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30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
CONTINUA
30. Continue V. E. Ilustríssima a leitura: Se não estiver enganado, não foi um movimento qualquer do cometa que atormentou Galileu e o obrigou a inventar alguma coisa que desconhecia ou que não se atrevia a expor, mas o atormentou apenas aquele movimento mediante o qual, além do nosso vértice ou zênite, ele aproxima-se mais do polo.
Então, se o cometa não tivesse chegado além do zênite, não haveria existido a necessidade de Galileu cogitar a respeito deste outro movimento. Ele mesmo parece admitir isto com suas próprias palavras quando diz: Se não colocarmos outro movimento a não ser o movimento reto e perpendicular, afirmaremos, então, que o cometa sobe só em linha reta em relação ao nosso zênite e não irá mais para a frente. Admitamos, então, que nunca cometa algum haja ido além do nosso zênite; afirmamos, todavia, que mesmo assim seu movimento pode explicar-se com este movimento retilíneo. Com efeito, consideremos o globo terrestre ABC, sendo B o lugar de onde sobe o vapor; o olho do espectador encontrar-se-á em A, tendo sido observado o cometa no começo, por exemplo, em E, e seja G o lugar a ele correspondente no céu; consideremos que o cometa se movimente para cima ao longo da linha BO, por espaços iguais E, F, FM, MO: afirmo que, mesmo que todo aquele vapor suba ao longo da linha DO, nunca, por toda a eternidade, alcançará o nosso zênite, nem aparentemente. Com efeito, vamos traçando uma linha AR paralela à BO: nunca o movimento aparente do cometa resultará ser amplo quanto o GR e nunca o raio visual poderá coincidir com a linha AR.
Como, com efeito, o raio visível deve sempre encontrar-se com a reta BO, ao longo da qual aparece o cometa, e como o raio AR é paralelo à linha BO, não poderá nunca encontrar-se com as camadas paralelas: portanto, nunca o raio por meio do qual vê-se o cometa poderá alcançar R; e, por consequência, o movimento aparente do cometa não somente não alcançará nosso zênite S mas nem o ponto R que se encontra muito longe do zênite. Aparecerá, com efeito, no começo em G, depois em F, depois em I, enfim em L, etc.; mas nunca alcançará R.
Sarsi volta, como V. E. Ilustríssima percebe, a alterar o texto do Sr. Mário, querendo demonstrar que ele escreveu que o movimento perpendicular à Terra tivesse a finalidade de conduzir o cometa ao ponto vertical; isto não se encontra em seu texto, mas encontra-se, pelo contrário, que tal movimento procederia rumo ao vértice: segundo meu parecer, Sarsi age assim para ter ocasião de nos apresentar esta demonstração geométrica, construída sobre fundamentos não mais profundos que o raciocínio sobre a definição das linhas paralelas, de cuja ação alguém poderia talvez deduzir uma conclusão não muito honrosa para Sarsi. Pois, ou ele acha esta sua conclusão e demonstração uma coisa muito inteligente e invulgar, ou algo que podia haver sido demonstrado também por crianças: se ele a considera uma coisa infantil, pode ter certeza de que nem o Sr. Mário nem eu nos encontramos num nível de conhecimento tão infeliz que por falta de tal conhecimento tivéssemos que errar; porém, se ele a considera como coisa sutil e nova, eu não saberia como evitar pensar que ele é de uma inteligência pobre e que precisa retornar à disciplina do Mestre. A verdade, então, é que o movimento perpendicular à superfície terrestre não alcança nunca o vértice (com exceção, porém, daquele que sai do mesmo lugar do observador, coisa esta que talvez Sarsi não nota), mas é também verdade que nunca nós afirmamos que ele o alcance.
31. Além disso, desde que, como Galileu mesmo afirma, o movimento do cometa pareceu mais rápido no começo e diminuiu pouco a pouco, é necessário ver em que proporção a diminuição do movimento deve proceder nesta linha reta.
Com certeza, se examinarmos afigura de Galileu, quando o cometa encontrar-se em E, veremos que aparecerá em G; quando depois, percorrendo os espaços iguais EF, FM, MO, mostrar seu movimento aparente nos pontos F, I, L, ver-se-á que seu movimento alcança a diminuição máxima; porque o arco FI resulta ser apenas a metade de GF, e IL a metade de FI, e assim para os outros, o movimento aparente do cometa deve diminuir, então, na mesma proporção. É necessário saber, porém, que o movimento observado do cometa não diminui nesta proporção: pelo contrário, nos primeiros dias sua diminuição foi tão insignificante que não era percebida com facilidade. Com efeito, percorrendo no início mais ou menos três graus por dia, tendo já decorrido vinte dias, pareceu haver diminuído apenas um pouco aquela velocidade inicial. Se quisermos até julgar os cometas de Tycho dos anos de 1577 e 1585, poderemos com clareza entender como permaneceram afastados daquela grande diminuição. Se alguém me perguntar agora em que consistirá, então, a medida do movimento aparente do cometa ascendente em linha reta, respondo: se o cometa começar a aparecer quando o vapor que o produz não se encontra muito distante da Lua, coisa muito provável, e além disso considerarmos que o lugar do globo terrestre do qual o vapor se eleva seja distante de nós sessenta graus, respondo que o movimento aparente do cometa, por todo o tempo de sua duração, transporá menos de um grau em 31 minutos. Com efeito, seja o globo terrestre ABC, a concavidade da Lua GFH, distante do centro D da Terra 33 semidiâmetros, segundo Ptolomeu; Tycho, na realidade, coloca uma distância quase dupla, o que seria mais vantajoso para mim; e seja A o lugar do qual enxerga-se o cometa, B o lugar do qual sobe o vapor. Afirmo que quando se vir o cometa em E, o ângulo DE A será de um grau e 31 minutos; por isso, se traçarmos AF paralela a DE, o ângulo FAE será também de um grau e 31 minutos, pois é alternado com DAE entre as mesmas paralelas; então as duas retas, AE e AF, interceptarão no céu o arco de um grau e 31 minutos. Mas a reta AF, paralela a DE, não alcançará nunca o cometa como ficou assentado antes: então ele não concluirá nunca o movimento de um grau e 31 minutos. O fato de o ângulo DEA encontrar-se no côncavo da Lua com um grau e 31 minutos é facilmente demonstrável. Porque, como é conhecido por hipótese, o ângulo EDA havendo sessenta graus no triângulo ADE, e além disso o lado AD de um semidiâmetro terrestre, e o lado DE de 33 semidiámetros; aceitando que 36, soma dos dois lados AD, DE, está para 32, diferença dos mesmos lados, assim 173 205, tangente da semissoma dos outros dois ângulos, isto é, do ângulo de sessenta graus, está ao quarto número, encontrar-se-á 163 036, tangente do ângulo de 58 graus e 29 minutos, os quais, subtraídos de sessenta graus, isto é, da metade dos dois ângulos remanescentes, deixarão o ângulo DEA de um grau e 31 minutos, segundo regras trigonométricos.
Eu acreditei, pela demonstração anterior de Sarsi, que ele tivesse visto, e talvez entendido, o primeiro livro dos Elementos da geometria; porém aquilo que ele escreve aqui me coloca em grande dúvida a respeito de sua habilidade matemática, pois, pela figura delineada arbitrariamente, quer tirar a proporção da diminuição da velocidade aparente do movimento atribuído pelo Sr. Mário ao cometa onde ele já havia demonstrado não haver observado que em todos os livros dos matemáticos nunca ninguém se preocupou com as figuras, todas as vezes que é relatada a descrição; e que em astronomia particularmente seria de todo impossível querer manter, nas figuras, as proporções que realmente existem entre os movimentos, as distâncias e as grandezas dos orbes celestes, proporções que sem prejuízo algum da ciência alteram-se tanto que aquele círculo ou ângulo que deveria ser mil vezes maior que outro não alcança nem dois ou três graus.
Observe-se, agora, também o segundo erro de Sarsi, isto é, imaginar que o mesmo movimento deve aparecer realizado com as mesmas aparentes desigualdades por todos os lugares de onde ele seja observado e por todas as distâncias ou alturas onde o objeto móvel se encontre. Todavia a verdade é que, havendo marcado no movimento retilíneo, ascendente em forma perpendicular, muitos espaços iguais, por exemplo, os movimentos aparentes de quatro partes próximas da Terra apresentarão no céu entre elas mutações muito mais desiguais que aquelas de quatro outras partes bem afastadas; assim, a desigualdade, que nas partes baixas era grandíssima, estando longe, nas outras permanecerá, em vez, insensível Assim da mesma forma, em outra proporção, parecerão realizar-se os mesmos atrasos se o observador estiver perto do início da linha do movimento, e não parecerão estar longe. Contudo Sarsi, pois encontra na figura (pág. 179) que os arcos GF, FI, IL, isto é, os movimentos aparentes, diminuem grandemente e muito mais daquilo que não foi percebido no movimento do cometa, persuadiu-se de que tal movimento não pode ser apto de forma alguma, para ele, nem percebeu como tais diminuições podem aparecer sempre menos desiguais, conforme a altura do objeto móvel seja maior. Ele sabe muito bem que nas figuras não se observam, nem é muito importante observar, as devidas proporções, o que ele mesmo nos testemunha naquela figura onde mostra que o ângulo DEA é só de um grau e meio apesar de mostrar-se a nós no desenho com mais de quinze graus, e o semidiâmetro da concavidade lunar DE é apenas triplo do semidiâmetro terrestre DB, que ele afirma ser 33 vezes maior; isso devia-lhe ser suficiente para conhecer quão grande é a ingenuidade daquele que quisesse descobrir o raciocínio de um geômetra medindo com os instrumentos suas figuras. Então, concluindo, afirmo, Sr. Lotário, que pode existir muito bem, em um mesmo movimento retilíneo e uniforme, uma aparente diminuição, grande, média, pequena, mínima ou mesmo não perceptível; e se quiserdes provar que nenhuma delas corresponde ao movimento do cometa, será necessário que desenheis outra figura em vez de medir as já desenhadas; e vos asseguro que escrevendo vós tais coisas não receberíeis o aplauso de outros, a não ser daqueles que não entendem nem o Sr. Mário nem mesmo a vós e que dão vitória ao mais prolixo e àquele que fala por último.
Escute, V. E. Ilustríssima, aquilo que apresenta Sarsi por último. Ele quer provar, segundo meu parecer, por aquilo que relata sobre a pequenez do movimento aparente que o movimento retilíneo, já muitas vezes lembrado, não é absolutamente apto para o cometa (acredito nisto mas não tenho certeza, pois o mesmo autor, depois de suas demonstrações e cálculos, não conclui nada). Por causa disso pressupõe ele que o cometa, em sua primeira aparição, distasse da Terra 32 semidiâmetros terrestres, e que o observador estivesse colocado sessenta graus longe do ponto da superfície terrestre que perpendicularmente encontra-se abaixo da linha do movimento deste cometa; manifestadas as duas hipóteses, demonstra que a quantidade do movimento aparente pode alcançar, no céu, apenas um grau e meio; e termina aqui sua exposição, sem finalidade e sem chegar a conclusão alguma. Porque Sarsi não o fez, vou tirar eu, então, duas conclusões: a primeira será que o mesmo Sarsi gostaria que o leitor ingênuo chegasse a uma conclusão por si mesmo, e a outra que verdadeiramente deriva daquela premissa e que não é fruto de pessoas ignorantes. Eis a primeira: "Então, leitor, em cujo ouvido ressoa aquilo que foi demonstrado acima, isto é, que o movimento aparente de nosso cometa percorreu o céu, por muitas e muitas dezenas de graus, raciocine agora e fique certo de que o movimento retilíneo do Sr. Mário de forma alguma se lhe assenta, pois, com muita dificuldade, pode por meio dele superar um único grau e meio". Esta é a conclusão dos ingênuos. Mas quem possuir elementos de lógica, juntando as premissas de Sarsi com as conclusões, formará este silogismo: "Aceitando que o cometa, em seu aparecer, fosse alto 32 semidiametros terrestres, e que o observador se encontrasse sessenta graus longe da linha de seu movimento, a quantidade de seu movimento aparente não podia exceder-se de um grau e meio; mas ele excedeu-se dezenas e dezenas de graus; (agora surge a verdadeira consequência) então, no tempo das primeiras observações, nosso cometa não se encontrava 32 semidiametros acima da Terra, nem o observador se encontrava sessenta graus longe da linha do seu movimento". De boa vontade seja concedido isto a Sarsi, porque esta é uma conclusão que destrói suas próprias premissas: mesmo que, de um certo ponto de vista, seu silogismo permaneça imperfeito, nem se oponha ao Sr. Mário, o qual já abertamente escreveu que um simples movimento retilíneo não é suficiente para satisfazer à aparente mutação do cometa, mas é necessário acrescentar alguma outra causa de seu desvio; este raciocínio, esquecido por Sarsi, tira toda força a qualquer raciocínio seu. Mas é bem conhecido, além disso, outro grande erro de lógica em seu discurso. Sarsi quer, pela grande mudança de lugar do cometa, demonstrar que o movimento retilíneo do Sr. Mário não lhe era adequado, porque a mudança que se origina de tal movimento é pequena: e, pois, a verdade é que a este movimento retilíneo podem seguir mudanças pequenas, medíocres e mesmo muito grandes, conforme o objeto móvel se encontre mais acima ou mais abaixo, e o observador mais ou menos longe da linha deste movimento, Sarsi, sem perguntar para o opositor a que altura ou a que distância se encontra o objeto e o observador, coloca ambos em lugares adaptados à sua necessidade e não à do opositor, e afirma: Aceitamos que o cometa, em princípio, seja alto 32 semidiametros, e o observador afastado sessenta graus. Porém, Sr. Lotário, se o opositor disser que o cometa não se encontrava a muitas milhas de distância e o observador também bastante perto, o que fareis deste silogismo? Qual será vossa conclusão? Nenhuma.
Haveria sido necessário que nós, e não vós, houvéssemos atribuído ao cometa e ao observador tais distâncias e então nos haveríeis destruído com as nossas próprias armas; e, mesmo querendo nos destruir com as vossas era necessário provar antes que tais eram verdadeiramente as distâncias adequadas (o que não fizestes), em vez de imaginá-las arbitrariamente, escolhendo outras mais prejudiciais por causa do adversário. Este particular já me leva a crer um pouco que seja mesmo verdade aquilo que nunca quis acreditar, isto é, que vós fostes discípulo daquele mesmo do qual vos declarastes porque cai ele próprio, se não estou enganado, no mesmo erro, enquanto quer demonstrar errada a opinião de Aristóteles e dos outros que consideraram o cometa como coisa elementar com sua residência também na região elementar. A eles, porém, opõe-se, como enorme inconveniente, o volume desmedido que o cometa deveria possuir, e seria incrível que a Terra pudesse dar-lhe lugar e alimento; situa-o depois, para mostrá-lo como uma máquina enorme, e sem permissão dos adversários, na parte mais alta da esfera elementar, isto é, na mesma concavidade da esfera lunar, e daqui, aparecendo da forma que nós o vemos, ele deduz que seu volume deve ser pouco menos que quinhentos milhões de milhas cúbicas (note o leitor que o espaço de uma única milha cúbica é tão grande que poderia conter mais de um milhão de navios, que provavelmente nem existem no mundo), máquina então anormal e desonesta demais, e cara demais para o gênero humano que a tivesse que sustentar. Porém Aristóteles e seus discípulos responderão: "Pai nosso, afirmamos que o cometa é elementar e pode acontecer que esteja longe da terra cinquenta ou sessenta milhas ou talvez nem isso, e não 121.704, como vós o considerais arbitrariamente. Portanto, seu corpo não é de tantos milhares de milhas, nem impossível de ser saciado e alimentado"; aqui só resta, ao opositor, aceitar e calar-se.
Quando se deve convencer um adversário, é necessário enfrentá-lo com suas melhores e não com as piores afirmações, do contrário deixar-se-ia a ele sempre a possibilidade de retirar-se livre, deixando o opositor atordoado e sem mais raciocínio, como aconteceu com Rogério ao aparecer de Angélica.
32. Vejamos agora como ele continua e queira ler V. E. Ilustríssima este quarto argumento: Apesar de a Terra estar imóvel e não ser prudente para um homem religioso afirmar isto, todavia, se alguém quer saber de mim se com o movimento da Terra pode-se explicar o movimento do cometa em linha reta, respondo: se outro movimento algum não pode ser concebido sobre a Terra a não ser aquele pensado por Copérnico, nem assim com este movimento retilíneo conseguimos salvar os fenômenos do cometa. Apesar de que pelo movimento anual de Copérnico, o Sol, segundo seu parecer, vê-se do equador mover-se quer ao sul, quer ao norte (e todavia ele considera imóvel), contudo qualquer um desses movimentos realiza-se em um semestre inteiro e naquele breve espaço de quarenta dias, quando apareceu o cometa, o Sol pareceu movimentar-se só um pouco, isto é, três graus, e não muito maior, por causa deste movimento da Terra, pôde ser percebido o desvio aparente do cometa; o qual, mesmo acrescentando-lhe todo aquele movimento que se originava aparentemente de seu movimento retilíneo, nunca poderá igualar o movimento observado do cometa.
Sarsi quer demonstrar aqui que nem colocando o movimento da Terra, como foi colocado por Copérnico, poder-se-ia explicar e sustentar este movimento retilíneo e aquele desvio do vértice; porque, mesmo que o movimento da Terra origine o aparente desvio do Sol quer rumo à região austral, quer rumo à boreal, todavia no espaço de cento e quarenta dias, quando foi observado o cometa, este desvio não foi de mais que três graus, nem muito maior que isso podia aparecer o cometa; assim, esta medida junto com aquele único grau e meio que podia originar a outra dependente do próprio movimento retilíneo nos deixa bem longe daquele grandíssimo movimento que se percebeu nele. Não havendo nós afirmado nem falado que este aparente desvio seja causa de qualquer movimento de qualquer outro corpo, especialmente corpo terrestre, que o próprio Sarsi confessa saber que nós o consideramos falso, aparece com muita clareza que ele o introduziu arbitrariamente para fazer aumentar o seu volume.
Assim, não temos obrigação alguma de responder sobre aquilo que nunca afirmamos. Porém, não quero me abster de afirmar que duvido fortemente de que Sarsi esteja já com uma ideia perfeita dos movimentos atribuídos à Terra, nem das várias e numerosas aparências que por causa deles haveríamos de perceber nos outros corpos mundanos. Vejo que Sarsi, sem diferença alguma de posição, embaixo ou fora da eclíptica, dentro ou fora do grande orbe, no norte ou no sul, perto ou longe da Terra, considera que, da mesma forma que um desvio aparece no corpo solar, colocado no centro desta eclíptica, deve da mesma forma ou um pouco diferente ser percebido em qualquer outro objeto visível, colocado em qualquer lugar do mundo; isto está bem longe de ser verdade, não resultando contradição alguma do fato de que, por meio de postura diferente, aquela mudança que no Sol aparece de três graus possa aparecer em outro objeto de dez, vinte, trinta graus. Concluindo, se o movimento atribuído à Terra, que eu, como pessoa piedosa e católica, considero falso e inexistente, é adequado para justificar tantas e tão diferentes aparências como podem ser observadas nos corpos celestes, não quero assegurar que este movimento tão errado não possa também responder erradamente a propósito das aparências dos cometas, se Sarsi não expuser raciocínios mais lógicos que aqueles que produziu até agora.
33. Leia agora V. E. Ilustríssima o quinto argumento: Tudo isto ter-se-ia verificado se o movimento de todos os cometas que existiram até agora tivesse sido igualmente breve e regular. Porém, se observarmos os outros cometas, cujo movimento procedeu de forma completamente diferente disto, com muito mais clareza, tornar-se-á evidente ser possível ou não admitir movimento retilíneo para os cometas. Pesquisamos Cardano; segundo Pontano, ele afirma isto: "Foi percebido por nós um cometa com cabeça pequena e cauda curta, que pouco depois, adquirindo uma grandeza maravilhosa, dirigiu-se do oriente para o norte, com movimento às vezes rápido, às vezes vagaroso; e até a volta de Marte e Saturno, ele procedia ao contrário, isto é, indo a cauda para a frente até chegar às Ursas; donde, logo que Saturno e Marte começaram a movimentar-se com movimento retilíneo, desceu para oeste tão rapidamente que percorreu num dia trinta graus; e, logo que se dirigiu para Áries e Touro, não foi mais percebido ". Além disso, no mesmo autor, segundo Regiomontano, encontramos: "Nos idos de janeiro de 1475 foi percebido por nós um cometa sob a Libra com as estrelas da Virgem, cuja testa movimentou-se lentamente até encontrar-se perto da Espica; caminhando antes através das pernas de Boote para a esquerda, afastando-se, tanto assim que descreveu, num dia normal, um arco de circunferência máxima de quarenta graus, onde, encontrando-se no meio do Câncer, estava distante do zodíaco 67 graus no máximo; indo, então, através dos dois polos do zodíaco e do equinócio até o meio dos pés de Cefeu, e em seguida através do seio de Cassiopéia, sobre o ventre de Andrômeda; depois, avançando ao longo do Pisce boreal, onde diminuía muito seu movimento, aproximava-se, então, do zodíaco, etc.". Por isso, no começo e no fim, movimentou-se com movimento bem vagaroso, no meio, em vez muito rápido, o que se opõe bem abertamente a este movimento retilíneo; com efeito, este movimento é sempre mais rápido no começo e depois diminui devagar; porém, opõe-se a tudo isto com grande evidência o cometa de Pontano, vagaroso no começo e muito rápido no fim. Escuta aquilo que se pode ler nas Meteoras: "Lembro que uma vez caído da estrela de Ícaro, levava para a frente uma pequena cauda e com movimento lento caminhava sob o frio céu boreal; aqui colocava novamente a cabeça em frente, e com movimento favorável rumava para oeste, avançando rapidamente, até chegar entre os ferozes cornos do Touro de Agenor ". Nestes dois cometas, com muito maior dificuldade, pode-se explicar aquele movimento retilíneo, havendo eles percorrido com o próprio movimento um inteiro semicírculo máximo em pouquíssimo tempo; com efeito, para explicar este movimento será de pouca ajuda qualquer movimento da Terra. Não possuo a mínima intenção de oferecer um elenco dos cometas e de seus vários movimentos, porém, se alguém pesquisar aqueles que trataram destes argumentos, encontrará muitas coisas que não combinam de forma alguma com o movimento retilíneo. Falamos até demais a respeito do movimento e da substância do cometa.
Aqui Sarsi, relatando as outras várias mudanças realizadas por outros cometas e descritas por outros autores, acaba confirmando suas palavras. Mas aquilo que escrevi antes responde também a esta tese, nem é necessária outra coisa, se antes, deixando de lado Sarsi os raciocínios gerais e levando em vez em conta as características particulares dos cometas, não comece a verificar se eles eram altos, baixos, austrais ou boreais, se apareceram em época de solstícios ou equinócios; particularidades que Sarsi não observou, e necessaríssimas para um exato raciocínio, como ele mesmo poderá verificar todas as vezes que prestar maior atenção a esta pesquisa.
34. Vou apresentar agora a última questão do nosso exame: Agora resta pesquisar a barba ou cabeleira do cometa ou, como você gosta de chamá-la, cauda, que com aquela curvatura leva os astrônomos a brigar.
Todavia Galileu acha poder oferecer uma explicação satisfatória também para isto. Porém aqui devo, em primeiro lugar, acrescentar que não existe motivo algum para que ele considere seu este novo sistema de explicar a cauda, pois Galileu expôs esta sua teoria que já havia sido delineada por Kepler e publicada por ele com suficiente clareza. Com efeito, procurando os motivos pelos quais as caudas dos cometas às vezes parecem curvas, afirma que isto não deriva da paralaxe, o que foi demonstrado também em outro lugar, nem da refração, apresentando muitas provas desta teoria; porém, no fim, afirma que este fenômeno deve ser deixado entre os vários segredos da natureza. Quis, então, prevenir isto, pois Galileu afirma não ter encontrado ninguém que tenha escrito a respeito, além de Tycho. Kepler e Galileu diferem entre eles só nisto: Galileu apresentou a hipótese que aquele não julgou de importância alguma, deixando assim, por causa desta pouca importância, a questão não resolvida.
Sarsi, na verdade, mostra-se desejoso demais de me tirar completamente qualquer vestígio de glória: e não satisfeito de descobrir como falso e não concludente o raciocínio apresentado como meu pelo Sr. Mário, isto é, que a cauda do cometa às vezes nos parece em forma de arco, acrescenta que eu não apresentei nada de novo, pois tudo havia sido já publicado, e em seguida recusado como errado por João Kepler; assim, no espírito do leitor, todas as vezes que se examinasse a relação de Sarsi ficaria o conceito de eu ser um ladrão de ideias alheias, mas ladrão de pouca conta, que vai juntando até coisas recusadas. Porém, quem sabe se a pequenez do roubo não me faça ser considerado, por Sarsi, até mais culpado do que se eu me tivesse aplicado a roubos maiores, por ter uma maior inteligência? E se por acaso, em vez de roubar uma coisinha sequer, me tivesse dedicado com maior afinco à procura de textos não muito conhecidos em nossos países, e, havendo encontrado alguma publicação de algum bom autor, houvesse eu tentado suprimir o seu nome e atribuir a minha autoria a obra inteira, talvez este procedimento lhe tivesse parecido heroico e grande, enquanto o outro lhe pareceria desastrado e infame. Porém eu não sou tão generoso e livremente confesso minha covardia. Porém, mesmo sendo muito pobre de coragem e forças, sou rico de honra; assim não quero, Sr. Lotário, permanecer com esta honra, mas quero, com toda liberdade, escrever e demonstrar vossa falta, deixarei que a explique melhor na apresentação de vossas desculpas.
O próprio Tycho quis dar uma explicação a esta aparente curva da cauda, derivando-a de algumas hipóteses apresentadas por Witelo, mas o Sr. Mário demonstrou que ele não havia compreendido aquilo que Witelo havia publicado, por serem elas de todo insuficientes para demonstrar esta curva. O próprio Sr. Mário acrescentou aquela teoria que a ambos parecia ser a única causa verdadeira desta curvatura. Opõe-se Sarsi, e, querendo contestá-la e ainda mais querendo atribuí-la a Kepler, cai no mesmo erro que Tycho, declarando não ter entendido nada a respeito daquilo que escrevem Kepler e o Sr. Mário, ou ao menos fingindo não entender nada de ambos, querendo que ambos escrevam a mesma coisa quando escrevem duas coisas fatalmente diferentes. Kepler quer explicar a razão da curva como se a cauda do cometa fosse curva de verdade e não uma aparência; o Sr. Mário a supõe reta e procura a causa da aparência da curva. Kepler a reduz a uma diversidade de refrações dos próprios raios solares, originadas da mesma matéria celeste da cauda, matéria que só naquela parte que serve à produção da cauda (mais ou menos densas segundo os graus de aproximação com uma estrela mais ou menos densa) produz tantas refrações que, de todas elas, resulta uma única refração distensa não retamente mas em arco. O Sr. Mário introduz uma refração originada não pelos raios do Sol mas pelas características do cometa, não da matéria celeste aderente à sua cabeça mas originada pela esfera vaporosa que circunda a Terra: assim, a força eficiente, a matéria, o lugar e a maneira destas produções são muito diferentes, nem existe outra igualdade entre estes dois autores a não ser a única palavra refração. Eis as precisas palavras de Kepler: "A refração não pode ser causa desta curva, a menos que imaginemos alguma coisa prodigiosa, alguma matéria mais ou menos densa segundo os graus de aproximação desta estrela, excetuando-se o lado onde vira a cauda". Será possível, Sr. Lotário, que vos deixastes levar pelo desejo de diminuir minha honra, qualquer que ela seja em relação à ciência, assim de não levar em consideração não só minha reputação mas nem aquela de muitos outros amigos vossos? E a esses amigos, com mentiras e falsidades, procurastes fazer acreditar que vossa teoria fosse verdadeira e bem fundamentada e dessa forma adquiristes o seu aplauso e seus elogios, mas agora, se eles lerem esta minha publicação, através dela compreenderão quantas vezes e de que forma quisestes tratá-los de ingênuos, eles considerar-se-ão ofendidos por vós, e a consideração que eles tiveram de vós mudará. Bem diferente, então, é o raciocínio apresentado e recusado por Kepler, pessoa que eu sempre considerei honesta, sincera e sábia, e que, com certeza, confessaria que minha teoria é completamente diversa da dele, e da mesma forma que a sua teve que ser recusada a minha deve ser aceita, pois é claramente comprovada, mesmo que Sarsi procure contestá-la.
35. Vamos examinar qual é a força de sua contestação: Pesquisemos se, como afirma Galileu, a curva da cauda pôde nascer da refração. Com efeito, o cometa não parece haver observado as leis descritas por Galileu a seu respeito: curvar-se somente todas as vezes que caminhasse rumo ao horizonte indo quase paralela a ele, cortando-o verticalmente; rumar ao zênite todas as vezes que virasse naquela direção. Com efeito, guardou sua primitiva curvatura só três ou quatro dias, quer perto quer longe do horizonte; depois pareceu desviar-se da linha que podia alcançar o Sol, através da cabeça do cometa, não mostrando, porém, curva alguma, apesar de o caminho da cauda aparecer amiúde inclinado para o horizonte. Porém, se Galileu falasse a verdade, deveria ser percebido no início muito mais reto que quando subia para o alto. Com efeito, levantou-se tanto sobre o horizonte que se mostrou quase vertical; assim, subindo avançava sempre mais inclinado para o horizonte, cortando muitos planos verticais, como qualquer um pode perceber por meio do próprio globo, observando-se, por exemplo, em qualquer globo celeste, o lugar do cometa e o caminho da cauda correspondente ao dia 20 de dezembro. Com efeito, naquela época, a cauda passava entre as duas últimas estrelas da cauda da Grande Ursa, e a cabeça do cometa era distante de Artur 25 graus e 54 minutos e da Coroa 24 graus e 25 minutos. Se, então, for encontrado o cometa sobre um globo e for descrito o caminho da cauda, esta aparecerá na mesma volta do globo que emerge do horizonte, mais ou menos segundo um plano vertical; subindo mais, encontrar-se-á depois mais ou menos paralela ao horizonte: todavia, mesmo nesta posição não apresenta curva alguma.
Esta é uma forma ineficiente demais para confutar uma demonstração de perspectiva que alcance uma conclusão, pois Sarsi quer que outros consigam mais com suas hipóteses, as quais podem ser alteradas e acomodadas à sua necessidade. Perdoe-me Sarsi, para suspeitar assim, pois ele próprio mais frequentemente dá ocasião de não nos permitir acreditar naquilo que ele apresenta. Que crédito se deve dar às hipóteses de alguém em relação aos acontecimentos passados, dos quais não sobra nada, enquanto o mesmo, falando de coisas permanentes, atuais, públicas, impressas, de dez hipóteses apresentadas nove são alteradas e até relatadas ao contrário? Reafirmo que a demonstração apresentada pelo Sr. Mário é justa, geométrica, perfeita e necessária; Sarsi devia procurar antes entendê-la com perfeição e depois, se não lhe parecesse exata, mostrar sua falsidade, seja demonstrando falsos argumentos, seja demonstrando falso o desenvolvimento do raciocínio, o que, aliás, não fez nada disso ou talvez muito pouco. Nossa demonstração prova que o objeto observado, sendo colocado em linha reta e originado fora da esfera vaporosa, perto e inclinado para o horizonte ou muito acima dele, apresentar-se-á curvo ao olho longe do centro desta esfera de vapor, porém, se aquele surgir no horizonte ou for muito acima dele, apresentar-se-á a nós completamente reto ou com uma curva imperceptível. O cometa que estamos pesquisando agora, que nos primeiros dias foi visto abaixo e inclinado, é visto inclinado também; subindo, mostrou-se reto e assim ficou, pois sempre apareceu muito alto; o cometa de 77, que eu observei continuadamente, pois manteve-se sempre baixo e muito inclinado, foi sempre visto com muita curva: outros menores, que observei bem altos, apresentam-se retos: assim, o efeito da curva estará de acordo com essas conclusões todas as vezes que procedermos com observações verdadeiras. Verifiquemos aquilo que Sarsi contesta à nossa demonstração e quanta importância possuem suas hipóteses.
36. Não vejo como pode acontecer que Galileu aceite com tanta certeza que uma região vaporosa tenha aparecido ao redor da Terra, quando ele mesmo ensina fundamentalmente que esses vapores originam-se em lugares mais altos que os outros, querendo alicerçar sua teoria sobre o movimento retilíneo. Ele até afirma que os próprios cometas são formados só por aqueles vapores saídos do cone de sombra da Terra. Então, se o vapor se afasta da superfície da Terra três mil passos aqui e lá estende-se ainda por mais de mil léguas, mesmo assim esta região vaporosa conservará uma figura esférica? Com certeza aqueles que até hoje relataram os rudimentos da esfera ensinam que a parte mediana do ar, que consta especialmente de vapores (mesmo mantendo uma figura determinada), é um esferoide mais oval que redondo, pois, nas partes abaixo dos polos, os vapores se dissolvem menos pelo Sol e sobem por isto mais alto que nas partes abaixo do círculo dos equinócios e da zona tropical, onde se dissolvem com mais facilidade pela proximidade do calor do Sol. Então, se esta região não pode ser esférica e não se afasta homogeneamente da Terra, e não possui igual densidade em todas as suas partes, a curva da cauda não poderá nunca originar-se da esfericidade desta região que não existe. Afirmo tudo isto em relação ao parecer de Galileu sobre aquilo que diz respeito diretamente ao cometa. Ele mesmo impede que se acrescente outra coisa, pois numa longa exposição apresentou aquilo que pensava dizer a respeito com poucas palavras, nos impedindo, então, de falar mais sobre o assunto. Como poderíamos, com efeito, haver refutado alguma coisa que ele não apresentou e que não podíamos adivinhar? Vamos em frente.
Como V. E. Ilustríssima pode claramente perceber, Sarsi contesta que nossa demonstração se apoia sobre um falso fundamento, isto é, que a superfície da região vaporosa é esférica, o que ele, de muitos modos, prova ser errada. Em primeiro lugar, diz que nós afirmamos muitas vezes que estes vapores sobem mais de um lugar que de outro. Mas esta hipótese não se encontra no texto do Sr. Mário: é verdade que ele relata que em tempos determinados aconteceu que alguns vapores subiram mais que de costume; mas isto verificou-se poucas vezes e por muito pouco tempo; porquanto afirmar, por causa disso, que a figura da região vaporosa não é redonda é uma afirmação arbitrária de Sarsi.
Além disso, afirma outra falsidade, isto é, que nós relatamos ser o cometa originado por aqueles mesmos vapores que, ultrapassando o cone de sombra, formam a aurora boreal; isto também não se encontra no texto do Sr. Mário. Acrescenta em terceiro lugar: Se tal vapor subisse a um lugar por três milhas e em outro mil léguas, dever-se-ia ainda considerar esta figura como esférica? Não senhor, Sr. Sarsi, e aquele que afirmasse uma coisa parecida seria um grande ignorante, segundo meu parecer; porém, não encontro ninguém que a tenha afirmado, nem sonhado, acredito eu. Citai o nome de alguém. Em relação aos cientistas que ele coloca em quarto lugar, ou seja, aqueles que ensinam os primeiros elementos da esfera, e que afirmam que a figura desta região é mais oval que redonda, respondo que Sarsi não deve ficar admirado por ter chegado ao conhecimento disto e eu não; pois eu não aprendi astronomia com esses mestres de pouco fundamento, mas com Ptolomeu, que não me parece que haja escrito a propósito. Mas, mesmo aceitando que esta figura fosse de verdade oval e não redonda, o que concluiríeis, Sr. Lotário? Nada mais que a cauda do cometa não é dobrada em forma de arco de uma circunferência, mas em linha oval; coisa que eu posso conceder sem prejuízo para nossa explicação e para nosso método de demonstrar a causa desta curva aparente; porém não posso conceder-vos aquilo que gostaríeis de deduzir afirmando: Se esta região vaporosa não é esférica, nem uniformemente longe da Terra, nem uniformemente densa (tese apresentada por três vezes, com palavras diversas, para espantar os ingênuos), a curva da cauda não pode derivar de tal coisa redonda que não existe. Esta conclusão não se deduz logicamente das nossas premissas, o máximo que pode derivar é que esta curva não é parte de uma circunferência mas de uma linha oval: e este seria vosso muito mísero ganho, mesmo que tivésseis certeza de que esta região era oval e não esférica. Com efeito, se esta curva for uma figura de arco de circunferência ou de elipse ou de linha parabólica ou hiperbólica ou espiral ou outras, não acredito que alguém o possa determinar com certeza, pois as diferenças dessas inclinações, num arco de dois ou três graus no máximo, resultam de todo imperceptíveis.
Devo ainda considerar as últimas palavras das quais concluo misticamente várias consequências e várias ideias ocultas de Sarsi. Primeiro, entende-se bem claramente que ele pesquisou o texto do Sr. Mário não objetivamente, com a finalidade de estudá-lo ou louvá-lo, mas com a firme resolução de impugná-lo (como percebi desde o começo); desculpando-se de não havê-lo confutado mais, afirmou: Como contestar coisas que ele não relatou e que eu não podia adivinhar? A verdade é bem o contrário, isto é, ele não contestou outras coisas a não ser aquelas não apresentadas pelo Sr. Mário, que ele procurou adivinhar. Acrescenta que o Sr. Mário escreveu com palavras obscuras, e que numa dissertação bem longa não esclareceu o significado. Respondo a isto que o Sr. Mário teve uma intenção bem diferente da do Mestre de Sarsi. Este Mestre, como é claro no início do texto de Sarsi, escreveu para o vulgo, para ensinar-lhe com suas explicações aquilo que sozinho não poderia compreender. Mas o Sr. Mário escreveu para os mais sábios que nós, e não para ensinar, mas para aprender, e por isso apresentou sempre em forma de dúvida e não doutrinariamente, fazendo referência às doutrinas dos mais sábios: e se nossa publicação parecesse tão obscura para Sarsi, devia, antes de censurá-la, esclarecê-la e não contestar aquilo que não entendeu, com perigo de queimar-se. Porém, se eu devo expor abertamente meu parecer, na verdade não acredito que Sarsi passe para a frente sem impugnar a maior parte das coisas escritas pelo Sr. Mário por não tê-las compreendido, mas, ao contrário, porque elas eram abertamente claras e verdadeiras, e por isso considerou melhor afirmar não entendê-las do que, contra a sua vontade, aceitá-las e louvá-las.
Quero referir-me agora ao terceiro exame, onde Sarsi, por meio de quatro proposições, coletadas livremente entre mais de cem que encontramos no Discurso do Sr. Mário, se esforça por fazer-nos parecer pouco inteligentes: todas as outras, mais importantes que estas, passam-as sob silêncio e as vai acomodando à sua opinião, acrescentando, tirando e torcendo sempre alguma coisa.
37. Veja V. E. Ilustríssima: Antes de examinar corri maior cuidado algumas teorias de Galileu, como vou fazer, gostaria que todo mundo ficasse ciente de que nada está mais fora de minhas intenções que combater em favor de Aristóteles. Não me preocupo, no momento, em pesquisar se são verdadeiras ou falsas as teorias daquele grande homem.
Quero demonstrar que as máquinas postas em movimento por Galileu foram de pouca resistência e validade, as tentativas foram vãs, e, para falar abertamente, as proposições principais sobre as quais, como sobre suportes, apoiava-se todo o peso de sua demonstração não têm aparência alguma de verdade, e, se alguém quiser examiná-las com cuidado, as considerará, acredito, falsas. Na tentativa de contestar, então, o parecer de Aristóteles, afirma entre outras coisas que o ar não pode movimentar-se no mesmo sentido do céu lunar; disto se segue que nem por este movimento pode ser acendido, como Aristóteles deduzia.
Como, pois, afirma Galileu, aos corpos celestes deve ser atribuída uma figura perfeitíssima, será, então, necessário afirmar que a superfície côncava deste céu é esférica e lisa, sem permitir aspereza alguma; porém, aos corpos lisos não aderem nem ar nem fogo; por isso, não se movimentarão com o movimento deles. Ele prova tudo isso com um argumento tirado de uma experiência. Com efeito, afirma ele, faça-se virar ao redor de seu centro um vaso semiesférico liso e sem aspereza alguma; o ar contido não se movimentará com seu movimento, o que nos mostra uma vela acesa colocada não longe da superfície interna do vaso, cuja chama não se dobra para lado algum com o movimento do vaso; ao contrário, se o ar fosse levado junto com o movimento do vaso, levaria consigo aquela chama também. Até aqui fala Galileu. Nisto você poderá encontrar coisas que são aceitas como verdadeiras e outras que não o são, outras que não são nem mesmo consideradas verdadeiras e demonstradas falsas.
Antes de tudo, se alguém negar a afirmação apresentada por Galileu, isto é, que ao côncavo lunar deve-se atribuir figura esférica e lisa, de que forma poderá ser demonstrado o contrário?
Com efeito, se se deve atribuir aos corpos celestes uma forma lisa e redonda, deve-se fazê-lo especialmente para que não resulte impedido seu movimento. Pois, se as superfícies segundo as quais os orbes estão em contato permitissem alguma aspereza, sem dúvida esta atrasaria seu movimento. Além disso, a superfície externa do céu superior, segundo Aristóteles, necessita ser redonda para não deixar surgir um vazio em seu movimento, vazio que se manifestaria se existissem ângulos.
Porém, todos esses raciocínios não possuem força alguma neste caso. Com efeito, se esta superfície côncava no céu lunar não é nem redonda nem lisa, mas áspera, não é tolice alguma, pois ao seu movimento não se pode opor o corpo próximo, seja ele ar ou fogo, e não surge vazio algum, pois sempre é introduzido um corpo no lugar do outro. Além disso, se admitimos esta aspereza, muito melhor se conserva a junção de todos os corpos móveis: com efeito, de acordo com o movimento do céu, movimentam-se os elementos superiores cujos movimentos percebemos gerar cada dia muitas coisas e destruir muitas outras.
Na verdade, Galileu, afirmando dever-se atribuir necessariamente aos corpos mais nobres uma forma redonda, desejará que os homens, muito mais nobres que o céu, sejam redondos e lisos? Porém, segundo os oráculos dos sábios, preferimo-los quadrados. Haveria preferido, então, afirmar que a cada um fosse melhor atribuir a figura que é mais apta para conseguir sua finalidade. Disto, não sem razão, alguém poderia concluir assim: portanto, como a concavidade da Lua deve, de certa forma, coligar e juntar estes corpos inferiores àqueles superiores, foi necessário fabricá-los ásperos e compactos, em vez de lisos.
Sem ir mais para a frente, encontramos aqui sempre as mesmas artimanhas de Sarsi. Primeiro, não se encontra no texto do Sr. Mário a afirmação, segundo Sarsi feita por nós, de que a corpos lisos e limpos não adere nem ar nem fogo: Sarsi nos impõe esta falsidade arbitrariamente para abrir caminho à teoria, exposta um pouco mais abaixo, de um certo lastro de vidro. Além disso, Sarsi finge não perceber que a nossa afirmação relativa à concavidade lunar como superfície de todo esférica, lisa e limpa, não é verdadeira por ser uma hipótese nossa, mas porque Aristóteles assim afirma bem como os seus seguidores, cuja opinião contestamos sem aceitar as premissas. E, fingindo encontrar no texto do Sr. Mário aquilo que não existe, simula não perceber aquilo que muitas vezes repetimos abertamente, isto é, que nós não admitimos aquela multiplicidade de orbes sólidos até agora aceita, mas consideramos difundir-se nos imensos campos do universo uma sutil substância etérea por meio da qual os corpos sólidos mundanos vão vagando com movimento próprio. Mas que estou eu afirmando? Lembro-me agora de que Sarsi havia percebido tudo isto antes, na parte 34, onde afirma: Pois, para Galileu, não existem os orbes celestes de Ptolomeu, e, segundo o sistema do próprio Galileu, não encontramos no céu nada de sólido. Não pode, assim, o Sr. Sarsi esconder o fato de haver internamente entendido que nós afirmamos que a concavidade lunar é perfeitamente esférica e lisa, falamos não porque a aceitamos como tal, mas porque assim considerou Aristóteles, contra o qual estamos nos opondo. Porque se tivésseis acreditado ser mesmo a nossa opinião, nunca teríeis nos perdoado esta contradição, isto é, negar completamente qualquer diferença entre orbes e solidez para depois admitir os dois: erro muito mais grave que todos os outros que levastes em consideração. Muito vão é, então, todo o restante do vosso raciocínio, onde vos esforçais em provar que a concavidade da Lua deve ser sinuosa e áspera em vez de lisa e limpa; este esforço é vão, reafirmo, e não vou dar nenhuma resposta. Todavia, quero que (como afirma o grande poeta) "entre nós se lute como cavaleiros", e considerar qual é a força da sua opinião.
Afirmais, Sr. Sarsi: Se alguém negasse que a superfície côncava lunar fosse lisa e limpa, de que forma e com que meio seria possível afirmar o contrário? Acrescentais depois, como se fosse uma prova apresentada pelo adversário, um discurso fabricado arbitrariamente e de fácil confutação. Com efeito, se o adversário respondesse e afirmasse: "Sr. Lotário, aceitando que os orbes celestes sejam de matéria sólida e diversa da concavidade lunar, assevero-vos que é necessário que esta superfície côncava deva ser limpa e lisa mais que um espelho: pois, se ela fosse sinuosa, as refrações das estrelas visíveis, chegando até nós, apresentariam continuamente uma série de extravagâncias, como nos acontece justamente quando observamos os objetos externos através de uma janela cujos vidros são polidos e alisados, ou através de outra, cujos vidros não estão trabalhados; e seja porque os objetos estão em movimento, ou seja, porque movimentamos a vista, as figuras que passam através dos vidros lisos não sofrem alteração alguma, mas passando através de vidros não trabalhados é impossível contar quantas e quais formas extravagantes apresentam; o mesmo aconteceria se a concavidade lunar fosse sinuosa e ficaríamos admirados em ver com quantas mudanças de figuras, movimentos e situações as estrelas fixas ou errantes se nos apresentariam de acordo com a passagem através de um ou outro orbe lunar; mas, não percebendo diversidade alguma, então a concavidade é lisa". O que responderíeis a tudo isto, Sr. Sarsi? Precisará de muito trabalho para nos persuadir de que este discurso não é novo para vós, mas que o considerastes supérfluo, e que não me pertence, mas é de outros, já abandonado como obsoleto e superado, e que é melhor, enfim, enterrá-lo. Este é, pois, o meu raciocínio para provar que a concavidade lunar é lisa e não sinuosa. Observamos agora qual é o apresentado por vós para provar o contrário, e lembramos que estamos discutindo sobre os elementos superiores, isto é, se eles são levados ao redor pelo movimento celeste ou não (pois este é o ponto controverso da conclusão), isto é: "Ar e exalações não podem ser movimentados com o movimento celeste" havendo eu afirmado que o côncavo lunar é liso e havendo-o provado com a uniformidade das refrações. Vós, provando o contrário, afirmais: Se aceitamos que a concavidade é sinuosa, resulta muito melhor explicada a conexão de todos os corpos móveis, pois, assim, movimentam-se os elementos superiores de acordo com o movimento celeste. Mas, Sr. Lotário, este é o erro que os lógicos chamaram de petição de princípio, pois considerais aceito aquilo que é colocado como pergunta, e que eu nego já, isto é, que os elementos superiores se movimentem. Possuímos quatro conclusões, duas minhas e duas vossas. A minha primeira é: "A concavidade é lisa" e a segunda: "Por isso os elementos não são levados em movimento". Que a concavidade seja lisa foi provado por mim através das refrações das estrelas, e a conclusão é clara. A vossa primeira é: A concavidade é áspera e a segunda: Leva consigo os elementos. Provais que a concavidade é áspera porque assim é, e com o movimento dela são levados os elementos celestes, e deixais o adversário na mesma situação que antes, sem ganhar nada, o que poderá continuar a afirmar que a concavidade não é áspera nem leva consigo os elementos. Era necessário, então, para sair do círculo fechado, que tivésseis demonstrado uma das duas conclusões com outro meio. Nem replique que demonstrastes satisfatoriamente a desigualdade da superfície afirmando que assim juntam-se melhor as coisas superiores com as inferiores, pois para juntá-las é suficiente uma simples união, e vós mesmo mais abaixo aceitais a mesma aderência e união também quando a concavidade é lisa e não áspera, porque esta prova resultaria superficial demais. Nem a outra teria mais força, se por acaso tivestes a pretensão de ter provado que levam consigo os elementos superiores, pois por meio deste movimento produzem-se os nascimentos e as mortes, e talvez por causa dele são puxados para baixo o fogo e o ar superior, que são também fantasias fundadas no ar; e muito tarde conseguiríamos nos esquentar se tivéssemos que esperar a expulsão do fogo para a Terra e especialmente que vós agora mesmo declarastes que ele empurra para cima, e por isto faz força, e empurrando, de uma certa forma, adere sempre mais à superfície da Terra: raciocínios e discursos infantis, pois aceitam e contestam as mesmas coisas, segundo uma ingênua inconstância.
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