto — Adam rebateu. — Nem sugeri que ele convide Lady Clara.
— Ainda não. Mas estava chegando a hora — Brentworth respondeu.
— Interesse próprio foi a última coisa que pensei. De fato, a ideia me ocorreu porque Langford fica reclamando sobre ser perseguido por aquelas mães. Se der uma festa e não convidar as duas jovens em questão, deveria pôr um fim em todo esse boato.
— Boato? Que boato? — Langford se sentou ereto, de repente, alerta.
— Oh. Você não soube? Que gafe a minha mencionar.
— Não se castigue, Stratton. Ele seria obrigado a falar sobre isso em certo momento — Brentworth disse.
— Falar sobre o quê? Fale claramente, um de vocês.
— Há um boato de que a senhorita Hermione Galsworthy espera uma proposta antes que a Temporada acabe — Adam disse. — Em breve, na verdade. Dizem que...
— A mãe dela só está inventando fofoca na esperança de que eu morda a isca. Essas mulheres são negligentes. Bom, não vou morder. Vou...
— Dizem — Brentworth repetiu — que você a beijou no baile Fulton. Atrás de um vaso. De verdade, Langford, se vai se comportar mal, tente ser mais discreto.
Langford ficou pálido e deu um longo gole no vinho do porto.
— Bom, você a beijou? — Adam perguntou. — Se vai permitir que o inimigo o comprometa assim, vou ter que reconsiderar o respeito que dou ao seu conselho sobre estratégias.
— Eu não a beijei... Ela... me beijou.
Brentworth se inclinou e fez uma expressão perplexa.
— Como isso aconteceu? Ela tem a metade da sua altura. Ela subiu em uma cadeira, segurou você pelas orelhas e lhe deu um beijo? Fingiu que tinha um cisco no olho, depois roubou um beijo quando você se abaixou para verificar?
Langford fez careta para ele.
— Pode ver como minha ideia é brilhante — Adam disse. — Dê essa festa de jardim, mas não a convide nem à outra cuja mãe provavelmente está tramando como comprometê-lo completamente agora que as apostas aumentaram e o tempo é essencial.
Langford estreitou os olhos para Adam.
— Talvez eu dê. Deveria também deixar Marwood e a família fora da lista de convidados, para ninguém interpretar mal meu interesse na irmã dele.
— Não me importo se convida Marwood. Quanto à irmã mais nova, seu irmão Harry vai querer que ela esteja lá, tenho certeza. Pareceu bem interessado em Lady Emilia quando todos nós visitamos a casa de Marwood naquele dia. Já que ela vai precisar de uma acompanhante, também pode convidar a avó dela...
— Não.
— Ou a irmã mais velha.
Brentworth sorriu.
— Bem pensado, Stratton.
— Langford pode ser o príncipe da sedução, mas eu me orgulho de ser rei de me aproveitar das consequências disso.
— É melhor que Brentworth, que se tornou imperador de não se divertir.
— Por que diz essas coisas? Sabe muito bem que não é verdade — Brentworth disse.
Langford lançou um olhar sincero para Adam.
— Houve uma festa boa no verão passado. Brentworth aqui dignou-se a ir. Só que, quando ele chegou, fez todos nós prometermos não encorajar fofocas sobre isso depois.
— Não achei que, naquele tempo incerto, beneficiaria o reino ter todas as salas de estar e lojas de café ocupadas com lordes perseguindo ciprianos nus nas florestas no lago Country durante um jogo de deuses e ninfas.
— A fofoca é metade da diversão. Se você não aprovasse, não deveria ter ido e aproveitado tanto.
— Não era uma questão de aprovação, mas de discrição. Sei que essa palavra não está em seu vocabulário, mas vale a pena aprender.
— Que se dane a discrição.
— Como você sempre disse. Já que seu comportamento indiscreto não o está salvando daquelas mães, e está realmente sendo usado contra você, sua reputação não lhe dá nenhum crédito nem lhe beneficia. Eu, por outro lado, estou maravilhosamente livre de tais táticas femininas. Quem de nós você acha que conseguiu lidar mais sabiamente com isso?
— Ele as assusta — Langford disse para Adam. — A cara que ele faz quando sofre os agrados delas faz até a mãe mais ambiciosa se encolher. É chamado de o Duque Mais Duquês. Não é um elogio.
— Se previne que garotinhas se joguem em mim, vou me acostumar ao título. — Brentworth balançou a cabeça. — Um vaso? O que pensou que iria acontecer quando a namoradeira o levou para lá?
Langford corou de novo.
— Bom, não tenho intenção de dar uma festa de jardim. Eu seria motivo de risada. Mulheres mais velhas que devem dá-las.
— Já que Langford aqui é muito teimoso para enxergar a salvação que seu plano oferece, eu o farei, Stratton, e o salvarei de cuspir para cima — Brentworth disse. — Meu jardim é muito mais bonito, de qualquer forma.
— Eu tenho um jardim muito lindo — Langford rebateu.
— O de Brentworth é melhor — Adam discordou. — Mas você irá, e preste muita atenção às jovens convidadas, para que ninguém conclua que você de fato se afetuou a Hermione Galsworthy.
— Eu vou, contanto que entenda que não vou flertar com a irmã mais nova de Marwood — Langford concedeu. — Deixe meu irmão Harry fazer isso, se ele souber como.
— Não quero que flerte com nenhuma das irmãs de Marwood — Adam disse diretamente.
— Daqui a uma semana, então — Brentworth decidiu. — Não haverá vasos, Stratton, mas o jardim está repleto de arbustos obscuros perfeitos para seu objetivo. Acredito que fará bom uso deles. Discretamente.
— Eu disse que meu plano não é para o meu bem, mas o de Langford.
— Ah. Claro. Perdão. Esqueci essa parte.
— Ainda penso que a senhorita precisa de um mordomo — Jocelyn murmurou no ouvido de Clara enquanto colocava uma bandeja com refrescos.
Clara a ignorou. Em três dias, uma governanta assumiria tarefas como servir chá e café a convidados e atender à porta. Outra mulher limparia. Uma terceira cozinharia. Sua equipe da casa estava se expandindo de maneira satisfatória até onde ela sabia.
O único buraco na lista eram o cocheiro e o mordomo. Ela iria preencher aquelas vagas, depois comprar uma carruagem e dois cavalos para puxá-la. Talvez comprasse um cavalo para cavalgar também. Gostou muito de galopar em Galahad.
Seus pensamentos mudaram rapidamente de galopar para outras atividades nas quais se envolveu naquele dia, já que elas também foram, majoritariamente, partidas de Stratton. Não se importaria muito se aquelas lembranças gerassem repulsa ou, no mínimo, autocondenação. Infelizmente, em vez disso, ela se viu bem corada e excitada antes de incitar uma reação mais apropriada e também se lembrar de que ele talvez tivesse motivos ocultos.
Aquele breve lapso romântico tinha sido bom, mas ela esperava que Stratton não interpretasse mal ou desse um significado especial para ele. Se o fizesse, ela precisaria lembrá-lo de sua opinião em relação a casamento. Alguns beijos e carinhos eram inofensivos, mas ela não permitiria que qualquer homem fosse dono dela, que era o significado de casamento.
Deixou esses pensamentos de lado para que nenhuma de suas convidadas comentasse seu rubor. Felizmente, elas estavam ocupadas aceitando xícaras de chá ou café de Jocelyn e pegando bolinhos com a ponta dos dedos.
— A impressão terminará amanhã e as cópias das assinantes vão para o correio no fim da semana — Althea disse. — Clara se reuniu com nossas mulheres entregadoras na segunda, e cada uma virá e receberá as cópias que levará às livrarias que atende.
Lady Farnsworth, de cabelo escuro e olhos de aço, equilibrava sua xícara e o pires em uma mão enquanto examinava uma prova do jornal com a outra.
— É certamente o volume mais impressionante até agora. Acho que a ordem das entradas lhe dá certa seriedade sem parecer tão pesado quanto para entediar um tolo.
O artigo de Lady Farnsworth vinha primeiro. Ela era uma das colaboradoras que usavam o nome verdadeiro, e um artigo político da viúva de um barão dava seriedade ao jornal. Tão politicamente interessada quanto qualquer homem, Lady Farnsworth poderia não ser recebida pelas damas mais chiques, que não gostavam de sua excentricidade crescente, mas diziam que os homens mais inteligentes gostavam de sua companhia. Quanto à sua posição social, ela tinha há muito tempo expressado suas opiniões no que ela chamava de esquisitices tribais aos montes. No fim de sua vida, parara de se importar com quem gostava dela.
Clara e Althea haviam decidido que apenas as notícias de Lady Farnsworth dariam credibilidade ao jornal e ficaram encantadas quando o convite delas de escrever para o Parnassus fora aceito. Pelo menos poderiam reprimir qualquer crítica de que um jornal cheio de colunistas aparentemente anônimos também poderia ser trabalho de apenas uma pessoa.
— Estou mais impressionada de como a impressão gravou os desenhos que eu tinha feito — Lady Grace disse. Ela limpou os dedos delicados na toalha, para que o açúcar no bolo não sujasse seu conjunto de seda impecavelmente costurado. Lady Grace sempre usava roupas que deixavam Clara com inveja, e sua estrutura alta e esguia engrandeciam perfeitamente esses trajes. Finalizando com seu rosto delicado, cabelo bem escuro e uma boca cor-de-rosa, e outras mulheres poderiam ter desculpas para odiá-la. — Espero que ele inclua aquelas páginas corretamente.
— Nós vimos as primeiras cópias que saíram, e ele conseguiu fazer perfeitamente — Clara informou. Aquelas páginas haviam custado um centavo. Ela não poderia negar que um artigo sobre moda era muito melhor com desenhos sobre o assunto. Se o Parnassus um dia tivesse que arcar com tudo, no entanto, isso seria um luxo com o qual não poderia arcar.
— Tudo parece em ordem — Lady Farnsworth afirmou, colocando a prova de lado. — Você se superou. Ouso dizer que deveríamos brindar com algo mais comemorativo do que café.
— Não tenho licor, infelizmente.
— O que você tem?
Althea deu um sorriso diabólico para Clara.
— É, o que você tem? Certamente há algo aqui para propósitos medicinais.
— Acho que deve haver um pouco de xerez. Jocelyn, veja se consegue encontrar o xerez e quatro taças.
Jocelyn não teve dificuldade em encontrá-lo, já que ficava em um armário próximo onde poderia pegar com facilidade, doente ou não. De fato, Clara guardava algumas taças ali com ele.
Lady Farnsworth pegou o decanter e se serviu de uma taça cheia antes de devolver a Jocelyn. A dama fez as honras para as outras.
— Oh, vejam, você publicou outro poema da sra. Clark. Estou tão feliz — Lady Grace disse. Ela ainda revisava sua prova, aberta no colo. — Oh, nossa, esta é diretamente satírica. — Ela leu enquanto bebia. Algumas risadas pontuavam sua concentração. — O nome dela é mesmo sra. Clark?
— É.
— Há milhares de sras. Clark em Londres, então ela também pode usá-lo — Lady Farnsworth pontuou. — Um nome desse é tão bom quanto ser anônimo.
Diferente do meu nome, que é agora bem conhecido e precisa de coragem para usá-lo, ela também poderia ter dito, já que seu comentário incluía aquela implicação.
— Vamos fazer outro volume antes de a Temporada acabar? — Lady Grace questionou. — Pergunto para saber se preciso fazer anotações quando for a festas.
— Gostaria de tentar publicar a cada dois meses, se conseguirmos — Clara disse. — Agora que estou morando aqui, posso conseguir ajuda com mais facilidade, para que não recaia tudo sobre mim e Althea.
As sobrancelhas de Lady Farnsworth se arquearam.
— Está morando aqui? — perguntou não muito surpresa, mas o tom foi surpreendente.
— Mudei-me na semana passada.
— Isso é bom? Quero dizer, uma mulher sozinha...
— Não estou sozinha, e ficarei menos sozinha conforme os criados que contratei começarem a chegar.
— Sua avó não pode ter aprovado, não que ela aprove muita coisa, de qualquer forma. — Lady Farnsworth nunca escondia o desgosto pela avó de Clara. As duas eram da mesma geração, e Clara supunha que tinha acontecido algo desagradável entre elas no passado.
Lady Grace riu.
— Acho que é seguro dizer que não. Estou correta, não estou, Clara? Mas nossa Clara é valente, e eu diria corajosa! Se meu irmão não fosse tão maleável, eu ficaria tentada a fazer o mesmo. — Ela colocou sua taça na mesa. — Preciso ir agora. Estou ansiosa para receber minha cópia, Clara. Você e Althea têm um ótimo jornal aqui, e será comentado por todo lado.
Ela se levantou. Lady Farnsworth soltou sua bebida e também se levantou.
— Não será só isso que será comentado — ela murmurou.
Assim que Clara acompanhou-as para fora, voltou e viu Althea folheando uma das provas.
— Nós nos superamos, se posso dizer, Clara. No entanto, a cada dois meses pode ser muito ambicioso.
— Não vamos saber até tentar.
— Mas vamos precisar de mais colaboradoras. Se publicar com essa frequência, não podem ser sempre os mesmos nomes e vozes.
— Então vamos procurar outras pessoas — ela falou confiante, mas sem saber como faria. — É difícil expandir as assinaturas a menos que haja uma regularidade na publicação, então, se quero levar isso a sério, preciso pensar em como será.
— Trimestral seria aceitável.
Clara confiava no julgamento de Althea. O fato de sua amiga aconselhar um crescimento mais cauteloso era um caminho a ser considerado.
Althea se esticou para um dos bolos.
— Lady Grace é muito engraçada. Pegou um desses imediatamente, mas tivemos que ouvi-la dizer oh, não deveria três vezes enquanto ela o comia. Queria que mulheres não fizessem isso. Ou que aproveitassem o pecado ou não se comprometessem com ele. E, tendo abraçado o pecado, não choramingar depois de como isso poderá deixá-las robustas.
— Peque livremente ou nem peque, você quer dizer.
— Exatamente. Talvez eu escreva meu próximo artigo sobre isso. É um ponto de vista que as mulheres precisam ouvir.
Clara pensou se Althea falaria apenas de comer bolos naquele artigo. Conhecendo-a, provavelmente não. Outros pecados seriam levantados em seu argumento. Althea era lógica e consistente.
— É assim que você vive, Althea? Peca livremente?
— Há indícios de que eu não peco. Você não me viu devorando seus bolos hoje.
— Não estou falando de bolos.
Althea virou todo o corpo na direção de Clara.
— O que está me perguntando?
Althea provavelmente era a amiga mais próxima de Clara no momento, mas ela viu que não poderia dizer o que significava.
— Está me perguntando se eu tive casos, Clara?
— Claro que não. Seria grosseiro e ousado.
— Mas não se importaria se eu desabafasse com você, correto?
— Por favor, não. Eu nunca deveria ter dito isso. — Ela se inclinou para a frente e pegou o decanter. — De repente, isso parece atraente.
— Não se desculpe. Está curiosa. Assim como eu. Penso por que esse assunto é de seu interesse agora.
Clara bebeu mais do xerez do que era normal para ela. Deu-lhe algo para fazer enquanto encontrava uma forma de desconversar.
— Você pensou em ter um amante? — Althea perguntou. — É esse o verdadeiro motivo pelo qual se mudou para cá, ou pelo menos um deles?
— Não tenho necessidade de um amante. Pelo menos não agora. Simplesmente perguntei-me se, à medida que as mulheres amadurecem, a opinião delas sobre tais assuntos muda.
— Definitivamente. Se a sua está mudando, você não é incomum. Não somos mais meninas.
Ali estava. Ela não era incomum por se achar indiferente às regras com as quais era aterrorizada quando garota. Não era incomum ficar fascinada por prazeres por muito tempo negados a ela. Supôs que parte da mudança era que agora ela tinha muito menos a perder.
— Claro — Althea continuou — que sua situação não é parecida com a minha. Eu sou viúva. Você não é. Faz diferença. Tenho certeza de que entende isso.
— Muito bem. Ninguém ergueria as sobrancelhas ao saber que você se mudou para a própria casa, estou certa.
— Duvido que sobrancelhas seriam erguidas se eu tivesse um amante, como pensou. Você, por outro lado... — Althea se esticou para lhe dar um aperto delicado na mão. — É o caminho de uma mulher solteira, suponho. Todas essas ideias sobre virtude e inocência recaem sobre tais mulheres eternamente. Até Lady Farnsworth, que se orgulha de sua liberdade, não aprovaria se você ficasse com algum homem. Nem ele sairia ileso depois de se aproveitar de você.
Não posso dizer que ele se aproveitou. Eu gostaria, mas não posso.
Jocelyn entrou para levar a bandeja. Antes de chegar nela, tirou uma carta do bolso do avental e entregou para Clara.
Althea havia se levantado a fim de se preparar para sair, mas parou quando viu a carta.
— Parece importante. Papel superior e uma letra muito linda. E postado.
Clara abriu para que pudesse satisfazer ambas as curiosidades.
— Que estranho. Eu mal o conheço. — Entregou a carta para Althea. — O Duque de Brentworth me convidou para uma festa na próxima semana. Uma festa de jardim.
— Dizem que é o mais bonito da cidade. O jardim, quero dizer. O que diz sobre sua irmã?
— Ele não pode convidá-la diretamente, já que ela não está saindo, mas a incluiu em meu convite. Se eu contar para ela, vai insistir em ir, então também precisarei ir.
— Sua avó poderia acompanhar se ele convidasse toda a sua família.
— Descobrirei se Brentworth convidou toda a minha família. Nada que ouvi sobre o homem sugeria que ele sofreria voluntariamente com a presunção de Vovó, mas pode tê-la convidado mesmo assim.
— Se não, você deve cumprir o dever, pelo bem de sua irmã.
— Se é um sacrifício, suponho que consiga aguentar.
Althea riu e lhe deu um beijo de despedida. Clara leu o convite de novo e pensou se Madame Tissot teria um de seus novos vestidos prontos a tempo.
dam atrasou-se para ir à festa de jardim de Brentworth pela chegada de uma carta no período da tarde. Ao ver a letra, mandou seu criado para longe enquanto a lia.
A letra de sua mãe mostrava o equilíbrio de sempre, mas suas palavras foram menos reconfortantes.