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OS ASSALTANTES INVISÍVEIS / Franklin Dixon
OS ASSALTANTES INVISÍVEIS / Franklin Dixon

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio "SEBO"

 

 

 

 

   

- Frank, aquele não é o carro preto que o pai pediu que nós procurássemos? - perguntou Joe.

Um carro de desporto de marca estrangeira, com o porta-bagagens amolgado, ultrapassou o descapotável dos Hardy, na parte baixa da cidade de Bayport.

- De facto, parece! - E Frank acelerou, em perseguição do outro veículo.

Frank Hardy, de 18 anos e cabelo negro, e o irmão, Joe, louro e um ano mais novo, andavam a percorrer as ruas de Bayport a pedido do pai, que era um famoso detective particular. Aquela noite de Agosto estava quente e os rapazes haviam baixado a capota do carro.

Alguns quarteirões à frente, o outro carro deteve-se num sinal vermelho. Os Hardy pararam mesmo atrás dele. Graças à luz de um candeeiro próximo, puderam observar melhor o carro de desporto.

- Deve ser este o que procuramos - murmurou Frank. - Não é provável que existam dois modelos iguais com a traseira amolgada, em Bayport.

O único ocupante do dito carro era o homem sentado ao volante. Usava um chapéu preto e Frank e Joe só lhe conseguiam ver a parte de trás da cabeça.

- O pai deu-te mais alguns pormenores sobre o caso quando telefonou? - perguntou Joe.

Nisto, o outro partiu, disparado, ao sinal verde. Frank abanou negativamente a cabeça e pisou o acelerador.

- Não, não teve tempo. Estava com muita pressa quando ligou de Nova Iorque.

O senhor Hardy dissera que, antes de ter deixado Bayport, vira por acaso um carro idêntico ao que os rapazes tinham acabado de localizar. Pensava ter reconhecido o condutor como um famoso ladrão de jóias chamado Noel Strang e pediu aos filhos que procurassem a fotografia do homem no seu próprio arquivo criminal.

Fenton Hardy fora em tempos detective na Polícia de Nova Iorque. Mudara-se para a cidade de Bayport com o intuito de abrir a sua própria agência e em breve ficara conhecido como o melhor investigador particular daquele estado. Frank e Joe haviam herdado as capacidades detectivescas do pai e ajudavam-no frequentemente a resolver os casos que tinha entre mãos.

Os dois rapazes continuaram a perseguir o carro de desporto que seguiu em alta velocidade para uma zona residencial. Ali as ruas não estavam tão bem iluminadas, mas chegava para não o perderem de vista sem que tivessem de se aproximar demasiado.

- Parece que vai para fora da cidade - disse Joe.

- Conseguiste tirar-lhe a matrícula?

- Sim, apontei-a quando parámos no sinal luminoso.

Em poucos minutos, o carro preto saiu da área urbana e desapareceu numa curva da estrada. Frank desligou os faróis para que o descapotável se tornasse menos visível. Mas o condutor do outro carro já devia ter-se apercebido da perseguição. Assim que os Hardy passaram a curva, viram-no aumentar de velocidade e afastar-se deles.

- Deve ter-nos visto! - observou Joe.

- Está a afastar-se muito depressa - concordou Frank. - Aquele carro deve ser uma bomba! Felizmente afinámos o motor do nosso na semana passada.

O ponteiro do velocímetro subiu quando Frank acelerou mais. Lentamente, a distância que separava os dois carros foi diminuindo. Estavam a aproximar-se de outra curva na estrada quando, de repente, o tubo de escape do carro da frente começou a lançar uma densa nuvem de fumo avermelhado.

- É uma cortina de fumo! - gritou Joe. - Ele traz um lança-fumos ligado ao tubo de escape!

Uma fracção de segundo depois, os rapazes sentiram os olhos a arder intensamente.

- Acabou-se! - exclamou Frank.

Muito rapidamente, ligou de novo os faróis, mas os focos de luz não conseguiam penetrar o denso manto de fumo que os envolvia. Estavam quase na curva.

Frank pisou o travão com força. Meio cego, apenas podia adivinhar mais ou menos a localização da curva. Rodou o volante e o carro derrapou, atravessou a estrada e foi parar ao lado oposto.

- Cos diabos! - Joe endireitou-se, ainda a tremer com o choque, e fez por acalmar os nervos.

Tremendo também, Frank suspirou profundamente.

- Graças a Deus, não apareceu nenhum carro na direcção contrária, porque então seríamos um monte de sucata neste momento!

- Será que podemos arriscar-nos a voltar de novo à estrada?

- É melhor não - decidiu Frank -, porque não consigo ver um palmo à frente do nariz. Podemos sofrer um acidente.

Joe concordou e acrescentou:

- Vamos assegurar-nos se estamos mesmo fora da estrada.

Apertando os lenços contra o nariz e os olhos lacrimejantes, os rapazes saíram do carro. No meio do fumo e da escuridão da noite era impossível determinar a posição exacta em que se encontravam, mas Frank tacteou com o pé e verificou que estavam sobre a berma da estrada. O descapotável fora parar quase encostado à base da ravina que daquele lado acompanhava a estrada.

Frank e Joe ficaram fartos de esperar, mas não havia nada a fazer senão deixar que o fumo se desvanecesse. Entretanto, os rapazes decidiram escalar a colina, muito a custo, tossindo aflitivamente, para atingir o ar puro.

- Reparaste na cor do fumo? - perguntou Joe, respirando com dificuldade. - Não era uma cortina de fumo vulgar!

- Pois não. Eu diria que se tratava de uma combinação de fumo e gás lacrimogénio.

Passados alguns minutos, a nuvem dissipara-se o suficiente para que pudessem voltar de novo à estrada.

- Agora não temos qualquer hipótese de encontrar o homem - disse Joe, decepcionado.

- Mesmo assim, vamos manter os olhos bem abertos. Há algumas casas por aqui e uns atalhos. Quem sabe se não descobrimos o carro.

Os Hardy seguiram a estrada por mais uns quilómetros, atentos a qualquer indício, mas foi em vão. Desapontados por terem perdido a presa, Frank e Joe deram meia volta e tomaram a direcção de Bayport. A meio do caminho para a cidade, avistaram alguém a acenar freneticamente na estrada com um foco de luz.

- Será que houve algum acidente? - perguntou Frank.

- Não vejo nenhum carro - retorquiu Joe. - Deve ser alguém a pedir boleia.

Frank abrandou para verificar do que se tratava. A pessoa que acenava com a luz correu imediatamente ao encontro dos rapazes. Era um jovem gordo, de cara redonda, mais ou menos da idade deles.

- Chet Morton! - exclamou Joe, muito surpreendido.

O rapaz esbracejava com grande excitação para que parassem o carro. Frank estacionou perto dele e Joe abriu a porta de trás.

- O que se passa, Chet?

- Joe! Frank! Céus, foi uma sorte vocês aparecerem agora!

Chet arquejava, tremia e estava pálido. Vestia calções e levava um saco pendurado nos ombros.

- Viste algum fantasma? - perguntou Frank, enquanto o amigo entrava para o banco de trás.

- Eu n... n... não vi nenhum fantasma, mas quase jura... vava que ouvi um! - retorquiu Chet.

Frank e Joe trocaram um olhar admirado.

- O que queres dizer com isso de teres ouvido um fantasma? - perguntou Frank.

- Foi exactamente o que eu disse. Ele gritou-me! - e Chet tremeu. - Oooh, foi horrível!

- Estás a gozar? - perguntou Joe.

- Achas que eu estaria assim se estivesse a gozar?

- Não - disse Frank. - Parece que alguma coisa te apavorou mesmo. E se contasses a história toda?

Chet explicou que andara a recolher amostras de pedras. Ao cair da tarde, tinha parado para comer qualquer coisa e então adormecera.

- Vai à fava! - Joe riu-se descaradamente. - Se calhar, encheste tanto essa barriga que nem te podias mexer e sonhaste com o fantasma.

- Já sei, já sei! - retorquiu Chet, aborrecido. - É verdade que eu gosto de comer. E então? Afinal querem mesmo ouvir a minha história ou não?

- Continua - incitou Frank.

- Bom, dormi mais do que esperava - prosseguiu Chet. - Quando acordei, já estava escuro. Encontrava-me algures nas colinas a oeste daqui. Primeiro, não havia meio de encontrar a minha lanterna eléctrica, mas, quando a descobri, dei com um bocado de chão de mosaicos, muito curioso.

- Um chão de mosaicos? - repetiu Joe. - O que queres dizer com isso?

Chet encolheu os ombros.

- Não sei que outro nome dar àquilo. Era um quadrado pequeno, liso, tal qual o chão de uma casa, e não tinha mais do que um metro de lado, todo com pequenos mosaicos coloridos. Mas o mais estranho é que não havia mais nada à volta a não ser árvores e arbustos.

Os mosaicos coloridos, tal como Chet explicou, formavam um desenho curioso que lembrava um dragão.

- Aproximei-me mais para ver melhor o que era aquilo - continuou Chet - e... Uau! Vindo não sei de onde, ouvi um grito horrível, de fazer gelar o sangue nas veias!

- Está-se mesmo a ver que tu gritaste, não? - disse Frank, disfarçando um sorriso.

- Podes crer que sim! A voz voltou a gritar-me, mas eu não percebi o que disse - e os olhos de Chet esbugalharam-se de pavor, quando o rapaz se lembrou do sucedido. - Eu comecei a correr até chegar a um carreiro que segui até à estrada. Estava a pedir boleia para casa quando vocês dois apareceram.

- E se nos levasses lá agora? - sugeriu Joe.

- Pensam que eu sou doido? A sério, se aquilo não era um fantasma, era de certeza um lunático qualquer faminto de sangue!

- Oh, vá lá! - incitou Frank. - Se calhar, era só alguém a pregar-te uma partida. Vamos lá investigar.

Chet mostrou-se ainda hesitante, mas finalmente concordou em ir com eles. Guiou-os até um atalho de terra batida, que os Hardy haviam passado uns metros atrás. Frank foi dirigindo lentamente pelo caminho estreito, até que Chet exclamou:

- Foi aqui mesmo! Lembro-me deste carvalho enorme!

Frank parou. Pegando em lanternas eléctricas, os três rapazes saíram do carro. Subiram um declive e chegaram a uma zona cheia de cónios e ciprestes, onde o chão se encontrava coberto de folhas secas e galhos além de muita erva.

- Aqui estão as pegadas do Chet - disse Joe, apontando com o foco da lanterna para marcas de erva pisada. - Conduz até àquela...

Um grito horrendo soou na escuridão! Depois veio outro mais fraco, numa voz rouca e desagradável.

- O-o-o chão!

Parecia o último suspiro de um moribundo!

Chet ficou paralisado de terror, mas Frank e Joe correram imediatamente na direcção de onde vinha a estranha voz, vasculhando a escuridão em redor com as lanternas eléctricas.

- Aqui, Joe! - exclamou subitamente Frank. Joe correu logo para o irmão. Deparou-se-lhe um homem estendido no chão com o rosto virado para baixo. Frank voltou-o para cima com cuidado. Era um indivíduo alto e calvo, apenas com alguns cabelos finos cor de areia. Tinha uma palidez de morte. Frank tomou-lhe o pulso, enquanto Chet se aproximava a correr.

- Ele está m-m-morto? - gaguejou Chet.

- Não, mas tem o pulso muito fraco - murmurou Frank. - E a pele parece viscosa. Dá ideia de que está em estado de choque.

Os Hardy não lhe encontraram quaisquer sinais de feridas ou ossos partidos.

- O que vamos fazer com ele? - perguntou Joe ao irmão.

- É melhor levá-lo a um hospital.

Os rapazes pegaram no corpo inerte e transportaram-no até ao carro, onde o deitaram no banco traseiro. Chet sentou-se à frente com os Hardy. Frank tomou o volante e acelerou em direcção a Bayport.

Quando seguiam por uma zona arborizada nos arredores da cidade, o homem voltou a si e sentou-se.

- Por favor, parem o carro! - implorou, ainda fraco.

Frank encostou à berma.

- íamos levá-lo ao hospital - explicou.

- O senhor estava inconsciente - acrescentou Joe. - O que aconteceu?

- Eu... eu conto-vos tudo daqui a pouco - disse o homem. - Neste momento, sinto-me tonto. Acho que os solavancos do carro estavam a deixar-me agoniado. Importam-se que eu saia e apanhe um pouco de ar?

- Não. Vá à sua vontade - disse Joe, compreensivo.

Chet inclinou-se para trás e abriu a porta. Assim que pôs os pés no chão, o indivíduo saltou para fora do carro e atirou com a porta, que se fechou com estrondo. Depois contorceu a cara até ficar com uma expressão assustadora.

- Se vocês não querem meter-se em sarilhos, mantenham a boca fechada sobre tudo isto! - ameaçou num fôlego. - E estou a avisá-los, nem sequer tentem seguir-me!

Com estas palavras, desapareceu na escuridão das árvores que ladeavam a estrada.

 

Os três rapazes ficaram petrificados.

- Com mil diabos! - balbuciou Chet, quando recuperou a voz. - É assim que se agradece?

- Vou atrás daquele tipo! - explodiu Joe. Abriu a porta e ia já a saltar para fora do carro, mas

Frank impediu-o.

- Espera, Joe! Agora, é impossível apanhá-lo. Além disso, ele pode estar armado.

Joe deu razão ao irmão e, relutantemente, voltou a sentar-se. Não se via vivalma por ali, a zona era muito mal iluminada e parecia só haver terrenos vazios e pequenas fábricas. O estranho desaparecera e sem dúvida alguma poderia encontrar vários sítios onde esconder-se se fosse perseguido.

- Gostava mesmo de saber do que é que aquele tipo estava com medo - murmurou Joe quando já se afastavam no carro. - E também como foi ali parar, inconsciente.

- Também eu - disse Fránk. - O melhor é avisarmos a polícia.

- Bem, meus amigos, eu... aaa... estou bastante cansado - disse Chet, pouco à vontade. - Será que vocês podiam deixar-me em casa primeiro?

- O que se passa contigo? - provocou-o Joe. - Estás com medo de ficar detido como suspeito?

- Já vos disse que estou estoirado - retorquiu Chet. - Além disso, vocês, Hardy, estão sempre a meter-se em embrulhadas e mistérios. Esse tipo de coisas põe-me nervoso.

Frank e Joe sorriram no escuro. Era verdade que tinham investigado uma série de casos emocionantes. O primeiro fora O Mistério da Casa Abandonada; ao mais recente tinham chamado O Regresso do Rei Pirata.

Depois de terem deixado Chet na quinta dos Mor-ton, os Hardy dirigiram-se à esquadra da polícia de Bayport, onde foram encontrar o chefe Collig a fazer serão. O homem, de aspecto possante, riu abertamente ao vê-los entrar no seu gabinete.

- Andam ocupados com outro caso?

- Estamos a ajudar o pai - explicou Frank. - Mas apareceu outra coisa.

Contou tudo acerca do homem inconsciente que mais tarde recuperara os sentidos no carro deles, para desaparecer em seguida na escuridão depois de os ter ameaçado.

Collig concordou que era um episódio deveras estranho, mas, apesar disso, nada indicava que houvesse sido cometido algum crime. Pelo telefone, deu a dêscrição do fugitivo ao agente que enviava as mensagens radiofónicas às viaturas da ronda e ordenou que procurassem o homem para ser interrogado.

Frank contou-lhe tudo sobre a perseguição ao carro de desporto preto e sobre a cortina de fumo que os forçara a sair da estrada.

- Noel Strang, não é? - O chefe Collig franziu o sobrolho. - Já ouvi falar dele. É um tipo esperto, mas neste momento não consta da lista dos procurados. Vocês sabem porque é que o vosso pai quer mantê-lo debaixo de olho?

- Não, não sabemos - disse Frank. - O pai só nos pediu que o procurássemos e tentássemos descobrir o que é que ele anda a tramar.

- Nós temos a matrícula - acrescentou Joe. - Mas gostávamos de saber se o homem que andámos a perseguir era o Strang. Não o conseguimos ver lá muito bem.

Collig anotou a matrícula.

- Vou verificar este número no Departamento de Registo Automóvel. Agradeço terem cá vindo.

Os rapazes saíram da esquadra e dirigiram-se ao descapotável. Quando Frank apalpou o bolso à procura das chaves do carro, a sua expressão foi de desagrado.

- Perdi o meu canivete, Joe. Será que caiu quando eu me inclinei por cima do tipo que estava inconsciente?

- É possível - admitiu Joe. - Podemos procurá-lo amanhã. Calha que quero observar melhor aquele quadrado de mosaicos que o Chet nos descreveu.

- Também eu!

Frank pegou no volante e conduziu por entre o tráfego nocturno. De repente, uma luzinha vermelha apareceu no rádio de ondas curtas do tablier. Joe pegou no microfone.

- Aqui, Joe Hardy.

- Boa noite, filho. - A voz de Fenton Hardy soou do outro lado da linha.

- Pai! Quando é que chegou?

- Agora mesmo. Onde é que vocês estão?

- Estamos no centro da cidade, dentro do carro. De facto, íamos em direcção a casa.

- Ainda bem. Este caso em que estou a trabalhar agora parece bastante complicado e eu talvez vá precisar da vossa ajuda. Tenho de me ir novamente embora amanhã bem cedo e, por isso, gostava de vos pôr ao corrente de todos os detalhes ainda esta noite.

- Estaremos aí num minuto, pai!

Pouco tempo depois, o descapotável entrava na rampa de acesso à grande e agradável casa dos Hardy, que se situava numa rua arborizada. Os rapazes saltaram do carro e apressaram-se a entrar.

Fenton Hardy, um homem alto e bem constituído, mas com um aspecto cansado, estava na casa de jantar a tomar uma chávena de café. Sentadas à mesa juntamente com ele, encontravam-se a senhora Hardy e a tia Gertrude, irmã solteira de Fenton Hardy.

O detective saudou os filhos com um sorriso.

- Sentem-se, rapazes, que eu vou contar-vos tudo sobre este caso.

O senhor Hardy explicou-lhes que um grupo de companhias de seguros lhe havia pedido que investigasse uma série de roubos de jóias. O mais recente tinha ocorrido em Nova Iorque, no dia anterior.

- Nós ouvimos uma notícia sobre isso na televisão, pai! - exclamou Joe.

- Não há dúvida de que todos os roubos foram engendrados pelo mesmo bando - continuou o detective - e há uma característica estranha. Em todos os casos, os guardas ou outros responsáveis de serviço parecem ter perdido a memória por um curto período de tempo, exactamente enquanto se estava a dar o roubo.

- Quer dizer que eles desmaiaram? - perguntou Frank.

Fenton Hardy encolheu os ombros.

- Nenhum deles se recorda de ter desmaiado. Mas todos revelam que a certa altura se sentiram como que a voltar a si ou a acordar de um sono profundo. Admitem que possam ter estado inconscientes, sem no entanto terem dado por isso.

Gertrude Hardy, uma mulher alta, forte e angular, comprimiu os lábios e franziu o sobrolho, de um modo pouco convencido.

- Se me perguntassem, eu diria que eles tinham sido gaseados - declarou. - Uma espécie qualquer de gás que afecte o sistema nervoso, talvez lançado sobre as vítimas através de um tubo.

Frank e Joe fizeram um esforço para não se rirem. A tia tinha opiniões bem definidas e nunca hesitava em expressá-las.

- Talvez tenham sido gaseados - concordou o senhor Hardy -, mas se assim foi, é muito estranho que os peritos da polícia não encontrassem quaisquer indícios no ar depois do ocorrido.

- Talvez os bandidos os tivessem sugado outra vez pelo tubo - disse Joe, maliciosamente.

A tia Gertrude deitou-lhe um olhar furioso.

- Estás a gozar comigo, não é? Bom, se calhar tens uma teoria mais aceitável, rapaz!

Laura Hardy, uma senhora elegante e bonita, trocou um olhar divertido com o marido. Ambos sabiam que a tia Gertrude adorava falar sobre casos que o irmão e os sobrinhos investigavam, mesmo fingindo desaprovar um trabalho tão perigoso como aquele.

- Para falar verdade, nós próprios fomos gaseados esta noite - disse Frank, apalpando terreno com cuidado.

Contou tudo acerca da perseguiçã o ao carro de desporto preto, mas omitiu o facto de se terem despistado e saído da estrada.

- Hmmm. - Fenton Hardy franziu as sobrancelhas. - Acham que o condutor poderia ter-vos reconhecido... talvez por ter visto a vossa fotografia nos jornais?

Frank abanou a cabeça.

- Duvido, apesar de poder ter-nos visto pelo espelho retrovisor, quando parámos junto do candeeiro da rua. É mais provável que, ao reparar que ia um carro a segui-lo, resolvesse utilizar a cortina de fumo para meter medo a quem quer que fosse.

- Então esse homem é uma ameaça! - exclamou a tia Gertrude, indignada. - Porque é que vocês não contactaram logo a polícia por rádio? Podem crer no que eu digo, vocês...

O telefone começou a tocar, interrompendo a tia. Joe saltou da cadeira para ir atender.

- Quero falar com Fenton Hardy - disse abruptamente uma voz camuflada.

- Quem fala, por favor? - perguntou Joe.

- Não tem nada com isso! Diga-lhe só que atenda o telefone, se quiser ouvir algo importante!

Fenton Hardy aproximou-se logo, a um sinal de Joe, e pegou no auscultador.

- Pronto, estou a ouvir.

- Foi planeado outro roubo de jóias. Vai dar-se a bordo de um iate chamado Wanda, que está atracado em East Hampton, Long Island. Tudo irá acontecer hoje à noite ou amanhã de manhã. Percebeu tudo?

- Sim - respondeu o detective. - Mas quem está a falar?

- Um amigo. E não se incomode a tentar localizar a chamada!

Ouviu-se um "clic" no outro extremo da linha. O senhor Hardy desligou também, pensativo, e contou aos rapazes o que o informador lhe tinha dito.

- É melhor eu verificar se aquela denúncia é verdadeira - acrescentou. - Vou até East Hampton de carro.

- Acha que é o melhor a fazer, pai? - perguntou Frank, preocupado. - A chamada pode ser uma armadilha.

- É um risco que tenho de correr, filho.

O senhor Hardy telefonou para a esquadra da polícia de Suffolk, em Long Island, para informar da denúncia. Antes de sair de casa, sugeriu que os rapazes estudassem de novo a fotografia de Strang que constava do seu arquivo e ainda os dados sobre o homem.

- Lembrem-se de que não temos nenhuma prova contra ele - disse o detective. - Mas penso que ele é um dos ladrões de jóias do país mais capaz de organizar o tipo de roubos que estou a investigar.

- Quer que a polícia o apanhe para o interrogar? - perguntou Joe.

- Não, isso só iria pô-lo alerta. Agora, gostava de saber o que é que ele anda a fazer em Bayport.

- Manteremos os olhos bem abertos para ele - prometeu Frank.

Depois, o senhor Hardy fez uma chamada interurbana para o seu assistente principal, Sam Radley. Este voara até à Florida com Jack Wayne, um piloto que colaborava com os Hardy frequentemente. Andavam a trabalhar num outro caso. Fenton Hardy deu instruções a Sam para que se juntasse a ele em East Hampton, no dia seguinte.

Na manhã seguinte, Frank e Joe começaram o dia com um pequeno-almoço substancial de presunto fumado, ovos e pãezinhos caseiros. Pouco depois, meteram-se no carro e foram buscar Chet Morton. Depois de ter resmungado o suficiente, o rapaz acedeu a ajudá-los a procurar o curioso quadrado de mosaicos que ele próprio tinha encontrado na noite anterior. Frank estacionou o carro no caminho de terra batida, ao pé do carvalho enorme.

- Eu não sei como é que vos deixei convencerem-me a fazer isto - queixou-se Chet quando começaram a andar, subindo um morro. - Parece-me que não consigo ficar longe do perigo quando vocês estão por perto.

Joe riu-se.

- Pára de te lamentar. Não estás com medo de ouvir algum fantasma em plena luz do dia, pois não?

Quando chegaram a terreno plano, Frank exclamou:

- Olhem, estou a ver uma casa além!

Joe e Chet olharam na direcção em que ele apontava. Uma mansão grande e com nítidas marcas do tempo espreitava por entre as árvores, a pouca distância dali.

- Não reparei em nenhumas luzes para aqueles lados ontem à noite - disse Joe. - Será que mora lá alguém?

- Talvez não - respondeu Frank. - Parece abandonada há bastante tempo.

Durante meia hora, os rapazes andaram a investigar por entre as ervas e matagal bravio que cobria aquela zona. Não conseguiram dar com a superfície de mosaicos que Chet tinha descrito nem encontraram o canivete de Frank.

- Tens a certeza de que não estavas com visões ontem à noite? - perguntou Frank a Chet.

Joe fez um riso escarninho.

- E também com "ouvidões", não?

Antes que Chet pudesse defender-se, uma voz troou:

- Fiquem exactamente onde estão!... Agora, voltem-se os três!

Os rapazes viraram-se, muito surpreendidos. Um homem alto e com cara de falcão, com um nariz fino e proeminente, estava parado no meio das árvores a observá-los. Tinha uma das mãos dentro do bolso do casaco como quem segura uma arma.

Frank e Joe reprimiram uma exclamação. O homem era por uma pena o da fotografia de Noel Strang que o pai possuía no seu arquivo!

 

- Não fiquem aí especados! - rosnou ele. - O que é que querem daqui?

Chet engoliu em seco.

- Bom... aaa... o senhor está a ver... Ontem à noite...

- Eu perdi o meu canivete - falou Frank. - Estávamos à procura dele.

- O teu canivete, hem? - O homem mostrou um ar carrancudo e desconfiado. - Não têm nada de andar aqui a meter o nariz nem ontem, nem agora, nem nunca! Isto é propriedade particular. Desapareçam daqui!

A tremer com medo, Chet encaminhou-se rapidamente para o carro. Frank e Joe não se moveram, continuando a fixar atentamente o homem.

- Não ouviram! - disse ele, numa voz forte e cortante. - Desapareçam! E não voltem cá nunca mais!

Avançando uns passos na direcção dos Hardy, o homem moveu o braço como se fosse tirar a arma do bolso do casaco. Sem uma palavra, os dois irmãos seguiram Chet.

- Aquele era o Noel Strang! - murmurou Joe. - Tive ganas de lhe atirar à cara o que sabemos.

Frank abanou a cabeça.

- Agora não. Lembra-te do que o pai disse.

- Ele não deve ser o dono desta propriedade - argumentou Joe. - E se é, temos de descobrir o que é que ele está cá a fazer.

- Também essa é a minha intenção - replicou Frank. - Mas acho melhor fazê-lo às escondidas, sem que ele desconfie de nada.

Chet já tinha entrado para o carro. Sentara-se no banco de trás, com o corpo todo rígido e ainda pálido e nervoso, mas tentando parecer normal.

Frank sentou-se ao volante e Joe ao lado. Ainda olharam de relance para trás, para o cimo do morro, e viram Strang a observá-los.

- Oh... oh!... - fez Joe. - Acabei de me lembrar de uma coisa!

- O quê? - perguntou Frank.

- Se foi ele quem utilizou a cortina de fumo ontem à noite, é natural que se lembre do nosso carro.

- Cortina de fumo! - balbuciou Chet, com os olhos quase a saltarem das órbitas, como Frank reparou pelo retrovisor. - Vocês querem dizer que aquele tipo é um gangster?

- Não é bem isso - disse Joe, ao mesmo tempo que Frank completava a manobra de inversão do sentido de marcha. - É só um famoso ladrão de jóias chamado Noel Strang.

Chet suspirou repetidamente enquanto os Hardy lhe contavam toda a história.

- Pronto. Estou frito! Não quero embrulhar-me noutro dos vossos casos. É melhor levarem-me a casa.

Os Hardy sorriram.

- Chet, bem sabes que gostas tanto de emoções fortes como de comida - disse Frank.

- Ajuda-te a manter o peso equilibrado - acrescentou Joe.

- Olhem lá, eu vou perder alguns cinco quilos só de me lembrar desse ladrão - retorquiu Chet. - O Strang pode muito bem mandar um homem atrás de nós.

Joe deu uma risada.

- Bastava ameaçá-lo de que te sentavas em cima dele. Não ganharia para o susto!

De repente, Frank pareceu preocupado.

- Acabo de me lembrar de uma coisa, Joe.

- Alguma coisa má?

- Não é lá muito boa. Aquele canivete tinha o meu nome gravado e, se o Strang o descobre, pode relacionar-nos com Fenton Hardy.

Joe soltou um assobio baixo.

- Vamos torcer para que ele não o encontre! Pouco tempo depois, Frank metia pela rampa da entrada da quinta dos Morton. A irmã de Chet, Iola, uma jovem de cabelos negros, estava sentada no alpendre da frente, juntamente com a sua amiga Callie Shaw, uma rapariga loura e de olhos castanhos.

Iola levantou-se de um salto quando os rapazes saíram do carro.

- Olá! - exclamou! - Esperem pela surpresa que Callie e eu temos para vos mostrar!

Os olhos das duas amigas brilhavam de emoção. Joe sorriu para Iola, por quem "tinha um fraquinho".

- Parece bastante importante.

- Ah, se calhar são missangas novas para as pulseiras delas - zombou Chet.

- Que engraçadinho! - retorquiu Iola. - Vou fazer-te ficar verde de inveja-, ou melhor, púrpura!

Dirigiram-se todos para dentro de casa e Callie explicou que ela e Iola tinham andado a recolher pedras no dia anterior. Com uma gargalhada, revelou também que Chet e Iola eram grandes rivais nessa tarefa.

Na casa de jantar, Iola dirigiu-se prontamente a uma taça de ponche antiga que estava em cima de uma mesinha de rodas. Escolheu entre várias uma pedra mais ou menos do tamanho de uma uva. Era de um tom violeta-claro e tinha o formato de um cristal não polido.

- Regalem os olhos! - disse ela, agitando a pedra mesmo debaixo do nariz de Chet.

- Bem, vê lá se estás quieta para eu a ver melhor - barafustou o irmão, que observou o achado com uma admiração invejosa.

- É linda - observou Frank. - É uma ametista? Iola acenou afirmativamente com a cabeça, cheia de orgulho.

- E é verdadeira!

- Levámo-la hoje de manhã à joalharia do senhor Filmer para nos certificarmos se seria verdadeira ou não - acrescentou Callie. - O senhor Filmer identificou-a logo.

Os olhos de Chet quase lhe saltaram das órbitas com a emoção.

- Uauu! Uma jóia verdadeira! - exclamou. - Onde é que a encontraram?

- Não nos lembramos - confessou Iola.

- Não se lembram? - repetiu Chet. - Mas como é que vocês podem ser tão descuidadas? Não vêem que pode haver um tesouro em ametistas no mesmo lugar?

- É que nós apanhámos amostras de pedras em vários sítios - explicou Callie. - Não havia muita luz porque já era tarde e nunca pensámos que esta podia ser tão valiosa.

- Nem sequer temos a certeza de qual de nós a apanhou - continuou Iola.

Chet ia continuar a censurá-las quando Joe olhou por acaso pela janela.

- Ei! - gritou ele. - O vosso celeiro está a arder!

Os outros olharam logo, abrindo a boca de surpresa. Nuvens de fumo negro saíam em borbotões pela porta aberta do celeiro!

- Meu Deus! - gritou Chet. - E o pai que nem cá está! Depressa, vamos usar os extintores e baldes de água!

Os cinco jovens saíram a correr, seguidos da senhora Morton, que viera precipitadamente da cave, alarmada pelos gritos deles.

Não se viam quaisquer sinais de chamas. Frank e Chet entraram logo pelo celeiro dentro para ir buscar os extintores que estavam pendurados na parede. Entretanto, Joe e as raparigas preparavam-se para trazer os baldes com água do poço.

- Oh, Meu Deus! - gritou a senhora Morton, aflita e sem saber o que fazer. - Não será melhor chamar os bombeiros?

- Não se incomode, mãe! - gritou Chet, reaparecendo cá fora. - Isto não é nada de grave, afinal.

O fumo começava já a desvanecer-se e só Frank e Chet estavam todos enfarruscados por terem passado pela nuvem negra.

- Era uma lata de óleo... que estava a... a arder - explicou Frank a tossir.

- Não percebo como começou - acrescentou Chet. - Não sabia que o óleo de tractor podia inflamar-se por combustão espontânea.

Com suspiros de alívio, regressaram a casa. A senhora Morton providenciou sabão e toalhas para Chet e Frank se lavarem na cozinha. Joe e as raparigas voltaram à casa de jantar.

Iola foi pela ametista, mas não a encontrou.

- Callie, levaste a jóia lá para fora contigo? - perguntou.

- Não. Não a deixaste em cima da mesa?

- Pensava que sim.

Iola procurou ansiosamente dentro da taça de vidro, mas acabou por virar a cara desolada para os outros que a observavam.

- Não está aqui!

Desataram os três a procurar a pedra preciosa. Joe, de gatas, examinou o chão, enquanto as raparigas passaram a pente fino até as gavetas e prateleiras dos armários. A ametista tinha desaparecido! Frank e Chet foram informados do ocorrido assim que entraram na casa de jantar.

- Bonito serviço - resmungou Chet. - Primeiro, um incêndio e, agora, as meninas perdem a única pedra de valor que nós encontrámos até hoje.

Frank e Joe olharam um para o outro. Estavam a pensar exactamente o mesmo.

- Aposto que aquele incêndio foi um pretexto para nos afastar de casa! - exclamou Joe.

- Queres dizer que a pedra foi roubada? - interrogou Iola.

- Também me dá essa impressão - disse Frank. - E pela mesma pessoa que deitou fogo à lata de óleo.

Nos olhos de Callie surgiu um brilho momentâneo, pois a rapariga lembrou-se de qualquer coisa.

- Eu ouvi um carro a afastar-se na altura em que regressávamos a casa - disse. - Aposto que era o ladrão a fugir!

Chet deixou-se cair pesadamente numa cadeira.

- Céus, acho que não pode acontecer-nos mais nada hoje! - Mas logo mudou de tom e pareceu muito mais animado. - O que não quer dizer que não possamos almoçar.

Frank telefonou de imediato à polícia e deu parte do roubo. Logo de seguida, ligou para casa e avisou a mãe de que ele e Joe almoçariam em casa de Morton.

Quem recebeu o recado foi a tia.

- A propósito - disse Gertrude Hardy -, o Tony Prito já telefonou duas vezes para falar contigo ou com o Joe. Não deixou nenhum recado, mas disse que era urgente.

- Onde posso encontrá-lo? - perguntou Frank. - No escritório do pai?

- Hmm... Não. Acho que ele disse que estava a ligar da doca.

- Está bem, tia. Obrigado.

Frank e Joe pediram desculpas à senhora Morton por terem de comer à pressa o delicioso almoço que já estava servido. Assim que acabaram, prepararam-se para sair, explicando que iam à procura de Tony Prito.

Tony, um colega da idade deles, de cabelo negro, era um grande amigo dos dois irmãos. Era frequente irem os três até à baía de Barmet no seu barco a motor, o Nápoles. Frank e Joe dirigiram-se rapidamente à doca, mas não encontraram Tony em lado algum.

- Aposto que saiu no Nápoles - disse Joe, procurando-o com o olhar por todo o porto.

- Provavelmente. - Frank observou o céu limpo e as águas azuis, ligeiramente encrespadas, da baía. - Joe, vamos buscar o Vedeta e tentar encontrá-lo.

- Está bem.

Os Hardy apressaram-se a ir até à barraca de madeira onde guardavam o seu próprio barco a motor.

Enquanto isto, Tony acabava de chegar à casa dos Morton na carrinha do pai.

- Olá, Chet. Já viste o Frank e o Joe, hoje? - perguntou ao rapaz que vinha a sair de casa.

- Claro. Eles almoçaram cá. Mas foram-se logo embora, há cerca de quinze minutos, para se encontrarem contigo no cais.

Tony empalideceu de repente.

- Meu Deus! Espero bem que eles não resolvam sair no Vedeta.

- Porquê? - perguntou Chet, surpreendido.

- Vem comigo e eu conto-te. É melhor irmos ter com eles quanto antes.

Chet quase nem teve tempo de entrar na carrinha antes que Tony desse a volta e arrancasse. Assim que o veículo ganhou velocidade na estrada, Tony explicou:

- Eu vi dois tipos com ar de poucos amigos a espreitarem para dentro da doca coberta onde o Frank e o Joe guardam o barco deles. Tive logo a sensação de que andavam a tramar alguma!

- Viste quem era? - perguntou Chet, excitado.

- Não, mas receio que eles lá estivessem com a intenção de sabotar o barco!

- Não avisaste a senhora Hardy e a tia Gertrude?

- Acho que era o que devia ter feito - disse Tony, arrependido. - Mas não quis alarmá-las.

Assim que a carrinha parou no cais, Chet exclamou, apontando para a água.

- Olha, lá vão eles!

O Vedeta afastava-se lentamente da baía. Distinguiam-se duas silhuetas a bordo.

- Chegámos tarde de mais - lamentou Tony.

Os dois rapazes apearam-se da carrinha e desataram a gritar e a acenar freneticamente na direcção dos Hardy. Mas o barco dos amigos já ia demasiado longe para que estes pudessem ouvi-los.

Subitamente, deu-se uma violenta explosão a bordo do Vedeta!

 

A força da explosão fez a proa do Vedeta elevar-se bem acima da água! Os ocupantes foram cuspidos borda fora e o barco voltou-se ao contrário. O fumo era imenso.

- Vamos! - gritou Tony para Chet. - Temos de ir recolhê-los!

- Onde está o Nápoles? - Chet arfava enquanto corriam ambos ao longo do cais.

- Deixei-o amarrado na doca norte.

No pontão, a multidão começava já a aglomerar-se, numa confusão de comentários. Os dois rapazes chegaram por fim junto do barco. Chet empurrou-o para fora e Tony pô-lo a funcionar. Num segundo, aceleravam ao encontro dos amigos.

Chet, que ia sentado à proa, gritou aliviado.

- Parece que o Frank e o Joe estão bem!

Os Hardy haviam-se debatido por algum tempo no meio das ondas, mas estavam já agarrados ao casco do seu barco. O Nápoles aproximou-se, abrandando.

- Puxa, isto é que eu chamo serviço bem montado!

- comentou Joe, enquanto ele e o irmão se deixavam içar para o barco de Tony. Este explicou-lhes:

- Nós viemos para vos avisar do perigo.

- Mas nós também andávamos à tua procura - retorquiu Joe. - Como o teu barco não estava recolhido...

- Pois não, eu saí com ele e depois deixei-o na doca norte quando regressei.

- O que queres dizer com isso de avisar do perigo? - perguntou Frank.

Tony contou-lhes que tinha visto os dois homens a espreitarem para a casa onde eles guardavam o Vedeta. Estava ele a acabar de falar, apareceu em cena uma lancha da Guarda Costeira que, tal como outros barcos, vinha para socorrer os rapazes.

- Estão todos bem? - gritou da lancha o oficial.

- Eles estão bem, só bastante molhados - retorquiu Chet.

- O que foi que aconteceu?

- Uma explosão qualquer no compartimento da frente - explicou Frank. - Suspeitamos de sabotagem.

O oficial da Guarda Costeira ordenou ao timoneiro que manobrasse a lancha de modo a que ficasse o mais perto possível da embarcação sinistrada. Havia um buraco no casco, junto à proa, mas o sistema de flutuação de emergência, na parte da frente do barco, impedira que este se afundasse.

- Os seus amigos conseguem rebocar o barco até à doca de reparação sem problemas? - perguntou o oficial aos Hardy.

- Cá nos arranjaremos, se mais alguém nos ajudar - disse Tony.

- Eu ajudo-vos, rapazes! - gritou um homem de um iate próximo.

- Nesse caso, é melhor que vocês regressem comigo ao posto da Guarda Costeira para prestar declarações - disse o oficial a Frank e Joe.

Os Hardy subiram a bordo da lancha, que de imediato rumou ao porto.

No posto, Frank e Joe contaram a história toda a um tenente chamado Anson.

- Vocês são os filhos do Fenton Hardy, não são?

- perguntou ele.

- Somos sim, senhor - respondeu Joe.

- Acham que esta sabotagem estará relacionada com algum dos casos que o vosso pai está a investigar?

- Pensamos que sim, mas não temos a certeza ainda.

O tenente insistiu:

- Têm alguma teoria?

- Alguém deve querer ver-se livre de nós, pelo menos, tentou fazer-nos desistir da nossa investigação - declarou Frank. - Na minha opinião, a bomba foi detonada quimicamente, talvez em contacto com a água salgada. Mas algo me diz que explodiu demasiado cedo, que os sabotadores esperavam que nos tivéssemos afastado mais da baía.

- Exacto - concordou Joe. - Aposto que esperavam que a explosão fizesse desaparecer o barco e nós nos afogássemos com todas as provas que temos contra eles. Mas, felizmente, o barco virou-se mas ficou a flutuar, o que permitiu que nos agarrássemos a ele.

O tenente Anson anotou as declarações dos dois irmãos e depois disse:

- No relatório, fica escrito que vocês vão continuar com as vossas investigações. Mas, por favor, mantenham-nos sempre informados.

Mandou o seu ordenança acompanhar os rapazes até ao carro. Frank e Joe seguiram para casa, onde a tia Gertrude os recebeu com ar desaprovador.

- Deus do céu! Felizmente, a vossa mãe foi para uma reunião na biblioteca!

Ordenou-lhes que descalçassem os sapatos ensopados, para evitar sujar a alcatifa. Entretanto, não se conteve e continuou ansiosamente:

- O que foi que vos aconteceu? Esse malandro que vocês procuram conseguiu fazer das dele, não?

Frank sorriu disfarçadamente e deu-lhe um abraço molhado, que a tia ainda tentou evitar.

- Foi um pequeno acidente, tia. Um banho que nós não esperávamos.

Os rapazes tinham acabado de mudar de roupa quando o telefone tocou. Foi Joe quem atendeu. Do outro lado da linha estava o chefe Collig.

- Recebi um relatório do Departamento de Registo Automóvel sobre a matrícula do tal carro de desporto. Está registado em nome de Aden Darrow.

- Nunca ouvi falar dele - respondeu Joe.

- Nós também não temos nada sobre ele nos nossos arquivos.

- E quanto à morada?

- Só um número de rua em Eastern City - disse Collig. - Pedi ajuda à polícia local, mas não puderam adiantar mais nada. A tal rua está a ser toda demolida para dar lugar a uma auto-estrada.

- Pista falsa. Bom, muito obrigado, chefe. Pouco tempo depois, chegaram Tony Prito e Chet.

Informaram que o Vedeta já se encontrava em segurança na doca de reparação.

Frank telefonou para lá a fim de se inteirar do preço da reparação do barco e, em seguida, os quatro rapazes recapitularam em conjunto os acontecimentos do dia. Frank e Joe puseram logo Tony ao corrente do caso.

- Suspeitam que os homens que colocaram a bomba estavam a trabalhar para o Strang? - perguntou Tony.

- Provavelmente - admitiu Frank. - Principalmente, se ele encontrou o meu canivete e ficou a saber quem nós somos.

- Aposto que ele nos reconheceu ontem à noite! - exclamou Joe.

- E aquele malandro que roubou a ametista da Iola e da Callie? - perguntou Chet. - Talvez tenha sido também o Strang. Vocês não dizem que ele é um ladrão de jóias?

Frank franziu as sobrancelhas.

- Lá isso é verdade. Mas é um ladrão de alto gabarito. Duvido que aquela ametista tenha valor suficiente para que ele se tivesse arriscado.

- De qualquer maneira, o Strang anda a actuar aqui nas redondezas - disse Joe. - Quem sabe se não se tem escondido naquela casa velha... Nós vimo-lo a rondar por ali esta manhã!

- Pode muito bem ser - disse Frank.

Tony perguntou onde ficava a tal casa. Quando Joe I lhe explicou, a tia Gertrude, que também estava a ouvir, exclamou:

- Mas essa é a mansão do velho Perth!

- A tia sabe quem mora lá? - perguntou Frank.

- Ninguém, segundo tenho ouvido dizer - respondeu ela. - Está abandonada há anos. O local ganhou o que se pode chamar uma reputação sinistra.

- O que quer dizer com isso? - inquiriu Joe.

- Parece que morreu lá alguém em circunstâncias misteriosas. Não me lembro bem quem. Mas dizia-se [ que o local estava assombrado.

- Assombrado? - Chet engoliu em seco. A tia Gertrude fungou.

- Só disparates. Há pessoas que acreditam em tudo. Isso já foi há tantos anos!... Muito antes de qualquer de vocês ter nascido.

- Conte-nos mais, tia - insistiu Frank. Gertrude Hardy sentou-se na sua cadeira preferida.

- Bom, ao princípio a casa pertencia a um homem chamado Jerome Perth. Creio que não era nada boa pessoa, pelo que se costumava dizer dele - O que fazia ele? - perguntou Frank.

- Era um grande homem de negócios, mas trabalhava na sombra. As pessoas acusavam-no de todo e qualquer tipo de crimes: especulação e fraude com acções da bolsa, infracções com patentes e coisas do género. Tanto quanto sei, nunca ninguém conseguiu provar fosse o que fosse contra ele.

- Devia ser um tipo bastante esperto - observou Tony.

- Oh, lá isso era - concordou a tia Gertrude. - E fez uma data de inimigos. De facto, algumas pessoas que ele enganou tentaram mesmo matá-lo. Por fim, refugiou-se naquela mansão, que ele próprio mandou construir, e viveu ali, apavorado, até ao fim dos seus dias.

- Então nenhum dos seus crimes lhe trouxe felicidade - observou Joe.

- Realmente, não. Recordo-me de ouvir dizer que ele tinha um escritório no andar de baixo, onde colocara também uma cama, e quase nunca saía dessa divisão.

- Mas a tia não se lembra de quem é que lá morreu nas tais circunstâncias misteriosas? - perguntou Joe.

Gertrude Hardy abanou a cabeça.

- Algum parente, penso eu, mas não me recordo dos pormenores.

Entretanto, Frank teve uma ideia súbita. Telefonou de imediato a Iola Morton e perguntou-lhe se se encontrava mais alguém na joalharia quando elas tinham ido mostrar a pedra preciosa ao dono da loja.

- Sim, estava - respondeu Iola. - Apareceu outro cliente logo a seguir a nós. Lembro-me de que nos perguntou onde tínhamos encontrado a pedra. - Subitamente, Iola exclamou: - Oh, queres dizer que pode ter sido ele quem nos roubou a ametista?

- É possível - disse Frank. - Podia ter-vos seguido até casa. A Callie ainda está aí contigo?

- Está. Queres falar com ela?

- Nós vamos aí ter.

Cinco minutos depois, já Frank, Joe e Chet iam a caminho da quinta dos Morton no descapotável dos Hardy. Tony tivera de voltar ao trabalho na empresa de materiais de construção do pai.

Os Hardy levaram com eles o estojo de retratos robot do pai. Para além de um pequeno visor, aquele equipamento incluía algumas fitas de filme mostrando centenas de diferentes cortes de cabelo, olhos, orelhas, narizes, queixos, óculos e chapéus.

Iola e Callie ficaram fascinadas quando os amigos demonstraram a utilidade daquilo e lhes pediram que descrevessem as características do tal estranho.

- É como se estivéssemos a fazer um puzzle! - exclamou Callie.

Pouco a pouco, conseguiram determinar as características físicas do homem e foram-nas juntando no écran, até que tomou forma um rosto completo.

- Com mil diabos! - exclamou Joe. Ele e Frank entreolharam-se petrificados.

- É o tipo que encontrámos ontem à noite, inconsciente! - explicou Frank.

Chet, por detrás dos Hardy, abriu a boca de espanto.

- E é mesmo! - Joe - sugeriu Frank -, e se levasses este desenho à joalharia e perguntasses ao senhor Filmer se conhece este homem?

- Está bem. E tu?

- Eu quero ir até aos escritórios do Bayport News, a ver se descubro nos arquivos alguma notícia sobre a mansão do velho Perth.

Joe deixou o irmão junto do edifício do jornal e uns minutos depois arrumava o carro em frente da joalharia. Levando consigo o desenho, dirigiu-se ao proprietário da loja.

O senhor Filmer, um homem muito magro e com óculos de lentes bifocais, parecia estranhamente nervoso.

- Eu... aaa... realmente não me re... recordo de ter visto mais ninguém, a... aqui na loja, na altura em que a lola e a Callie cá... cá estiveram - respondeu a gaguejar.

- Por favor, tente lembrar-se - insistiu Joe.

- Acho que não sou capaz.

- Bem, pelo menos, deixe que lhe mostre uma fotografia do homem para ver se o senhor...

Joe calou-se de repente. A porta que dava para a divisão por detrás da loja encontrava-se ligeiramente aberta e Joe acabara de vê-la mover-se um pouco.

Estava alguém a escutá-los atrás da porta!

"Então é por isso que o senhor Filmer não pode ajudar-me! - pensou Joe. - Aposto que está cheio de medo da pessoa que se escondeu ali dentro!"

O jovem detective não pensou no que fazer mais do que por uns instantes. Se pedisse licença ao joalheiro para ver de quem se tratava, a pessoa teria tempo de fugir. Mas se fosse de repente... Joe saltou por cima do balcão e abriu a porta abruptamente.

Um homem alto e de cabelo louro, muito parecido com o do desenho, largou a fugir em direcção a uma janela. Joe seguiu-o e tentou agarrá-lo, mas o desconhecido pegou num banco e atirou-lho para cima. Atingiu-o uma têmpora e o rapaz caiu no chão, inconsciente!

 

Assim que Joe recuperou a consciência, sentiu algo frio e húmido sobre a testa. Estava encostado ao canto da divisão interior da joalharia e o senhor Filmer estava curvado sobre ele. Acabava de lhe aplicar uma toalha molhada sobre o ferimento.

- Está melhor? - perguntou o joalheiro, ansioso.

- E... eu acho que sim, a não ser o "galo" na cabeça.

- Meu Deus! Tem aí um alto e pêras!

- Isso não tem importância. - Joe tentou pôr-se de pé. - E o tipo que me acertou com o banco?

O senhor Filmer, desolado, apontou para uma janela aberta.

- Fugiu a correr pela rua abaixo.

- Suponho que seja o mesmo que aqui estava quando a Iola e a Callie trouxeram a ametista, não é? - perguntou Joe, reprimindo um comentário irado.

O dono da loja enrubesceu.

- Peço-lhe imensa desculpa por lhe ter mentido. É que ele estava escondido, o tempo todo, aqui atrás a ouvir a conversa e eu fiquei apavorado de mais para falar.

- Bom, ele já cá não está. Mas quem é ele?

- Não faço ideia - disse o senhor Filmer, parecendo confuso. - Aparece muitas vezes aqui na loja para falar com os coleccionadores de pedras e mostra-se particularmente interessado em ametistas. É tudo o que lhe posso dizer.

- E hoje, quando é que ele cá chegou? - perguntou Joe.

- Poucos minutos antes de você ter entrado. Perguntou-me se tinha cá estado alguém a fazer perguntas sobre ele. Quando lhe disse que não, avisou-me que calasse a boca. Senão, espancar-me-ia. Nisto, viu-o chegar e escondeu-se cá atrás.

- Promete-me que se ele aparecer cá outra vez, tenta avisar logo a polícia? - pediu Joe.

- Com certeza!

Filmer meneou vigorosamente a cabeça, desejoso de emendar o seu erro.

Joe ainda pensou em tirar as impressões digitais, mas lembrou-se então que reparara que o homem usava luvas. Antes de sair da loja, telefonou ao chefe Collig e narrou-lhe o incidente.

Quando Joe chegou a casa, a mãe insistiu em fazer-lhe um penso na ferida, que aumentava a olhos vistos. A tia Gertrude aproximou-se para supervisionar o tratamento, resmungando abertamente contra os perigos do trabalho dos detectives. Joe ia sorrindo disfarçadamente ao escutar os comentários tão típicos da enérgica senhora.

Pouco tempo depois, foi a vez de Frank entrar em casa. Deitou uma olhadela a Joe, que estava sentado numa poltrona a ver televisão, e soltou um assobio.

- Onde arranjaste essa condecoração?

- Bati com a cabeça contra um banco.

Joe virou-se de frente para o irmão e contou o que tinha acontecido na joalharia. No fim, acrescentou:

- Ainda não consegui perceber como é que ele soube que nós íamos lá perguntar por ele.

- Provavelmente, fez o mesmo raciocínio que nós - retorquiu Frank. - As raparigas só apanharam a ametista ontem e a loja era o único lugar onde um estranho soube do caso.

- Por outras palavras, ele calculou que nós havíamos de juntar dois mais dois. Para não correr quaisquer riscos, decidiu ameaçar o Filmer para o forçar a calar-se.

Frank concordou e Joe mudou de conversa.

- E que tal se me contasses agora o que descobriste tu?

- Já sei a história toda - replicou Frank, entusiasmado. - A pessoa que morreu na mansão do Perth em circunstâncias misteriosas foi um sobrinho do velho. Devia ter causado grande sensação, pois o Times tinha uma data de colunas sobre o assunto.

Os olhos de Joe brilharam de curiosidade.

- O que aconteceu?

- Bom, o sobrinho, um tal Clarence Perth, mudou-se para a mansão depois de Jerome Perth ter morrido de um ataque cardíaco. Instalou-se no escritório do tio, o tal onde ele dormia. Mas poucos dias viveu para gozar a herança.

- Porquê?

- Uma noite, muito depois da meia-noite, os criados ouviram-no gritar de terror - continuou Frank. - Quando entraram no quarto, depois de arrombar a porta, encontraram-no estendido no chão, com o crânio partido. E vê bem isto: mesmo antes de morrer, o sobrinho murmurou umas palavras que eles perceberam como "o chão"!

Joe deu um assobio.

- Uau! quando o Chet ouvir isto, vai ficar com a certeza de que foi mesmo um fantasma que nos gritou ontem à noite.

- Mas ainda há mais - continuou Frank. - Tanto a porta como as janelas do quarto estavam fechadas por dentro e nenhuma delas tinha sido violada. Portanto, não havia hipótese do assassino ter entrado ou saído do quarto.

- E não havia portas secretas ou paredes falsas? Frank encolheu os ombros.

- Os artigos dos jornais dizem que a polícia procurou passagens secretas, mas não conseguiu encontrar nenhuma. É claro que os métodos de detecção criminal nessa altura não eram o que são hoje.

- E sobre a questão do fantasma?

- Existem várias pequenas notícias na sequência disto que falam de que algumas pessoas declararam ter visto uma figura fantasmagórica a rondar a mansão do Perth.

- Humm! Não há dúvida que existirá sempre gente pateta e crédula! - comentou uma voz apimentada.

A tia Gertrude veio sentar-se numa poltrona e começou a passajar meias.

- Estejam à vossa vontade e não se ralem comigo - disse, quase num resmungo. - Continuem lá a vossa conversa sobre esses disparates.

Frank e Joe sorriram pois sabiam de sobra que a tia estava morta por ouvir todos os pormenores. Pareceu grata quando Frank lhe repetiu as informações que havia obtido no Bayport Times.

- Sim, agora me lembro do sobrinho do Perth - afirmou a tia Gertrude puxando pela memória. - Pobre homem! Sempre achei que ele fora marcado pelo destino para pagar pelos crimes do tio.

Durante o jantar, Frank e Joe mantiveram-se silenciosos e pensativos. Nenhum deles acreditava que os estranhos gritos que tinham ouvido perto da mansão do Perth pudessem ser do fantasma do sobrinho. De qualquer maneira, era um fenómeno misterioso.

- Gostava de voltar àquela mansão - declarou Joe quando a família acabou a sobremesa. - Tenho um palpite que iremos lá encontrar algumas respostas não só sobre o fantasma mas também sobre o Strang.

Frank concordou.

- Iremos os dois assim que escurecer.

Duas horas depois, os rapazes arrancavam no descapotável e dirigiam-se aos arredores de Bayport. O carro deslizava quase sem ruído na noite calma e iluminada pela lua, pois apenas leves nuvens esbranquiçadas salpicavam o céu. Quando viraram para o caminho de terra, Frank desligou os faróis e, logo à frente, encostou o carro junto de uns arbustos.

- É melhor levarmos as lanternas eléctricas - murmurou Joe.

Os rapazes apearam-se e começaram a subir o caminho. Ao longe, distinguiam-se luzes que provinham da mansão.

- Está alguém dentro da casa assombrada - observou Joe. - Talvez seja o Strang. É melhor não fazermos barulho!

Os Hardy enfiaram-se por entre as ávores e arbustos. De repente, uma rosnadela feroz fê-los voltar-se, assustados, para a esquerda.

Um enorme cão de guarda com ar selvagem estava plantado em frente deles. Observava-os com os olhos a brilharem como brasas no escuro! Rosnou outra vez e parecia pronto a atacar os dois intrusos.

- Anda! Não discutas com ele - murmurou Frank, começando a recuar sorrateiramente.

Mas Joe segurou-o pelo braço.

- Espera, Frank! Aquilo não é um cão a sério. É só um boneco telecomandado!

Incrédulo, o irmão mais velho olhou com mais atenção. E compreendeu que Joe tinha razão.

- Macacos me mordam! - praguejou. - Aquele boneco parece suficientemente feroz para te arrancar a cabeça à primeira dentada!

- Devemos ter atravessado algum feixe de um sistema electrónico que lhe acende os olhos e o faz rosnar - sugeriu Joe, esticando a mão para tocar no boneco, como se quisesse assegurar-se de que o "animal" não era mesmo de carne e osso.

- Espera, Joe! - Frank agarrou-lhe a mão e afastou-a. - Pode estar electrificado e dar choque.

Tirando o cinto das calças, Frank pegou na ponta de cabedal e encostou lentamente a fivela de metal ao cão mecânico. Uma luz azul e branca crepitou e iluminou a escuridão assim que o metal tocou no "bicho".

- Uau! - esclamou Joe. - Aquilo ia fazer-me dar cá um pulo! Frank, achas que o tipo que nós encontrámos ontem aqui ficou inconsciente por ter apanhado um choque valente?

- Acho que foi isso mesmo. E olha que, se foi, todos os cuidados são poucos.

Mais cautelosamente do que nunca, os Hardy aproximaram-se da mansão. A casa, cujas paredes eram todas revestidas de placas de madeira já muito desgastadas pelo tempo, tinha na frente um varandim e era encimada por torreões e beirais de ferro rendilhado. Tufos de ervas e plantas bravias, que cresciam junto às paredes, rodeavam-na de um autêntico matagal.

- Vamos começar por aquelas janelas em que há luz, neste andar debaixo - sugeriu Frank.

Avançaram sorrateiramente para uma das janelas. Olharam lá para dentro. A pouca mobília, toda encostada às paredes, consistia numas prateleiras, uma secretária, cadeiras, uma mesa e uma cama.

- Este devia ser o tal escritório onde o Jerome Perth dormia - murmurou Joe

Aproximando mais a cara do parapeito, para ver melhor, o rapaz deixou escapar um grito de espanto.

- Frank, olha! A sala não tem chão!

 

Por um momento, Frank pensou que o irmão estava a brincar. Depois, também ele aproximou a cara do parapeito da janela. Por baixo da mobília do quarto, só se via uma escuridão sem fim!

- Isto é de loucos! - murmurou. - A mobília não pode estar suspensa no ar!

- Se ao menos pudéssemos ver melhor!

Joe achatou o nariz contra a vidraça e espreitou para baixo. De súbito, Frank fez um leve "psst" e puxou o irmão, fazendo-o acocorar-se.

- O que se passa? - murmurou Joe.

Frank apontou para as traseiras da casa. À distância, avistava-se uma pequena luz movimentando-se entre as árvores. Os rapazes recuaram e agacharam-se na sombra de uns arbustos.

Enquanto ali estavam, os olhos de Joe pousaram no que parecia ser uma moeda antiga. Caída no chão, brilhava vagamente sob o clarão de luz que vinha de dentro de casa. Joe apanhou-a e guardou-a dentro do bolso.

Entretanto, o foco de luz aproximava-se lentamente. Vagueava e descrevia ziguezagues ao acaso. A brisa nocturna passava com um som lúgubre pelo meio dos cónios e cipestres. Em poucos minutos, a luz encontrava-se muito perto do esconderijo dos rapazes.

Frank franziu os olhos na escuridão. De súbito, sentiu um arrepio na espinha.

- Joe! - exclamou. - Estás a ver o mesmo que eu?

- Podes crer! - disse Joe, engolindo em seco. Quem transportava a luz era uma figura fantasmagórica, vestida de branco! Mas o bom senso dos rapazes disse-lhes que tinha de ser humana.

- É a nossa oportunidade de acabar com essa história de fantasmas de uma vez por todas - murmurou Frank.

Joe olhou para o irmão.

- Queres dizer que vamos apanhar o fantasma?

- Isso mesmo. Mas ainda não. Espera até eu fazer sinal.

A silhueta branca movia-se suave mas rapidamente, parando de vez em quando entre os arbustos. A certa altura como que fez menção de se aproximar da casa, mas logo se afastou na direcção oposta.

Frank encostou a boca ao ouvido de Joe.

- Vamos esgueirar-nos e agarrar o senhor fantasma de surpresa!

Silenciosos como sombras, os Hardy deslizaram pelo meio do matagal. Movimentando-se com passos leves, aproximaram-se da silhueta misteriosa. Mas Joe, mais impulsivo, meteu o pé num emaranhado de arbustos e caiu pesadamente no chão.

O "fantasma" virou-se, visivelmente alarmado pelo barulho. Virou a lanterna e focou os dois rapazes, apagando a luz abruptamente. Um instante depois, tinha-se eclipsado na escuridão!

Frank parou só o tempo suficiente para se certificar de que o irmão não estava magoado e continuou a perseguição. Joe pôs-se logo de pé.

Por esta altura, já não se avistava nenhuma silhueta branca. Então, Joe vislumbrou uma mancha pálida entre as árvores. Estaria o fantasma a tentar escapar-se-lhes, regressando a casa? Joe correu naquela direcção para interceptá-lo.

Viu de facto o fantasma passar entre duas árvores. No mesmo instante chegou-lhe aos ouvidos o som de uma campainha de alarme, que retinia dentro da mansão!

"Tem de haver outro olho electrónico escondido entre as árvores!" - concluiu Joe.

Uma enxurrada de luzes resplandeceu à volta da casa. A porta da frente abriu-se de par em par, dando passagem a três homens. Enquanto isso, o fantasma afastara-se para o lado esquerdo e desaparecera de novo na escuridão - desta vez, em direcção à estrada mas não para o lado onde se encontrava o carro dos dois irmãos.

Joe parou, sem saber ao certo o que fazer a seguir. Se continuasse com a perseguição, arriscava-se a ser apanhado pelos homens vindos da casa antes de conseguir alcançar o descapotável.

"Tanto quanto sei, podem muito bem ter sido eles os responsáveis pela explosão no nosso barco" - disse para consigo.

Ao ver os homens aproximarem-se, Joe tomou uma decisão rápida e desatou a correr por entre as árvores. Um instante depois, assustou-se com um sussurro que vinha de um arbusto perto. Uma silhueta corria na sombra ao seu lado:

- Estás bem, Joe?

- Estou, mas não me faças quase morrer de susto desta maneira!

Os ruídos provocados pela perseguição diminuíram e os Hardy atingiram o declive por onde desceram rapidamente até ao carro. Entrando no descapotável, Frank ligou a ignição e ouviu-se de imediato o ronro-rar do motor. Virando o volante todo, fez meia volta e acelerou.

- Foi o que se chama "dar às de vila-diogo"! - exclamou Joe.

- Conseguiste ver bem os homens que saíram da casa? - perguntou Frank.

- Não muito bem - respondeu Joe -, mas acho que um deles podia ser o Strang.

Ao entrar em casa, pela porta da cozinha, os dois irmãos ouviram um zunido sonoro que vinha da cave.

- É o sinal do rádio de ondas curtas! - exclamou Frank.

Precipitaram-se pela escada abaixo e ligaram o poderoso aparelho que utilizavam para comunicações secretas.

- Fenton Hardy chama Bayport. Responda, por favor!

As últimas palavras soaram mais claramente pois entretanto Joe ligara o receptor.

- Bayport a Fenton - disse Frank. - Estamos a ouvi-lo alto e bom som!

- Ainda bem. Esperava encontrá-los em casa.

- Em que é que deu aquela denúncia do telefonema? - perguntou Frank, cheio de curiosidade.

- Por enquanto, não deu em nada - informou o senhor Hardy. - O Wanda só chegou às seis horas da tarde. Os passageiros são todos gente rica e há um grande número de jóias a bordo. Mas, até agora, ainda não encontrámos nenhum indício de que esteja iminente um roubo.

- Pai, acha que a denúncia era falsa?

- Para já, é muito cedo para afirmar isso. A polícia está de olho alerta, mas ainda não localizou quaisquer suspeitos. Também há que admitir que tenham cancelado o assalto por qualquer motivo.

- Outra hipótese é que o bando queira retê-lo em East Hampton, enquanto se prepara para atacar noutro lugar qualquer - observou Frank.

- É precisamente disso que eu tenho medo – comcordou o detective. - Entretanto, nem eu nem o Sam podemos fazer nada. Como é que estão as coisas aí em Bayport?

Frank informou rapidamente o pai dos acontecimentos do dia. O senhor Hardy ficou pasmado ao saber da explosão no Vedeta e do ataque a Joe na joalharia do senhor Filmer. Mostrou-se também muito intrigado com a informação do Departamento de Registo Automóvel.

- Tenho a certeza de que já ouvi falar desse tal Aden Darrow, mas não estou a ver a propósito de quê - declarou o detective. - Procurem no meu arquivo.

Depois de conferenciar brevemente com o seu colaborador Sam Radley, Fenton Hardy acrescentou:

- Filho, da maneira como estão as coisas em Bayport, acho que é melhor o Sam partir já para aí e ajudar-vos na investigação. Eu falo com o Jack Wayne. Ele deve poder deixar aí o Sam antes da meia-noite.

- Está bem, pai. Nós vamos ter com o Sam ao aeroporto.

Frank e Joe desligaram o aparelho e apressaram-se a subir até ao primeiro andar, onde ficava o gabinete do pai. Uma cuidadosa busca no arquivo revelou que não constava nenhum Darrow da lista criminal.

- O pai deve estar a fazer qualquer confusão - concluiu Joe.

A senhora Hardy e a tia Gertrude estavam a ver um filme na televisão. Os rapazes foram juntar-se-lhes.

- Suponho que agora vos sabia bem uma ceia - falou a tia, depois de o programa acabar.

- Não diríamos que não - retorquiu Frank com um sorriso.

Enquanto Gertrude Hardy se dirigia à cozinha, Joe lembrou-se subitamente da moeda que apanhara perto da janela da mansão. Mal a examinou, o jovem detective deu um grito de entusiasmo.

- Frank! Olha para isto!

A moeda parecia ser feita de latão. Dos dois lados, ostentava o desenho de um dragão!

- Uau! É o mesmo desenho que o Chet viu no tal quadrado de mosaicos! - exclamou Frank.

Excitados, os rapazes começaram a discutir sobre a sua nova pista. A senhora Hardy observou também a moeda e fez notar o desenho de uma violeta por cima da cabeça do dragão. Pouco depois, a tia Gertrude regressou à sala, carregando um tabuleiro com sanduíches, biscoitos e leite. Também ela ficou curiosa e pediu para ver o achado dos sobrinhos.

- Mas isto pertenceu ao velho Jerome Perth! - anunciou, triunfante.

- Como é que a tia sabe? - perguntou Joe.

- Pelo desenho, claro! - e acrescentou: - Era a marca comercial dele.

- Tiazinha, é maravilhosa! - exclamou Frank.

- Aquele velho patife costumava distribuir essas moedas a torto e a direito - continuou ela -, especialmente quando alguém lhe pedia que contribuísse para alguma instituição de caridade! Dizia que as moedas trariam sorte a quem as possuísse, o que era mais importante do que o dinheiro. - Com um resmungo Gertrude Hardy comentou ainda: - O dragão era mesmo apropriado!

- Bom, uma vez que este é o desenho que o Chet descreveu, que viu no quadrado de mosaicos, pelo menos ficamos a saber que ele não imaginou coisas - disse Joe a Frank.

- Só que continuamos sem perceber do que é que se trata - contrapôs Frank.

Laura Hardy e a cunhada ficaram deveras interessadas a ouvir a experiência por que Chet tinha passado. A primeira, então, franziu as sobrancelhas, pensativa.

- Gertrude, não houve em tempos uma estufa perto da mansão do velho Perth? - perguntou.

- Acho que sim, Laura. Parece-me que a deixaram ao abandono e acabaram por demoli-la. Porquê?

- Estava cá a pensar se a dita superfície de mosaicos não terá sido parte do chão dessa estufa.

Joe deu um estalinho com os dedos, entusiasmado:

- Aposto que acertou em cheio, mãe! - exclamou.

Frank assentou com a cabeça, concordando.

- Mas nesse caso, porque é que não conseguimos encontrá-lo hoje de manhã? - perguntou, intrigado.

Antes que alguém pudessse responder, o noticiário da televisão monopolizou as atenções.

- Uma notícia de última hora acaba de nos chegar à redacção - disse o locutor. - Informam-nos de que houve um grande assalto em Chicago, hoje às dez horas da noite. Os assaltantes apoderaram-se de mais de cem mil dólares em pedras preciosas em bruto, da Companhia de Jóias Spyker. Não conhecemos mais pormenores por agora.

- Ei! Aquela denúncia que o pai recebeu pelo telefone era mesmo para o afastar - explodiu Joe. - Punha as mãos no fogo em como o Strang queria ter a certeza de que o pai estava ocupado em Long Island antes de o bando executar este novo golpe!

Frank levantou-se de um salto.

- Anda, Joe! Temos algo a investigar esta noite!

 

- Em que estás a pensar, Frank?

- Tu não ficaste bem certo se o Noel Strang era um dos homens que saiu da mansão - explicou o irmão -, mas sabemos que o vimos hoje de manhã.

- Sim. E então?

- Para ele estar envolvido neste último roubo de jóias, tem de ter ido de avião para Chicago. Era a única hipótese de lá chegar a tempo. Talvez possamos verificar isso no aeroporto.

- Boa ideia - concordou Joe. - Espera. Vou buscar a fotografia do Strang. Podemos utilizá-la ao perguntar ao pessoal do aeroporto se o viu.

Os Hardy chegaram ao aeroporto poucos minutos antes da meia-noite. Joe sugeriu:

- Vamos começar por procurá-lo nas listas de passageiros dos voos de hoje com destino a Chicago.

- O Strang não utilizaria o seu próprio nome se se preparava para cometer um crime - objectou Frank.

- Talvez não. Mas que tal um dos seus nomes falsos? - lembrou o irmão.

Joe apontou para um papel que continha uma série de informações sobre Strang e que estava colado no verso da fotografia.

- Tens razão. Vale a pena averiguar.

Em todos os balcões do aeroporto, os rapazes pediram para ver as listas dos passageiros dos voos com destino a Chicago desde a manhã. Não encontraram nem o nome de Strang nem nenhum dos seus pseudónimos conhecidos.

Joe mostrou a fotografia de Strang ao empregado de um dos balcões, mas o homem abanou a cabeça.

- Todo o pessoal das linhas aéreas que está agora a trabalhar, entrou ao serviço há uma hora. - Mas apontou para um empregado que estava a carregar malas junto ao portão de embarque e acrescentou: - Podem perguntar àquele bagageiro ali. E tentem também o Benny no quiosque dos jornais.

- Obrigado, é isso mesmo que vamos fazer.

Os rapazes mostraram a fotografia ao bagageiro e ao homem do quiosque. Nenhum deles se recordava de ter visto tal pessoa.

- Falta-nos ver dos voos charter - lembrou Joe. - Vamos tentar naquele balcão das informações.

Ali informaram-nos que teriam de perguntar na torre de controle.

- É lá que os planos de voo são preenchidos - explicou o empregado.

Antes que chegassem a dirigir-se para a torre, Joe avistou um avião que se aproximava.

- O Skyhappy Sal! - exclamou.

Era o avião charter pilotado por Jack Wayne. Este era um piloto veterano que frequentemente punha os seus serviços à disposição de Fenton Hardy. Em breve os rapazes apertavam a mão a Jack e ao seu passageiro, Sam Radley.

- Fizeram um bom voo? - perguntou Joe ao enérgico assistente do pai.

Sam acenou afirmativamente.

- Rápido e suave. Creio que chegou a altura de me darem umas luzes sobre o caso para começarmos a planear a nossa acção.

- Com certeza. Agora mesmo.

Frank contou-lhe em resumo os acontecimentos recentes em Bayport. Quando informou do roubo de jóias de Chicago, acrescentou:

- O Joe e eu íamos agora à torre de controle indagar se houve algum voo charter para Chicago em que o Strang pudesse ir.

- Eu faço isso, se querem - ofereceu-se Jack. - Conheço o controlador.

- Óptimo - disse Frank. - Temos aqui uma fotografia do Strang. Talvez algum dos controladores o reconheça, no caso de ele ter ido num voo especial. Entretanto, há outra coisa que podemos nós fazer.

- O quê? - perguntou Radley.

- Investigar se o carro de desporto do Strang está no parque de estacionamento do aeroporto.

- Boa ideia, Frank - disse Radley, aprovadoramente. - O teu pai deve ter-te dito que um bom detective verifica todos os pormenores.

Enquanto Jack Wayne ia à torre de controle, os outros dirigiram-se ao parque de estacionamento.

Quando começaram a volta de inspecção, surgiu um homem entre duas filas de carros estacionados. Tinha um pescoço de touro e um corpo muito musculoso, o cabelo um pouco comprido e espesso, e vestia um blusão desportivo de cores berrantes. Ao ver os detectives, virou-se rapidamente e começou a fugir.

Sam Radley quedou-se espantado.

- Aquele era o Duke Makin - murmurou.

- O que foi condenado por vários crimes? - perguntou Joe, que já ouvira o pai mencionar o nome.

- Sim - respondeu Sam. - O que será que ele anda a fazer por aqui?

Os seus instintos detectivescos vieram à superfície e ele avançou a passos largos para investigar. Frank e Joe seguiram-no, ansiosos.

Subitamente, ouviu-se o barulho de um motor, e um carro aproximou-se, saindo da escuridão. Sam e os Hardy tiveram de afastar-se para o lado para o deixar passar!

- É o carro do Strang! - gritou Frank.

Makin ia sentado ao volante e pareceu-lhes vislumbrar uma figura no banco de trás, mas o carro passara por eles depressa de mais para poderem ter a certeza. Depois, acelerou em direcção à estrada.

- Venham! Vamos segui-los! - disse Frank.

Correram os três para o descapotável dos rapazes e arrancaram direitos à saída do parque. Mas Makin levava um grande avanço e já estava fora de vista.

Ainda andaram uns bons quilómetros, mas depois de terem passado vários cruzamentos e curvas, Frank concordou com os outros em abandonar a perseguição, que não valia a pena. Desapontados, regressaram ao aeroporto.

- O que é que acha que o Makin estava a tramar, Sam? - perguntou Frank. - Acha que ele faz parte do bando do Strang e que está metido nos roubos de jóias?

Radley franziu o sobrolho e encolheu os ombros.

- Deve haver alguma ligação entre os dois, uma vez que ele ia no carro do Strang. O problema é que nós nem sabemos ao certo se o Strang está envolvido nos roubos.

- Parece-me que ia alguém atrás, no carro - observou Joe. - Talvez fosse o próprio Strang a tentar passar despercebido.

- É possível - concordou Radley. - Mas o que é que ele estava a fazer no parque de estacionamento do aeroporto a esta hora da noite?

Quando chegaram à pista de aterragem, Jack Way-ne tinha notícias importantes. Um avião charter- que pertencia a um piloto chamado Al Hirff - havia descolado às 9.37 h. da noite. No plano de voo constava como destino Chicago e o aeroplano levava um passageiro chamado Norbert Smith.

- Um dos operadores da torre estava na pista de aterragem nessa altura - continuou Jack - e viu o passageiro entrar a bordo. Pela fotografia, disse que o tipo se parecia muito com o Strang!

- Agora estamos a chegar a algum lado! - exclamou Joe. - Para começar, o Strang não era o tipo que ia escondido no carro.

- Você conhece esse tal Hirff? - perguntou Frank a Jack.

- Já o tenho visto por aqui - respondeu o piloto.

- Ele alugou um espaço no hangar cerca de uma semana antes de eu ter voado com o Sam para a Florida.

- Jack - disse Radley -, dá para ficares por aqui e nos informares quando o avião regressar?

- Claro. Tenho de fazer no escritório. Talvez até possa aproximar-me do Hirff e obter algumas informações para vocês.

- Boa ideia - disse Frank. - Só mais uma coisa, Jack. Fique de olho alerta para um carro de desporto preto estrangeiro com a traseira amolgada. Talvez venha buscar o Strang quando ele voltar.

- Fica descansado! - prometeu o piloto. Radley ia passar a noite no quarto de hóspedes em cada dos Hardy. Enquanto se dirigiam para casa, os rapazes foram discutindo a situação com ele.

- O avião descolou às nove e trinta e sete da noite - raciocinou Joe em voz alta - e o roubo deu-se às dez horas. De certeza absoluta que o Strang não conseguiu chegar a Chicago a tempo!

- Talvez ele tenha planeado tudo desta maneira - prosseguiu Frank - para arranjar um álibi perfeito, no caso de lhe verificarem os movimentos. Podia ter mandado o bando fazer o assalto e aparecer em Chicago imediatamente a seguir para tomar conta das jóias e levar os outros para fora da cidade.

- És capaz de ter acertado em cheio - concordou Radley.

Quando chegaram a casa, a senhora Hardy recebeu-os com a informação de que o marido tinha acabado de contactar via rádio.

- Ele soube do roubo de jóias em Chicago logo depois de você ter saído de Long Island, Sam. Pede que o contacte imediatamente.

Radley e os rapazes apressaram-se a descer à cave e pôr o transmissor a aquecer. Em breve a voz de Fenton Hardy soava ao receptor. Frank e Joe puseram-no rapidamente a par dos últimos acontecimentos.

- Bom trabalho, filhos! - felicitou-os o detective.

- Esta é a primeira pista sólida que vai relacionar o Strang com os roubos de jóias.

- Pai, quer que tentemos localizá-lo para interrogatório, se ele regressar a Bayport? - perguntou Frank, tirando o microfone a Joe.

- Não, a polícia local não tem poderes para o fazer. De qualquer maneira, iam precisar de um mandato de captura de Chicago - respondeu o senhor Hardy. - Além disso, a não ser que o Strang fosse suficientemente parvo para levar as jóias com ele, o que eu acho que não acontece, continuamos sem ter qualquer prova contra ele. Até a arranjarmos, não tem qualquer utilidade abrirmos o jogo.

- E eu, Fenton? - perguntou Sam Radley.

- Vou talvez precisar da tua ajuda para investigar em Chicago. Façamos o seguinte, Sam. Se o Strang aparecer em Bayport amanhã perto das oito horas da manhã, fica por aí e ajuda os rapazes. Se não, vem no voo comercial das oito e meia para Chicago e encontramo-nos no aeroporto de O'Hare.

Radley e os dois irmãos tomaram o pequeno-almoço cedo na manhã seguinte. Pouco depois, os Hardy levaram o assistente do pai ao aeroporto. Como o avião de Hirff ainda não tinha chegado, Radley apanhou o voo das 8.30 h. para Chicago.

Frank e Joe regressaram a casa e foram à procura de Duke Makin no arquivo criminal do pai. Descobriram que Makin já tinha cumprido três penas diferentes e fora posto em liberdade recentemente, depois de ter estado em Sing Sing. Desde essa altura, pelo menos segundo o que o dossier indicava, não fora acusado de mais nada.

Em seguida, Frank telefonou para um agente imobiliário que era amigo do senhor Hardy e foi informado de que a propriedade do velho Perth estava a cargo de um procurador de nome Cyrus Lamkin.

Os rapazes dirigiram-se ao escritório deste. Lamkin estava sentado diante de uma escrivaninha antiga com tampa de correr. Era um homenzinho baixo e gordo, de cabelo branco, com a frente do colete salpicada de partículas de cinza de charuto.

- Vocês são os Hardy, não são? - perguntou ele, levantando-se para os cumprimentar. - Um bom homem, o vosso pai! Em que é que posso ajudar-vos?

Frank perguntou a medo se ele lhes podia revelar em que estado se encontrava a mansão de Perth.

- Mas eu vendi-a há poucos meses - respondeu Lamkin. - Por bom preço, por acaso. Creio que os proprietários ficaram felizes por se verem livres daquele trambolho. São parentes distantes do primeiro dono. Moram no Ohio.

- Quem é que a comprou? - perguntou Joe.

- Foi um homem chamado Aden Darrow. - Frank e Joe olharam um para o outro, espantados, mas Lamkin, sem o notar, continuou: - Trata-se de um indivíduo um pouco mal-humorado, mas é um génio, segundo dizem. Era professor na Western State University.

Mais uma vez, os Hardy entreolharam-se, boquiabertos. Porque seria que um professor universitário se aliaria a um bandido tão conhecido como o Strang?

Lamkin ia falando:

- É engraçado como no mercado imobiliário uma propriedade pode de repente passar a suscitar tanto interesse - concluiu em tom de conversa. - Vejam o exemplo da mansão do Perth. Abandonada durante anos, aparece Darrow inesperadamente e compra-a logo. Agora vêm vocês perguntar por ela, e já é o segundo inquérito em poucos dias.

- Quer dizer que esteve cá mais alguém a fazer perguntas sobre a casa? - interrogou Frank.

- Sim, um dia destes veio cá um possível inquilino. Queria arrendá-la.

- Era alguém da região? - inquiriu Joe.

- Não, de Nova Iorque. - Lamkin fez uma pausa para consultar o seu memorando. - Um senhor chamado Delius Martin.

Na verdade, Frank e Joe iam de surpresa em surpresa: aquele era um dos nomes falsos de Duke Makin!

Depois de mais uns momentos de conversa com o senhor Lamkin, os rapazes agradeceram-lhe e despediram-se.

- O que é que tu achas disto tudo, Frank? - perguntou Joe, quando se dirigiam ao carro.

- Nada. Para mim, o puzzle está a ficar cada vez mais complicado. Um professor universitário arrenda uma casa; um famoso ladrão de jóias vai morar com ele; e agora ainda temos de relacionar Makin com tudo isto!

Os rapazes decidiram verificar o passado de Dar-row, mas, antes disso, dirigiram-se à doca de reparações para se inteirarem dos progressos no Vedeta. O responsável prometeu que o barco ficaria pronto dentro de três dias.

Frank e Joe localizaram o Nápoles parado ali perto.

Foram alegremente saudados por Tony Prito que sugeriu que fossem os três dar um mergulho.

- Que tal? - disse Joe, voltando-se para o irmão. - Temos os calções de banho no carro.

- Por mim, acho uma óptima ideia.

Tony conduziu o barco para o largo, não muito longe, e ancoraram num local agradável, perto de uma pequena enseada abrigada. Uma lancha com cabina largou também a âncora próximo deles.

Frank e Tony deram um mergulho e umas braçadas rápidas e subiram em seguida para bordo do Nápoles, pois queriam apanhar banhos de sol. Joe preferiu continuar a nadar sozinho.

Ágil como uma foca, Joe mergulhou bem fundo, gozando a sensação refrescante da água límpida. Depois, dobrando-se sobre si próprio, começou a nadar para a superfície.

De súbito, sentiu que alguém o agarrara por baixo e quase imediatamente um braço possante passou-lhe à volta do pescoço e arrastou-o para o fundo.

 

Joe tentou lutar desesperadamente. Já tinha expelido a maior parte do ar que trazia nos pulmões antes de ter sido atacado. Agora estava preso debaixo de água, sem qualquer hipótese de gritar por socorro.

O rapaz desatou aos murros e pontapés, mas não conseguia libertar-se do braço de ferro que lhe rodeava o pescoço. O único resultado que obteve foi uma maior pressão contra a maçã de Adão e uma insuportável guinada nas costelas. Quando tentou virar-se de frente para o atacante, este rolou com ele.

Sentia os pulmões quase a rebentar. Se ao menos conseguisse chegar à superfície...

A bordo do Nápoles, Frank começou a ficar preocupado.

- O que é que Joe estará a fazer? - murmurou.

- Talvez tenha encontrado uma sereia - gracejou Tony, preguiçosamente.

Ao observar mais atentamente a água, Frank reparou em pequenas bolhas de ar que vinham à superfície a uns metros dali.

Sem mais demoras, Frank lançou-se à água e mergulhou, direito ao ponto onde notara as bolhas. Nadou debaixo de água, rompendo o azul transparente do mar, até que o coração quase lhe parou. Acabava de ver Joe, que se debatia, impotente, contra um homem-rã de óculos de mergulhador.

Mal detectou Frank a avançar na direcção deles, o homem-rã libertou a vítima e fugiu para a superfície.

"Deus do céu! Espero não ter chegado demasiado tarde!" - pensou Frank ansiosamente.

Joe, inerte, já não reagiu. Frank agarrou-o por debaixo dos braços e arrastou-o até à superfície.

- Tony! Vem dar-nos uma ajuda! - gritou Frank assim que pôs a cabeça fora da água.

Tony, que estivera à espera de um sinal qualquer dos Hardy, logo que ouviu chamar, fez o Nápoles deslizar até junto deles. Em poucos minutos, Joe já se encontrava dentro do barco.

- Vamos já para terra! Depressa! - exclamou Frank.

Acomodando o irmão no fundo do barco, começou de imediato a fazer-lhe respiração boca a boca.

O Nápoles rumou velozmente ao porto. Os balanços do barco tornavam duplamente difíceis os esforços de Frank. Tony desligou o motor e gritou por socorro, ao entrar com o barco na doca. Quatro homens ajudaram a içar Joe para fora do Nápoles e deitaram-no no chão. Frank recomeçou a fazer-lhe respiração boca a boca.

- Já chamei uma ambulância! - gritou alguém. Mas Joe deu sinais de voltar a si. Frank murmurou uma acção de graças.

- Céus! Escapaste à tangente! - disse Tony, ajoelhando-se ao lado do amigo.

- A quem o dizes! - Joe sorriu, ainda fraco. - Acho que devo ter engolido quase metade da água da baía.

No momento em que a ambulância chegou, Joe já se pusera de pé. Permitiu que o médico o examinasse, mas recusou-se a deixar-se levar para o hospital.

- Não insistam. Eu já estou bem! - teimou.

- Bom, eu não posso obrigá-lo - respondeu o médico, que se voltou para Frank e disse: - Pelo menos, leve-o para casa e meta-o na cama por algum tempo.

Quando já estavam sentados no carro, depois de a ambulância ter partido, Joe protestou.

- Ouçam lá, eu não tenho sono! Porque é que sou obrigado a ir para a cama? Assim, tenho que contar à mãe tudo o que aconteceu. Pensem só no barulho que a tia Gertrude vai fazer!

- Está bem, se tens a certeza de que já te sentes refeito.

Quando iam de volta para a doca, Joe lembrou:

- O homem-rã que me atacou devia ter vindo do outro barco que estava ancorado na enseada.

- Julgo que esse barco se foi embora antes de o Frank e eu nos estendermos a tomar banhos de sol - objectou Tony.

- Mas o Joe é capaz de ter razão na mesma - disse Frank. - Podia ter partido e combinado recolher o homem-rã noutro lado qualquer. De certeza absoluta que o atacante não se encontrava escondido na praia à espera de que nós aparecêssemos. Nem nós próprios sabíamos que íamos nadar para ali.

- Acho que tens razão - concordou Tony, franzindo o sobrolho, pensativo. -Deve ter sido azar. Os tipos localizaram-nos por acaso e decidiram que era a altura ideal para pôr fora de jogo pelo menos um dos irmãos Hardy.

Os rapazes meteram-se no Nápoles e deram uma rápida volta de investigação até à enseada. O iate tinha desaparecido do mapa. Nem Tony nem nenhum dos dois irmãos tinha observado a outra embarcação com a atenção suficiente para identificá-la e Frank também mal tinha visto o homem-rã, de modo que não possuíam quaisquer elementos para dar às autoridades.

Os três rapazes vestiram-se a bordo do Nápoles enquanto se dirigiam de novo à doca. Aí, Frank e Joe despediram-se de Tony e seguiram para casa. O calhambeque vermelho-vivo de Chet estava estacionado em frente da porta e uma rapariga esperava, sentada ao lado da entrada.

- É a Iola! - exclamou Joe quando se aproximaram.

Ela correu ao encontro dos rapazes, enquanto eles saíam do carro.

- Oh, até que enfim! - bradou, entusiasmada. - Estava com medo que vocês não chegassem a tempo!

- Aconteceu alguma coisa? - perguntou Frank.

- Acho que encontrámos o homem que roubou a nossa ametista. Pelo menos, pensamos que sabemos onde ele está!

- Onde? - interrogou Joe, interessado.

Iola explicou-lhes que ela, Callie e Chet tinham ido novamente procurar pedras naquela manhã, nos arrabaldes de Bayport. Enquanto andavam a tentar encontrar o local onde as raparigas haviam descoberto a ametista, repararam num homem que os seguia à distância.

- E parecia-se com o tipo que vos fez perguntas na joalharia? - quis saber Frank.

- Estava demasiado longe de nós e escondia-se atrás das árvores cada vez que olhávamos na direcção dele - disse Iola -, por isso, não temos a certeza se era o mesmo.

- Onde é que estão o Chet e a Callie? - perguntou Joe.

- Ficaram lá, a almoçar como se nada fosse. Mas o Chet disse-me que viesse tentar apanhar-vos.

- Está bem. Mete-te no calhambeque e mostra-nos o caminho - disse Frank. - Nós seguimos-te.

Iola dirigiu-se às colinas a oeste de Bayport. Frank e Joe seguiam-na de perto no descapotável. Por fim, o calhambeque parou à beira da estrada. Os Hardy estacionaram ao lado da rapariga.

- Vamos ter de andar um bocado - avisou Iola.

Depois de caminharem cerca de cinco minutos, chegaram ao cimo de uma colina que dava para um desfiladeiro estreito. Iola explicou-lhes que Chet e Callie estavam à espera deles do outro lado.

- E o homem que tem andado a seguir-nos deve estar algures ali em baixo, entre aquelas rochas e arbustos. Pelo menos, era onde se encontrava quando fui ter com vocês.

- Um cenário perfeito - regozijou-se Joe. - Frank, e se entrássemos os dois no desfiladeiro por este lado e tentássemos apanhá-lo de surpresa? Ele só teria duas hipóteses: ou subir a ravina para chegar à estrada ou ir em frente e passar pelo Chet, ao sair do outro lado.

Frank concordou com o plano e os rapazes abriram caminho pela encosta abaixo, até atingirem o fundo do desfiladeiro. Iola seguiu pelo topo da colina, para ir ter com Chet e Callie.

Os dois irmãos separaram-se, procurando o homem entre os arbustos e as enormes moles de pedra que pareciam ter desabado outrora para o colo do desfiladeiro. Vinte minutos depois, chegaram à saída da garganta, com uma expressão muito desiludida nos rostos. Chet e as raparigas correram ao encontro deles.

- Encontraram-no? - perguntou Chet. Frank abanou a cabeça.

- Não, mas há alguns indícios de que esteve aqui.

- Localizámos um rasto de ramos partidos onde alguém escalou a encosta para sair do desfiladeiro - acrescentou Joe.

Na cara de lua cheia de Chet estampou-se o desapontamento.

- Cos diabos! E eu que tinha a certeza de que íamos apanhá-lo!

- Aposto que ele desconfiou que a Iola ia buscar reforços - disse Callie - e por isso decidiu não ficar por aqui.

Os Hardy dirigiram-se a casa no seu descapotável, ansiosos por começar a investigação sobre Aden Dar-row. A mãe informou-os de que Jack Wayne telefonara do aeroporto. Foi a vez de Frank ligar para o piloto.

- O Strang aterrou aqui há cerca de uma hora - comunicou Jack. - Ainda tentei encontrar-vos, mas não consegui.

- Vinha mais alguém com ele? - perguntou Frank.

- Só o piloto, o Al Hirff. O tal carro preto de desporto não apareceu, mas vi chegar outro de onde saiu um tipo com ar carrancudo que foi ter com eles. Depois, partiu com o Strang.

- E o Hirff?

- Ainda está aqui no aeroporto. Tentei meter conversa com ele, mas não tive sorte nenhuma.

- Bom trabalho, Jack - disse Frank. - Continue a tentar, por favor.

Frank pôs o irmão a par das últimas notícias. Os dois rapazes comeram um almoço rápido de sanduíches e tarte de limão. Quando se preparavam para fazer uma chamada interurbana para a Western State University, o telefone tocou e Joe foi atender.

- Fala o Filmer da joalharia - disse a voz do outro lado da linha.

- Ah, sim, o senhor Filmer. Aconteceu alguma coisa?

- Bom, apareceu um homem aqui na loja há uns minutos com três pedras preciosas para eu avaliar. Não sei qual é o mistério em que vocês estão a trabalhar, mas achei que eram capazes de estar interessados nisto: as pedras eram todas ametistas!

 

A pulsação de Joe aumentou quando o rapaz ouviu uma informação tão empolgante.

- Vamos já para aí falar consigo, senhor Filmer! - exclamou.

Desligando o telefone, contou de imediato a Frank o que o joalheiro lhe havia dito.

- Talvez estejamos no caminho certo - concordou Frank.

A tia Gertrude, que estava toda entregue a limpar a forma da tarte, fez uma pausa ao ver que os sobrinhos se preparavam para sair desalvorados pela porta da cozinha.

- Santo Deus! Onde é que vocês vão agora? - resmungou. - Não vêem que até podem dar cabo da digestão?

- Dos seus cozinhados? Ora, tia! - retrucou Joe na brincadeira, precipitando-se para fora antes que ela lhe pudesse responder.

Os rapazes entraram no descapotável e dirigiram-se à joalharia na Avenida da Baía. Se bem que o homem parecesse mais uma vez um pouco nervoso e obviamente não tivesse nenhuma vontade de se ver envolvido num caso criminal, estava desejoso de poder ajudá-los.

- Quanto ao homem que trouxe aqui as pedras, o senhor já o tinha visto antes? - inquiriu Fránk.

- Não, e ele não quis dizer o nome - respondeu o dono da loja. - As ametistas estavam ainda em estado bruto... e eram bastante grandes.

- E verdadeiras?

- Ah, sim, sem dúvida.

- Perguntou-lhe onde as tinha encontrado? - inquiriu Frank.

- Bem, eu tentei descobrir de onde é que elas provinham, mas ele foi muito evasivo. E não quis deixar as ametistas para serem cortadas e polidas, embora eu lhe tenha oferecido os meus préstimos por um preço razoável.

- É capaz de descrever o aspecto dele? - perguntou Frank.

- Oh, um homem alto com voz rouca. - A maçã-de-adão do dono da joalharia andava para cima e para baixo, como se o simples facto de pensar no outro indivíduo o fizesse sentir pouco à vontade. - Estava vestido de uma maneira bastante desportiva e usava um blusão axadrezado. O cabelo ondulado e um pouco comprido.

Frank olhou boquiaberto para Joe. A descrição coincidia com uma personagem já conhecida deles.

- Parece ser o Duke Makin - murmurou Joe, que tentou obter uma pista melhor e perguntou ao senhor Filmer: - Viu por acaso que tipo de carro é que ele tinha?

- Acho que não veio de carro - respondeu o joalheiro -, se bem que podia alguém tê-lo deixado aqui à porta... Mas fiquei a observá-lo quando saiu daqui e vi-o apanhar um táxi do outro lado da rua.

- Há quanto tempo foi isso? - perguntou Frank.

- Humm... há cerca de meia hora.

- Obrigado, senhor Filmer! Deu-nos uma grande ajuda!

- Não têm de quê, rapazes.

Frank e o irmão apressaram-se a atravessar a rua. Dentro de um táxi estava um motorista refastelado no assento da frente a ler o jornal. Os rapazes descreveram-lhe Makin e perguntaram se tinha reparado que colega o tinha levado.

- Acho que foi o Mike. Deve estar quase a chegar, se não tiver arranjado outro cliente.

Os Hardy foram sentar-se no carro, decididos a esperar um pouco. Quando já haviam passado vinte longos minutos de impaciência, chegou um carro à praça. O primeiro motorista olhou para os rapazes, assobiou-lhes com dois dedos na boca e apontou na direcção do outro veículo. Frank e Joe passaram para o outro lado da rua e foram interrogar o homem que tinha acabado de chegar.

- Sem dúvida que conheço a pessoa que vocês procuram - disse-lhes. - Levei-o a um parque de piqueniques qualquer, na marginal.

- A um parque de piqueniques?

- Sim, realmente parecia um sítio curioso para um homem como ele - replicou o motorista. - Pensei que talvez fosse encontrar-se lá com alguém.

A pedido de Frank, o homem descreveu o local, esboçando um mapa tosco num pedaço de papel. Frank deu-lhe uma gorgeta e dirigiu-se com o irmão para o descapotável.

- Vamos lá dar uma olhadela ao local agora mesmo - propôs Joe. - Pode ser que encontremos uma pista qualquer.

- Boa ideia!

Frank ia ao volante e conduziu o carro a toda a velocidade para a estrada marginal.

Em poucos minutos, chegaram ao local que o motorista lhes descrevera. Tratava-se com efeito de uma pequena clareira para piqueniques. Viram apenas uma família sentada a uma das mesas. De resto, o parque estava deserto.

Os Hardy saíram do carro para dar uma volta. Para trás da clareira, seguia-se uma área arborizada cujo chão estava coberto de pedaços de madeira e que se prolongava num declive íngreme até ao mar.

- Sempre gostava de saber o que é que o Makin andava aqui a fazer - resmungou Joe.

- Devia ter um motivo qualquer - afirmou Frank. - Temos de descobrir qual.

Os dois rapazes foram circundando o parque de piqueniques, espreitando por entre as árvores e os arbustos. Subitamente, Joe apontou para a água e exclamou:

- Frank, olha!

Lá em baixo e a cerca de 30 metros do sítio onde se encontravam, a margem tinha uma reentrância quase completamente coberta de juncos. Aí, vislumbrava-se, meio escondida, uma lancha com cabina.

- Oh... oh!... Aposto que encontrámos a resposta!

- cantarolou Frank. - Talvez seja o mesmo barco de onde veio o homem-rã!

Os Hardy contornaram um morro e voltaram ao topo do declive que ia até à água, num ponto que ficava mesmo acima da pequena enseada. Mas nem mesmo dali a embarcação ficava bem visível, pois o casco estava escondido por pesados molhos de juncos e canas e havia muitos arbustos com folhagem densa no terreno que descia até ao mar.

- Encontraram mesmo o lugar ideal para se esconderem - murmurou Joe. - Vamos aproximar-nos mais.

Começaram a descer a ladeira a íngreme, mas, à medida que as árvores e os arbustos iam rareando, eles sentiam-se demasiado visíveis. De facto, quando já estavam relativamente perto da lancha, viram um homem sair de repente da cabina e levantar um braço.

- Cuidado! Ele pode estar a atirar uma granada! - gritou Frank.

Os rapazes deitaram-se no chão, entre os arbustos, e quase no mesmo instante ouviram um objecto a rasgar o ar na direcção deles. Bzzz!... Bam!

- É uma granada de gás lacrimogénio! - gritou Joe para o irmão.

Os dois rapazes puseram-se de pé num instante e apressaram-se a subir a encosta, enquanto ouviam o ruído de um motor posto a funcionar. Em segundos, a zona ficou coberta de uma densa nuvem de fumo vermelho!

Sufocados e respirando com dificuldade, com os olhos a arder e a lacrimejar, Frank e Joe atingiram por fim o cimo e correram na direcção da área dos piqueniques. A família que ali estava a comer olhou, estupefacta, para os rapazes.

- O que é que aconteceu? - gritou o homem.

- Um malandro qualquer, num barco ali em baixo, atirou-nos com uma granada de gás lacrimogénio - disse Frank.

- Mas isso é incrível! Deviam chamar a polícia - exclamou a mulher.

- É o que vamos fazer - prometeu Frank. Felizmente, soprava uma brisa de terra, que afastou o fumo da clareira, empurrando-o para a baía.

Os Hardy regressaram rapidamente ao carro e puseram o aparelho de rádio a aquecer. Frank contactou o posto da Guarda Costeira e o oficial de serviço prometeu que iria enviar uma patrulha para procurar a lancha. De qualquer maneira, não havia muita esperança de encontrar o barco porque os rapazes não tinham reparado em quaisquer características especiais, nem mesmo no nome do barco. Frank e Joe regressaram a casa desapontados.

- Achas que o Makin estava a bordo da lancha? - perguntou Joe.

Frank encolheu os ombros e esticou o lábio inferior, em expressão de dúvida.

- Não sei. Aquela enseada parecia quase um pântano. Não era de maneira nenhuma de acesso fácil para quem quisesse entrar ou sair do barco. Mas o fumo vermelho era do mesmo género do que nos lançou o carro na outra noite. Isso já relaciona a lancha com o Strang.

Joe olhou para o irmão.

- A propósito, porque é que perguntaste ao Fil-mer se aquelas ametistas eram verdadeiras?

- O Makin é um belo vígaro, que já se meteu numas poucas, lembras-te! Por isso ocorreu-me que talvez planeasse utilizar as pedras para outro golpe.

Assim que os rapazes chegaram a casa, Frank telefonou para a Western State University. Explicou que queria obter algumas informações sobre um antigo professor chamado Aden Darrow.

- Vou ligar ao reitor, o professor Gibbs - respondeu o telefonista.

Frank explicou a Gibbs quem era e o que pretendia.

- Ah, sim, já ouvi falar várias vezes do seu pai. Em que posso ajudá-lo?

Frank adiantou-lhe apenas que o nome de Darrow tinha surgido no meio de uma investigação que estavam a fazer. Perguntou ao reitor se podia dar algumas informações sobre o passado do ex-professor daquele estabelecimento.

- Até ao último trimestre, o professor Darrow dava, aqui na universidade, um curso especial de detecção de crime - retorquiu Gibbs. - Ele é de física e química orgânica. Antes de ter começado a leccionar aqui, trabalhou em laboratórios da polícia em várias cidades.

- E porque é que ele saiu da universidade?

- Bom, ele pretendia obter ajuda financeira para um projecto que afirmava que seria de grande valor para a polícia.

- Que género de projecto? - quis saber Frank.

- Para falar verdade, sabemos muito pouco acerca disso. O professor Darrow ultimamente tinha-se tornado misterioso e desconfiado. De facto, pensámos até que estava à beira de um esgotamento nervoso. Depois de o conselho científico lhe recusar qualquer tipo de subsídio para o seu projecto, Darrow ficou muito desanimado e pediu a demissão.

- Estou a ver. - Frank ficou pensativo por um momento, e depois acrescentou: - Disseram-nos que ele comprou recentemente uma casa aqui em Bay-port. Por acaso, ele não o informou de quais eram os seus planos ao deixar a universidade?

- Não, nem uma palavra sobre isso. De facto, não fazíamos qualquer ideia do seu paradeiro antes de você nos contactar.

Frank tinha acabado de desligar o telefone, quando se sentiu um avião passar quase a rasar a casa. Os rapazes ouviram o aparelho andar às voltas por cima da moradia.

- Talvez seja o Jack Wayne! - exclamou Joe, correndo para a janela para observar melhor. - É o Skyhappy Sal, não há dúvida. Se calhar, o Jack quer falar connosco!

Os Hardy desceram imediatamente à cave e ligaram o aparelho de rádio. Joe pegou no microfone.

- Hardy a Sal!... Está a ouvir-nos? A voz do piloto soou no auscultador:

- Alto e bom som, Joe. Ouçam, acho que arranquei uma pista "quente" ao Hirff. Pode estar relacionada com os roubos de jóias que o vosso pai...

A voz do piloto sumiu-se por causa de uma súbita interferência. Quando ouviram de novo, estava tão baixa que só perceberam algumas palavras:

- São grados tubarões.....ametista...

Nisto outra interferência ainda mais forte cortou a voz de Jack e, logo a seguir, perderam o contacto.

 

Joe sintonizou ansiosamente o aparelho, tentando restabelecer o contacto.

- Hardy a Sal, responda, por favor... Hardy chamando Sal!

Não obtinham qualquer resposta. Os dois rapazes olharam um para o outro, confusos.

- O que é que achas que correu mal com a transmissão, Joe? - perguntou-lhe o irmão.

- Sei lá! Estou preocupado é se o Jack está bem ou não!

Os rapazes correram pela escada acima e saíram para a rua. Franzindo os olhos por causa da claridade, observaram o céu. O avião de Jack já não era mais que um ponto no azul, e desapareceu rapidamente de vista. Dirigia-se para sul.

- Pelo menos, ainda está lá em cima! - arquejou Frank, com um suspiro de alívio.

Joe acrescentou:

- Esperemos que chegue bem, seja qual for o seu destino.

Os dois irmãos reentraram em casa. Durante alguns minutos, tentaram restabelecer o contacto via rádio com o Skyhappy Sal, mas os seus esforços foram em vão. Por fim, voltaram para a sala e sentaram-se comodamente.

- Gostava mesmo de saber o que é que o Jack estava a tentar comunicar - disse Frank, pensativo e preocupado.

- Também eu. Aquela mensagem era muito estranha!

Joe franziu o sobrolho, tentando encontrar um significado qualquer para as palavras que percebera.

- São grados tubarões?!... A que podia estar ele a referir-se?

- Não me perguntes. Para mim aquilo era grego. - Frank franziu o sobrolho, concentrando-se. - Já me lembrei de que ele talvez falasse de tubarões por oposição a peixe miúdo, como se costuma dizer em relação a redes de malfeitores. Nesse caso ele tem informações que conduzem aos cabecilhas...

Joe abanou a cabeça.

- Não estou a ver o Jack a chamar-lhes "grados tubarões". O que me faz cismar é a rota dele. Ia para sul. Se ao menos soubéssemos para onde!...

- E tubarões mesmo. Vês alguma ligação? Nisto, Frank imobilizou-se, deu um estalinho com os dedos e saltou da cadeira num impulso.

- Espera! Devemos estar a ficar bloqueados com o calor. Podemos descobrir para onde é que o Jack ia se perguntarmos à torre de controle do aeroporto!

O rapaz correu para o telefone que estava na entrada e marcou um número. Falou por alguns instantes e depois desligou, regressando à sala de estar, com uma expressão carregada no rosto.

- O controlador da torre disse que o Jack não preencheu o plano de voo, o que provavelmente significa que ele não ia sair desta área.

- Então, talvez nos dê notícias dentro de pouco tempo.

- Esperemos que sim!

Nesse exacto momento, um carro estacionou em frente da casa, com um estridente ranger de pneus e um grande estardalhaço do motor.

- Não me digam... Deixem-me adivinhar: é o Chet Morton - gozou Frank.

Joe sorriu e deitou uma olhadela pela janela ao calhambeque vermelho de Chet.

- Quem mais poderia ser?

Foi abrir a porta da frente e o amigo entrou muito depressa.

- Olá, Hércules! Como é que te saíste no rasto da ametista? - perguntou Joe.

- Não me saí nada bem.

Chet continuou em direcção à sala de estar e sentou-se num sofá antes de se explicar.

- As duas raparigas ainda não conseguiram lembrar-se de onde é que encontraram as pedras... e também não apanhámos mais nenhuma.

- Azar! - disse Frank num tom simpático.

Os Hardys puseram Chet ao corrente das últimas novidades, incluindo a mensagem via rádio de Jack Wayne.

- Tubarões? - Os olhos de Chet abriram-se desmesuradamente. - Espero que vocês dois não estejam a pensar ir ao encontro de nenhum desses bichos durante esta investigação. - Fez uma pausa para aspirar o aroma que vinha da cozinha. - Mmm! Será que me cheira a frango?

- Frango frito. - A senhora Hardy estava encostada à ombreira da porta e sorriu ao olhar para os rapazes. - E temos mel para acompanhar os biscoitos quentes da tia Gertrude. Gostavas de jantar connosco, Chet?

- Se gostava?! Céus, adorava! Mas é melhor telefonar à minha mãe para a avisar.

Acabado o jantar, uma hora depois, a campainha da porta tocou. Frank foi ver quem era.

- Um telegrama para Frank e Joe Hardy - anunciou o mensageiro.

Frank assinou o recibo e abriu o envelope amarelo enquanto regressava à sala.

- Ei! É do reitor Gibbs, da Western State Univer-sity! - Leu o texto em voz alta: - "Irmã professor Darrow ansiosa por encontrá-lo. Se possível, por favor contactem-no. Peçam-lhe para telefonar."

- Uau! Que bela oportunidade! - exclamou Joe. Chet parecia confuso.

- Porque dizes isso?

- Isto dá-nos uma desculpa perfeita para irmos já à mansão do Perth e tentarmos descobrir o que se passa por lá! - explicou Frank. - Também queres vir?

- Bem, não sei. - Chet virou-se desconfortavel-mente na cadeira. - Talvez seja melhor não contarem comigo.

- Não sejas medricas! Está decidido: vais connosco! - disse Joe, dando-lhe uma palmada amigável nas costas.

Frank acrescentou:

- Acabo de me lembrar de uma coisa. Se o professor Darrow deu aulas de métodos de detecção criminal, talvez encontremos alguns artigos da autoria dele nos jornais do pai. Isso já nos dava uma base para conversar com ele. E até pode ser que nos forneça uma pista para perceber do que consta o tal projecto muito secreto.

- Boa ideia! - concordou Joe, cheio de entusiasmo.

No escritório do pai, os jovens detectives estudaram o índice anual dos três jornais criminais que o senhor Hardy assinava. Só conseguiram encontrar um artigo escrito por Aden Darrow. Tratava de potência de raios luminosos. Embora o artigo não lhes desse qualquer pista sobre o actual campo de pesquisa de Darrow, incluía uma fotografia do professor, a demonstrar um aparelho de raios ultra-violetas. Usava óculos e era bastante calvo, tendo alguns cabelos brancos.

- Bom, pelo menos já ficamos a saber como ele é fisicamente - observou Joe.

Os rapazes saíram então de casa e meteram-se no carro. No horizonte, estendia-se o brilho vermelho do pôr do sol. Passaram a área residencial da cidade e seguiram para os arrabaldes onde a estrada era ladeada de arvoredo.

Em breve encostavam o carro perto do caminho de terra batida que ia dar à velha mansão.

- Tratam vocês do assunto - disse Chet. - Eu fico no carro à vossa espera.

Sorrindo disfarçadamente, Frank e Joe afastaram-se pelo carreiro ascendente que levava a casa. Joe tocou à porta. Passaram-se alguns momentos. Estava quase a tocar pela segunda vez quando a porta se abriu de repente. Um homem alto, de cabelo negro e rosto magro e carrancudo, encarou-os.

Noel Strang!

- Então, o que desejam? - perguntou, observando-os com um olhar frio e duro.

- Temos uma mensagem para o senhor que mora aqui.

- Moro eu aqui - retorquiu Strang. - O que é?

- Queremos falar com o professor Aden Darrow - disse Frank, mostrando o telegrama.

Strang estendeu a mão para pegar no telegrama, mas Frank não lho deixou ao alcance.

- Lamento, mas a mensagem é pessoal. É da parte da irmã dele.

- É uma pena! - rosnou Strang. - O professor Darrow sofreu um esgotamento nervoso por excesso de trabalho e teve de partir para férias. Não faço a menor ideia de como encontrá-lo.

- Ele saiu do país? - perguntou Joe. - Se saiu, talvez nós...

A porta fechou-se estrondosamente na cara dos rapazes!

Frank e Joe olharam um para o outro sem saber o que fazer. Deram meia volta e desceram os degraus do varandim. Nisto, brilhou uma luz no lusco-fusco do entardecer. Provinha de uma das janelas do andar de cima. Joe olhou por cima do ombro e, puxando o irmão pelo braço, exclamou:

- Frank, olha!

Através da cortina da janela, divisaram por alguns segundos um homem que se parecia de mais com o professor Darrow! Um instante depois, ele moveu-se e desapareceu de vista.

- O Strang provavelmente está a observar-nos - murmurou Frank. - Vamos embora!

Já no carro, começaram a planear os passos seguintes.

- Vamos dar uma volta por aí até escurecer e depois regressamos para vigiar aquela janela - sugeriu Joe.

- Está bem - concordou Frank.

Saindo do desvio, os rapazes vaguearam pela estrada até que a escuridão caiu. Então, regressaram e estacionaram o descapotável num sítio seguro, não visível da casa. Levando consigo as lanternas eléctricas, os três rapazes subiram mais uma vez o declive já familiar. Chet não estava muito entusiasmado, apesar de ter acedido a acompanhá-los.

De súbito Frank parou, quando o luar se reflectiu em algo no chão. Cuidadosamente, acendeu a lanterna, cobrindo o vidro com a mão para não se detectar de longe.

Ali estava a superfície quadrada de mosaicos que Chet lhes havia descrito! Era bem visível o desenho do dragão em pequenos mosaicos coloridos.

- Cá está! - murmurou Chet, entusiasmado.

- Como é que não a encontrámos antes? - interrogou-se Joe.

- Se calhar, às vezes está coberta de ramos e folhas e não é por acaso - aventou Frank.

Antes que chegassem a observar o desenho mais de perto, Chet engoliu em seco e apontou para o lado esquerdo. Uma figura branca movia-se lentamente entre as árvores!

- É aquele fantasma de novo! - exclamou Joe. - Desta feita, vamos apanhá-lo!

Chet moveu os lábios para dizer qualquer coisa, mas não saiu som por ele estar tão aterrorizado. Como não queria que o deixassem ficar para trás, avançou a tremer, atrás dos dois irmãos.

Frank e Joe correram em direcção à figura fantasmagórica, determinados a não deixarem que os iludisse uma segunda vez. Mas o fantasma já os vira e afastava-se rapidamente, qual névoa que se esfuma.

A perseguição prolongou-se em círculos e ziguezagues, nos terrenos à volta da mansão. Em breve Chet perdeu todo o medo, à medida que se foi convencendo de que o espectro esvoaçante era de carne e osso. Juntou-se à caçada com entusiasmo, saltando pesadamente tal como ao perseguir um jogador da equipa adversária, que estivesse em posse da bola num desafio de futebol americano, na escola.

Frank ia mais adiantado do que os outros dois na correria pelo meio do arvoredo.

- Joe! Estás a vê-lo? - perguntou a certa altura, para trás. - Acho que fugiu naquela direcção!

Como não obteve qualquer resposta, o rapaz olhou por cima do ombro e deteve-se, de boca aberta de espanto.

Joe tinha desaparecido!

 

Frank girou sobre si próprio e franziu os olhos, perscrutando a escuridão.

- Joe! - chamou quase num sussurro. - Joe, onde é que estás?

Chet correu na direcção de Frank.

- O que é que aconteceu? - perguntou, ansioso.

- Não sei. O Joe vinha só uns metros atrás de mim ainda agora, mas já não o vejo.

Chet olhou em redor, devagar. O fantasma também tinha desaparecido, engolido pelas trevas.

De súbito, chegou-lhes aos ouvidos a voz abafada de Joe:

- Aqui, vocês dois! Mas tenham cuidado onde pisam! Caí dentro de um buraco!

Frank e Chet avançaram na direcção da voz de Joe. Frank levava a lanterna a iluminar o chão à frente deles. Os dois rapazes pararam ao deparar-se-lhes um buraco enorme e quadrado.

- Ei! É aquele quadrado de mosaicos! - exclamou Chet. - Mas está para baixo!

Frank verificou que a superfície de mosaicos se tinha aberto, descendo como a tampa de um alçapão e ficando suspensa por um dos lados, sobre a parede de uma cova quadrada. Os mosaicos coloridos brilhavam sob a luz da lanterna.

- Estou aqui em baixo - chamou Joe. - Aquela misteriosa superfície quadrada funciona como alçapão. Um dos suportes deve ter cedido... ou então alguém a abriu por controle remoto. E não é tudo. Aqui em baixo há um túnel!

Frank fez passar a luz à volta do buraco. Tinha paredes de tijolo e cerca de três metros e meio de profundidade. No lado oposto ao painel de mosaicos, havia uma abertura com tamanho para uma pessoa entrar por ali sem se baixar. Ao lado, pela parede acima, uma escada de metal permitia o acesso ao buraco.

- Uau! - Chet pôs-se de joelhos e espreitou lá para baixo. - Onde é que acham que isto vai dar?

- Aposto que segue daqui um túnel que vai ter à casa - respondeu Joe, iluminando a abertura com a sua própria lanterna.

Frank contou a Chet a ideia da senhora Hardy de que o bocado de chão de mosaicos tivesse sido de uma estufa que existia perto da casa. Joe acrescentou:

- A estufa talvez tenha sido construída para esconder esta extremidade do túnel.

- De qualquer maneira foi uma queda e pêras! - exclamou Frank, de repente. - Magoaste-te, Joe?

- Não! Consegui cair bem. Afinal, sempre serviram tantos trambolhões que demos no judo! Além disso, o chão é bastante macio. Deve ter sido atape-tado para o caso de haver um acidente. Frank olhou com atenção em todas as direcções.

- Parece que mais uma vez perdemos de vista o nosso fantasma.

- Vamos então investigar este túnel - propôs Joe. Chet engoliu em seco, pouco à vontade.

- Como é que sabem o que é que vamos encontrar do outro lado do túnel?

- Não sabemos. É isso que queremos descobrir.

- M-m-mas ainda agora disseste que alguém pode ter aberto isto por controle remoto - disse Chet, a tremer. - Imagina que os patifes vêm aí e nos apanham a meio do túnel! Ou, então, pretendem atrair-nos a uma armadilha!

Joe sorriu e apontou a lanterna para a entrada do túnel.

- Está ali uma espécie de telefone pendurado num gancho. Provavelmente, é um intercomunicador para a casa. Queres que eu ligue e pergunte se eles têm alguns planos?

Frank ficara sério.

- Acho que o Chet tem razão, Joe. Talvez seja melhor um de nós ficar aqui, fora do túnel, para o caso de haver novidade.

- Está bem. Então atirem vocês dois a moeda ao ar. Eu cá vou entrar por aqui - declarou Joe, entusiasmado.

Frank pegou numa moeda, atirou-a ao ar e colocou-a nas costas da outra mão.

- Quem ganhar, vai com o Joe. O que escolhes, Chet?

- Hmm... Bom... Caras!

Frank apontou a luz para a moeda.

- Caras! Acho que te calhou a ti, Chet, mas não és obrigado a ir. Se queres, ficas aqui e eu...

- Nada feito - protestou Chet corajosamente. - Eu ganhei, por isso vou eu.

Com o ar de um condenado a caminho da cadeira eléctrica, o rapaz desceu pela escada de metal. Joe estava já dentro do túnel.

- Anda! - chamou por cima do ombro. Quando Chet meteu pelo túnel, roçou no auscultador do intercomunicador e fê-lo saltar do gancho. Surgiu uma luz vermelha, decerto um sinal de chamada que correspondia a uma campainha a tocar na outra extremidade do fio! Olharam os dois para o aparelho como se fosse uma serpente venenosa, pronta a atacá-los. Subitamente, ouviu-se uma voz no auscultador.

- Está lá!... Está lá!

Joe agarrou no auscultador, enquanto a voz continuava:

- És tu, Waxie?

Joe respondeu num tom baixo e breve:

- Sim?

- Bom, o que é que queres agora? - inquiriu a voz, irritada. - Para que voltaste?

Joe olhou desesperadamente para Chet. Então, seguindo a primeira inspiração que lhe veio à cabeça, respondeu pelo nariz:

- Ordens.

- Ordens?! O que se passa contigo, Waxie? Estás bom da cabeça? O patrão acabou de dar-te as informações todas sobre o chão que desaparece... - A voz calou-se, como se o homem tivesse ficado desconfiado.

- Espera lá! O que é isto? Quem é que fala?

Joe largou o auscultador e deu um grande empurrão a Chet.

- Anda! Vamos embora! - segredou, alarmado.

- Não tarda estamos metidos em maus lençóis!

Os rapazes subiram a escada à pressa e contaram a Frank o que tinha acontecido. Correram os três para o carro. Em poucos segundos, Frank ligou a ignição e acelerou em direcção à estrada.

- Que azar - resmungou Joe, quando já iam longe.

- A culpa foi toda minha - admitiu Chet. - Estraguei-vos os planos. Mas podem estar certos que aprendi uma coisa! Não me meto mais em nenhuma das vossas loucas investigações. Por isso, da próxima vez, não contem comigo!

Os Hardy deram uma gargalhada e Joe pediu desculpa pela sua observação. Persuasivos, os dois jovens detectives conseguiram fazer com que Chet mudasse de ideias, revelando-lhe que não podiam passar sem a sua ajuda.

O relógio por cima da lareira estava quase a dar as nove horas, quando Frank e Joe chegaram a casa. Um recado deixado em cima da mesa de jantar explicava que a mãe e a tia tinham ido visitar uns vizinhos ali perto.

Os rapazes pegaram em maçãs e leite que estavam no frigorífico e Frank foi buscar dois copos. Em seguida sentaram-se à mesa da cozinha para fazer um apanhado da investigação.

- Achas que devíamos avisar a polícia? - perguntou Joe.

- Sobre o Darrow? - Frank encolheu os ombros, duvidoso. - Não sei. Não temos bem a certeza se foi ele quem nós vimos. Além disso, pode ter pedido ao Strang que não deixasse entrar nenhuma visita. Não te esqueças de que o reitor Gibbs nos disse que ele se tinha tornado uma pessoa muito mal-humorada.

Joe acenou com a cabeça.

- Quem me dera que o pai ou o Sam Radley aqui estivessem para nos aconselharem o que fazer.

Uns momentos depois, o aparelho de rádio da cave fez-se ouvir.

- Talvez seja o pai! - exclamou Joe, pousando o copo e atirando o centro da maçã para o balde do lixo.

Os rapazes precipitaram-se para a cave e em breve estavam a ouvir o pai, que falava de Chicago.

- O Sam e eu ainda andamos à procura de pistas por aqui - informou Fenton Hardy. - Parece que os ladrões apagaram bastante bem o rasto. A propósito, foi utilizado o mesmo método dos assaltos anteriores. O vigilante de serviço perdeu os sentidos e não deu por nada do que se passou.

O detective escutou com toda a atenção, quando Frank e Joe o puseram ao corrente dos últimos acontecimentos ali em Bayport. Também ele ficou intrigado com o corte da comunicação via rádio com Jack Wayne. À pergunta dos filhos sobre o que fazer em seguida quanto à velha mansão do Perth, ficou silencioso por um momento e depois interrogou:

- A janela em que vocês pensam ter visto o Dar-row estava tapada ou obstruída de alguma maneira?

- Não. Até estava parcialmente aberta - respondeu Joe.

- Então, se era mesmo o Darrow, parece pouco provável que esteja retido contra a sua vontade. É possível que o Strang ande a tramar alguma às escondidas dentro da mansão. Admitamos que o Darrow não está ao corrente de nada. Mas, por outro lado, ainda não possuímos nenhuma prova de que o Strang esteja envolvido nestes roubos de jóias. Precisamos de uma prova qualquer antes de entrar em acção. Entretanto, tenho outro trabalho para vocês, filhos.

O senhor Hardy explicou que acabara de receber outra denúncia anónima por telefone.

- A pessoa só disse "Vá ao Edifício Haley, Bayport" e desligou logo a seguir. Tenho a impressão de que era outra pista falsa, mas gostava que vocês fossem lá averiguar.

- Vamos já para lá - prometeu Frank.

Uns minutos depois, o descapotável seguia velozmente pelas ruas da cidade. Encostou em frente de um edifício novo de escritórios, na Avenida Central.

O guarda da noite, um homem já idoso, estava sentado à secretária, na entrada do prédio. Quando Frank e Joe entraram, ele deitou uma olhadela ao relógio de parede que marcava já 9.41 h.

- Acho que vêm um pouco tarde de mais, rapazes. O edifício vai fechar daqui a menos de vinte minutos. Queriam falar com alguém em especial?

Quando Frank se identificou, o rosto do guarda iluminou-se.

- Oh, são os filhos do senhor Fenton Hardy, não são? Bom, tenho muito prazer em conhecer-vos!

Frank revelou-lhe porque lá tinham ido e perguntou se acontecera alguma coisa fora do normal.

- Não, a não ser que vieram entregar uma ecomenda de diamantes ao Paul Tiffman no quinto andar, pelas oito e meia. Mas eu já tinha sido informado de que a encomenda viria. Sabem, o Tiffman é comerciante de pedras preciosas. Quando ele cá fica até tarde, como hoje, para receber alguma coisa, avisa-me sempre. Em geral toda a gente sai por volta das seis horas.

Tanto Frank como Joe ficaram alerta ao ouvir mencionar "pedras preciosas". Antes, porém, de chegarem a fazer algum comentário, a campainha do elevador tocou. O guarda levantou-se.

- Com licença, rapazes. Tenho de servir também como ascensorista depois das seis horas. Deve ser o Tiffman que quer ir para casa.

Os Hardy pediram para acompanhá-lo. Quando o guarda abriu a porta do elevador no quinto andar, deparou-se-lhes um homem forte, de bigode preto, que mostrava um ar preocupado.

- O portador ainda não apareceu? - perguntou. O guarda mostrou-se surpreendido.

- Mas... É claro que sim, senhor Tiffman. Chegou por volta das oito e meia. Trouxe-o cá acima e levei-o de novo para baixo, depois de ele lhe ter entregado o embrulho com os diamantes.

Tiffman ficou boquiaberto.

- Você está doido? - explodiu, de repente. - Eu não recebi nenhumas pedras preciosas. Ninguém foi ao meu escritório esta tarde!

 

O guarda olhou fixamente para o comerciante de gemas. Em ambos os rostos começou a espalhar-se uma expressão zangada.

- Senhor Tiffman, não sei que espécie de piada é essa - disse o guarda -, mas eu vi o portador com os meus próprios olhos!

- Pois eu também não sei, Mike, que raio de graça é que você acha que tem - rosnou Tiffman. - Estou a dizer-lhe que não veio nenhum portador ao meu escritório, hoje!

- Não sei que lhe diga! Ele veio até aqui e foi-se embora!

- Acho que seria melhor chamar já a polícia - alvitrou Frank, calmamente.

- Mas quem é você? - inquiriu Tiffman, irritado.

- Nós somos os filhos de Fenton Hardy, um detective particular.

Frank explicou-lhe que houvera denúncia anónima. A atitude de Tiffman mudou radicalmente. O guarda da noite chamou a polícia. Um carro-patrulha chegou ao edifício em poucos momentos e o chefe Collig apareceu uns minutos depois, acompanhado de um detective à paisana.

- Vocês os dois tomem conta da porta - ordenou Collig aos dois agentes do carro-patrulha. - Os outros venham comigo lá acima, ao escritório do senhor Tiffman.

Entraram os cinco para o elevador que os levou ao quinto andar. A porta de Tiffman, de boa madeira com embutidos, tinha uma placa num dos cantos. Ostentava o número 507 em algarismos metálicos e o nome por baixo, Paul Tiffman, Especialista em Pedras Preciosas.

Depois de os Hardy terem informado Collig da denúncia anónima e de os dois homens do edifício terem contado as suas histórias, o chefe da polícia comentou:

- Parece-me que esse portador foi rápido no golpe que deu.

- Quer dizer que ele simplesmente se foi embora sem entregar as pedras?

Quando o chefe Collig acenou afirmativamente, Tiffman franziu o sobrolho e abanou a cabeça.

- Isso não faz sentido. Se ele planeava desaparecer do mapa com os diamantes, para que se dava ao trabalho de vir a Bayport?

- Há alguma possibilidade de ele ter sido surpreendido entre o elevador e o seu escritório? - perguntou Joe. - Poderia um assaltante dominá-lo, arrastar o corpo para fora de vista e depois descer no elevador como se fosse o portador? Coliig voltou-se para Mike.

Que lhe parece a si? Tem a certeza de que o homem que conduziu lá abaixo era o mesmo que trouxe até aqui?

A certeza absoluta - asseverou o guarda secamente. - A não ser que ele fosse muito bom em disfarces. Aquele portador tinha cabelo ruivo, sardas e um sinal na face. E o homem que desceu também.

- Já alguma vez tinha visto este portador? - perguntou o chefe Coliig a Tiffman.

- Nunca o vi mais gordo.

- Quem o mandou cá?

Tiffman referiu uma firma de importadores de diamantes, em Nova Iorque.

Já tinha recebido outras encomendas desta firma?

Mais uma vez, Tiffman abanou a cabeça.

Normalmente, desloco-me eu próprio a Nova Iorque uma vez por mês para escolher as pedras que me interessam - explicou. - Mas acontece que eu queria reunir uma colecção especial para mostrar a um bom cliente de Dorset Hills amanhã. Essa firma de Nova Iorque estava à espera para hoje de um carregamento da África do Sul e por isso prometeu fazer-me chegar uma selecção de gemas ainda esta noite.

Como é que o portador viajaria? - interrogou Coliig.

- De comboio. Pelo menos, disseram-me que ele chegava a Bayport no comboio das oito e um quarto.

Collig pegou no telefone e ligou para a central da polícia de Nova Iorque, pedindo que vigiassem os comboios que ali chegassem. Ligou também para a esquadra de Bayport e mandou que enviassem um alerta geral para todo o estado, com a descrição do tal portador. Por fim, tentou contactar a firma de importadores de diamantes, mas obviamente o escritório estava fechado.

- Bom, fizemos tudo tudo o que podíamos, por agora - observou Collig, pousando o auscultador. - Mas havemos de ter esse portador aqui amanhã de manhã com algumas respostas, ou não me chame eu Ezra Collig!

Frank e Joe voltaram com pressa para casa, pois faziam tenções de contactar o pai pelo rádio e contar-lhe aquele novo mistério. Mas a mãe, que já havia regressado com a tia Gertrude, disse-lhes que não iriam encontrar o pai.

- O pai ligou para cá enquanto vocês estiveram fora - explicou. - Ele e o Sam Radley tiveram de ir com urgência a Gary, em Indiana, no rasto de uma pista nova e provavelmente não estarão de volta a Chicago antes de amanhã à tarde.

Na manhã seguinte, os Hardy continuavam sem ter novas da parte de Jack Wayne, por isso, dirigiram-se ao aeroporto para perguntar por ele. No escritório do Serviço Aéreo Especial, encontraram um jovem piloto, um free-lancer, chamado Tom Lester, que muitas vezes se encarregava de pequenos serviços de voos charter a pedido de Jack.

- Vocês também andam à procura do Jack? - interrogou.

- Andamos, sim - respondeu Frank, que logo lhe contou o mistério da mensagem via rádio, tão estranhamente interrompida.

Tom também não conseguiu encontrar nenhuma explicação.

- Realmente, é muito estranho - concluiu. - O que me preocupa é que o Jack não preencheu nenhum plano de voo. Geralmente, em tais circunstâncias, era de esperar que regressasse ontem à noite.

- Achas que ele pode ter-se despenhado? - perguntou Frank, ansiosamente.

- Sei lá!... É que, se o rádio dele parou de repente, isso explica porque não pediu ajuda. - Tom coçou o queixo, pensativo. - Suponho que não querem contar-me mais nada sobre o caso que estão a investigar, não é?

Sabendo que o jovem piloto era de confiança, os Hardy puseram-no ao corrente de todo o mistério. Os olhos azuis e inteligentes de Tom Lester mostraram um grande interesse logo desde o início.

- Acho que o Jack está a tentar ir o mais longe possível - deduziu Tom. - Provavelmente, até tentou ganhar a confiança do Hirff. Se ele se foi encontrar com alguém do bando talvez ainda não tenha tido oportunidade de vos contactar outra vez.

- De facto, tem lógica - disse Joe.

- Ele não deixou nenhuma mensagem para ti na secretária? - perguntou Frank a Lester.

O piloto abanou a cabeça.

- Não reparei em nada. Mas vamos ver outra vez. Quase em seguida, Frank debruçou-se sobre um bloco que Jack Wayne tinha junto do telefone:

- Vejam isto! - exclamou.

Na folha de cima estavam anotadas umas palavras com a caligrafia de Jack: "Ametista chama Seacat". Tom leu aquilo com o sobrolho franzido.

- Esta palavra "ametista" está relacionada com a mensagem de rádio!

- Conheces esse Al Hirff? - perguntou Frank.

- Já ouvi falar dele e tenho-o visto por aí - respondeu Lester -, mas nunca fomos formalmente apresentados.

- Vamos à procura dele - sugeriu Frank. - Se o metermos numa conversa banal, talvez consigamos arrancar-lhe alguma pista.

O hangar privativo, alugado por Al Hirff para guardar o avião, estava fechado à chave. Os Hardy e Tom Lester deram a volta ao aeroporto, procurando-o noutros hangares e no terminal dos passageiros, mas não conseguiram encontrá-lo. Quando Frank e Joe finalmente se foram embora, Tom prometeu manter os olhos bem abertos e vigiar o piloto.

Ao sair do aeroporto, os rapazes seguiram para a esquadra da polícia, para saber se havia mais novidades sobre o mistério dos diamantes desaparecidos na noite anterior. No caminho, discutiram a enigmática anotação de Jack.

- Aquela palavra "Seacat" parece-me ser o nome de um barco - aventou Joe.

Frank concordou.

- Sabes, até pode ser o nome daquela misteriosa lancha com cabina.

Mal chegaram à esquadra, convidaram-nos logo a entrar no gabinete do chefe Collig. Aí, deparou-se-lhes um homenzinho de cabelo ruivo, sardas e um sinal numa das faces, sentado na cadeira em frente da secretária de Collig.

- Ainda bem que chegaram, rapazes - saudou-os o chefe da polícia. - Este é o Dan O'Bannion, o portador.

Os Hardy ouviram com todo o interesse a história de O'Bannion.

- Tal como já disse ao chefe Collig - disse ele -, levei aquele embrulho de pedras preciosas ao escritório do senhor Tiffman. Depois de lhas entregar, regressei a Nova Iorque no comboio seguinte.

- Ficou com um recibo? - perguntou Frank.

- Claro que sim! Está em cima da secretária do chefe.

Collig mostrou-lhes o papel. Estava assinado "Paul Tiffman".

- Telefonei para o Tiffman e pedi-lhe que viesse cá - acrescentou Collig.

Quando o especialista em gemas chegou, O'Bannion ficou petrificado.

- Mas não foi a este senhor que eu entreguei a encomenda - exclamou.

- Eu também nunca o vi a si antes - disse Tiffman, agastado.

- O senhor não estava de certeza no escritório quando eu lá fui - concordou o homem ruivo.

- Eu estive a tarde inteira no meu gabinete e ninguém podia ter tomado o meu lugar!

Tiffman declarou que a assinatura que constava no recibo não era dele e provou-o, mostrando a carta de condução e outros documentos. O’Bannion encolheu os ombros, de lábios cerrados.

Frank sugeriu que voltassem todos ao edifício Haley.

- Se reconstituirmos o que aconteceu ontem à noite, talvez consigamos descobrir mais qualquer coisa.

- Boa ideia, rapaz - exclamou o chefe Collig. Em dez minutos, estavam a subir para o andar do escritório de Tiffman. Ao saírem do elevador, a expressão do portador alterou-se.

- O que se passa? - perguntou-lhe Joe. O’Bannion apontou para uma mossa enorme e indisfarçável no revestimento da parede.

- Tenho a certeza de que aquela mossa não estava ali ontem à noite - disse ele.

- Já aí está há mais de duas semanas -- contrapôs Tiffman. - Uns carregadores descuidados bateram com um móvel na parede quando vieram entregar uma mobília.

No momento que entraram no gabinete de Tiffman, O'Bannion pareceu mais confuso ainda.

- Não foi este o gabinete onde eu entrei! - exclamou. - A disposição da mobília era diferente!

- Talvez esteja a precisar de óculos! - atirou-lhe Collig. - Não olhou para a placa na porta?

- Olhei, sim! - O'Bannion recuou. - O número do escritório era o quinhentos e sete e a placa dizia "Paul Tiffman, Especialista em Pedras Preciosas"!

O rosto do chefe Collig enrubesceu de impaciência.

- Vou mandar vir um perito - bradou, depois de bater violentamente com o punho no tampo da secretária. - Você, o senhor Tiffman e o guarda da noite vão todos fazer testes no detector de mentiras!

- Não tenho nada a esconder! - retorquiu O'Bannion.

Frank e Joe iam bastante confusos ao sair do edifício Haley. Os dois rapazes teriam gostado de dar uma volta de barco, para aclarar as ideias sob o ar fresco e salgado naquele dia soalheiro. Como o Vedeta ainda não tinha sido reparado, concordaram em fazer um passeio de carro ao longo do porto.

O Nápoles estava encostado à doca. Tony retocava pequenos defeitos no casco com verniz, enquanto Chet Morton, que se refastelara num banco, folheava uma revista de desportos. Frank e Joe aproximaram-se sem pressa, dispostos a conversar com eles.

- Têm alguma novidade sobre o vosso caso? - perguntou Tony.

- Imensas - replicou Joe em tom lamentoso. - O problema é como deslindá-las todas.

- Livra! - resmungou Chet. - Agora incluem poesia nesta revista, e é pires que se farta. Oiçam este verso: "O meu coração sangra dos desgostos que me dás..."

De repente, Frank soltou uma exclamação.

- Talvez fosse isso que o Jack Wayne tentou dizer!

 

Joe deitou um olhar confuso ao irmão. Não conseguia ver qual a relação entre o que Chet lera e a mensagem do piloto amigo.

- Estás a delirar, Frank?

- Não. Tu próprio estranhaste que o Jack se referisse a "grados tubarões" porque ele não é pomposo a falar. Pois bem: e se entendemos tudo mal por causa dos ruídos de interferência?

- Já percebi - exclamou Joe. - Achas que ele devia estar a falar de uma coisa completamente diferente!

- Exactamente! De uma angra dos tubarões!

- Quer dizer que afinal o Jack Wayne estava a referir-se a um lugar.

Joe deu um estalinho com os dedos, entusiasmado.

- Claro! A Angra dos Tubarões deve ser o nome do sítio para onde o Jack se dirigia quando o vimos virar para sul!

- Algum de vocês já ouviu este nome antes? - inquiriu Frank.

Chet encolheu os ombros largos.

- Eu não.

Para Joe era inteiramente desconhecido. Mas Tony franziu a testa, pensativo.

- Esse nome não me é estranho. Tenho a impressão de que já o ouvi algures.

- Onde? - perguntaram os dois irmãos ao mesmo tempo.

- Não sei. Se vocês tiverem razão, deve ser algum sítio ao longo da costa. Talvez eu já lá tenha estado no Nápoles. Deixem-me procurar no mapa.

Tony abriu o cacifo do barco e tirou de lá um mapa da área da baía de Barmet. Ele e Chet subiram para o cais e os quatro rapazes abriram o mapa. Mas depois de todos o percorrerem com os olhos de ponta a ponta, concluíram que não constava ali nenhum nome parecido com aquele.

- Outra pista falsa! - suspirou Joe, desapontado.

- Não vamos desistir cedo de mais - protestou Frank. - Talvez não seja suficientemente importante para aparecer no mapa, ou talvez o nome não seja oficial.

- E se perguntássemos ao velho Clams Dagget? - sugeriu Chet.

- É uma ideia - apoiou Joe. - Se há alguém que saiba, há-de ser ele.

Dagget era um antigo marinheiro, já reformado, que dirigia agora um serviço de ferry-boats entre a ilha do Rochedo e a baía de Barmet.

Frank deitou uma olhadela ao relógio de pulso.

- O Clams não virá aqui buscar mais nenhum passageiro antes da uma e meia. Vamos até casa almoçar, Joe. Podemos passar aqui mais tarde e fazer-lhe as perguntas que queremos.

- Está bem. Na verdade estou quase a morrer de fome!

Cada um dos rapazes comeu dois hamburgers e uma quantidade generosa de batatas fritas. Tinham acabado de se servir da famosa tarte de morangos à moda antiga, da tia Gertrude, quando o telefone tocou. Era Tom Lester a ligar do aeroporto.

- O Al Hirff acaba de chegar - disse o piloto a Frank. - Se querem falar com ele, têm agora uma boa oportunidade.

- Onde é que o encontramos?

- Neste momento, está no hangar a testar o avião. Tem um nariz de buldogue e usa patilhas compridas. É impossível confundi-lo.

- Certo. Obrigado, Tom.

Frank desligou o telefone e contou a Joe o que o outro disssera.

- Ainda não é uma hora, por isso dá para irmos já ao aeroporto, antes de procurarmos o Clams Dagget.

- Por mim, acho bem. Olha, e se eu levasse a minha máquina fotográfica nova e tirasse sorrateiramente uma fotografia ao Hirff? Talvez o pai o reconheça.

- Boa ideia.

Joe comprara havia pouco tempo uma máquina em miniatura com dinheiro que tinha poupado. Podia fixar-se na lapela do casaco, por exemplo, para tirar fotografias secretamente. Os dois rapazes vestiram blusões desportivos, para disfarçar melhor a manobra de Joe.

Pouco tempo depois paravam o carro no parque de estacionamento do aeroporto. Foram logo direitos ao hangar de Hirff. A porta estava aberta e, lá dentro, via-se um aparelho bimotor bastante grande. Era um hidroavião. O piloto, contudo, não se encontrava ali.

Os rapazes entraram com certa precaução no hangar e chamaram-no sem alarido. Joe deitou uma olhadela curiosa à cabina do avião, mas a fuselagem era demasiado alta para se ver bem para o interior. Subindo para o avião, reparou num mapa de navegação, dobrado, com marcações a lápis, preso com uma mola acima do assento do piloto.

- Ei, Frank! Estou a ver um mapa da área costeira de Bayport, e tem coisas marcadas a lápis! - ciciou Joe, muito entusiasmado.

Frank avisou-o:

- Cuidado, Joe! Aí vem ele!

Um homem que correspondia à descrição de Tom Lester dirigia-se em passo apressado para o hangar!

Num ápice, Joe desprendeu a pequena máquina da lapela do casaco e tirou uma fotografia ao mapa. Depois, saltou para o chão.

- O que é que vocês dois estão aqui a fazer? - gritou o piloto, entrando quase a correr.

Fingindo a maior calma, Joe tirou uma fotografia a Hirff e, em seguida, guardou a máquina no bolso do blusão. O piloto, lívido de fúria, tentou empurrar Frank e agarrar Joe. Só que o primeiro resistiu-lhe quando menos ele esperava. O jovem detective fê-lo rodar sobre si próprio com um golpe de judo e deu-lhe em seguida um soco no queixo com tanta força que o deitou no chão. Hirff sentou-se e pestanejou, surpreendido.

Frank disfarçou um sorriso.

- Se queria que eu me afastasse do seu caminho, devia pedir com bons modos!

Hirff pôs-se de pé, resmungando.

- Muito bem, seus espertinhos! E se eu chamar a polícia?

- À vontade - retrucou Frank calmamente. - O hangar estava aberto, por isso nós entrámos para o cumprimentar, e não tocámos em nada.

- Quando a polícia chegar, talvez possamos falar da Angra dos Tubarões - acrescentou Joe.

A observação foi como um tiro às cegas. Joe esperava apanhar Hirff de surpresa ou provocar-lhe alguma reacção sintomática. Mas o efeito foi bastante diferente do que Joe pensara obter. Hirff empalideceu e toda a sua fúria pareceu desvanecer-se como que por encanto.

- Eu... eu n-ão sei do que é... que vocês estão a falar - balbuciou. - Lamento ter-me enraivecido. Mas pensei que andassem aqui a bisbilhotar para sabotar o avião ou coisa parecida. Vão-se embora agora! Desapareçam e vamos esquecer isto tudo!

- Claro, se é isso que você quer - e Frank voltou-se para o irmão: - Anda - disse-lhe.

Joe não pôde evitar uma última observação sarcástica:

- Se por acaso mudar de ideias acerca de chamar a polícia - espicaçou - diga-lhes que nos encontram no cais dos ferry-boats.

Os dois irmãos sentiam nitidamente os olhos de Hirff quase a queimar-lhes as costas, ao dirigirem-se ao parque de estacionamento. Quando já se afastavam do aeroporto, Frank comentou:

- Céus! Acertaste em cheio! Mas espero que não tenha sido um erro revelar para onde vamos a seguir.

Joe encolheu os ombros.

- Duvido que o bando vá tentar algum golpe sujo em plena luz do dia. De qualquer modo, se o fizerem, tanto melhor para nós. É uma maneira de os apanharmos em flagrante!

Já na doca, viram alguns passageiros a embarcar no Sandpiper. Mas Clams Dagget estava encostado a um dos postes de amarração, a fumar o seu cachimbo de espiga de milho, aparentemente sem pressa nenhuma de partir. Cumprimentou os Hardy com a cabeça.

- Olá, rapazes! Como é que vão as vossas investigações?

- De vento em popa - retorquiu Frank com um sorriso. - Talvez possa ajudar-nos. Já alguma vez ouviu falar de um sítio chamado Angra dos Tubarões?

- Claro. Fica a sul da baía. Uma vez, perdi lá uma âncora.

Os Hardy ficaram entusiasmados.

- Não conseguimos encontrá-lo no mapa - disse Joe.

- Não admira - replicou Clams, sem tirar o cachimbo da boca. - Esse não é o verdadeiro nome. Há cerca de dez anos, houve uns banhistas que foram atacados por tubarões que apareceram por ali, por isso as pessoas dos arredores começaram a chamar-lhe a Angra dos Tubarões. Quase ninguém lá vai agora. É um sítio praticamente abandonado.

Frank pegou num lápis e num pedaço de papel e pediu a Dagget que desenhasse um mapa, para que ele e Joe dessem com o local. O velho marinheiro teve todo o gosto em ajudá-los.

Os Hardy agradeceram-lhe e regressaram ao carro, que tinham deixado num parque no lado oposto da estrada. Quando iam a passar por um quiosque à entrada do estacionamento, Joe gritou, alarmado.

- Frank, olha!

A porta do descapotável estava aberta e um homem rebuscava o porta-luvas.

Frank e Joe pretenderam atravessar a estrada a correr, mas tiveram de esperar por uma aberta no tráfego. Entretanto, o homem olhou em volta, em guarda, e viu-os. Imediatamente se esgueirou por entre os carros do parque de estacionamento e, no momento em que os Hardy puderam aproximar-se, ele entrou num automóvel que já o esperava e que acelerou com um forte roncar do motor.

- Vamos! - gritou Frank, apressando-se a entrar no descapotável.

Sentou-se ao volante e Joe ao lado. Frank deu a volta, arrancou para a saída do parque e meteu logo pela estrada.

Rodaram cerca de dois quilómetros com o outro carro bem visível. Depois, os Hardy perceberam que ele virava para a direita.

Num abrir e fechar de olhos, o descapotável chegou àquele ponto e Frank guinou na mesma direcção. O carro obedeceu com um guinchar de pneus. Encontraram-se num carreiro tortuoso, com vegetação cerrada de ambos os lados, mas do carro perseguido... nem sombra!

Bam!

O descapotável ficou subitamente desgovernado. Frank pisou o travão e rodou o volante de um lado para o outro, num esforço enorme para segurar o carro. Conseguiu, com sorte, abrandar e parar antes que batessem contra uma árvore.

- Ufa! - deixou escapar Joe, com um suspiro de alívio.

Bastante pálidos e a tremer, os rapazes saíram do carro, para ver os danos.

- Foi o pneu da frente do lado direito que rebentou - anunciou Frank.

- E aqui está o que o provocou - e Joe apontou para um monte de pregos retorcidos, tachas e cacos de vidro espalhados pelo chão à entrada do atalho. - Os malandros devem ter atirado aquelas porcarias do carro prevendo que nós íamos virar para aqui.

Danados de frustração, os Hardy tiraram o macaco do porta-bagagens e prepararam-se para mudar a roda.

De repente, um pequeno objecto voou por cima deles, vindo das árvores, rodopiou pelo ar e foi aterrar perto do descapotável. Começou imediatamente a lançar uma nuvem de fumo vermelho.

Frank ficou tenso de raiva.

- Cuidado, Joe! Estamos a ser atacados!

Três homens com máscaras antigas saltaram dos arbustos e aproximaram-se dos rapazes!

 

Na altura em que a granada rebentou e Frank gritou para avisar o irmão, Joe ocupava-se de tirar o pneu sobresselente do porta-bagagens, de costas para o caminho.

Voltou-se ao ouvir o alerta de Frank, mas os atacantes já estavam quase em cima dele. Tentou ainda levantar a roda e atirá-la contra eles, mas dois dos bandidos agarraram-no.

Frank correu em socorro do irmão, empunhando a chave de porcas que tinha na mão. O terceiro homem agarrou-lhe o braço, torceu-o de modo a obrigá-lo a largar a ferramenta e deu-lhe um soco, que o atirou desamparado para a vala que ladeava o caminho.

Em poucos segundos, o fumo vermelho cobriu toda a área. Os Hardy respiravam com dificuldade e tinham os olhos a lacrimejar do ardor.

Os atacantes de Joe agarraram-no com firmeza e revistaram-no. Um deles arrancou-lhe a máquina fotográfica da lapela do casaco.

Frank teimava em pôr-se de pé, mas todas as tentativas eram frustradas com um soco ou um empurrão que o desequilibravam de novo. Depois, tão depressa como tinham aparecido, os mascarados sumiram-se através do fumo.

Joe recompôs-se, pegou num lenço para tapar o nariz e os olhos e encaminhou-se às cegas para onde devia estar o irmão. Frank, por sua vez, veio ao encontro dele e, agarrando-se um ao outro, fugiram a correr da zona do fumo. Entretanto, ouviram à distância o barulho do motor de um carro a afastar-se.

Conseguiram finalmente atingir o ar puro. Ainda a tossir, os dois rapazes encostaram-se a uma árvore e olharam um para o outro, com os olhos inflamados, a chorar.

- Caramba. Desta vez, caímos que nem uns patinhos, Frank!

- Pois foi. Olha, devíamos regressar ao carro e contactar a polícia pelo rádio.

- Está bem, mas só depois de o fumo desaparecer.

Pouco depois, já podiam aproximar-se do descapotável. Frank ligou o aparelho de ondas curtas e deu à polícia uma descrição do veículo que tinham perseguido.

Entretanto, Joe montava o pneu.

- Desculpa, Frank, o culpado disto tudo fui eu - disse, arrependido. - Não devia ter falado ao Hirff na Angra dos Tubarões.

- Deixa lá. De qualquer forma, não nos teriam apanhado se tivéssemos usado a cabeça.

- Porque dizes isso?

- Aquele tipo que estava a vasculhar o nosso porta-luvas era provavelmente só um engodo - explicou Frank. - Se ele não encontrasse o que procurava, aposto que tinha ordens para deixar que nós o víssemos. Era fácil adivinhar que íamos atrás deles. Por isso, já tinham preparado tudo para o furo, com os pregos e os vidros partidos, além do ataque com o gás lacrimogénio.

Joe abanou a cabeça com desânimo.

- Céus! Agora é que me sinto mesmo um idiota!

- E levaram a tua máquina, não foi?

- Sim. Felizmente, estava no seguro! Mas há uma coisa que eles não levaram.

- O que foi?

- Dá uma olhadela ao porta-luvas.

Frank olhou e mostrou-se em seguida muito espantado.

- O filme! Como é que apareceu aí?

- É muito simples. Tirei-o da máquina enquanto os perseguíamos no carro. - Joe sorriu e foi guardar o pneu furado no porta-bagagens. - Tinha cá um palpite de que podíamos ter sarilhos se fôssemos apanhados por aqueles tipos e o porta-luvas pareceu-me um sítio seguro porque já tinha sido revistado.

- Bem pensado!

Já no regresso a casa, Joe observou:

- O Hirff foi o responsável por aquele ataque.

- Claro. Mas, agora, tenta prová-lo... É mais que certo que ele telefonou aos cúmplices no momento em que saímos do aeroporto e garantiu assim um álibi perfeito.

Logo que chegaram a casa, os rapazes revelaram o filme e fizeram uma ampliação do mapa que estava dentro do avião de Al Hirff. Tal como já esperavam, mostrava a área costeira de Bayport. Um determinado ponto na costa a sul da baía de Barmet estava assinalado com um círculo a lápis.

- É o mesmo local que temos no mapa do Clams Dagget, a Angra dos Tubarões! - exclamou Frank, que franziu o sobrolho em seguida. - Não percebo uma coisa, Joe. Se o Hirff ficou a saber que já tínhamos a informação da Angra dos Tubarões e que acabávamos por lá ir dar, porque estava tão ansioso por recuperar o filme?

- Então não reparaste em tudo, Frank. Olha! Aqui mesmo - e Joe apontou para um "x" que mal se via no mapa.

Indicava um ponto não longe da costa e da enseada que lhes interessava. Frank deu um assobio.

- O que será isso?

- Talvez uma prova suficiente para pôr o bando todo atrás das grades - concluiu Joe. - Esta fotografia iria relacioná-los com o que quer que seja que se encontra aí no xis.

- Uau! - Frank rejubilou. - Tenho a sensação de que finalmente estamos a chegar ao que interessa, Joe!

- Se ao menos soubéssemos o que significa aquela frase do Jack: "Ametista chama Seacat".

- Lembra-me uma chamada de rádio - comentou Frank. - Se é, combina com o que nós achamos que é o "Seacat".

- Por outras palavras, uma comunicação com um barco.

- Isso mesmo. Mas a palavra "ametista" deixa-me baralhado... A não ser que seja o nome de outro barco, ou talvez de um avião que estivesse a chamar.

- É isso, Frank! - Joe deu um estalinho com os dedos, entusiasmado. - Podia ser um nome de código para o avião do Jack ou mesmo para o próprio Jack!

- Exacto. Vamos partir do princípio de que a ideia do Tom Lester estava correcta, que o Jack tentou aproximar-se do Hirff e do bando. E considerar também o teu palpite de que ele estava a voar em direcção à Angra dos Tubarões.

- Está bem. E depois?

- Não estás a ver? Talvez o Jack se dirigisse para lá seguindo as instruções do Hirff. Este disse-lhe que contactasse um barco chamado Seacat por rádio e combinasse encontrar-se com ele na Angra dos Tubarões.

- Tens toda a razão! - exclamou Joe. - Então, se o Jack ia numa missão a mando dos tipos, aquela mensagem rádio não foi sabotada. Deve ter sido interrompida acidentalmente.

- Vou tirar isso a limpo agora mesmo! - disse Frank.

Ligou para a estação de rádio de Bayport e foi informado de que houvera algumas dificuldades de transmissão no dia anterior, aparentemente, devido a manchas solares. - Frank, vamos até à Angra dos Tubarões averiguar o que significa o tal xis - propôs Joe. - Se calhar até localizamos o avião do Jack!

- De acordo - anuiu Frank. - Mas primeiro, vamos telefonar ao pai. Pode ser que já tenha regressado ao hotel.

Os rapazes conseguiram contactar Fenton Hardy.

- Como correram as coisas em Gary, pai? - perguntou Frank.

- Chegámos a um beco sem saída - respondeu o detective. - O carro em fuga foi visto lá. Mas tenho a certeza de que foi só um truque para nos fazer acreditar que os ladrões se tinham ido esconder naquela zona.

Quando o senhor Hardy soube do mistério no edifício Haley e dos diamantes desaparecidos, concluiu que tinha sido manobra dos mesmos ladrões de jóias.

- É melhor o Sam e eu voltarmos já para aí, o mais depressa possível - disse ele a Frank. - Vamos tentar chegar a Bayort ainda esta noite.

O senhor Hardy ouviu com grande interesse tudo o que Frank lhe contou sobre Al Hirff, a anotação no bloco de Jack Wayne, o ataque com a bomba de gás lacrimogénio que os rapazes tinham sofrido e a teoria deles sobre a Angra dos Tubarões.

Depois de desligarem o aparelho, os dois irmãos dirigiram-se de carro ao porto de Bayport. Alugaram um barco a motor e largaram imediatamente. Ao passarem pelo pontão, avistaram o Nápoles com Tony e Chet a bordo.

Os rapazes acenaram uns aos outros e os Hardy aproximaram o barco. Frank contou-lhes onde se dirigia com o irmão.

- Para que é que alugaram um barco? - exclamou Tony. - Eu levo-os lá no Nápoles.

Frank considerou a proposta do amigo durante alguns momentos e depois abanou a cabeça.

- Tenho outro trabalho para vocês.

- É só dizeres.

- Temos um palpite de que o Seacat é o nome do barco com cabina que o bando usa - explicou Frank. - Que tal se vocês procurassem nestas enseadas todas aqui à volta e tentassem encontrar um barco com esse nome?

Tony e Chet concordaram e os Hardy partiram para a sua pesquisa. Saindo da baía, viraram para sul, navegando sempre junto à costa. Levaram cerca de meia hora até avistarem a Angra dos Tubarões.

- Se Angra dos Tubarões é o nome que lhe deram localmente, pergunto-me como foi que o bando a encontrou - murmurou Joe, como se pensasse em voz alta.

- Devem ter ouvido o nome a um barqueiro ou a um pescador da zona - concluiu Frank.

Joe abrandou o motor assim que entraram na enseada, que era arborizada nas margens, com uma faixa de areia que se estendia por cerca de 400 metros, sendo o resto da costa rochoso.

- Frank, aquela praia deve ter servido como uma óptima pista de aterragem para o Skyhappy Sal - fez notar Joe. - E se fôssemos ver se há algum rasto das rodas do avião?

- Boa ideia!

Joe aproximou o barco do areal e ancorou-o. Os rapazes descalçaram os ténis e as meias, saltaram do barco e caminharam por dentro de água, que já só lhes dava pelo meio da perna. Chegados a terra, verificaram que a areia não apresentava quaisquer marcas.

- Podes ter razão na mesma - disse Frank ao irmão. - As marcas podem ter desaparecido com a maré cheia.

Regressando ao barco, os Hardy consultaram a ampliação fotográfica do mapa de Hirff. A marca "x" indicava um local mais para o interior, na direcção da enseada, e junto a um pequeno regato que vinha desaguar não longe da praia. Para além dos gritos das gaivotas que esvoaçavam acima deles e do barulho da rebentação, tudo ali era calma e silêncio.

Frank franziu o sobrolho, preocupado. O ruído do motor do barco devia ouvir-se bem longe.

- Se algum daqueles comparsas anda por aqui, não vamos decerto apanhá-lo de surpresa - observou.

Joe conduziu suavemente o barco até ao ponto onde desaguava o regato. Frank amarrou-o a uma rocha e saltaram os dois para terra. Seguiram ao longo da corrente de água e não tardou que avistassem uma velha cabana de madeira entre as árvores.

- Então era isto que o xis estava a marcar - exclamou Joe.

Avançaram cautelosamente, dispostos a investigar o interior da cabana. De súbito alarmaram-se, ao ouvir o ruído de um motor de avião sobre a enseada. Um momento depois, o aparelho sobrevoou-os, bem visível.

- É o Skyhappy Sall - gritou Frank.

O avião dirigia-se para o mar. Para espanto dos rapazes, inclinou-se sobre uma asa, descreveu um círculo e começou a baixar - mesmo direito a eles! E o piloto desligou o motor. Nesta altura os Hardy viram que era Jack Wayne, acompanhado de outro homem. Aquele acenou freneticamente para os rapazes.

- Não entrem na cabana! - berrou com toda a força.

Depois ligou de novo o motor, tentando manter o avião suficientemente alto - mas o aparelho continuou a perder altitude perigosamente.

- Ele vai cair! - gritou Joe.

Um instante depois, ouviu-se um grande impacto e o barulho de metal amachucado!

 

Receando o pior, Frank e Joe desataram a correr. Assim que conseguiram sair da zona arborizada, viram que o avião tinha caído na praia, a cerca de 200 metros dali. O nariz do avião estava espetado para o ar e uma das asas toda amachucada.

Os Hardy aproximaram-se, ansiosos. Jack encontrava-se ainda dentro da cabina, mas o acompanhante havia sido projectado para fora com a violência do embate e estava já a pôr-se de pé. Cambaleou um pouco e sacudiu a areia que o cobria de cima a baixo. Mal viu os rapazes, o homem pareceu procurar algo no chão.

- É capaz de estar a ver se encontra a arma - avisou Frank. - Temos de o agarrar antes disso!

A suposição de Frank devia estar correcta, pois, quando os Hardy já estavam perto, ele desistiu da busca e desapareceu na vegetação. Joe ia persegui-lo, mas Frank agarrou-lhe o braço e apontou para o Skyhappy Sal. Viam-se chamas irromper da fuselagem!

- Deixa lá o tipo. Ajuda-me a tirar o Jack dali! O lado direito do avião, de onde o homem tinha sido cuspido, estava virado para cima. A porta ficara pendente, toda aberta. Frank trepou até à cabina, desprezando as chamas que aumentavam rapidamente. Jack permanecia meio dobrado atrás dos comandos e sangrava da cabeça.

- Ele arriscou a vida para nos avisar! - observou Frank. - Espero bem que ainda esteja vivo.

Não havia tempo a perder. O jovem detective agarrou o corpo inerte o melhor que pôde e com a ajuda do irmão fez o piloto sair lentamente pela porta da cabina. Os dois rapazes transpiravam abundamente. Finalmente afastaram-se do avião, carregando com dificuldade o corpo do amigo.

A uma distância suficientemente segura do aparelho sinistrado, deitaram Jack na areia e voltaram-se para observar o Skyhappy Sal pela última vez.

- Uma parte da engrenagem eléctrica deve ter entrado em curto-circuito - disse Joe.

- Nunca o saberemos - murmurou Frank. - Quando o fogo atingir o depósito de gasolina...

As suas palavras foram cortadas por uma explosão que fez do avião uma espectacular bola de fogo e uma coluna de fumo negro elevou-se no ar.

- Safa! Conseguimos salvá-lo mesmo a tempo! - arfou Joe, com a voz a tremer.

Os rapazes voltaram então toda a atenção para Jack Wayne. A cara e a camisa do piloto estavam manchadas do sangue que escorria de uma ferida na parte de trás da cabeça. Frank tomou o pulso do piloto e encostou o ouvido ao peito dele, numa tentativa de auscultá-lo.

- Graças a Deus, ainda está vivo! - exclamou o rapaz, muito tenso.

Joe arrancou uma tira da sua própria camisa para fazer uma ligadura. Felizmente, apesar de o cabelo de Jack estar bastante empapado junto da ferida, o sangue parecia já ter estancado.

Frank humedeceu a cara do amigo com um pedaço de pano molhado. Nesse momento, o piloto estremeceu e abriu os olhos. Quando viu Frank e Joe debruçados para ele, esboçou um sorriso de alívio.

- Ainda bem que vocês estão a salvo - murmurou.

- Ainda bem que nós estamos a salvo?! - repetiu Joe, deitando ao irmão um olhar confuso.

- Deve ter que ver com a cabana - retorquiu Frank. - Você estava a tentar avisar-nos, não era, Jack?

O ferido fez um aceno fraco com a cabeça.

- Eu estava ali à espera com o outro tipo... íamos encontrar-nos com o chefe dele. Então, ele... Ele captou uma mensagem pelo rádio a avisar que vocês dois iam aparecer por aqui. Mas davam instruções a alguém para armadilhar aquela cabana... de modo a fazê-la ir pelos ares.

- Espere. Vamos lá ver se nos entendemos – interveio Frank friamente. - Você voou até aqui porque o Hirff lhe ofereceu uma oportunidade de se juntar ao bando?

O piloto assentiu.

- E o seu avião estava escondido na mata para que ninguém o localizasse? - acrescentou Joe.

- Exac... tamente - balbuciou Jack. - Prepará-vamo-nos para nos ir embora quando vimos o vosso barco. O Barney, o tipo que se encontrava comigo... mandou-me manter o avião baixo até vocês estarem fora de vista. E depois partíamos...

A voz de Jack parecia cada vez mais fraca e Frank recomendou-lhe que não falasse. Mas, o piloto, num estado de semiconsciência, não o ouviu e balbuciou ainda:

- O Barney estava a ameaçar-me com uma arma.. • e a testar-me... para ver o que eu... faria. A única maneira que arranjei para vos avisar foi...

Neste momento Jack deixou pender a cabeça para o lado.

- Ficou de novo inconsciente. Pobre homem! - exclamou Frank, tomando-lhe de novo o pulso.

- Ele salvou-nos a vida, Frank - murmurou Joe. - Nós íamos mesmo entrar naquela cabana e teríamos ido pelos ares se o Jack não tem...

A tranquilidade que reinava ali foi de repente interrompida pelo barulho de um barco a motor. Os Hardy levantaram-se de um pulo, a tempo apenas de ver o barco que ali os trouxera a afastar-se da costa.

A bordo ia o homem que tinha sido cuspido do avião, aquele a quem Jack chamara Barney.

- Que par de imbecis que nós somos - gritou Joe, furioso. - Enquanto estávamos para aqui a dar à língua, deixámos que ele desse a volta e apanhasse o nosso barco.

Já não havia qualquer hipótese de recuperarem a embarcação. Barney aumentou-lhe a velocidade e em breve saía da enseada, apontando para o mar alto.

- Agora é que vão ser elas! - resmungou Frank.

- Estamos aqui encurralados, Joe, e o Jack precisa urgentemente de assistência médica.

A ampliação fotográfica do mapa ficara dentro do barco e nenhum dos rapazes se lembrava de qualquer pormenor do local, mas Joe tinha ideia de que a estrada mais próxima ficava pelo menos a 15 quilómetros dali.

- Parece-me que só temos duas alternativas, Joe - disse Frank, pensativo. - Ou ficamos aqui à espera, até que alguém nos venha buscar ou, então, um de nós vai tentar encontrar uma estrada qualquer e pedir ajuda.

- É muito longe e há o risco de não conseguir encontrar o caminho de volta por entre as árvores quando escurecer. Mas existe outra hipótese, Frank.

- Qual?

- Tentarmos entrar na cabana sem despoletar os explosivos. Podíamos utilizar o aparelho de rádio dos tipos.

- Tens razão! Não tinha pensado nisso...

Mas Frank cerrou os maxilares, preocupado e não muito convencido.

Nisto, a atenção dos rapazes foi desviada por um pequeno iate que se dirigia para a baía. Frank e Joe começaram aos pulos, a gritar e a agitar os braços até que compreenderam que não necessitavam de fazer sinais. O barco tinha sido obviamente atraído ao local pelo fumo e pelas chamas que consumiam o avião sinistrado.

O dono do barco aproximou-se e, pondo as mãos em concha, gritou:

- O que é que aconteceu? Precisam de ajuda?

- Precisamos, sim - respondeu logo Frank. - O avião despenhou-se e o piloto está gravemente ferido. Pode levar-nos a Bayport?

- Claro que sim - disse o homem, pronto a ajudar.

Em condições normais, os Hardy não se teriam arriscado a mover um homem nas condições de Jack. Mas acharam que não havia outra alternativa. Utilizando um oleado que o dono do barco lhes passou, improvisaram uma maca e levaram o ferido para bordo.

O senhor Webb, o dono do iate, um homem já de cabelos brancos, fez a embarcação recuar, para saírem da enseada.

- É pena eu não ter nenhum rádio, rapazes, senão podíamos contactar o porto e pedir uma ambulância.

- Estamos-lhe muito gratos, senhor Webb – retorquiu Frank. - Se não tivesse aparecido, não sei o que seria de nós.

Havia poucas hipóteses de localizarem ou recuperarem o barco roubado. Mas, quando iam a chegar à baía, Joe pensou tê-lo visto por um momento e pediu um binóculo emprestado ao senhor Webb.

- É o nosso homem, não há dúvida - disse ele, um instante depois, passando o binóculo a Frank. - Vai para os lados da enseada das Gaivotas.

Alguns minutos depois de terem encostado à doca, apareceu uma ambulância no local, em resposta a uma chamada telefónica feita por Frank. Vinha um médico que prestou imediatamente os primeiros socorros a Jack. Em seguida, o piloto ferido foi transportado para terra numa maca. Os Hardy saltaram para o seu descapotável e seguiram a ambulância, que arrancou dali com a sirene a tocar.

Do hospital, Frank falou para Ezra Collig e fez-lhe um relato completo dos acontecimentos. O chefe prometeu enviar de imediato alguns peritos para desarmadilharem a cabana e procurarem pistas. Garantiu-lhes também que lançaria um alerta para recuperar o barco roubado.

- A propósito, Frank - continuou Collig -, o Tiffman, o portador das jóias e o guarda do edifício foram submetidos a testes com o detector de mentiras esta tarde.

- E quais foram os resultados? - perguntou Frank.

- Quer acredites quer não, nenhum deles acusou nada. - Collig parecia verdadeiramente irritado e confundido. - Não sei que tipo de golpe é que eles tramaram, mas podes ter a certeza de que eu vou descobrir tudo!

Em seguida, Frank telefonou para a casa que lhe alugara o barco e explicou o que se passara.

- Estou certo de que a polícia o descobrirá - concluiu.

Alguns minutos depois, um médico saiu da sala das urgências.

- O vosso amigo parece estar bem. Não tem fracturas - disse aos rapazes -, no entanto está ainda inconsciente e pode ter um traumatismo.

Os Hardy, apesar disto, sentiram-se aliviados por as notícias não serem piores.

Já passava das seis horas e os rapazes deviam ir para casa jantar. Mas Frank teve uma ideia que quis verificar imediatamente com Mike, o guarda do edifício Haley. Ligou para casa a avisar que demoravam e depois saiu do hospital com Joe.

- O que posso fazer por vocês, rapazes? - saudou-os Mike pouco mais tarde. - Ainda andam à caça de pistas sobre o que aconteceu aqui ontem à noite?

- Sim, mais ou menos - disse Frank. - Gostava de lhe fazer algumas perguntas e saber exactamente o que se passou antes e depois de o mensageiro cá chegar.

- Está bem. Vamos a isso.

Com algumas perguntas intercaladas, Frank conseguiu que o homem lhes contasse tintim por tintim o que sucedera na noite anterior. Parecia que alguém apagara da memória de Mike dois períodos de cerca de vinte minutos cada - o primeiro por volta das sete horas e o segundo perto das oito e quarenta e cinco.

- Acho que devo ter passado pelas brasas - admitiu o guarda, envergonhado. - Recordo-me de ter despertado das duas vezes.

- O que vem confirmar o palpite do pai. - A voz de Frank estava tensa. - Joe, acho que já posso explicar o que aconteceu aqui na noite passada.

 

Joe olhou para o irmão, mal se meteram no descapotável e se afastaram do edifício Haley.

- Desembucha lá a tua teoria, Frank!

- O chefe Collig diz que as três pessoas submetidas aos testes do detector de mentiras estavam a dizer a verdade - começou Frank. - O guarda, o portador e o senhor Tiffman.

- E daí?

- Daí - continuou Frank - que podemos depreender que o guarda levou mesmo o portador para cima, mas não até ao quinto andar, e que o O'Bannion entregou de facto as pedras preciosas, mas não no escritório do Tiffman.

- Ei, espera um minuto - protestou Joe. - Se o O'Bannion não levou os diamantes para o escritório do Tiffman, onde os entregou então?

- Num gabinete do sexto andar... ou do quarto.

- Mas porque dizes isso?

- O Mike adormeceu duas vezes - respondeu Frank - e, durante esses dois períodos de tempo, alguém podia ter feito uma troca de fios dos botões do elevador, assim como das placas dos escritórios. Joe franziu o sobrolho.

- Queres dizer que ele pensa que conduziu o homem ao quinto andar, mas de facto, o levou a um andar acima ou abaixo.

- Exacto.

- E o controle do elevador podia ser alterado de modo a enganar o operador?

Frank acenou afirmativamente, enquanto paravam num sinal vermelho.

- Tenho a certeza que sim, Joe. Para aquele elevador andar, só é necessário carregar num botão. Além disso é dos que têm portas sólidas. Quem vai lá dentro não vê nada para fora. Um tipo esperto conseguia facilmente fazer o elevador parar no andar errado, trocando só alguns fios. E a pessoa que fosse lá dentro nem daria pela diferença, nem mesmo o próprio guarda, a menos que controlasse o tempo da viagem.

- E quando o portador chamou o elevador para descer? - perguntou Joe.

- Isso acenderia uma luzinha no painel - retorquiu Frank. - Mas vamos supor que o circuito tenha sido viciado. O O'Bannion toca do sexto andar, mas a luz mostra o quinto. O Mike carrega no botão do quinto andar e o elevador vai na realidade até ao sexto, onde o O'Bannion o espera. Nenhum deles percebe que há algo errado.

- Uau! Bem pensado! - exclamou Joe. - E os números das placas dos escritórios também foram alterados, não?

- Tal qual. Provavelmente por um cúmplice, para apressar o trabalho. Não se trata de portas de vidro com os números e os nomes pintados. Estes figuram em placas de metal.

- Que são muito mais fáceis de alterar - concordou Joe. - Os malfeitores podiam ter arranjado duplicados das placas do quinto andar.

- E não era preciso substituir todas - acrescentou Frank, quando iam a sair da Rua do Meio para se dirigirem à área residencial de Bayport. - Só nas portas por que o portador ia passar. E, é claro, tiveram de substituir os cincos por seis.

- Parece um plano infalível - observou Joe. - Um dos tipos fica à espera no gabinete falso e recebe as pedras preciosas. Já depois de o portador se ir embora, adormecem o guarda outra vez e tornam a pôr tudo como estava antes.

- Exacto - retorquiu Frank. - Agora, a questão é: como é que eles adormecem as vítimas?

- Tenho andado a pensar nisso - disse Joe, preocupado. - Frank, pode ser aí que o professor Darrow e os seus conhecimentos científicos entram em acção.

- Queres dizer que ele e o Strang são unha com carne?

- Talvez. -Joe encolheu os ombros. - Provavelmente, ele revoltou-se contra a sociedade em geral porque ninguém o ajudou e financiou o projecto. Ou então fizeram-lhe uma lavagem ao cérebro.

- Sabe-se lá - admitiu Frank. - Ele parece ser uma pessoa estranha, pelo que o reitor contou.

Frank virou para o caminho particular da casa deles.

- Outra coisa, Joe! O que significaria aquela observação que tu ouviste dentro do túnel?

- Sobre o chão que desaparece? Tenho cá um palpite que se referia àquele quarto sem chão.

- Se calhar, tens razão. Mas há outro chão que desaparece: a superfície de mosaicos perto da mansão.

Joe sorriu.

- À falta de melhor, temos duas soluções para o mesmo mistério!

De repente a tia Gertrude pôs a cabeça fora da porta das traseiras.

- Vocês estão à espera que eu vos sirva o jantar dentro do carro? A comida já está fria!

- Desculpe, tiazinha - disse Frank. - A culpa foi toda minha.

A tia Gertrude, cheia de curiosidade, mal podia esperar que os rapazes contassem os últimos acontecimentos. À mesa, ouviu com ansiedade o que se tinha passado na Angra dos Tubarões. Tanto ela como a senhora Hardy ficaram preocupadas com o estado de Jack Wayne.

- Oh, espero que ele não tenha sofrido nada de grave - disse a mãe dos rapazes.

Ainda os dois irmãos não tinham chegado à sobremesa, apareceram Tony e Chet com mais notícias interessantes.

- Encontrámos um iate chamado Seacat - anunciou Tony, ofegante. - Parece-se com aquele que nós vimos antes de o homem-rã atacar o Joe.

- Onde é que ele está agora? - perguntou Frank.

- Numa daquelas enseadas por onde a marginal passa - respondeu Chet, muito entusiasmado.

A tia Gertrude resmungou, indignada, quando Frank e Joe saíram à pressa, sem acabar de jantar. Eles saltaram para o descapotável e seguiram o calhambeque de Chet.

Era quase noite fechada quando os quatro amigos encostaram os carros perto da enseada. Parado no mesmo local, entre as árvores, encontrava-se um carro de dois lugares, bastante amachucado.

- Deve pertencer a alguém do iate - aventou Tony. - Não vejo mais ninguém aqui por perto.

- Tive uma ideia - disse Joe. - Deixa-me levar o descapotável, Frank. Chet, arruma o teu carro além, no meio daquelas árvores. Eu encontro-me com vocês dentro de uns minutos junto daqueles salgueiros.

Os outros anuíram, perguntando-se o que seria que Joe planeava fazer. O rapaz fez uma volta em "U" e afastou-se. Chet conduziu o carro para o lugar indicado e desceu o declive que chegava até à beira da água.

Frank e Tony já lá tinham chegado.

Os três rapazes esconderam-se entre os salgueiros e olharam para a água. O iate parecia repousar silenciosamente naquele crepúsculo agradável. Havia um pequeno barco a remos preso a um dos lados. Então aperceberam-se de uma luz fraca através das vigias da cabina.

Passaram-se dez minutos. Por fim, Joe juntou-se a eles.

- Usei aquele rádio emissor de sinais do pai - explicou - e prendi-o ao eixo da roda do carro de dois lugares, para podermos saber sempre onde ele está.

- Boa ideia - disse Frank, aprovadoramente. Passaram-se mais alguns minutos. Então, a luz a bordo do iate apagou-se. Nesse momento, um vulto saiu da cabina, mas já estava escuro de mais para os rapazes distinguirem a cara do homem. Este olhou à volta, depois saltou furtivamente para o barco a remos e dirigiu-se para terra.

- O tipo estava com medo de ser apanhado - murmurou Tony.

- Cheira-me que não é o dono do barco - concluiu Frank. - Aposto que não tinha autorização para estar lá dentro.

O homem entretanto já estava a amarrar o barco a uma árvore e a seguir começou a subir a colina.

- Deve ser dele o carro de dois lugares - murmurou Joe, entusiasmado.

Os rapazes apressaram-se a chegar aos seus carros. Joe tinha estacionado o descapotável debaixo das árvores, junto ao calhambeque de Chet. Ouviram o outro ligar o motor e um momento depois passou por eles. Joe ligou o receptor do aparelho de sinais. Ouviu-se um zumbido baixo e constante.

- Pronto! Vamos embora! - disse a Frank.

O descapotável virou para a estrada, com o calhambeque de Chet logo atrás. Frank manteve os faróis no mínimo e guardou uma distância segura do carro de dois lugares. Contornaram Bayport e meteram pela mesma estrada em que tinham seguido o carro de desporto preto três noites antes. Joe acompanhava o trajecto do carro da frente com a ajuda de uma antena móvel.

- Está a dirigir-se à mansão do Perth! - exclamou Joe, quando uma súbita falha no zumbido do rádio revelou que a presa tinha virado algures.

Os rapazes pararam na berma da estrada e esperaram alguns minutos, para não serem notados. Então, entraram também no caminho da mata e estacionaram os carros perto de uns arbustos. Começaram a procurar o outro veículo. Em breve Frank o localizou mais adiante, meio escondido entre as árvores.

- Dá a impressão de que ele está a tentar passar despercebido - murmurou Tony.

- Pois é. Tenho a certeza de que não é nenhum dos homens do Strang - concordou Frank, enquanto Joe anotava a matrícula.

- Como é que agora o encontramos? - perguntou Chet.

- Vamos dar uma volta por aí e manter os olhos bem abertos - respondeu Joe.

Os quatro rapazes começaram a subir o morro já conhecido. Todos se viraram, alarmados, ao ouvir um rosnar feroz que lhes acelerou as pulsações. Frank teve mesmo de tapar a boca de Chet com a mão, para evitar que o amigo começasse aos berros.

- Calma, pá! É só um cão de guarda mecânico, para afastar pessoas como nós.

Chet engoliu em seco quando o cão voltou a rosnar.

- Hmm... Resultou com uma pessoa! - declarou o rapaz, que deu meia volta, disposto a descer o caminho.

Frank acalmou-o e continuaram. Tony e Chet ficaram à espera na sombra das árvores enquanto Frank e Joe seguiam na direcção da casa. Estavam quase a chegar à entrada quando ouviram um "Pssst!" abafado de Tony e se voltaram para trás.

Uma silhueta branca movia-se na direcção da casa.

- O fantasma fugitivo - balbuciou Joe.

Os rapazes desataram a correr para aquele lado, mas a figura misteriosa detectou a presença deles e fugiu.

"Aquele fantasma deve ter um olho na parte de trás da cabeça!" - pensou Joe, furioso, continuando a correr.

Num instante, o espectro desapareceu de vista por entre as árvores. Frank resolveu agir segundo um palpite. Cortando caminho até ao carro de dois lugares, escondeu-se no meio de uns arbustos ali perto. O vulto branco destacou-se de súbito na escuridão. Dirigia-se ao carro e abriu a porta. Antes de chegar a entrar, Frank agarrou-o!

O mascarado lutou violentamente, mas os outros três rapazes apareceram também no local e ajudaram Frank a encostá-lo contra o carro.

- Bastante sólido para um fantasma! - observou Chet.

- Não tão sólido como tu - gracejou Joe -, mas é de carne e osso por baixo desta túnica.

- Vamos lá a ver quem é - disse Frank, puxando o carapuço branco que lhe tapava a cara.

 

Chet soltou uma exclamação de surpresa, quando Tony fez incidir a luz da lanterna eléctrica no rosto do homem.

- É o fulano que nós encontrámos aqui, inconsciente, outro dia.

- E também é o ladrão que roubou a ametista da Iola e da Callie - acrescentou Frank.

O homem encolheu-se ao ver-se descoberto.

- Por favor, rapazes - implorou -, não pretendo fazer mal a ninguém. Esta farsa do fantasma era só para pregar uma partida, nada mais do que uma brincadeira.

- Uma brincadeira de mau gosto - disse Tony, secamente.

- E roubar a ametista também não passou de uma brincadeira?

O homem empalideceu.

- Não, isso... isso foi um truque sujo da minha parte, assustá-los com o incêndio na lata de óleo e roubar-lhes a pedra mesmo debaixo do nariz. – Pássou nervosamente a língua pelos lábios e continuou: - É que eu tinha de possuí-la! Por direito, essa pedra pertence-me.

Os rapazes ficaram pasmados.

- Que história é essa? - perguntou Joe.

O homem remexeu-se, sentindo-se pouco à vontade.

- Isso não importa - balbuciou. - Olhem, encontram o que procuram no bolso do lado direito do meu casaco.

Joe enfiou a mão dentro do bolso referido. Logo a seguir, levantou a mão, segurando uma pedra púrpura.

- A ametista! - exclamou Chet.

Joe entregou-lha, para que ele a devolvesse às raparigas.

- O senhor ainda não respondeu à pergunta que o meu irmão lhe fez - interveio Frank, friamente. - Porque disse que a ametista lhe pertence?

O desconhecido tinha uma expressão furiosa no olhar, tal como a de um animal apanhado numa armadilha.

- Já lhes disse que isso não interessa! - respondeu. - Eu sei o que é que vocês andam a tramar! Estão a tentar sacar-me informações, para ver se conseguem ficar com as pedras todas.

- Ouça lá - disse Frank, irritado -, eu não sei o que é que quer dizer com isso, mas é melhor que vá falando depressa ou então chamamos a polícia!

- Não, não! Por favor! - O homem pareceu de repente perder toda a coragem. - Não posso ir agora para a prisão... Ainda há tanto que fazer! Eu explico, eu digo-vos tudo o que quiserem saber.

- Pode começar por responder à pergunta do Joe e, depois, contar-nos porque tem andado por aqui vestido de fantasma.

- Está bem.

O homem engoliu em seco e falou devagar.

- O meu nome é Karl Nyland Júnior. Há alguns anos atrás, o meu pai descobriu um filão de ametistas, nos arredores de Bayport. Foi ter com o velho Jerome Perth para lhe pedir ajuda financeira e até assinaram um acordo de sociedade. Mas aquele vigarista do Perth enganou-o!

- Como foi isso? - perguntou Frank.

- O Perth comprou o terreno e pô-lo em nome dele e depois tentou sempre adiar as coisas com o meu pai, dizendo que estava à espera do relatório de um geólogo. Por fim, o meu pai acabou por fartar-se. Discutiram e o Perth expulsou o meu pai da mansão. Mas, primeiro, escarneceu dele. Disse-lhe que os documentos da sociedade e as ametistas que o meu pai lhe tinha dado, estavam bem guardadas, num sítio fora da mansão, e que ninguém podia chegar-lhes. O certo é que o meu pai não foi suficientemente esperto para as encontrar.

- Céus! Parece que o velho Perth era mesmo uma raposa velha! - murmurou Tony.

- Aquele homem era o diabo em figura de gente - declarou Nyland. - Mas também, teve o que mereceu. A briga provocou-lhe um ataque cardíaco e ele morreu no dia seguinte.

- Os documentos da sociedade não apareceram quando inventariaram as coisas dele? - perguntou Frank.

- Não, os advogados afirmaram que não havia documentos nem ametistas no meio dos bens do Perth. O meu pai ainda continuou secretamente a procurá-los durante muito tempo, mas nunca conseguiu encontrar nada.

Joe deu um estalinho com os dedos.

- Deve ter sido ele a figura fantasmagórica que as pessoas diziam que andava a assombrar os arredores da casa!

- Sim, ele andava aqui à procura na noite em que o sobrinho do Perth morreu - admitiu Nyland. - Foi o que lhe deu a ideia de se vestir como um fantasma. Pensou que assim espantava os intrusos e manteria a mansão desocupada até conseguir localizar o esconderijo. Mas nunca o encontrou.

- Pelo menos, o plano para afastar as pessoas daqui resultou - disse Chet. - E agora o senhor tem andado a tentar o mesmo disfarce.

Nyland acenou afirmativamente, com uma expressão de culpa.

- Eu apanhei um choque eléctrico quando andava aqui à procura, na outra noite. Foi quando vocês me encontraram inconsciente. Como me viram a cara, decidi que seria melhor vestir o fato de fantasma como disfarce, para o caso de vocês cá voltarem.

- Porque é que esperou tanto tempo para começar a busca das pedras? - inquiriu Joe.

- Eu era ainda criança e vivia com uns parentes noutro estado quando o Perth vigarizou o meu pai - explicou Nyland. - Foi só há pouco tempo que eu encontrei o diário dele e soube da história toda. A minha mulher tem estado muito doente e eu já contraí dívidas para pagar as contas do hospital, por isso decidi vir a Bayport e tentar encontrar as pedras e os documentos da sociedade.

- Parece que tem sido em vão - comentou Frank. O homem acenou afirmativamente.

- Sem tirar nem pôr. Tudo o que tenho para vos mostrar é isto.

O homem enfiou a mão no bolso e retirou uma dúzia de pequenos discos de metal. Cada um tinha gravada a imagem de uma violeta sobre a cabeça de um dragão!

- As moedas da sorte do Perth! - exclamou Joe. - Nós encontrámos uma perto da mansão. O senhor deve tê-la deixado cair ali.

- É possível - admitiu Nyland.

- Sabe por acaso o que significa esse desenho? - perguntou Frank.

- Na verdade, não sei - disse Nyland friamente -, mas, cá para mim, o dragão é o próprio Perth e a violeta representa as pedras dessa cor que ele roubou ao meu pai. Joe franziu o sobrolho.

- Só havia um exemplar do documento do acordo da sociedade? Não havia uma cópia?

- Não. Nisso, o Perth foi muito esperto e o meu pai, ingenuamente, confiou nele e não insistiu em que se fizessem duas cópias.

- Sendo assim o Perth podia simplesmente destruir o documento e acabar com a sociedade, pois o terreno já era dele...

- Mas mantendo a situação, dominava o meu pai, ganhando tempo. É que o meu pai tinha já descoberto dois filões de pedras preciosas para uma companhia mineira. Sem dúvida nenhuma, o Perth pensou que ele poderia vir a fazer outras descobertas igualmente valiosas. E tenho a certeza de que o velho foi suficientemente cruel para manter o acordo mesmo depois da discussão, só para atormentar o meu pai.

- O senhor tem qualquer ideia de onde possa estar localizado o filão das ametistas? - perguntou Joe.

Nyland abanou a cabeça, desapontado.

- Não. O Perth possuía uma grande propriedade, mas foi tudo vendido depois da morte dele. E o diário não mencionava nada. Foi por isso que eu segui as duas raparigas depois de as ter ouvido dizer ao joalheiro que haviam achado uma grande ametista. Esperava que tivessem encontrado o local onde estava o filão.

- E o que é que o senhor estava a fazer há bocado a bordo daquele iate? - perguntou Tony.

Nyland encolheu os ombros.

- Foi só um palpite. Há qualquer coisa de muito estranho nas pessoas que moram agora na mansão. Esta tarde, vi dois dos homens na cidade e ouvi-os pronunciar a palavra "ametista". Pensei que podiam ter em poder deles os documentos relacionados com o filão, por isso segui um deles. Ele entrou naquele barco. Esperei que saísse e fui eu a bordo. Mas foi uma perda de tempo. Não consegui descobrir nada.

Nyland deixou descair os ombros. Meio a chorar, começou a contar tudo sobre a doença da mulher e das dívidas que estavam a deixá-lo desesperado. Implorou que não o entregassem à polícia. Os quatro rapazes sentiam-se perplexos e embaraçados. Decidiram então deixar a decisão a cargo do senhor Hardy.

Nessa altura, acendeu-se uma luz numa janela do andar de cima, na mansão. Joe exclamou:

- É a janela onde apareceu o homem que se parecia com o professor Darrow, Frank. Vamos ficar por aqui! Pode ser que o vejamos outra vez!

Frank olhou para Chet e Tony.

- O meu pai deve chegar hoje. Dava para vocês levaram o Nyland até à nossa casa e esperarem que ele chegue?

- Claro. Basta-me telefonar aos meus pais - respondeu Tony.

- A mim também. E pode ser que a tia Gertrude nos arranje qualquer coisa para comermos - acrescentou Chet, cheio de esperanças.

Ansioso por evitar ser preso, Nyland aceitou que os rapazes o levassem com as mãos amarradas e prometeu não lhes dar problemas. Seguiram os três no carro de Chet.

- Aquele homem é estranho, mas penso que estava a dizer a verdade - observou Frank. - Parece mesmo que tem andado sob uma grande tensão nervosa.

Os Hardy voltaram a subir o morro. Cautelosamente, abriram caminho através da vegetação rasteira, na direcção da casa.

De repente, ouviram um grito estranho ali perto - depois outro, mais fraco, cujas últimas palavras, apenas balbuciadas, já tinham ouvido anteriormente:

- O-o-o chão!

Frank e Joe sentiram-se gelar de susto.

- É só uma partida - disse Frank entredentes, recomeçando a andar.

Estavam quase a chegar à mansão quando ambos se sentiram gelar de choque. Uma figura branca e luminescente levantara-se do chão!

- Nós já apanhámos o fantasma...

- Ele é falso, Joe. Tem de ser!

Frank ficou de olhos fixos no fantasma, fascinado. O espectro começou a mover-se na direcção deles! Resistindo ao impulso de fugir, os Hardy avançaram e agarraram-no. Joe suspirou de alívio ao sentir-lhe a armação de arame por baixo do fato. Estava coberto por uma espécie de tecido sintético que fora mergulhado em tinta fosforescente.

- É só um espantalho articulado! Devemos ter pisado um mecanismo que o acciona.

- Isso mesmo. E olha para as rodas. A brisa empurrou-o na nossa direcção!

Continuaram a caminhar. Junto de uma árvore, detiveram-se e olharam para a janela iluminada. Distinguiam no interior prateleiras com garrafas e tubos de ensaio e alguns aparelhos eléctricos.

- Um laboratório! - murmurou Joe.

De uma das janelas fechadas do rés-do-chão, vinha música de rádio. Subitamente, apareceu um homem na janela do andar de cima. Era calvo e usava óculos. Segurava um livro aberto numa das mãos.

- Lá está ele! - segredou Frank.

- Não há dúvida de que é o Darrow - concordou Joe. - Se ao menos conseguíssemos falar com ele!

- É uma possibilidade remota, com o Strang e os seus homens à volta. Por agora, já vimos tudo o que precisávamos. Vamos para casa esperar pelo pai.

Os dois irmãos deram meia volta e começaram a atravessar a mata, dirigindo-se ao carro. A meio caminho ouviram de novo os gritos da voz aflita.

- Espera, Joe - sussurrou Frank. - Aquela superfície de mosaicos fica algures por aqui. Já reparaste que ouvimos sempre os gritos nesta zona?

Os rapazes acenderam as lanternas eléctricas e examinaram cuidadosamente o chão. Subitamente, o foco de Joe incidiu num pequeno objecto que sobressaía no meio da erva.

- Aposto que é isto, Frank! Deve ser uma espécie de sensor, talvez de infravermelhos, que acciona um gravador quando alguém se aproxima.

Joe tentou examiná-lo mais de perto. Nesse momento a voz emitiu novo grito. Desprevenido, Joe recuou instintivamente e bateu com um pé contra uma pedra.

Frank deu um grito de susto quando o chão cedeu sob os seus pés. Mergulhou verticalmente.

- A saída do túnel! - exclamou Joe. - O meu pé bateu numa pedra. Foi a mesma coisa que aconteceu ontem à noite. Deve ser a maneira de abrir isto do exterior.

- Exacto. E olha só para todo este monte de raízes e arbustos! Realmente, formam uma bela camuflagem para a superfície de mosaicos. - Frank iluminou o túnel com a lanterna eléctrica. - Será que podemos entrar na casa por aqui, sem o Strang e os comparsas nos verem, e ir falar com o professor Darrow?

Joe saltou para o lado de Frank.

- Cá por mim estou pronto! Vamos lá ver onde vai dar o túnel!

 

Frank estava só a falar meio a sério quando propôs que entrassem na casa através do túnel, mas o entusiasmo de Joe era contagiante e ele não resistiu. Pareceu-lhe uma boa oportunidade para tentar obter informações ou uma pista qualquer que ajudasse a desvendar o caso!

- Está bem. Vamos lá espreitar.

Avançaram para o túnel. Frank tomou a dianteira e apontou para a escuridão o foco amarelo da lanterna eléctrica.

- Cuidado com esse intercomunicador! - avisou Joe. - Não queremos outra conversinha com o colega do Waxie!

A passagem, revestida de tijolo, prolongava-se por centenas de metros. Finalmente, os rapazes encontraram uma porta. Tinha uma fechadura, mas abriu logo que Frank experimentou o trinco.

- Deve abrir-se automaticamente quando o chão de mosaicos desce - murmurou.

- Nesse caso, para que serve o intercomunicador?

Frank encolheu os ombros.

- Talvez para alguém que se esconda no túnel poder comunicar com a casa. Ou talvez eles ponham um vigia à entrada do túnel de vez em quando e queiram que ele os contacte por telefone de tempos a tempos.

Os rapazes iluminaram o que os cercava.

- Devemos estar na cave da mansão - murmurou Joe.

Encontravam-se numa enorme divisão revestida a cimento, húmida e a cheirar a bafio. Havia ali um caixote com carvão, um forno todo enfarruscado e coberto de teias de aranha, e um aparelho de ar condicionado que parecia novinho em folha. A um canto, descobriram um lance de escadas para cima.

Frank perguntou então:

- Achas que devemos arriscar-nos a subir? Ou voltamos para trás?

- Não sejas palerma! Vamos falar com o professor Darrow! Ou já te esqueceste?...

Caminharam cautelosamente até às escadas e começaram a subir devagar. Foram dar à cozinha da mansão. Dali, partiam outras escadas para o andar superior. Os degraus rangeram sob o peso dos rapazes, mas felizmente a música que vinha da parte da frente do rés-do-chão abafava os passos deles.

Chegando ao topo, os dois irmãos meteram por um corredor que ia para o lado da frente da casa, mas deram uma série de curvas, pois parecia que aquele andar obedecia a uma planta muito excêntrica. Depois de passar por várias portas, os Hardy pararam em frente da única cuja fresta deixava ver um fio de luz.

- Deve ser aqui o laboratório - ciciou Frank. Joe fez figas, com os dedos cruzados.

- Pronto. Vamos lá investigar.

Frank abriu a porta. O professor Darrow tinha na mão um tubo de ensaio com um líquido colorido e aproximava-o da luz. Voltou-se quando os rapazes entraram e ficou tão espantado que deixou o líquido derramar-se em cima da mesa!

- Professor Darrow? - inquiriu Frank. Joe fechou suavemente a porta atrás deles.

A mão do cientista tremia quando ele pousou o tubo de ensaio numa base e, cheio de medo, olhou fixamente para os Hardy através dos óculos de aros de metal.

- Quem são vocês? O que querem de mim? - gritou, numa voz aguda e desafinada.

As notas camufladas da música do rádio soavam ali através do chão.

- Nós somos Frank e Joe Hardy, senhor Darrow - começou Frank. - O nosso pai chama-se Fenton Hardy.

O rapaz presumiu que o nome do pai seria familiar a um perito na detecção de crimes. Mas Darrow olhou para eles, não dando qualquer sinal de o ter reconhecido.

- Fenton Hardy, o detective particular - acrescentou Joe. - Talvez já tenha ouvido falar dele.

- Talvez.

Os olhos do cientista fixaram-se nos rapazes. Vestia uma bata branca de laboratório e viam-se-lhe pontas desgrenhadas de cabelo grisalho, espetadas em volta do crânio estreito.

- Porque é que vocês vieram aqui?

- O reitor Gibbs da Western State University pediu-nos que o localizássemos e... - começou Frank a explicar.

- Não pediu nada! Vocês vieram aqui para me espiar!

- Isso não é verdade! - exclamou Frank.

- O reitor entrou em contacto connosco por causa da sua irmã - disse Joe, friamente. - Pediu que o senhor entrasse em contacto com ela. Se calhar está preocupada porque não recebeu notícias...

Joe calou-se de repente, ao reparar que o professor estava a tentar chegar com a mão a um estranho aparelho redondo, pousado em cima da sua mesa de trabalho. Parecia-se vagamente com um aquecedor eléctrico portátil.

- Cuidado, Frank!

Joe avisou o irmão no momento exacto em que o professor Darrow carregou num botão do aparelho. Mas o segundo já não teve tempo de reagir. A máquina disparou um raio de luz intensa, que o atingiu em cheio. Frank ficou instantaneamente paralisado, como uma estátua, e perdeu o conhecimento!

Reparando no fio eléctrico que ia da máquina a uma tomada na parede, Joe tirou a ficha da parede, antes que o cientista pudesse fazer-lhe o mesmo.

- Socorro! Socorro! - gritou o professor.

Joe olhou desesperadamente à volta. A música do rádio do andar de baixo tinha parado. Um instante depois, ouviu-se o barulho de passos apressados pela escada acima!

"O Strang e os seus homens - pensou Joe. - Tenho de me esconder depressa! Mas onde?"

Nisto, Darrow atacou-o e tentou torcer-lhe o braço, mas Joe conseguiu soltar-se e deu um empurrão ao professor que o fez recuar, desequilibrado. O homem chocou com um canto da mesa de trabalho e caiu, no meio de uma chuva de tubos de ensaio, retortas e outros objectos de laboratório.

Indefeso, Joe fugiu por uma porta de comunicação para um quarto contíguo. A porta fechou-se violentamente atrás dele no preciso instante em que Strang e outros cúmplices penetravam no laboratório.

- Por ali - gritou Darrow, apontando para a passagem por onde Joe desaparecera. - Por aquela porta!

O grupo precipitou-se para o labirinto de quartos contíguos. Joe manteve-se escondido por detrás dos pesados reposteiros vermelhos que cobriam as janelas do quarto ao lado do laboratório. Chegava-lhe a voz de Strang a gritar ordens.

Um momento depois, o famoso ladrão de jóias voltou ao laboratório, passando por Joe e quase lhe tocando sem se aperceber. Através da porta aberta, Joe ouviu-o falar com o professor.

- Pois é. Conheço o rapaz, sim. Reconheci-o logo - disse, referindo-se evidentemente a Frank. - Ele e o outro são filhos de um espião muito ardiloso que deve ter sido enviado a Bayport propositadamente para roubar a sua invenção.

- Era isso que eu receava! - respondeu Darrow.

- Portanto não é verdade que eles estejam de algum modo relacionados com o Fenton Hardy?

- Claro que não! De facto, o Hardy está agora a trabalhar secretamente para mim, a fim de proteger o seu projecto. - A voz de Strang tornou-se firme e persuasiva. - Não se preocupe, professor! Os meus homens em breve apanharão o outro rapaz. Nessa altura, entregá-los-emos ao FBI.

- Sinceramente, espero que assim seja - e Darrow suspirou pesadamente. - Primeiro, os órgãos superiores da universidade e os colegas invejosos impediram o financiamento para a minha pesquisa... Agora andam espiões à minha volta!

- A propósito - ouviu-se Strang perguntar -, qual foi a intensidade do raio que atingiu o rapaz?

- Foi leve. Mas deve mantê-lo adormecido o tempo suficiente para...

A campainha de um alarme soou estridentemente no andar de baixo, interrompendo o professor. Tanto Strang como Darrow desapareceram imediatamente do laboratório.

Joe esperou até ouvir os passos deles afastarem-se pelas escadas abaixo. Então, saiu rapidamente de detrás do cortinado e precipitou-se para o laboratório. Frank continuava na posição rígida. Joe encheu um recipiente com água da torneira e atirou-a para a cara do irmão. Frank pareceu estremecer.

- Frank!... Frank, estás a ouvir-me?

Joe abanou o irmão, dando-lhe ao mesmo tempo umas bofetadas leves. Pouco a pouco, Frank foi saindo do torpor, mas percebia-se que não fazia a menor ideia do que lhe tinha sucedido. Joe explicou-lhe tudo resumidamente e acrescentou:

- O Strang conseguiu convencer o professor que está rodeado de espiões, como nós, por exemplo. Entretanto, soou um alarme lá em baixo e eles foram ver o que se passava.

Frank sentia-se ainda um pouco tonto.

- Devo ter sido adormecido pelo mesmo aparelho que utilizaram nos roubos de jóias, Joe!

- Claro. E o Darrow pensa que viemos cá com a intenção de roubá-lo. Temos de encontrar uma saída deste lugar!

- Espera um segundo, Joe! O alarme que tu ouviste pode significar que o pai anda por aí... ou até mesmo a polícia.

- Pois pode - concordou Joe.

Pelos sons que ouvira, o rapaz sabia que existia uma escada da frente. Em breve a encontraram e agacharam-se no topo para ouvir o que se passava lá em baixo.

- Lá vêm eles agora! - dizia Strang. - Parece que conseguiram apanhar quem quer que foi que fez soar o alarme!

Frank e Joe espreitaram por cima do corrimão da escada para o vestíbulo. Strang estava à porta com o professor Darrow. Naquele momento, entraram três dos cúmplices, empurrando entre eles, sob a ameaça de uma arma, um homem alto e bem constituído, que usava o cabelo um tanto comprido e vestia um blusão de xadrês colorido.

- O Duke Makin! - murmurou Joe, muito espantado.

- Não encontrámos nem sombra do miúdo que fugiu, chefe - informou um dos recém-chegados. - Mas encontrámos o Makin a bisbilhotar lá fora.

- Bom trabalho, Barney! - disse Strang, aprovadoramente.

- O Barney era o homem que ia com o Jack Wayne no avião - murmurou Frank ao ouvido do irmão.

Duke Makin estava muito seguro de si, o que enfureceu Strang.

- Eu já te tinha avisado uma vez, Makin, para desapareceres da minha vista - barafustou o ladrão de jóias.

Makin riu com desprezo.

- E eu já te tinha dito, Strang, que estava a agir por minha conta neste teu roubo de jóias.

- Tu estás à procura de grandes sarilhos! Sempre no mesmo tom, Makin repontou:

- Tu é que estás metido em sarilhos. Depois de teres ouvido que o Fenton Hardy andava a investigar o teu caso, um amigo meu descobriu que ele estava em Chicago. Pedi a esse meu amigo que informasse o detective do golpe no edifício Haley. Como é que eu soube disto? Ouvi os teus homens a conversar depois de terem "fabricado" o gabinete do Tiffman. E há-de haver mais denúncias se eu não receber uma parte de todos os roubos de jóias que tu planeares de agora em diante. E também quero saber qual é o processo que tu usas para adormecer os guardas.

- De que é que ele está a falar? - perguntou o professor Darrow a Strang. - O que é que ele quer dizer com "todos os roubos de jóias que tu planeares"?

- Volte para o seu laboratório, professor! - ordenou Strang secamente. - Este homem é outro espião estrangeiro. Está simplesmente a tentar confundi-lo a si. Eu trato dele!

Darrow obedeceu sem pestanejar, mas via-se-lhe uma expressão intrigada no rosto quando começou a subir a escada. Frank e Joe esconderam-se na sombra. Darrow virou na direcção do laboratório sem dar por eles.

Entretanto, Makin tinha reatado a sua discussão com Strang.

- Eu estou a falar de negócios!

- Cala-te - explodiu Strang. - Nós sabemos que tu agrediste o Waxie no aeroporto e tiraste as ametistas do meu carro, mas foi o teu último golpe, Makin! Levem-no para o nosso quarto de hóspedes, rapazes. Eu trato dele mais tarde, depois de descobrirmos o outro miúdo!

Makin foi conduzido na direcção das traseiras da casa. Frank e Joe começaram a descer a escada pé ante pé, no intuito de escapar pela porta da frente.

Mas, de repente, Darrow deu um grito do seu laboratório:

- O rapaz, que nós deixámos aqui, desapareceu!

Com um rosnar de fúria, Strang regressou de novo à entrada e olhou para as escadas. Antes que os Hardy pudessem recuar, já ele os tinha visto!

 

Frank e Joe deram meia volta e lançaram-se escada acima, galgando os degraus a dois e dois e metendo pelo corredor para a direita para se afastarem do laboratório. Strang já vinha a subir a escada e chamava os seus homens para ajudarem a caçá-los.

Escolhendo ao acaso, Joe abriu uma porta e ambos entraram, disparados, batendo com a porta atrás de si. Também ali os quartos comunicavam uns com os outros formando um autêntico labirinto.

- Foi boa ideia o Perth ter construído a casa assim - arfou Frank, ao passar daquele quarto para o outro a seguir.

As correrias dos seus perseguidores levavam-nos em várias direcções, pois os homens tinham-se separado. Mas a mansão era enorme e os rapazes conseguiram atingir as outras escadas que conduziam ao andar inferior. Desceram por aí sem serem vistos. Joe deu um empurrão na porta das traseiras, mas ela recusou-se a abrir.

- Eles devem tê-la fechado quando começaram à nossa procura, para nos impedirem de sair! - murmurou Frank.

O túnel parecia-lhes agora a única saída.

Já iam a meio da escada para a cave, quando viram Al Hirff entrar pela porta do túnel. Com um grito, ele avançou na direcção dos rapazes, que tornaram a subir apressadamente a escada. Na cozinha, Frank agarrou num contentor do lixo e atirou-o pelas escadas abaixo. Em seguida, os dois irmãos enfiaram por um corredor lateral que seguia em direcção à parte da frente da casa.

Crash!

Ouviram Hirff tropeçar no contentor do lixo.

Um momento depois, uma voz furiosa começou a gritar ordens. Parecia a de Strang. Mais uma vez, soaram passos apressados a descer as escadas da frente, cortando as esperanças dos rapazes de fugirem pela porta principal.

- Aqui! - gritou Frank, aflito, parando em frente de um quarto do lado esquerdo.

Girando a maçaneta, abriram a porta e esgueiraram-se lá para dentro. Seguiram por um quarto pequeno, abriram outra porta e entraram numa sala enorme.

Passados uns instantes, a porta que dava para o esconderijo dos Hardy abriu-se violentamente de novo. Noel Strang acendeu uma luz e olhou em volta, irado.

- Devem ter acabado por sair pela porta da frente! - exclamou para alguém que se encontrava na entrada.

A luz apagou-se, a porta fechou-se e os passos dos homens afastaram-se mais uma vez.

Frank e Joe emergiram por detrás dos pesados cortinados que cobriam as janelas. Não se atreveram a acender as lanternas eléctricas, mas gradualmente os seus olhos foram-se habituando à escuridão.

- É o quarto do Jerome Perth - disse Frank -, o mesmo que nós vimos lá de fora.

- Mas agora o chão parece bem sólido - murmurou Joe.

Frank franziu o sobrolho enquanto observava melhor o quarto.

- Joe, notas alguma coisa de estranho na mobília?

- Não. O que é?

- À excepção daquela cadeira junto da secretária, todas as peças da mobília estão encostadas à parede, até as poltronas.

- Realmente, é muito estranho, Frank - murmurou o irmão. - Isso sugere-te alguma coisa?

- Claro que sim. Sugere-me que está tudo preso às paredes!

Frank tentou mover uma poltrona, a secretária e um armário. Nenhum deles cedeu um milímetro!

- Bem, isto explica uma coisa - observou. - Agora sabemos como é que a mobília estava suspensa no ar quando o chão não se via.

- Não se via! - repetiu Joe.

O rapaz parou a examinar a cabeceira da cama, presa à parede. Por cima do ombro, perguntou:

- Queres dizer que achas que o chão deste quarto desaparece realmente?

Quando se voltou para encarar Frank, Joe bateu com o cotovelo num ornamento qualquer da parede. O que se seguiu fez os Hardy soltarem uma exclamação de espanto.

O chão estava a afundar-se lentamente!

- O que é que tu fizeste, Joe? - perguntou Frank, aflito.

- Sei lá! O meu cotovelo tocou na parede algures perto do interruptor. Deve haver ali algum botão escondido ou qualquer coisa que faz o chão deslocar-se.

Nesta altura já todo o chão tinha descido, como um elevador, levando os rapazes e a cadeira solta para o andar de baixo. Um forte cheiro a bafio penetrou-lhes nas narinas.

Frank acendeu a lanterna e fez incidir o foco de luz nas paredes. À direita, via-se uma porta de madeira, no lado correspondente à janela do quarto.

- A entrada para o túnel! - murmurou Joe.

- Disseste que havia um interruptor ao pé da cama? - inquiriu Frank.

- Sim, provavelmente a luz acende-se e apaga-se quer junto da porta quer da cama.

- Joe, acho que já posso explicar como foi que o sobrinho do Perth morreu! - disse Frank, muito entusiasmado.

- Como?

- Não te esqueças de que ele só morou na mansão durante alguns dias e morreu. Possivelmente, nunca descobriu o segredo deste chão.

- E não sentiu curiosidade ao ver que a mobília deste quarto estava agarrada às paredes?

- Talvez... se é que alguma vez reparou nisso. Mas o tio era mesmo um velho teimoso e estranho e obviamente que os criados também desconheciam o mistério do quarto.

- Pois é. Acho que não sabiam, pois nunca falaram no assunto - concordou Joe. - Mas pergunto-me como é que eles nunca tocaram acidentalmente no botão, nem, por exemplo, quando faziam a limpeza do quarto.

Frank encolheu os ombros.

- Talvez o velho Perth lhes tenha dito que não o limpassem ou só os deixasse usar um espanador.

- É provável. Continua.

- Nós sabemos que o pai do Nyland, Karl Nyland, andava lá fora, à volta da casa, na noite em que o sobrinho morreu. Admitamos que ele tenha feito um ruído qualquer: O sobrinho ouviu-o e acordou...

Joe acenou afirmativamente.

- É uma hipótese. E depois?

- Depois, o sobrinho tacteou na escuridão para acender a luz, mas, por engano, carregou no botão que faz descer o chão, sem o saber.

- Uau! Estou a ver! - exclamou Joe. - O chão afundou-se, mas como a mobília continuou lá em cima, ele não se apercebeu do que se passava!

- Isso mesmo. Então saltou da cama e caiu pesadamente na cave e fracturou o crânio. Pobre homem! Mais tarde, quando os criados vieram investigar, abriram a porta do quarto contíguo e voltaram a repor o chão no seu nível normal sem darem por nada.

- Acho que tens razão - disse Joe aprovadoramente -, mas, se o Perth quisesse repor o chão no lugar normal a partir da cave, como é que ele o faria?

- É fácil de imaginar. Devia ter um automático regulado com um relógio que accionava o mecanismo do elevador se por acaso a porta do outro quarto não funcionasse.

- Claro - concordou Joe. - Nada mais natural, se o Perth concebeu este esquema como um meio de fuga de emergência.

- Exactamente - disse Frank. - Se alguma das vítimas das fraudes dele tentasse entrar à força na mansão para se vingar, o Perth poderia fazer descer o chão até à cave e escapar-se pelo túnel. Se realmente o assassino entrasse no quarto, encontrá-lo-ia vazio, com as janelas fechadas por dentro, e nem rasto do velho Perth.

- Frank, aposto que acabaste de resolver o mistério! - disse Joe, entusiasmado. - Tudo encaixa agora, até a última exclamação do sobrinho, antes de morrer. Estava a tentar dizer o que tinha acontecido.

- O... o chão! Está a subir! Para o túnel... depressa!

Os rapazes escapuliram-se pela entrada do túnel e seguiram ao longo da passagem revestida de tijolos que ia dar ao meio da mata. Frank ia à frente. Tinham já percorrido cerca de dois terços do caminho quando ele parou de repente.

- Pára, Joe! Talvez esta não seja a melhor saída para nós, afinal de contas - murmurou para o irmão.

- Porque não?

- Agora o Strang já sabe que nós entrámos na mansão pelo túnel.

Joe suspirou baixo.

- O que significa que pode estar alguém de plantão junto à saída! - Fez uma pausa a ponderar a situação. - Céus, nem teríamos qualquer hipótese de os ver no escuro. A não ser que acendêssemos as lanternas, o que por sua vez nos denunciaria.

Os rapazes concluíram rapidamente que os riscos seriam demasiado grandes.

- Voto que tentemos entrar de novo pela cave e ver se conseguimos convencer o professor Darrow a ajudar-nos - disse Frank.

- Para começar, foi ele o primeiro a denunciar-nos - objectou Joe. - E foi ele quem gritou ao Strang que tu tinhas fugido do laboratório.

- Eu sei, mas nós à primeira causámos-lhe a maior surpresa - argumentou Frank. - Agora, com a expressão que ele tinha quando começou a subir a escada depois de ouvir o que o Makin disse... Bom, acho que deve ter ficado a pensar longamente.

- De qualquer forma, não temos mais nenhuma alternativa - admitiu Joe, cujo olhar de repente se iluminou: - Espera, Frank! Dá uma olhadela a esse tijolo que a tua luz está a focar!... É mais escuro que os outros.

- O que é que isso tem?

- Parece que o cimento à volta está meio solto - disse Joe, muito tenso. - O Nyland não nos disse que o velho Perth escondeu os documentos da sociedade num sítio onde ninguém lhes poderia chegar?

Frank deitou ao irmão um olhar entusiasmado.

- Empresta-me o teu canivete, Joe.

A lâmina do canivete passou facilmente à volta do tijolo solto. Num momento, Frank já o tinha removido. Por detrás da abertura havia uma concavidade profunda. Estava repleta de papéis e de pequenos sacos de pano.

Frank retirou-os todos, um por um. Os saquinhos continham uma quantidade espantosa de pedras preciosas, umas delapidadas, outras em bruto: diamantes, esmeraldas, rubis e safiras.

Havia também certificados de mercadoria, títulos da bolsa e documentos relativos a vários acordos comerciais. Entre os últimos, encontraram o contrato feito entre Perth e Karl Nyland e um mapa que mostrava o local do filão das ametistas, ambos assinados por Nyland.

- Uau! - murmurou Joe. - Achas que estas jóias pertenciam ao velho Perth e que o Strang encontrou o esconderijo, tal como o Karl Nyland Júnior pensa?

- Palpita-me que o Nyland tem razão. O Strang encontrou-as e está também a utilizar o túnel para esconder o produto dos seus roubos até as coisas acalmarem. Um desses sacos com diamantes está endereçado ao Paul Tiffman.

- Isso também explicaria o que se passou quanto às ametistas do Karl Nyland, as que ele trouxe ao Perth - concluiu Joe. - O Strang encontrou-as aqui e decidiu vendê-las, uma vez que não eram roubadas. Mas o Makin roubou-lhas do porta-luvas do carro.

Os rapazes encheram os bolsos com uma parte das jóias e enfiaram o resto dentro das camisas. Levaram também os documentos da sociedade com Nyland e, em seguida, continuaram pelo túnel em direcção à mansão.

A casa estava calma. Frank e Joe perguntaram-se se os homens andariam a fazer buscas nos terrenos circundantes. Pé ante pé, começaram a subir a escada de trás para o andar de cima. Aí, seguiram o corredor até ao laboratório do cientista.

O professor Darrow estava sentado à sua mesa de trabalho e segurava a cabeça entre as mãos. Olhou para a porta, alarmado, quando os Hardy entraram. O seu rosto parecia taciturno e pálido. Para alívio dos rapazes, não mostrou quaisquer sinais de hostilidade, nem fez sequer menção de pedir ajuda.

- Vocês são mesmo os filhos do Fenton Hardy? - perguntou, afastando com a mão a identificação que os rapazes pretenderam mostrar-lhe. - Não importa.

Os papéis podem ser forjados. O que conta é que eu acredito agora que são vocês e não o Strang quem está a dizer a verdade.

- Parece-me que a conversa do Duke Makin o esclareceu mesmo, não foi? - disse Frank calmamente.

Darrow acenou afirmativamente, com ar cansado.

- Tenho sido um grande idiota. O Strang conseguiu convencer-me de que financiaria o meu trabalho em prol do bem comum. Mas, em vez disso, esteve sempre unicamente interessado no meu aparelho de raios paralisantes para cometer crimes.

- Se quiser mais uma prova - interveio Frank -, nós encontrámos o local onde ele escondeu o produto dos roubos e temos aqui as jóias todas.

- O mais importante agora - lembrou Joe - é chamar o meu pai e a polícia. Posso utilizar o telefone?

Darrow voltou a fazer que sim.

- Claro, façam favor.

O rapaz pegou no auscultador do telefone e começou a marcar o número. Já ia a meio quando uma risada fria e ameaçadora ecoou através da linha e a ligação foi cortada!

 

Joe pousou o auscultador com uma exclamação alarmada e voltou-se para Frank:

- Apareceu alguém na linha e cortou-me a ligação! Acho que é coisa do Strang!

- Será que o Strang sabe de que quarto partiu a chamada? - perguntou Frank ao professor.

Darrow olhou tristemente para os rapazes.

- Sabe. Obviamente, a minha extensão está sob vigilância. Provavelmente, há um aparelho qualquer que emite um sinal e avisa o Strang mal eu pego no auscultador. Algumas vezes que tentei fazer umas chamadas para o exterior, o Strang cortou-mas sempre. A desculpa dele era que estava a manter-me seguro e fora do alcance da detecção dos espiões estrangeiros.

- Vamos! - exclamou Joe. - Temos de fugir! Darrow não fez qualquer esforço para escapar, mas os Hardy precipitaram-se pelo corredor em direcção à escada de trás. Strang, Barney e os outros homens vinham a subir por ali. Frank e Joe lançaram-se na direcção oposta, para se lhes depararem Hirff e mais dois homens que avançavam para a escada da frente.

- Para o laboratório! - exclamou Frank. - Vamos tentar fugir pela janela. Talvez possamos descer pelo algeroz!

Sem mais delongas, os rapazes recuaram até ao laboratório. Iam já a passar para fora da janela quando os criminosos abriram violentamente a porta e lhes apontaram duas pequenas pistolas de raios paralisantes.

- Parem onde estão ou vão ficar tão duros como carne congelada! - gritou Strang, levando os rapazes a voltarem-se para o enfrentar. - Estas preciosas armas que nós temos na mão são miniaturas daquele aparelho muito útil que o professor Darrow utilizou contra vocês há pouco. Achámo-las muito acessíveis e fáceis de manejar nos roubos de jóias.

- Por favor! - protestou Darrow em voz fraca. - Estes rapazes não vos fizeram mal nenhum. Deixem-nos ir embora. Talvez concordem em não vos entregar à polícia.

- Cale-se, seu imbecil! - A voz de Strang soou como uma chicotada. - Você está tão metido nisto como nós. Acha que podemos deixá-los ir quando eles sabem tudo acerca dos nossos golpes?

Darrow encolheu-se todo e Strang dirigiu-lhe um riso escarninho.

- Eu enganei-o desde o início, seu cabeça de ovo! Com que então achava que eu ia investir uma pipa de massa neste aparelho só para que você desenvolvesse as armas de raios paralisantes para a defesa nacional? E ainda por cima engoliu um monte de tretas sobre espiões!

Nova risada, um ar cada vez mais ufano e Strang continuou:

- O que você esteve aqui a fazer, Darrow, foi apetrechar-nos para o maior roubo de jóias de que jamais houve notícia. E as suas granadas de gás lacrimogénio de cor púrpura foram um bónus!

Os homens de Strang desataram às gargalhadas, todos ao mesmo tempo. A reacção deles incitou o chefe a vangloriar-se e, assim, foi respondendo às diferentes perguntas que Frank e Joe lhe fizeram.

O primeiro sinal de que os Hardy lhe andariam no encalço fora dado pelos rapazes quando o seguiram no carro pela primeira vez. Os gritos fantasmagóricos haviam prevenido o bando de que alguém andava a espiolhar perto da saída do túnel, por isso na manhã seguinte tinham resolvido camuflar a superfície de mosaicos com terra e arbustos. Nessa altura haviam encontrado o canivete com o nome de Frank.

Mais tarde, um dos homens de Strang saíra pelo túnel e deixara a passagem descoberta. O chefe deduzira logo que os Hardy deviam ter dado com ela.

Ao saber através de um jornal, que publicara um artigo sobre os primeiros casos que os jovens detectives haviam investigado, que eles possuíam um barco, Strang ordenara que o sabotassem.

- Achei que estavam mesmo a pedir um susto valente e talvez me visse livre de vocês para sempre - continuou Strang.

Os rapazes tinham escapado com vida, mas, quando o Nápoles ancorara perto do Seacat, um dos cúmplices, um tal Moose, lembrara-se de atacar Joe debaixo de água.

Tal como os Hardy haviam suspeitado, Strang enviara dois dos seus homens, Kelso e Trigger, a Chicago para executarem o assalto à Spyker, depois de terem dado uma falsa pista ao senhor Hardy.

Strang arranjara maneira de se encontrar a bordo de um avião no momento do roubo, para ter um álibi no caso de ser acusado do roubo. Chegara a Chicago mesmo a tempo de receber as jóias roubadas, que escondera num compartimento secreto do avião de Hirff e levara mais tarde para o esconderijo do velho Perth.

Kelso e Trigger entretanto haviam fugido para Gary, em Indiana, onde se tinham desembaraçado do carro utilizado na fuga após o assalto e tinham regressado depois a Bayport num avião das linhas comerciais.

- Como é que o Makin foi dar ao aeroporto na noite do roubo? - perguntou Frank.

- Ele seguiu o Waxie, que estava à espera que eu chegasse de Chicago. Mas não esperou muito antes que o Makin o apanhasse e o forçasse a abrir o hangar do Hirff para poder procurar as jóias. Depois, levou o Waxie de volta ao carro e encontrou as ametistas no porta-luvas. Deu-lhe uma pancada na cabeça e estava para o deixar ali, inconsciente, como um aviso de que tínhamos de contar com ele, quando vocês os dois e o outro detective apareceram e deram de caras com ele. O Makin fugiu e eu cheguei a seguir, mas tive de deixar as jóias dentro do avião do Hirff e apanhar um táxi de regresso à mansão.

O bando alugara a cabana na Angra dos Tubarões como um esconderijo de emergência, para fugir para lá no iate se a polícia aparecesse por perto. Jack Way-ne tinha sido levado para lá por Barney depois de ter contactado o Seacat por rádio.

- O que é que você planeava fazer com o Jack? - perguntou Joe.

- Ele contou ao Hirff que o vosso pai lhe devia dinheiro e não queria pagar-lhe, razão por que andava furioso, e além disso precisava de arranjar dinheiro depressa. Pensámos que estivesse a dizer a verdade e que se dispusesse a contar-nos o que vocês já sabiam de nós. Caso contrário, ver-nos-íamos livres dele rapidamente. O Barney ia mantê-lo na cabana até eu ter oportunidade de lhe fazer umas perguntas.

Depois de Joe ter fotografado o mapa do avião de Hirff, este informara logo Strang do sucedido e o chefe mandara os seus homens apoderarem-se do filme. Como todas as tentativas haviam falhado, Strang contactara Barney pelo rádio, ordenando-lhe que armadilhasse a cabana e fugisse no Skyhappy Sal antes que os Hardy lá chegassem.

Quanto ao golpe no edifício Haley, Kelso ouvira falar da entrega das pedras através de um empregado mais descuidado da companhia. Kelso penetrara no edifício durante as horas de expediente e escondera-se numa casa de banho. Mais tarde, dera entrada a Waxie por uma saída de emergência.

Haviam-se esgueirado os dois até à entrada, onde o guarda da noite estava sentado à secretária com as costas viradas para a escada. Tinham-no adormecido com a arma de raios paralisantes.

Depois disso, Kelso alterara as ligações eléctricas no elevador e Waxie trocara os números e placas das portas dos escritórios do sexto andar por duplicados do quinto andar. Kelso fizera-se passar por Paul Tiff-man para receber os diamantes das mãos do portador. Quando terminaram o trabalho, voltaram a adormecer o guarda e apagaram todos os vestígios da sua presença.

- Como é que o Makin soube que vocês estavam a planear esse roubo? - perguntou Frank.

Strang deu uma gargalhada.

- Arrancámos-lhe essa declaração à força, antes de o adormecermos. O tipo esteve a vigiar a mansão nesse dia e seguiu o Kelso até ao edifício. Quando viu que ele nunca mais saía, calculou logo que havíamos planeado um golpe ali.

- E aquela voz que eu ouvi no intercomunicador do túnel? - perguntou Joe, para manter Strang a falar.

O ladrão de jóias riu-se.

- Pensas bastante depressa, rapaz. Devo fazer-te justiça. O Trigger pensou que o Waxie se esquecera das ordens e estava a pedir um rápido esclarecimento.

- Felizmente percebi que o tipo do outro lado da linha não era o Waxie - interveio Trigger. - Ele é um idiota! É doido pelas máquinas que instalámos aqui. Falar pelo intercomunicador, fazer mover o chão do quarto para cima e para baixo, etc.

- Talvez o Waxie se tenha esquecido de repor o chão no sítio, na noite em que nós espreitámos pela janela - adiantou Frank, tentando ganhar mais tempo.

- O Waxie esqueceu-se de muitas coisas demasiadas vezes! - A voz de Strang enrouqueceu. - Da última vez, quase parti uma perna e fartei-me. Felizmente para ele que fugiu quando fugiu.

Entretanto o professor Darrow ligara furtivamente o seu aparelho de raios paralisantes. De repente, pegou nele e apontou-o para os malfeitores. Mas Trigger viu a manobra.

- Cuidado, chefe! - gritou, empunhando a sua própria arma.

Strang saltou para o lado no momento exacto. Mas Trigger não teve hipótese de usar a arma. O feixe luminoso disparado pelo cientista paralisou os cinco homens de Strang.

No salto para se desviar do clarão Strang desequilibrou-se por um momento. Os Hardy viram a oportunidade de escapar. Frank atordoou-o com um forte soco no queixo e Joe retirou-lhe a arma. Em poucos momentos, tinham submetido Strang.

- Será mais seguro se eu o adormecer - sugeriu o professor Darrow aos rapazes. - Os raios da minha máquina não provocam danos permanentes. Afectam simplesmente alguns centros nervosos e imobilizam temporariamente o indivíduo.

- Talvez tenha razão - concordou Joe, com um sorriso aberto. - Não temos algemas aqui.

Enquanto o professor adormecia Strang com o raio, Frank avistou uns faróis de carro através das árvores que rodeavam a mansão. Pouco tempo depois, Fenton Hardy, o chefe Collig e um grupo de polícias entraram pela casa dentro para fazerem uma busca. Ficaram boquiabertos quando viram todo o bando dominado.

- Parece que perdemos os preliminares e acção principal - comentou o detective para Collig com uma gargalhada.

O chefe da Polícia e os seus homens sorriram com satisfação.

- Eu diria que seis KOs são espectáculo suficiente para uma noite só - gracejou o primeiro.

- Sete - emendou Joe, sorrindo. - Acho que vai encontrar outro no quarto de hóspedes.

Depois de ter ouvido toda a história, o senhor Hardy e Collig mostraram-se muito orgulhosos de Frank e Joe. Mas os rapazes salientaram que fora o cientista que saíra vitorioso no último momento.

- Vejo que o senhor foi bem enganado, professor - disse o detective. - Os factos que talvez ainda não saiba são os seguintes: Strang e os seus homens mantiveram esta mansão debaixo de olho, considerando-a o esconderijo ideal. Quando o senhor a comprou, eles arranjaram uma história para justificar virem viver consigo e aproveitaram então para utilizar a arma de raios.

Frank acrescentou:

- E o Makin, ao tentar intrometer-se no bando, ofereceu-se para arrendar o local. Ele queria era descobrir se o grupo do Strang planeava servir-se da mansão.

O senhor Hardy continuou:

- Mas, professor, não há dúvida de que o senhor lhes trocou as voltas! Tenho a certeza absoluta de que quaisquer acusações que lhe sejam feitas cairão pela base perante a sua actuação no desfecho deste caso.

- Como é que cá veio parar, pai? - perguntou Frank, quando a polícia já levava os prisioneiros.

- Depois de ouvir a história do Chet e do Tony e ao ver que vocês dois nunca mais apareciam, achei que já era tempo de desvendar o mistério da mansão - respondeu Fenton Hardy, pondo um braço à volta dos ombros de cada filho.

- O que eu gostava de saber era quem inventou todos os alarmes fantásticos que estão montados em redor da casa - disse Joe.

O professor Darrow sorriu, cansado.

- Fui eu, em parte para afastar os intrusos e em parte também para me divertir - explicou. -- Foi na altura em que estava a fazer as ligações eléctricas dentro de casa que topei com o chão que sobe e desce do quarto de Perth e contei ao Strang.

No dia seguinte, a polícia localizou o barco alugado pelos Hardy e que os malfeitores lhes tinham roubado na Angra dos Tubarões.

Finalmente os dois rapazes e o pai foram ao hospital visitar Jack Wayne, que já estava consciente e a recuperar rapidamente.

- Então, lá desvendaram mais um caso, hem? - disse o piloto.

- Foram o Frank e o Joe - respondeu o senhor Hardy. - Mas todos nos sentimos desolados com a perda do Skyhappy Sal.

Jack sorriu.

- Não se preocupem. O aparelho estava no seguro, por isso em breve terei outro Sal novinho em folha.

- O pai diz que vamos receber uma grande recompensa em dinheiro - disse Frank - e metade cabe-lhe a si, Jack. Isso dá-lhe para comprar uma data de aparelhos úteis e engraçados para o seu novo avião.

- Nós continuamos muito curiosos sobre aquela transmissão que foi interrompida, Jack - lembrou Joe. - Que tal repetir-nos agora a mensagem completa?

Jack pensou por um momento e pediu em seguida um lápis e uma folha de papel, onde escreveu o seguinte:

"Vou voar até à Angra dos Tubarões para me encontrar com um tipo que o Hirff me indicou. Ele disse-me que se a Angra dos Tubarões passar a servir-lhes de refúgio, vão precisar de um piloto e eu poderei ganhar uma pipa de massa. Vou-me identificar com o nome de código Ametista. Volto a comunicar logo que possa."

Alguns dias depois encontraram as jóias que Makin roubara. Os peritos chamados ao local do filão declararam que, embora não fossem muito valiosas como pedras ornamentais, valia bem a pena explorar o filão para fins comerciais.

Mais tarde, Frank e Joe encontraram-se com Tony e Chet na quinta dos Morton e falaram das conclusões dos peritos.

- Acabaram-se assim todas as preocupações do Nyland - comentou Frank. - O Joe e eu tínhamos pensado utilizar uma parte do dinheiro da recompensa para pagar as contas do hospital da mulher dele, mas, sendo assim...

- A minha parte vai para ajudar o meu pai a comprar um carro novo - participou-lhes Tony.

- Vocês não têm imaginação nenhuma - retorquiu Chet.

- Ouve lá, Chet! E se tu investisses a tua parte na compra de algum material de investigação para nos ajudares no nosso próximo caso? - atirou-lhe Joe em tom provocador, sem suspeitar sequer que em breve iam aproveitar os conhecimentos de astrologia do amigo para resolver um novo mistério: Os Astros Não se Enganam.

- Ah, sim? - retorquiu Chet. - Apareçam na geladaria de Bayport e eu vou mostrar-lhes em que é que vou investir o meu dinheiro: num fornecimento para o ano todo do maior gelado de banana que vocês já viram nas vossas vidas!

 

  

                                                                 Franklin Dixon

 

 

 

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OS ASTROS NÃO SE ENGANAM

 

Uma sucessão de estrondos ecoou como um tiroteio nas ruas sossegadas de Bayport. Uma velha car-ripana dobrou a esquina e parou em frente da casa de Fenton Hardy, o famoso detective particular. O condutor era um rapaz gordo e sardento.

Frank Hardy, um jovem de 18 anos e cabelo escuro, e o irmão Joe, louro e um ano mais novo, adivinharam quem era o visitante antes de o ver.

- É o Chet Morton de certeza - exclamou Joe, espreitando pela janela. - E vem excitado!

Chet chamou-os com um aceno.

- Há grandes novidades no porto - disse, quando os dois irmãos já vinham a descer os degraus da entrada. - Venham.

- Que sucedeu? - Perguntou Frank.

- Metam-se no carro e eu explico-lhes no caminho.

Acomodaram-se os três à frente e Chet pôs o carro em andamento. O veículo arrancou com um solavanco e lá foi sacudindo os passageiros ao mesmo tempo que ganhava velocidade. Dirigiram-se para o porto de Bayport. Joe apoiou uma mão no tablier para se segurar.

- É melhor contares o que sabes antes que esta velha carripana decida descansar um bocado.

Chet riu.

- O senhor está a referir-se à menina dos meus olhos, mas deixarei passar essa observação, dadas as circunstâncias. Agora, a sério, há mesmo sarilho ali em baixo. Tem que...

 

                                                                              

 

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