Criar um Site Grátis Fantástico
Translate to English Translate to Spanish Translate to French Translate to German Translate to Italian Translate to Russian Translate to Chinese Translate to Japanese

  

 

Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


TRAMAS DA SEDUÇÃO / Diana Palmer
TRAMAS DA SEDUÇÃO / Diana Palmer

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

TRAMAS DA SEDUÇÃO

 

Foi em um daqueles dias abafados, característicos do final da primavera, que Nick Reed começou a se sentir inquieto outra vez. Trabalhar para a agência de detetives de Dane Lassiter, em Houston, tinha sido excitante e interessante a princípio, mas agora o desejo de voltar a viajar parecia não lhe dar mais paz.

Pela janela aberta do escritório ele podia ver o parque que havia em frente, onde a figura de uma mulher caminhando ao lado de um cachorrinho peludo logo lhe chamou a atenção, pois o fez lembrar-se de Tabby.                                              

Tabitha Harvey. Nos últimos meses Nick evitara pensar nela por causa do que acontecera quando ele e sua irmã, Helen, haviam ido a Washington D.C., sua terra natal, pouco antes das festas de fim de ano. Não fora surpresa nenhuma descobrir que Tabby também estava na cidade e que todos tinham sido convidados para a mesma festa de reveillon. Afinal, Tabby e Helen eram amigas de infância e não perderiam uma oportunidade para ficarem juntas.

Não passara despercebido a Nick o interesse com que Tabby o fitara durante toda a festa, nem o modo como apenas duas taças de ponche a tinham deixado com a cabeça nas nuvens. Com certeza a amiga de sua irmã não estava acostumada a beber, o que ficara provado quando ela praticamente se atirara em seus braços, num cantinho da varanda, começando a beijá-lo.

Durante alguns minutos ele correspondera aos beijos com ardor, saboreando os lábios doces e trêmulos, mas não demorara muito para afastar-se e exigir uma explicação.

Ainda um pouco tonta por causa da bebida, Tabby lhe havia dito que os dois seriam muito felizes juntos e que sempre soubera que ele viria procurá-la quando estivesse pronto para assumir um compromisso definitivo.

Nick não tinha idéia de onde Tabby tinha tirado aquelas idéias absurdas. Ele já pensara em aproximar-se dela com intenções românticas, mas isso fora há muitos anos... Portanto, Ao ouvir tamanhos disparates, perdera por completo a cabeça e dissera-lhe coisas horríveis, até vê-la abandonar a festa correndo, com o rosto delicado e triste banhado de lágrimas.

Pouco tempo depois ele fora para casa, a fim de arrumar as malas   para partir. Embora não tivesse contado uma palavra à irmã sobre o acontecido, supunha que Tabby o houvesse feito. Desde então, nunca mais a vira. Arrependia-se das coisas que lhe dissera, mas achava difícil procurá-la para pedir desculpas.

Uma repentina batida à porta arrancou-o de seus devaneios.

— Você já se decidiu? — Helen perguntou, entrando no escritório. Nick Reed virou-se lentamente, os olhos escuros contrastando com os cabelos muito louros.

— Sim.

— Vai fazer o que lhe pedi? — ela indagou com um sorriso.

— Já pensei sobre o assunto e a resposta é não, não vou fazer.

— Nick, por favor!

— Não insista, Helen. Você terá de conseguir sua informação de outra maneira.

— Oh, Nick, você precisa me ajudar! Afinal, sou sua irmã, já esqueceu?

— Na verdade, não — resmungou ele com total indiferença. Havia momentos em que Helen gostaria de torcer o pescoço de seu querido e teimoso irmão, mas se o fizesse só lhe restaria o noivo, Harold, como companhia.

— Além de ser o único ex-agente do FBI que trabalha aqui na agencia de detetives Lassiter, você tem contatos nos lugares certos. Bastaria alguns telefonemas... — resmungou ela.

Nick e Helen encararam-se por alguns segundos. Fisicamente, eram bastante parecidos, tinham olhos escuros, nariz reto e expressão decidida. Nick, entretanto, sempre fora mais introvertido e calado.

Ao longo dos anos, Nick viajara bastante a trabalho, como agente do FBI, enquanto Helen continuava seus estudos em Washington D.C. Por causa disso os dois irmãos já haviam passado meses, às vezes mais de um ano, sem se encontrar.

E então Nick recebera um convite de Richard Dane Lassiter, um velho amigo, para pertencer ao quadro de detetives particulares de sua recém-criada agência. Ele não hesitara muito em deixar o FBI e mudar-se de Washington D.C., para Houston, no Texas. Levara Helen consigo, como sua assistente, pois depois de dois anos freqüentando a escola comercial a jovem estava apta a ocupar a posição. Era bom os dois poderem ficar juntos outra vez, pois seus pais já haviam falecido e eles não possuíam outros parentes.

Ao mudar-se para Houston, Helen sentira muita falta de Tabitha Harvey, sua amiga desde a infância. Para matar as saudades, as jovens se correspondiam, embora Tabby tomasse o cuidado de jamais mencionar o nome de Nick em suas cartas. Pelo jeito, suas lembranças da festa de reveillon deviam ser ainda bastante dolorosas.

— Não — repetiu Nick, por fim. — Não vou telefonar para o pessoal do FBI.

— Então contarei tudo — ameaçou Helen.

— Contará o quê?

— Direi a Dane que você foi almoçar com aquela loura maravilhosa em vez de trabalhar no caso para o qual foi designado.

— Vá em frente, conte tudo. A tal loura é um dos meus contatos. Não costumo misturar trabalho e diversão, sabia?

— Ainda assim você se diverte bastante — Helen argumentou, subitamente séria. — E nunca leva as mulheres a sério.

— Não me atrevo a tanto. Afinal, não fui feito para o casamento, para a vida em família. Gosto de viajar, de me envolver em casos perigosos e excitantes. E também aprecio uma ou outra loura bonita, quando não estou trabalhando.

— É uma pena. Você daria um ótimo marido.

— E quem iria me querer?

Helen estava a ponto de mencionar o nome de Tabitha Harvey, mas lembrou-se de que da última vez em que o fizera Nick quase subira pelas paredes de tanta raiva. Embora os dois irmãos já tivessem voltado a Washington depois da fatídica noite de reveillon, para resolver problemas relacionados ao aluguel da casa que lhes fora deixada de herança pelos pais, Nick nunca comentara o ocorrido entre Tabby e ele. Não admitia sequer que a irmã tentasse tocar no assunto.

— Nick, os inquilinos já deixaram a nossa casa. Dessa vez eu não posso ir a Washington para resolver o assunto na imobiliária. Você pode? — indagou Helen, de repente.

— O que a impede de ir? — ele perguntou, irritado.

— Estou noiva, meu caro, ao passo que você é livre e desimpedido. Além disso você está planejando há meses tirar alguns dias de folga, e podia aproveitar a chance para resolver o problema da casa.

— É, suponho que sim — Nick murmurou de má vontade, olhando para a porta. — Aí vem o chefe, Helen. Acho melhor eu ir andando agora e deixá-los a sós.

— Algum problema? — Dane perguntou ao entrar na sala e notar a expressão contrariada dos dois irmãos.

— Nenhum chefe — Helen respondeu sorrindo. — Nick e eu discutíamos banalidades. Ele já está de saída, por sinal.

Nick assentiu com um gesto de cabeça e saiu do escritório.

— Muito bem, como está indo a investigação do caso Smart? — indagou Dane, em seguida.

— Preciso de uma determinada informação e não consigo obtê-la. Ninguém parece disposto a falar sobre a ligação entre Kerry Smart e o FBI, e meu irmão se recusa a me ajudar — respondeu Helen.

— Mas Nick conhece todo mundo no FBI — surpreendeu-se Dane.                                                                                

— Ainda assim ele não pretende cooperar. — E eu não posso obrigá-lo a fazê-lo. Nick nunca fala sobre o período cm que trabalhou para o FBI. Provavelmente não quer ter mais nenhum contato com a agência.

— É possível. Bem, acho que vou apelar para Adams. Ele conhece uma ou duas pessoas que podem nos ajudar.

— Ótimo, fale com ele.

— Ok. E como estão Tess e o bebê?

— Tess está ótima, mas o bebê chora a noite toda. O pediatra disse que isso é normal e que essa fase logo vai passar. Até lá, porem, Tess e eu seremos obrigados a ficar acordados, pajeando o bebê — concluiu Dane, com um suspiro resignado.

— Não se faça de vítima — brincou Helen. — No fundo, você adora cuidar do seu filho, não é mesmo?

— Claro que sim. Eu seria capaz de viver sem respirar, mas jamais conseguiria ficar longe da minha família.

— Pois é... Quem diria que um solteirão como você acabaria por se render aos encantos da vida familiar? Bem, dê lembranças minhas à Tess e ao bebê. Agora, se me der licença, vou trabalhar.

Helen pegou suas coisas e rumou para a sala de Adams, desejando ter tempo disponível para visitar a esposa de Dane. Elas eram boas amigas, mas desde que o bebê havia nascido Tess se distanciara um pouco de Helen e aproximara-se mais de Kit, uma outra amiga que também dera à luz.

Adams ouviu o pedido de Helen e, depois de um único telefonema para o escritório do FBI, obteve a informação que ela desejava com tanta ansiedade.

— Belo trabalho! — exclamou Helen, entusiasmada. — Obrigada, Adams.

— Disponha. Ouça, que tal irmos tomar um drinque hoje, depois do expediente? Sei que você está noiva, portanto não precisa se preocupar, este é apenas um convite de amigo. E então, aceita?

— Aceito, desde que você não faça questão de pagar a conta sozinho.

— Combinado — respondeu ele, conduzindo-a até a porta. Helen afastou-se sentindo uma certa pena do colega, pois sabia ele era um homem solitário, sedento de companhia.

— Sobre o que você e Adams estavam conversando? — Nick perguntou, surgindo de repente por detrás dela.

— Que susto! Não o ouvi chegar — reclamou Helen.

— Claro que não ouviu. Sou um detetive particular, treinado para espreitar pessoas sem ser notado.

— É mesmo? — indagou Helen, irônica. — Grande novidade.

— Agora conte-me, o que estava fazendo na sala de Adams, irmãzinha? Tentando fugir às tentativas de aproximação dele?

— Não seja cruel, Nick, Adams é um sujeito legal.

— Eu também acho, só que ele costuma grudar nas pessoas e nunca desconfia quando está sendo inconveniente,

— Ora, que maldade — ela comentou, rindo.

— Você sabe que tenho razão. Embora seja boa pessoa, Adams muitas vezes é um chato. E então, conseguiu a informação que queria?

— Sim. E sem contar com a sua ajuda.

— Eu preciso mesmo ensiná-la a ser auto-suficiente. Afinal, não estarei sempre por perto.

— Nick... Está com algum problema? — Helen indagou, preocupada.

— Calma, não estou doente e nem prestes a morrer. Estou apenas ficando inquieto. Talvez eu me mude em breve.

— Vontade de viajar, outra vez?

— Ficar num mesmo lagar por muito tempo sempre me deixa entediado.

— Por que não vai para a nossa casa em Washington? Tire férias. Relaxe.

— Férias em Washington? Engraçadinha!

— Nick, você sabe que nossa casa fica num bairro calmo, cheio de paz e quietude. É o lugar ideal para quem precisa de alguns dias de descanso e solidão.                

— Solidão? Com Tabby vivendo na casa ao lado?

— Minha amiga está namorando um historiador, parece que o compromisso é sério. Sendo assim, você não precisará se esconder ou evitá-la.

— Mas ela não estava namorando ninguém quando estivemos cm Washington no começo do ano — observou Nick, mau humorado.

— Muita coisa pode acontecer em poucos meses. Tabby tem vinte e cinco anos e um bom emprego. Já está na hora de pensar em casar-se e ter filhos.

Nick ficou em silêncio durante um momento, sentindo-se traído, embora não conseguisse entender porquê. Tentando aparentar indiferença, resolveu mudar de assunto.

— Então, você conseguiu a informação que desejava através de Adams?

— Sim, e agora poderei dar o caso por encerrado. Dane acredita que conseguiremos livrar nosso cliente do processo.

— Ótimo. — Nick tocou o rosto da irmã de leve, numa carícia terna. — Por acaso você pensou que eu me recusei a entrar era contato com o pessoal do FBI por que tinha bons motivos para me manter afastado?

Helen permaneceu calada e fitou o irmão fixamente, apreciando a beleza do rosto de traços másculos e marcantes.

— Por que você está me olhando desse jeito?— indagou ele.

— Estava apenas pensando que você e um pedaço de mau caminho — respondeu ela, sorrindo. — Você se parece com papai, sabia? Não é de se estranhar que as mulheres se joguem aos seus pés. Quanto ao FBI, imagino que você evita falar sobre os anos em que trabalhou lá porque sente saudades.

— Realmente, às vezes sinto falta daquela vida, mas não é boa idéia falar do passado. Há feridas que nunca cicatrizam. — Sim, suponho que esteja certo.

— Ok, que tal sairmos para comer algo enquanto decidimos o que fazer com a casa em Washington? Estou ficando cansado dessa história de aluguel. Talvez fosse melhor vendê-la.

— Vender a casa? Ficou maluco, Nick?

— Eu sabia que você ia reagir assim. Venha, vamos comer. Poderemos brigar durante a sobremesa.

 

Nick levou a irmã a um restaurante luxuoso especializado cm frutos do mar. Helen hesitou por alguns segundos antes de entrar, sentindo-se deselegante no seu velho conjunto de saia preta e blusa branca.

— O que foi, agora? — indagou Nick, impaciente.

— Não estou vestida de maneira adequada para um lugar como este. Será que não poderíamos ir a um restaurante mais barato?

— Mais barato?

— Uma lanchonete, por exemplo. Pediríamos hambúrguer, cachorro-quente, batatas fritas...

— De jeito nenhum. Vamos entrar, garota.

Nick conduziu a irmã a uma mesa para dois e brincou: — Espero que você não seja do tipo que só come pizza, pois não há esse prato no cardápio.

— Se quer saber a verdade, Harold e eu já estamos um pouco cansados de pizza e sanduíches.

— Gosto do serviço daqui — comentou Nick, apreciando a atmosfera aconchegante criada pela suave música ambiente. — Além disso, a comida é deliciosa.

Uma garçonete loura aproximou-se e entregou-lhes o cardápio, os olhos fixos em Nick.

— Obrigado, Jean.

A mulher sorriu e afastou-se, lançando um olhar invejoso para Helen.

— A garçonete parece gostar de você, irmãozinho.

— Eu sei. Gosto dela também, mas não passa disso. A propósito, Helen, pare de bancar a casamenteira. Você apenas complica as vidas das pessoas.

— Isso é uma indireta? Do que está falando, afinal?

— Na última vez em que fomos a Washington, você praticamente jogou Tabby em meus braços durante a festa de reveillon, dizendo a ela que eu tinha vindo de Houston apenas para vê-la.

— Não pensei que alguém fosse sair magoado — murmurou Helen, notando a amargura na voz do irmão.

— De onde Tabby tirou a idéia de que meus sentimentos haviam mudado e que eu buscava um relacionamento sério? Confesso que fui pego de surpresa e disse-lhe coisas pouco delicadas, fazendo-a chorar. Desde que conheço Tabby, aquela foi a primeira vez em que a vi em prantos. Ainda me sinto mal quando penso no acontecido.

— Então você perdeu a cabeça...

— Fui pego de surpresa, já disse. Tabby estava falando sobre seu trabalho no departamento de arqueologia da universidade, e de repente começou a falar sobre um futuro a dois.

— O ponche tinha álcool demais — Helen murmurou, tentando desculpar-se. — E eu servi duas taças a Tabby.

— Só percebi que ela estava ligeiramente alta quando o estrago já tinha sido feito. Aquela súbita demonstração de afeto me deixou em pânico. Tabby è uma boa garota, mas não faz muito o meu tipo.

— E posso saber que tipo o atrai? É inacreditável esse seu apego absurdo à vida de solteiro. Tabby é uma mulher bonita e interessante.

— Mas ela pode muito bem viver sem mim. Uma casa aconchegante e uma vida tranqüila a dois não fazem parte dos meus planos. Quero viajar pelo mundo, é para essa finalidade que venho guardando dinheiro. Além do mais, gosto do meu trabalho de investigador, embora esteja começando a me sentir um pouco cansado.

— Tabby trabalha no ramo de investigação também, sabia? Antropólogos procuram soluções para mistérios que envolvem civilizações antigas, tentam descobrir como viviam os povos pertencentes a culturas milenares.

— Só que nenhuma múmia de dois mil anos vai levantar do sarcófago e apontar uma arma para Tabby.

— Provavelmente não. Mas o fato é que vocês dois gostam de viver em busca da verdade.

— Eu não pretendia magoar Tabby daquela maneira — Nick falou de súbito. — Fui ríspido, insensível.

— Bem, agora isso faz parte do passado. Tabitha está namorando firme e você não precisa se preocupar enquanto estiver em Washington, ainda que ela more sozinha na casa ao lado da nossa.

— É, tem razão.

Nick não estava ansioso para rever Tabby, e provavelmente ela também não desejava vê-lo nunca mais. Afinal, ambos eram do tipo que não perdoavam a si mesmos quando perdiam o auto-controle. Tabby ainda estaria recriminando-se por ter-se atirado nos braços de um homem que não a queria, enquanto Nick não conseguia perdoar-se por ter dito palavras tão duras.

— Tudo dará certo — Helen falou com suavidade ao ver a expressão preocupada no rosto do irmão.

— Você e sua frase favorita... E se nada der certo?

— Pelo amor de Deus, pense de maneira positiva, Nick! Agora vá comprar uma passagem e embarque no primeiro avião para Washington.

Dois dias depois, com a devida aprovação de Dane Lassiter, Nick rumou para a velha casa dos pais em Torrington, um bairro residencial afastado do centro de Washington. Tudo estava igual como era antes, pensou ele, enquanto dirigia devagar pela rua calma e admirava as árvores frondosas de tempos de infância.

A temperatura agradável aumentava ainda mais a sensação de paz e bem-estar, fazendo-o perceber pela primeira vez o quanto estava cansado. Estava mesmo precisando de alguns dias de folga, embora a princípio tivesse resistido à idéia de sair de Houston.

Ainda faltava muito para o fim do dia, portanto Nick não precisava se preocupar com a possibilidade de ver Tabby tão cedo; ela costumava voltar do trabalho apenas ao anoitecer. Entretanto, a imagem da morena alta, esguia, de cabelos compridos e doces olhos castanhos não lhe saíam da cabeça.

Pobre Tabitha. Por que Helen dera falsas esperanças à amiga, levando-a a agir como uma tola na festa de reveillon?

Embora se conhecessem desde a infância, Nick nunca imaginara que Tabby pudesse alimentar sentimentos românticos a seu respeito. Pelo menos, não até à festa de passagem de ano... Só esperava que o atual namorado dela a amasse e a fizesse feliz, e assim novas cenas constrangedoras seriam evitadas.

A vida doméstica não era para ele, por isso vinha pensando em se candidatar a um cargo na Interpol ou ir trabalhar como fiscal alfandegário no Caribe. Preferiria morrer a viver amarrado a alguém, sem se sentir senhor de suas ações.                      

Nick estacionou o carro que alugara defronte à casa onde crescera e permaneceu imóvel, olhando para ela, por vários minutos. Lar. Há anos ele não pensava em como era bom ter um lugar para o qual sempre pudesse voltar. Era estranho como podia prezar tanto a liberdade e ao mesmo tempo gostar de estar ali, sabendo que aquela casa era sua. O sentimento de posse era novo para Nick, assim como a sensação de vazio que o vinha atormentando desde o Natal. Nunca se sentira solitário antes. Por que, agora, tinha a sensação de que lhe faltava algo importante, quando sempre considerara sua vida tão movimentada e excitante?

Ao abrir a porta da frente da casa, Nick sentiu no ar um perfume que lhe falava de infância, de aconchego e amor. Tudo ali permanecia como seus pais haviam deixado ao morrer, nada fora mudado de lugar. Duas vezes por semana uma faxineira vinha cuidar da limpeza, portanto o lugar permanecia impecável, mesmo quando desabitado. Ver-se rodeado por objetos familiares e queridos deu a Nick uma profunda sensação de segurança, sensação que jamais pensara experimentar, pois julgava-se um homem sem raízes.

Vender a casa com toda a mobília lá dentro havia parecido uma boa idéia a princípio. Agora, ele já não tinha tanta certeza.

Depois de deixar sua bagagem num dos três quartos do segundo andar, Nick foi ao supermercado comprar mantimentos. Ao voltar, reparou num carro azul estacionando na garagem vizinha.

Uma mulher alta e elegante saiu do veículo e, sem sequer lançar um olhar na sua direção, entrou na casa ao lado.

Tabitha. Ela não tinha mudado nada, embora Nick a olhasse de maneira diferente agora, sem saber porquê.

Depois de alguns segundos ele entrou também, ajeitou as compras na cozinha, fez café e preparou um jantar simples, bife e salada. Enquanto comia, tentava entender porque Tabby se mostrara tão indiferente à sua presença, pois era impossível que ela não o tivesse visto.

O que acontecera no reveillon fora uma pena. Nick e Tabby conheciam-se há anos, era quase como se fossem da mesma família. Seria bom se pudessem sentar-se à mesma mesa e conversar sobre os tempos de criança, quando passavam horas brincando e correndo juntos pela vizinhança. Agora, porém, era provável que Tabby nunca mais lhe dirigisse a palavra.

Depois de terminar a refeição, Nick lavou a louça e sentou-se na sala de estar, com um livro de Agatha Christie nas mãos. Não havia nada como uma boa leitura, em lugar dos programas tolos que passavam na tevê.

O toque súbito da campainha, meia hora mais tarde, tirou-o da leitura. Curioso sobre quem poderia estar à sua procura às nove horas da noite, não perdeu tempo em atender.

E lá estava Tabby. Com os cabelos presos num coque severo, os óculos empanando a beleza dos olhos e uma expressão séria no rosto, ela era a própria imagem da preocupação.

— Olá — Nick cumprimentou-a, sorrindo.

Ela não retribuiu o sorriso, apenas fitou-o fixamente ao dizer:

— Eu não o teria incomodado se conhecesse outros detetives. O fato de você ter vindo para casa hoje é muito providencial.

— É mesmo? Por quê?

— Estou sob suspeita — Tabby murmurou, esforçando-se para manter o auto-controle. Num gesto de orgulho, ergueu a cabeça e continuou: —Não peguei nada e ainda não fui formalmente acusada, mas apenas eu tinha acesso ao objeto desaparecido. Trata-se de um pequeno vaso sumério, com sinais de escrita cuneiforme. Acham que fui eu quem o roubou.

 

— Você, uma ladra? Impossível! Eu a conheço desde menina e sei que não seria capaz de ficar com algo que não lhe pertence.

— Obrigada pelo voto de confiança, mas preciso provar minha inocência. Se você está planejando ficar na cidade por mais alguns dias, gostaria de contratá-lo para me ajudar.

— Contratar-me? Pelo amor de Deus, Tabby, sou seu amigo. Não quero ser pago por nada.

— Trata-se de trabalho — respondeu ela com firmeza. — Posso arcar com as despesas e nunca usaria nossa amizade para aceitar seus serviços de graça.

— Calma, não é preciso ser tão orgulhosa assim — Nick falou sorrindo. — Entre vamos conversar sobre o assunto.

— Eu... Não posso entrar.

— Por que não?

— Já é tarde e você está sozinho em casa.

— Está mesmo falando sério? — indagou ele sem disfarçar o espanto. — Será que está com medo por que bebeu um pouquinho antes de vir me procurar? — perguntou com um brilho maroto no olhar.

— De jeito nenhum! — Tabby respondeu corando. — Aliás, gostaria que você esquecesse o que aconteceu na festa de reveillon. Não estou acostumada a beber, e naquela noite o ponche me subiu à cabeça.

— Sei disso, pois a conheço bem.

— Uma situação como aquela jamais se repetirá. Só espero não tê-lo embaraçado.

— Não foi nada. Tem certeza de que não quer mesmo entrar? Afinal, não costumo fazer sexo com mulheres que me procuram com propostas de trabalho.

— Por favor, pare de brincar — pediu ela, as faces em fogo.

— Ok, como quiser.

— Pensei em lhe dar todos os detalhes do caso amanhã, durante a hora do almoço...

— Podemos conversar agora. — Nick acendeu a luz da varanda e convidou-a a sentar-se num dos degraus. — Sob a claridade, toda a vizinhança poderá ver que não estamos nus. Sente-se mais tranqüila, agora?

— Nick!

— Vamos, não seja tão antiquada. Você parece estar vivendo na Idade Média, ainda.

— É preciso que alguns de nós mantenham certas regras de decoro ou a civilização atual desaparecerá em breve — retrucou ela, exaltada. — Você já reparou como as coisas estão indo de mal a pior na estrutura social?

— Seria impossível não perceber.

— Drogas, maníacos sexuais, famílias inteiras vivendo pelas ruas, assassinos psicopatas à solta. São esses problemas sociais que provocam a ruína de grandes civilizações.

— Sem dúvida, só que a maioria das pessoas não parece nem um pouco preocupada com isso. — Nick tocou-a de leve no rosto e pediu: —Agora conte-me tudo o que aconteceu, Tabby. Que história é essa de roubo?

— Meus alunos estão estudando o povo dos sumerios e eu decidi levar um objeto valioso, datado daquela época, para mostrar-lhes durante a aula. Trata-se de uma peça única. Como eu já disse, é um vaso com sinais de escrita cuneiforme. A universidade pagou uma pequena fortuna para obtê-lo. É um objeto raro, insubstituível. Custou milhares de dólares.

— Como foi que ele desapareceu?

— Depois da aula deixei o vaso sobre a mesa do meu escritório e saí da sala por cinco minutos para atender uma aluna. Quando voltei, não o encontrei. Não há quem possa testemunhara meu favor. Ninguém pode provar que eu não roubei a peça.

— A aluna que a chamou não pode depor a seu favor?

— Ela pode dizer apenas que esteve comigo, mas não pode afirmar nada em relação ao vaso porque nem chegou a vê-lo,

— Então não há nenhuma testemunha?

— Não.

— Quem teria interesse em roubar a peça? Você disse que era valiosa...

— O vaso é valioso apenas para colecionadores. A maioria dos estudantes vê o objeto como uma simples curiosidade. Somente alguns membros da universidade, como Daniel, por exemplo, conhecem o valor real do vaso.

— Quem é Daniel?                      

— Um amigo. Daniel Myers, Nós... Temos saído juntos. Ele é honesto — Tabby apressou-se a dizer. — É um homem íntegro, seria incapaz de roubar qualquer coisa.

— Todos os ladrões são íntegros, até que a ganância os faz esquecer seus bons princípios.

— Não seja injusto, Nick. Você nem mesmo conhece Daniel.

— Tem razão — ele respondeu de má vontade, aborrecido ao vê-la defender Daniel com tanto empenho. — Me fale sobre esse seu amigo.                                                                                    

— Daniel é um homem gentil. É divorciado, tem um filho entrando na adolescência. Mora no centro de Washington e ocupa um cargo na universidade onde trabalho.

— E o que mais?

— É alto, elegante e muito inteligente.                                      

— Ele a ama?                        

— Não creio que você precise conhecer detalhes da minha vida   pessoal para resolver o problema do roubo, Nick. Por que não nos limitamos a falar de minha vida profissional?

— Porque não existe mais ninguém para tomar conta de você, e de certo modo estou me sentindo responsável pelo seu bem-estar.

— Eu já vinte e cinco anos e sei tomar conta de mim mesma. Além do mais você é apenas cinco anos mais velho que eu, não tem idade para bancar meu pai.                                                      

— Tabby, ouça...

— Daniel quer casar-se comigo — declarou ela, por fim, interrompendo-o.

— Isso não significa, necessariamente, que ele a ama — argumentou Nick.

—Você vai aceitar o caso ou não? — Tabby perguntou, mudando bruscamente de assunto.

— Claro. Mas é melhor que Daniel Myers não interfira.

— Ele não irá interferir — afinal Tabby, com certa reserva. Daniel costumava julgar-se superior a quem quer que fosse e com certeza não iria gostar de Nick. O pior era que Nick já não gostava de Daniel. Sem dúvida, a situação seria bastante delicada.

Mas Tabby precisava da ajuda de um profissional e, segundo Helen, Nick era um excelente detetive.

— Eu gostaria de ir à universidade amanhã e conhecer seu local de trabalho — disse ele.

— Amanhã é sábado.

— Portanto não haverá aulas, o que facilita meu trabalho.

— Eu ia às compras com Daniel, amanhã.

— Ele pode comprar roupas outro dia.

— Não íamos comprar roupas, e sim um anel de noivado.

Nick desviou o olhar, aborrecido com o que acabara de ouvir.

Odiava a idéia de ver Tabby ficar noiva, embora não conseguisse entender bem porquê. Resmungou, irritado:

— Bem, vocês terão de adiar o programa. Ficarei na cidade só até a próxima sexta-feira.

— Ok, vou telefonar para Daniel ainda hoje e explicar o contratempo.

— Ótimo. — Ao vê-la levantar-se para ir embora, Nick levantou-se também, sem esconder a preocupação, perguntou: — Seus colegas de trabalho ainda não conhecem o seu caráter, Tabby? Não percebem que você seria incapaz de roubar?

— Claro que sim, mas a situação está contra mim. Minha sala estava trancada quando o vaso sumiu, e só eu tenho a chave da porta.

— Tente não se preocupar — ele aconselhou, mesmo sabendo que se tratava de um caso difícil. — Conseguiremos resolver o problema.

— Obrigada, Nick.

— Não precisa agradecer. Telefono para você amanhã, às oito. É cedo demais?

— Costumo me levantar ao amanhecer.

— Como nos velhos tempos... Espero que não esteja planejando escalar a calha e entrar pela janela de um dos quartos da minha casa.

— Isso só aconteceu uma ou duas vezes, anos atrás. E foi no quarto de Helen que eu entrei.

— Você era um verdadeiro moleque, Tabby. Craque no beisebol e no futebol, capaz de subir nas árvores mais altas. Você não parece muito diferente, hoje.

— É, eu sei. Não importa a quantidade de calorias que eu coma, não consigo engordar um grama.

— Espere até chegar à meia idade.

— Ainda vai demorar alguns anos.

— Sim, muitos anos. Acho melhor você ir dormir, agora.

— Sim já é tarde. Boa noite.

Nick ficou na varanda, observando-a entrar na casa vizinha. Os velhos tempos... Não valia a pena pensar no passado, pois era sempre perigoso abrir a porta das lembranças.

Ele entrou e tentou retomar a leitura do livro, mas não conseguiu concentrar-se. O melhor mesmo era ir para a cama e tentar dormir, embora não estivesse acostumado a deitar-se tão cedo.

Às oito horas da manhã do dia seguinte Tabby já estava pronta, vestindo uma saia estampada e blusa branca, quando Nick tocou a campainha. Usando calça jeans e camisa azul com as mangas arregaçadas, ele parecia mais másculo e perturbador que nunca.

— Você precisa usar seus cabelos sempre presos nesse coque severo? Há séculos não os vejo soltos — reclamou Nick, antes mesmo de dizer "bom dia".

— Só costumo soltá-los à noite — respondeu Tabby.

— Para agradar Daniel?

— Vamos no seu carro ou no meu? — ela perguntou, ignorando a provocação.

— No meu, claro. Gosto de ter espaço para dirigir.

— O banco do meu carro é reclinável.

— Mas não é confortável guiar deitado.

— Nick!

— Vamos — disse ele, abrindo a porta do carro e ajudando-a a entrar. — Você indicará o caminho, pois faz muito tempo que não dirijo por aqui.

— Ora, faz apenas quatro anos que você deixou o FBI e foi embora de Washington.

— Às vezes tenho a sensação de que já passaram séculos...

— Suponho que Houston seja uma cidade bastante diferente de Washington.

— Não muito. Selvas de pedra costumam ser parecidas — disse ele, pondo o carro em movimento.

— É mesmo? Não conheço muitas cidades grandes, modernas. Viajo mais para lugares primitivos, isolados.

— Onde são feitas escavações arqueológicas?

— Sim. Já estive em Montana, ajudando arqueólogos e antropólogos a identificar restos encontrados no campo de batalha onde o general Custer foi derrotado. Também estive no Arizona, visitando as ruínas hohokan, e na Geórgia, participando de escavações que trouxeram à luz uma cabana do século dezoito.

— Parece excitante— comentou Nick, sem muita convicção.

— Embora possa parecer enfadonho, para mim tratasse da coisa mais interessante do mundo —afirmou Tabby, fazendo-lhe sinal para entrar numa determinada rua. — Eu adoraria, por exemplo, poder visitar a área dos aborígenes na Austrália e explorar algumas das ruínas gregas e romanas que estão começando a ser escavadas agora. Também gostaria de visitar Machu Pichu, no Peru, e as pirâmides maias, na América Central. Isso sem falar nas maravilhas que podem ser encontradas na África, na China... Há um mundo de mistérios à nossa volta, esperando para serem desvendados!

— Você parece um detetive falando.

— Creio que de certa forma sou um detetive. Procuro pistas no passado, enquanto você as procura no presente. Mas no final das contas, trata-se do mesmo trabalho de investigação.

— Imagino que sim. Depende do ponto de vista de cada um. Eles permaneceram em silêncio durante algum tempo, até que Tabby comentou:

— Reparei que você não está mais fumando.

— Parei há cinco semanas. Quando Lassiter resolveu largar o cigarro, fez a maior propaganda, pedindo a todos do escritório que parassem de fumar também. Eu me entusiasmei com a idéia, e até agora tenho conseguido resistir à tentação. Na verdade foi Tess quem insistiu para que Lassiter deixasse o vício. Quem diria, hein? Aquele machão sendo manipulado por uma mulher...

— Duvido que Tess o esteja manipulando. Lassiter simplesmente a ama e quer vê-la feliz. Além do mais, ele viverá mais tempo parando de fumar.

— Todos nós vamos morrer um dia. A diferença é que alguns partem mais cedo, outros mais tarde.

— É a lei da entropia.

— Lei da entropia?

— Exato. É assim que os cientistas se referem ao fato de que tudo envelhece e morre, mais cedo ou mais tarde.

— É uma pena não sermos capazes de encarar a morte com a frieza dos cientistas— Nick comentou.                                  

— Não seja sarcástico — ralhou ela, fazendo-lhe sinal para entrar no estacionamento reservado aos visitantes da universidade. — Pode parar aqui, já está bom.

— Por que não podemos parar do outro lado do estacionamento, mais perto dos prédios?

— Porque você não pertence à universidade e seu carro seria guinchado, parando numa vaga que não lhe pertence.

Sem nada responder, Nick saiu do carro e abriu a porta para Tabby.

— Quanta gentileza — ela falou com delicadeza exagerada.

— Quando quebrei a perna, anos atrás, você se cansou de me levar ao trabalho e de abrir a porta para mim — resmungou ele.

— Eu era tão boazinha — Tabby murmurou com uma ponta de melancolia.—Ah, os velhos e bons tempos...

— Você era um pouco menos irritante, também.

— Devolvo-lhe o cumprimento, Nick. A propósito, suponho que você terminará sua vida metido num tiroteio com espiões ou qualquer coisa do gênero.

— Que idéia encantadora. É muito amável da sua parte.

Ela desistiu de continuar a provocá-lo e conduziu-o até um dos prédios, dizendo:

— Meu escritório fica no segundo andar.

Subiram alguns lances de escada, passando pelas salas do departamento de história e de sociologia, até entrarem num largo corredor.

— O departamento de sociologia é pequeno, embora ofereça cursos interessantes— comentou Tabby.

— Estudei um pouco de sociologia quando fiz direito. São assuntos que se completam, você sabe.

— É verdade. Entre — ela convidou, abrindo a porta de seu escritório. —O laboratório de biologia fica do outro lado do corredor. O pessoal mudou-se para cá enquanto o laboratório principal é reformado. Eles têm cobras ali dentro — murmurou, com um arrepio de asco.

— Foi uma delas que acabou de gritar? — Nick indagou, irônico, ao ouvir um berro primitivo ecoar pelo local.

— Cobras não gritam. Foi Pai que berrou — respondeu Tabby, sorrindo.

— Quem?

— Pai é um macaco inteligentíssimo que precisa ser mantido trancado por causa de certos hábitos inconvenientes, como, por exemplo, rasgar todos os livros que encontra por perto e sumir com todas as chaves que vê pela frente.

— Ele fica na gaiola o tempo todo?

— Em geral, sim, mas sempre consegue-dar um jeito de sair da gaiola e aprontar as maiores confusões, como no dia em que invadiu a sala de conferências e começou a atirar pedacinhos de pão no nosso convidado de honra.

— Aposto que todo mundo riu.

— Talvez o pessoal da faculdade tenha achado divertido, mas o nosso convidado, um senador de Maryland, não viu a menor graça na coisa. Por Causa disso, deixamos de receber a doação que nos permitiria iniciar uma pesquisa sobre o comportamento social dos primatas. Bem, cá estamos — ela falou em seguida, mostrando a sala pequena e simples, abarrotada de livros. — Passo muitas horas de trabalho aqui dentro. Pertenço ao conselho da universidade e dou aulas de antropologia no meu tempo livre.

— Você sempre foi uma intelectual brilhante — Nick comentou, fitando-a com admiração e curiosidade. — Às vezes me sentia ameaçado, pois por mais que soubesse sobre um assunto, você parecia saber ainda mais.

— Ser considerada uma intelectual pode ser uma maldição quando se é muito jovem — ela murmurou com uma ponta de amargura. — Mas pelo menos a inteligência dura mais que curvas exuberantes e um rosto bonito.

— Não há nada de errado com seu corpo, embora não lhe fizesse inal algum engordar um ou dois quilos — disse Nick, com um sorriso carinhoso.

— Bem... Era sobre esta escrivaninha que o vaso estava logo antes de desaparecer — disse Tabby, indicando o móvel.

— Quando foi que ele sumiu?

— Ontem à tarde.

— Ok, pode ir ler um livro ou dar alguns telefonemas enquanto eu me distraio com uma pequena investigação.

— O que você pretende fazer?

— Vasculhar sua escrivaninha à procura de impressões digitais e outras pistas, é claro. Alguém entrou na sua sala depois do roubo? Não? Ótimo, isso vai facilitar meu trabalho.

Tabby fitou-o por um instante, ansiosa para fazer perguntas, mas desistiu de falar ao vê-lo tirar uma caderneta do bolso e começar a rabiscar uma série de anotações. Discreta, retirou-se do escritório.

Momentos depois Nick afastou-se da mesa, sem esconder a irritação. Não havia uma única impressão digital completa sobre a superfície áspera; tudo que conseguiu descobrir foi um fio, parecido com cabelo, que guardou num saco plástico. Se fosse mesmo um fio de cabelo humano, o laboratório do FBI poderia examiná-lo e descobrir a quem pertencia.

— Encontrou algo? — Tabby perguntou, esperançosa, ao voltar ao escritório.

— Quase nada. Não há uma única impressão digital, e...

Ele parou no meio da frase ao avistar um homem alto e de expressão arrogante à porta. Em plena manhã de sábado o sujeito estava vestindo temo e gravata, demonstrando ser um tipo formal.

— Este é o dr. Daniel Myers — Tabby apresentou o namorado, que não se deu ao trabalho de estender a mão para um cumprimento.

— Nick Reed — o detetive apresentou-se, também sem estender a mão.

— Você deve agir com discrição, Reed —   avisou Daniel. — Estou certo de que compreende os efeitos negativos que um episódio como esse pode ter sobre a universidade.

— Claro. Também compreendo muito bem como o caso pode afetar o futuro de Tabby.

— Tabby?

— É um apelido de infância. A família dela e a minha sempre foram muito amigas.              

— Parece nome de gato, você não acha, minha querida? — indagou Daniel, passando um braço ao redor dos ombros delicados de Tabitha.                                                      

Nick teve vontade de separar o casal, embora não entendesse muito bem sua própria reação. Considerava Tabby como a uma irmã, talvez estivesse apenas sendo superprotetor. Sim, só podia ser isso.

— Vou levar o material que colhi para o laboratório do FBI — anunciou Nick. — Tenho um amigo lá.

— Ele costuma trabalhar aos sábados? —indagou Tabby.

— Não. Irá trabalhar hoje apenas porque eu lhe pedi.

— É muita gentileza — disse ela, agradecida.

— Posso lhes dar uma carona antes de ir para o laboratório — Nick ofereceu, tentando parecer natural.

— Não será preciso. Tabitha deve ter lhe dito que planejamos comprar um anel de noivado ainda hoje — interveio Daniel.

— Sim. Ouvi dizer que vocês estão planejando se casar.

— É uma decisão sensata — Daniel explicou, num tom pomposo. — Eu vivo sozinho e Tabitha também. Depois do casamento iremos morar na casa dela, que é grande demais para uma única pessoa. Além disso, Tabitha gosta de cozinhar e de cuidar dos assuntos domésticos. Sendo assim, terei tempo de sobra para escrever meu livro.                                                  

— Livro? — Nick estava a ponto de explodir, e num esforço supremo conseguiu controlar a raiva.

— Nosso livro — Tabby interveio, lançando um olhar irritado a Daniel. — É um ensaio sobre o material que encontrei no campo de batalha Custer.

— E também inclui informações históricas, levantadas por mim — Daniel apressou-se a dizer. — Tabitha não poderia escrever o livro sem minha ajuda. Ela comete tantos erros de gramática.

— Será que Tabby precisa mesmo de ajuda? Ela sempre foi a primeira da classe em inglês, e conseguiu uma bolsa de estudos para a universidade Thorn.

— Eu tenho mestrado em inglês — retrucou Daniel, fuzilando Nick com o olhar. — A propósito, Reed, você chegou a formar-se em alguma coisa?

Apesar de ser formado em direito, Nick não pretendia entrar no jogo daquele sujeitinho empolado. Sorrindo com ironia, respondeu:

— Oh, entendo um pouco de leis. Afinal, sou detetive.

— Então deve ter completado apenas o segundo grau, como qualquer policial — respondeu Myers com ar de superioridade.

Antes que Nick explodisse de raiva, Tabby interveio, apressando-se a dar fim à situação constrangedora:    

— Obrigada por tudo, Nick. Falo com você mais tarde. Vamos, Daniel?

Segurando-o pelo braço, ela praticamente o arrastou para fora da sala. Tão logo se viu a sós com Tabby, Daniel murmurou, zangado:

— Não gostei de Reed.

— Eu sei — ela retrucou sem lhe dar muita atenção.

Nesse momento uma porta foi aberta no final do corredor e um homenzinho de bigode fino surgiu, parecendo ligeiramente hesitante.

— Ah... O objeto perdido já apareceu, Tabitha? — indagou o homenzinho, sem conseguir disfarçar o embaraço.

— Ainda não, dr. Flannery. Mas contratei um detetive particular para cuidar do caso.

— Detetive?

— Apenas para procurar o vaso.

— Claro, claro.

Depois de um até logo quase inaudível, o homenzinho deu as costas ao casal e afastou-se depressa.

— Talvez Flannery tenha roubado o vaso — Daniel murmurou.

— Ele está em dificuldades financeiras, foi obrigado a hipotecar a casa da família. E Flannery sabe que qualquer colecionador pagaria uma fortuna pela peça suméria.

— O dr. Flannery é um biólogo, não um ladrão — exclamou Tabby, convicta.

— Homens desesperados fazem coisas desesperadas —Daniel insistiu. Logo em seguida, mudou de assunto. — Você vai se casar comigo, não vai? Sempre nos demos bem, e tenho certeza de que nosso livro será um sucesso.

— Você não está querendo se casar comigo apenas para escrevermos um livro juntos, está?

— Não, claro que não. Que tolice, querida.

Embora a pergunta tivesse sido feita com ar de troça, Tabby não se sentiu muito segura com a resposta do futuro marido. Daniel quase não a beijava, e quando o fazia era sem grande entusiasmo. Ele nunca tentara carícias mais íntimas, nunca lhe mandara flores ou telefonara no meio da noite para dizer que a amava. Para completar, suas conversas giravam sempre em torno do tal livro. Tabby sempre sonhara em casar-se, mas não desse jeito, com um homem tão frio.

Na verdade, seus sonhos eram povoados pela imagem de Nick.

Por mais que tivesse tentado, ao longo dos anos, não conseguira tirá-lo da cabeça. Agora iria vê-lo todos os dias durante uma semana, e só pedia a Deus para ser capaz de esquecê-lo depois que o sumiço do vaso fosse esclarecido e ela se livrasse da acusação de roubo.

Tabitha não conseguiu achar um anel de noivado que a agradasse, pois na verdade não estava tão interessada assim em casar-se com Daniel Myers. Ele parecia decidido a usá-la para escrever o livro, ao passo que ela tentava apenas encontrar uma maneira de chamar a atenção de Nick. Era ridículo ficar noiva de um homem apenas para mostrar a um outro que alguém a considerava uma mulher desejável. Como se Nick pudesse ser iludido ou enganado! Assim como adivinhara as verdadeiras intenções de Daniel ao propor casamento, o mais provável era que ele também tivesse percebido por ­que Tabby aceitara ficar noiva sem estar apaixonada.

Depois de desistirem de comprar o anel, Daniel levou-a para almoçar num restaurante simpático. Tabby estava comendo a sobremesa quando ele pediu licença para ir ao banheiro.

Ao ficar sozinha à mesa, começou a pensar, sem querer, na fatídica festa: de reveillon.

Tudo lhe parecera possível naquela noite mágica. Ela usara um vestido preto de alcinhas e deixara os cabelos soltos, formando uma moldura de ondas suaves para o rosto levemente maquiado. Embora fosse bastante míope, resolvera tirar os óculos, ansiosa para causar a melhor das impressões. Sabendo que Tabby sempre amara seu irmão em segredo, Helen lhe havia dito que Nick estava pronto para assumir um compromisso e que ela era a mulher escolhida. Aquele pequeno encorajamento, aliado às duas taças de ponche que tomara, havia sido suficiente para fazê-la perder a cabeça.

Encostado junto à porta da varanda, com um copo de uísque nas mãos, Nick transpirava charme e masculinidade. De longe, Tabby o fitara por um longo tempo, o coração pulsando de amor. Louca de paixão, decidira aproximar-se.

— Sozinho, Nick?

— Não mais — ele respondera sorrindo. — Você está elegante, Tabby. Parece adulta.

— Tenho vinte e cinco anos.

— Não foi isso que eu quis dizer. Creio que lhe falta um pouquinho de sofisticação...

— Estou me esforçando para corrigir essa falha. Quer ver?, Ignorando o olhar surpreso de Nick, ela aproximara-se ainda mais, colando seu corpo ao dele num gesto cheio de sensualidade.

— Tabby!                                                        

— Não se preocupe. Quero apenas beijá-lo, querido.

Embora lhe faltasse experiência no campo amoroso, Tabitha amava tanto Nick que o beijo desajeitado se transformou numa carícia apaixonada.

Pego de surpresa, ele ficou imóvel durante alguns segundos e depois puxou-a para mais perto, pressionando-lhe os quadris com as pernas musculosas.

— É isso que você esta querendo? — indagou Nick, com voz rouca.

— Sim... Oh, me beije outra vez...

Eles estavam num canto escuro da varanda, protegidos por verdadeiras cascatas de plantas, mas Tabby já não se importava com a possibilidade de serem vistos. Tudo o que queria era sentir aqueles lábios ardentes apossarem-se dos seus.

Então, de súbito, Nick empurrou-a para longe, horrorizado com o que acabara de acontecer.

— Que diabo você pensa que está fazendo? — ele perguntou, os olhos brilhando de raiva. — Você não me parece ser do tipo que se embebeda e sai à procura de uma aventura passageira. Ou será que é isso que está querendo? Você me deseja, Tabby? — indagou, insolente. — Deve ter um quarto vazios lá em cima, talvez pudéssemos usá-lo. Ou, como último recurso, poderíamos ir para um canto escuro do jardim. Nós nos deitaríamos na grama, você levantaria a saia...

— Não, Nick — ela murmurou, em lágrimas. — Eu quero ser sua esposa, quero gerar seus filhos, pois sei que agora está pronto para assumir um compromisso. Não foi para isso que voltou a Washington?

— Voltei para resolver assuntos ligados à casa dos meus pais. Nada mais.

— Mas... Mas eu pensei... Pensei que você me queria — Tabby falou num fio de voz, o rosto tomado por uma palidez mortal.

— Eu, querer uma solteirona com cérebro de computador e seios pequenos? Meu Deus, você está louca?,

Cega pelas lágrimas e com o amor próprio reduzido a pó, ela lhe deu as costas e saiu correndo da festa. Helen foi procurá-la em casa e passou horas tentando ajudá-la a recuperar a calma. Tabby só conseguiu recompor-se um pouco quando a amiga prometeu guardar segredo sobre a dor que ela estava sentindo.

Desde então Tabitha não voltara a tocar numa gota de álcool, e a vergonha teimava em persistir. Nick, porém, nunca saberia o quão profundamente a magoara, e tudo que ela queria dele agora era ajuda para limpar seu nome nos meios acadêmicos. E quando o caso do roubo fosse solucionado, talvez ela aceitasse casar-se com Daniel, ainda que ele não fosse o homem da sua vida.

Quando Daniel voltou do banheiro, Tabby sorriu e tentou parecer alegre, esforçando-se para prestar atenção na conversa insípida e desinteressante do rapaz.

 

O laboratório do FBI, com seus equipamentos sofisticados, sempre fascinara Nick. Ali dentro era possível conseguir evidências partindo praticamente do nada. A estrutura do DNA contida num fio de cabelo, por exemplo, representava um padrão tão individual quanto uma impressão digital. As marcas da sola de um sapato, encontradas no local de um crime, podiam levar à pessoa que comprara o calçado, assim como um pedacinho de tecido revelava uma quantidade incrível de informações sobre a pessoa que o usava. Nick se orgulhara de pertencer ao quadro de uma agência tão poderosa quanto aquela. Mas depois que sua namorada, também uma agente do FBI, fora assassinada em serviço, ele ficara inconsolável e acabara pedindo demissão.

Hoje Nick se perguntava se algum dia amara Lucy de verdade ou se apenas se aproximara dela para amenizar a solidão. Pensara em procurar a companhia de Tabby, mas naquela época ela sempre se mantivera distante, dando-lhe a impressão de que o via somente como a um irmão mais velho.    

Naquela festa de reveillon, porém, ela agira de maneira inusitada, e Nick ainda sentia o sangue ferver ao lembrar-se do beijo longo e apaixonado que haviam trocado. Agora que já havia tido tempo para ajustar-se à idéia de que Tabby o queria, arrependia-se de tê-la rejeitado.

Entretanto, anos atrás, ele a desejara. E fora por sentir-se desprezado que saíra à procura de consolo nos braços de Lucy. Queria provar a si mesmo que não precisava de uma jovem nervosa, tímida, que nem sequer o via como homem.

Às vezes Nick tinha a impressão de que Tabby o temia, pois a única vez em que flertará com ele fora no reveillon, depois de beber um pouco além da conta. Pelo visto, ela só o considerava atraente quando estava meio bêbada, e isso feria seu orgulho masculino. Incomodava-o saber que não conseguia atrair nem mesmo uma garota como Tabby. Para piorar as coisas, ela nem era tão bonita assim, além de ser metida a intelectual. Por que então a lembrança daquele corpo esguio colado ao seu o mantinha acordado noites inteiras? Por que a recordação daqueles beijos ardentes o assombravam?

Nick obrigou-se a tirar esses pensamentos da mente e entrou no laboratório, onde encontrou um homem idoso debruçado sobre um microscópio.

— Olá, Bartolomeu — cumprimentou-o Nick, sorrindo.

— Nick! Que bom vê-lo — disse o homem, erguendo os olhos para encará-lo. — Pretende ficar na cidade por algum tempo?

— Pelo menos ate que você identifique algo para mim — ele retrucou, brincalhão. — Como tem passado, Bart?

— Já estive melhor. Quando se chega à minha idade, ale a artrite parece encorajadora, pois sentir dor significa que ainda estou vivo. E então, decidiu voltar a trabalhar conosco? Afinal, você sempre foi um ótimo agente.  

— Não, estou só passando férias na cidade. Cheguei à conclusão de que trabalhar como detetive particular é um pouco menos desgastante que ser agente do FBI.

— O que posso fazer para ajudá-lo?

— Gostaria que analisasse isso —disse Nick, entregando o saquinho plástico contendo o fio de cabelo.

— Está perdendo a prática, amigo? — Bart indagou, com uma piscadela tirando a amostra do saquinho com uma pinça.

— Meu Deus! — Nick exclamou, atônito, depois de olhar melhor para o material. — Isso não é um fio de cabelo humano!

— Exato. Trata-se de pêlo de animal. Alguém que você conhece tem cachorro?

Nick lembrou que o laboratório de biologia da universidade estava cheio de bichos. Tabby ia até lá de vez em quando, e alguns pêlos deviam ter grudado em sua roupa para depois caírem sobre a escrivaninha.

— Sim, cachorro ou outro animal qualquer — respondeu ele, por fim. — Estranho eu não ter reparado antes que isso não era um fio de cabelo. Agora me parece tão óbvio...

— Posso examinar o fio e descobrir a que animal pertence — sugeriu Bart.

— Não é preciso. — Nick suspirou. — Talvez eu esteja mesmo perdendo a prática e me tornando mais descuidado...

— Há algo que o preocupa?                  

— Sim, uma amiga, a quem estou tentando tirar de uma enrascada. — Nick deu de ombros. — Desculpe-me por tê-lo incomodado à toa, Bart.

— Se você descobrir alguma evidencia mais tangível, venha me procurar. Será um prazer ajudá-lo.                                  

— Obrigado, amigo. Foi bom reencontrá-lo depois de tanto tempo.

— Na verdade eu não esperava vê-lo de novo Nick, depois daquela tragédia.

— Sim, foi um golpe duro perder Lucy de uma maneira tão estúpida. Mas, no fundo, não sei se teríamos continuado juntos, se ela ainda estivesse viva. Afinal, nós só pensávamos trabalho, não nos preocupávamos muito com nossa vida pessoal.

Nick nunca chegara a amar Lucy, mas gostara bastante dela. A morte da namorada o assombrara durante anos; só agora ele parecia mais conformado com o que acontecera.

Percebendo que falar do passado perturbava o amigo, Bart apressou-se a mudar de assunto:

— Você se lembra daquela ruiva meio maluca que trabalhou conosco durante alguns meses e depois, para alívio geral, foi transferida para Miami?

— Uma tal de Cynthia?

— A própria. Pois agora ela é agente-chefe em Miami e tem feito um trabalho maravilhoso. Casou-se com um colega de trabalho e já é mãe de dois filhos.

— Engraçado, nunca pensei que Cynthia fosse do tipo que pensava cm casamento.

— O mesmo digo eu — riu Bart. — Sempre a julguei parecida comigo e com você. Eu, por exemplo, nunca encontrei a mulher ideal, e tenho a impressão de que você também não.

— Acho que alguns de nós são solitários por natureza — Nick murmurou, pensando de repente em Tabby e em Daniel Myers.

Ficou irritado na mesma hora. Por que tinha a sensação de que algo importante estava sendo arrancado de suas mãos?

A verdade era que não conseguia tirar Tabitha Harvey da cabeça, e durante todo o trajeto de volta, à universidade a irritação que sentia só fez aumentar.

Tabby não se encontrava em seu escritório Nick foi então até a secretaria e comprou um catálogo com informações sobre a universidade e seu quadro de professores. Acreditando estar munido com material suficiente para continuar a investigação, ele voltou para casa.

Depois de consultar o catálogo, telefonou para a irmã.

— O que está acontecendo por aí? Algo de errado? — Helen indagou, notando uma certa apreensão na voz do irmão.

— A carreira de Tabby irá por água abaixo se eu não descobrir o ladrão — Nick concluiu, depois de fazer um resumo da situação.

— Mas ela não pode ser despedida de uma hora para a outra, pois é professora efetiva — observou Helen.

— Isso não terá a menor importância se o vaso não for encontrado. Tenho uma lista de nomes e gostaria que você os investigasse para mim. Comece pelo tal noivo de Tabby.

— Daniel?

— Você o conhece?

— Claro. Ele, Tabby e eu fizemos o colegial juntos. Daniel é simpático, apesar de meio pomposo, e está pronto para assumir um compromisso sério. Será capaz de tomar conta da minha amiga.

— O mais provável é que ela tome conta dele. Não gostei daquele sujeito, Helen. É um tipo egoísta e esnobe.

— Concordo com você, mas Tabby tem o direito de escolher quem bem entender para marido.

— Mesmo que o cara seja um completo idiota?

— Mesmo assim. Agora me dê a lista de nomes e começarei a investigação. Mas devo lhe dizer desde já que não encontrarei nenhuma mancha no passado de Daniel. Ele é certinho demais.

— Isso é o que veremos. — Nick passou a lista à irmã e finalizou: — Muito bem, Helen, mãos à obra. Quando tiver qualquer informação concreta sobre uma dessas pessoas, telefone para mim.

— Pode contar comigo. A propósito, por que você não vai visitar Tabby agora e aproveita para perguntar se ela suspeita de alguém?

— Eu já havia pensado nisso, mas acho que não será possível. Tabby tem medo de arruinar sua reputação ficando a sós comigo.

— Ela vive num mundo antiquado, Nick. Não é uma mulher que eu chamaria de "moderna".

— Suponho que tenha razão. Mas é uma tolice tão grande agir assim...

— Talvez Tabby ainda não tenha conseguido superar o constrangimento da noite de reveillon. Ela nunca toma bebidas alcoólicas, o eu compliquei a situação contando-lhe mentiras sobre suas intenções de assumir um compromisso sério, Nick. Eu só queria ajudar Vocês dois a se entenderem, mas no fim acabei estragando tudo — admitiu Helen, pesarosa. — É provável que Tabby esteja com medo de ficar sozinha com você, temendo ser encarada como uma garota que se embebeda e depois se atira nos braços de qualquer um...

— Isso é ridículo! Eu a conheço bem e sei que não costuma agir assim.

— Por que não lhe diz isso?

— Talvez eu devesse...                    

— Pois vá em frente, e boa sorte! Ligo para você tão logo descubra alguma coisa, ok? Tchauzinho!

Já estava escuro quando Nick ouviu o barulho do carro de Tabby entrando na garagem vizinha. Droga, o que ela andara fazendo até tão tarde na companhia de Daniel?

Num impulso, sem nem mesmo deixar sobre a mesa o drinque que estava bebericando, saiu correndo, a tempo de abrir a porta do carro para Tabby e ajudá-la a descer.

— Oh, obrigada. Alguma novidade sobre o roubo? — indagou ela, ansiosa.

— Não, mas estou trabalhando firme no caso. — Vendo que Tabitha olhava para o copo em sua mão, ofereceu: — Quer um pouco? É uísque com soda.

— Detesto uísque.

— É mesmo? Mas na festa de reveillon você bebeu.

— Preciso entrar — Tabby murmurou, afastando-se com o rosto em chamas.

Nick puxou-a pelo braço, obrigando-a a fitá-lo, seus corpos quase se tocando.

— Não faça isso... — implorou ela num fio de voz.

— Na primeira vez foi você quem tomou a iniciativa — ele sussurrou com voz rouca. — Ainda posso sentir a pressão do seu corpo colado ao meu, e não consigo me esquecer do gosto de seus lábios macios e sensuais... Naquela noite, estive a ponto de perder a cabeça, mas me afastei para o seu próprio bem. Não tive intenção de magoá-la, juro.

— Eu sei — Tabby conseguiu dizer, tentando não pensar no orgulho ferido. — Só que agora tenho um noivo e...

— Aquele sujeito insignificante não a merece! Você está com Daniel apenas me mostrar que já não a interesso mais, certo? Pois bem, já entendi o recado. Pode terminar o noivado.

— Nick, não vou me casar com Daniel apenas para... Para provar alguma coisa a você. Tenho vinte e cinco anos, quero me estabelecer na vida, quero ser mãe. Meu noivo tem uma carreira sólida e não é dado a vícios como fumar, jogar ou... Beber.

— Eu também não costumo beber. E quando bebo, nunca passo da conta. Diga-me, você ainda não sabe beijar, não é mesmo? — ele perguntou de repente, mudando de assunto, fitando a boca carnuda de Tabby. — Eu deveria ter ensinado anos atrás, mas você tinha medo de mim.

— Não é verdade — ela retrucou, na defensiva.

— Então por que fugia toda vez que eu me aproximava? Nunca me esqueço da noite em que tentei convidá-la para sair e você sequer quis falar comigo, não tendo nem a delicadeza de atender a porta.

— Eu não podia imaginar que se tratava de um convite. Afinal você tinha dito a Helen que eu era uma chata e que não queria me ver na sua frente.

— Quando foi isso? — Nick indagou, sério.

— Naquele mesmo dia em que você pretendia me convidar para sair. Eu tinha dezoito anos, lembra? Quando o vi tocar a campainha, pensei que alguém havia contado que eu tinha uma paixonite aguda por você. Imaginei que você tinha ido me procurar para dizer que eu não passava de uma garota tola, por isso fugi.

Nick ficou surpreso com a revelação, pois Tabby nunca demonstrara gostar dele de modo especial.

— Foi Helen quem lhe contou isso? — indagou, por fim, intrigado.

— Oh, não, ela seria incapaz de tanta maldade. Foi Mary Johnson quem me contou.

— Mas eu jamais falei sobre você com ninguém! Nunca a chamei de chata e nunca pensei que se sentisse atraída por mim. Talvez você não saiba, mas Mary Johnson queria me namorar a qualquer custo, precisei ser duro para fazê-la entender que não havia a mínima chance de ficarmos juntos.

— Sempre pensei que ela fosse minha amiga.

— Com certeza tinha ciúmes de você.

— Bobagem — resmungou Tabby, acrescentando — Mary não se cansava de repetir que você me achava um tipo comum e sem graça e que não suportava me ver.

Nick suspirou. Então fora Mary a culpada de tudo! Pôr causa do jogo sujo de uma garota invejosa, Tabby o havia mantido à distância durante anos.

— Embora muito tempo já tenha passado, eu gostaria de dizer que não a considero comum ou sem graça — declarou ele, sincero. — Você sempre foi espirituosa, inteligente. Talvez pudesse engordar um ou dois quilinhos, claro, mas...

— Não costumo comer muito e trabalho demais, assim é difícil engordar.

— Eu sei. Tabby... Por que Daniel? — Nick indagou de repente, com delicadeza.

— Porque ninguém mais me quis — ela respondeu sem pensar. A seguir, embaraçada, murmurou: — Preciso entrar agora. Tenho uma pesquisa a fazer para o livro que estou escrevendo com Daniel.

— Maldito Daniel! Esqueça-o, e venha para casa comigo. Comprei um disco de blues, poderíamos dançar um pouco.

— Você gosta de bluesl

— Muito. É um ritmo envolvente.

— É melhor não aceitar o convite, já é tarde.

Ignorando a recusa, Nick praticamente arrastou-a para casa consigo. Quando já estava na sala, murmurou, com um sorriso fascinante:

— Prometo não seduzi-la. Não sem avisá-la antes... Agora tome um drinque, enquanto ligo o som.

— Não costumo beber e não sou boa dançarina.

Agindo como se não tivesse escutado nada, ele preparou um uísque com soda bem fraquinho e colocou o copo nas mãos trêmulas de Tabby. Logo depois os dois moviam-se lentamente pela sala de estar, os corpos embalados pela música sensual.

— Seu perfume é suave — Nick sussurrou, puxando-a mais para perto. — Me faz lembrar da noite em que a levei para o baile de formatura do colégio, lembra?

— Sim. Eu me senti no céu, embora soubesse que você só tinha me convidado a pedido de Helen.

— Helen não me pediu nada!

— Mas Mary me contou que...

— Mary mentiu, Tabby. Será que você ainda não percebeu que aquela garota me queria e tinha ciúmes de você?

— Ela era bonita.

— Mulheres bonitas existem aos montes, mas eu sou um homem muito, muito seletivo. Neste momento, por exemplo, desejo loucamente uma morena alta, de lábios carnudos.

— Por favor, não brinque comigo Nick.

— Na festa de reveillon seus lábios tinham um leve gosto de uísque. Ao sentir seu corpo colado ao meu, pensei que não conseguiria me controlar. Eu a desejei tanto...

— Não é verdade. Você me disse coisas horríveis, Nick!

— Não tive escolha. Ou agia de maneira rude ou a levava para cama. E Deus sabe o quanto lutei para não despi-la e possuí-la ali mesmo, naquela varanda escura.

— Será que não deveríamos parar de dançar um pouco? Está fazendo muito calor — disse Tabby num fio de voz, embaraçada com o rumo tomado pela conversa.

Sem nada responder, Nick beijou-a de leve na boca. Ela bem que tentou afastar-se, mas a pressão da língua masculina em seus lábios era tão insistente que não havia mais nada a fazer a não ser entregar-se às emoções.

   — Não resista. Quero ensiná-la a beijar — Nick segredou-lhe ao ouvido, antes de se apossar dos lábios carnudos com avidez. — Nick... — ela murmurou baixinho, atordoada pela onda de desejo que parecia sufocá-la. — Não posso esquecer Daniel...

— Sim, pode. Faça amor comigo, Tabby

Segundos depois estavam os dois deitados no sofá da sala, beijando-se com uma paixão desesperada. As mãos de Nick, ousadas e experientes, percorriam cada centímetro do corpo de Tabby, deixando-a em fogo, ansiosa por mais. Ao sentir os dedos fortes fecharem-se ao redor de seus seios firmes, ela gemeu alto, completamente transtornada.

— Levante os quadris um pouco— ele pediu, insinuando-se entre as coxas dela. — Não se preocupe, não há perigo, querida. Quero apenas ficar mais perto de você.

   Ao sentir toda a extensão do desejo de Nick, Tabby fechou os olhos e seu último pensamento coerente foi de que estava a ponto de perder a virgindade num sofá.

— Acompanhe o meu ritmo — ele pediu com voz rouca. — Movimente os quadris para cima. Humm, que delícia... Quero possuí-la agora, Tabby. Não consigo resistir... Você tomou precauções? Corre algum risco de engravidar?

— Risco. Engravidar. Aquelas palavras trouxeram-na de volta à realidade. Ela era noiva de Daniel Como fora capaz de se esquecer disso, entregando-se às carícias de um homem que já a rejeitara uma vez?

— Solte-me, Nick — ordenou, empurrando-o,

— Não era isso que você estava me pedindo minutos atrás — respondeu, afastando-se.

Tabby levantou-se, as pernas tremulas mal sustentando o peso corpo. Num gesto de aflição, passou a mão pelos cabelos desalinhados tentando recompor-se.

— Não vou tentar esconder minha excitação — Nick falou ao vê-la enrubescer e desviar o olhar de seu sexo rijo, coberto pela calça comprida. — Eu a desejo.

— Não estou à sua disposição para um caso passageiro. Não foi por esse motivo que vim até aqui.                                                

— Não mesmo? Será que está pretendendo negar o ardor com que correspondeu às minhas carícias?

— Com a sua experiência, você seria capaz de excitar até uma pedra — retrucou Tabby. —Mas eu não sou uma mulher disponível, estou noiva.

— Não por muito tempo. Depois que eu contar a Daniel o que quase fizemos no sofá da minha casa...

— Oh! Você não seria capaz!

— Estávamos vivendo momentos maravilhosos até você resolver bancar a puritana. Só Deus sabe porque uma mulher dona de lábios tão sensuais insiste em não seguir os impulsos do corpo.

— Vamos deixar meus lábios sensuais fora disso. Vou embora agora, tenho trabalho a fazer.

— Em vez de trabalhar, por que não vai para a cama comigo? Poderíamos fazer amor à noite inteira, e amanhã de manhã você nem se lembraria de Daniel.

— Amanhã de manhã eu estaria pensando em me suicidar, e você, além da ressaca, estaria às voltas com uma consciência pesada — Tabby argumento friamente. — Seria exatamente como na festa de reveillon, quando fui acusada de tentar seduzi-lo.

— Naquela noite você ainda não estava preparada para mim, como agora. É essa a diferença. Posso lhe dar algo que Daniel jamais será capaz de dar. Posso satisfazê-la como mulher.

— Obrigada, mas recuso a oferta. Contratei seus serviços como detetive, mas não pretendo.pagá-lo usando meu corpo.

— O que é uma pena, pois seu corpo é muito mais atraente que qualquer quantia em dinheiro.

— Nick, por favor! Quero saber... Você não contará nada ao Daniel, não é?

— Talvez.

Indignada, Tabby deu-lhe as costas e foi embora. Nick permaneceu imóvel durante alguns minutos e, depois de preparar mais um drinque, decidiu tomar um banho frio. Mas nem a água gelada foi capaz de apagar o fogo que o corpo de Tabby acendera nele. Como conseguiria esquecer a doçura daqueles lábios, o contorno dos seios firmes e redondos, a rigidez dos mamilos eretos de excitação?

Inquieto e insatisfeito, preparou mais outro drinque e abriu a janela   do quarto. Havia luzes acesas na casa de Tabby, portanto ela também não estava conseguindo dormir.

Nick debruçou-se à janela, pensativo. Era interessante como as duas mulheres que mais o haviam atraído até então pudessem ser tão diferentes.

Lucy Waverly havia sido do tipo mignon e vivaz, que adorava correr riscos. Sexo sempre fora o elemento mais forte da relação entre eles. Lucy agira como um bálsamo sobre o ego ferido de Nick, depois que se sentira rejeitado por Tabby anos atrás.

Amar? Não, ele nunca amara Lucy. Talvez tivessem chegado a se casar, levados apenas pela atração física mútua. Um tiro de revolver, porém, pusera fim a qualquer plano para o futuro.

A morte de Lucy o abalara demais e Nick passara a pensar com     maior freqüência nos riscos de sua profissão. Desde então recusava envolvimentos emocionais com as mulheres, limitando-se a colecionar aventuras.

Mas Tabby estava mudando tudo, envolvendo-o numa teia de sedução e encantamento. Embora a desejasse com loucura e não pudesse prever o que estava para acontecer entre ambos, tinha certeza de que não queria assumir nenhum compromisso sério. Apenas gostaria de possuí-la, transformá-la de virgem inexperiente em mulher plenamente saciada.

A perspectiva era tão deliciosa que ele passou o resto da noite em claro, sonhando acordado.      

 

Era domingo. Ainda sonolento e lutando para vencer o mal estar da ressaca, Nick conseguiu abrir os olhos. Ele, que raramente bebia, ficara acordado até de madrugada pensando em Tabby e tentando afogar as mágoas numa garrafa de uísque. Mas apesar de seus esforços para aplacar o desejo, continuava mais frustrado que nunca. Irritado consigo mesmo, voltou para a cama e só se levantou no meio dá tarde.

Um bule de café amargo e duas aspirinas depois se sentiu racional o suficiente para pesar os acontecimentos da noite anterior. Comportara-se como um perfeito idiota, sem dúvida. Por que a compulsão louca de se insinuar para cima de Tabby quando não tinha absolutamente nada a lhe oferecer, quando a simples idéia de se envolver num relacionamento permanente o deixava apavorado? Por que não conseguia manter as mãos longe daquele corpo esguio sempre que estavam juntos?

É claro que não seria capaz de contar a Daniel o que quase acontecera no sofá da sala, mas fora bom deixar Tabby um pouco insegura, pois assim ela baixaria as defesas.

A simples lembrança das carícias trocadas o punha em fogo, e sua irritação chegou ao máximo ao reparar num carro branco, estacionado em frente à casa de Tabby havia horas. Com certeza Daniel a estava visitando. Droga!

Chateado ao extremo, Nick decidiu ir para a cama cedo, depois de ter passado um dos piores e mais entediante domingo de toda sua vida.

Por volta das sete horas da manhã do dia seguinte ele já estava de pé, e não hesitou em rumar para a casa de Tabby, tão logo viu luzes acesas por lá.

Sonolenta, ela abriu a porta sem se dar conta de que ainda usava apenas a camisola curta sobre o corpo nu. Seria preciso ser um homem de pedra para não reagirá visão de uma imagem tão feminina. Ao perceber a intensidade do olhar de Nick, Tabby afastou-se tentando esconder-sc atrás do espaldar de uma cadeira.

— Por favor — ela pediu com um sorriso nervoso —, lembre-se de que você é um solteirão convicto.

— Não adianta. Tire essa cadeira da frente, Tabby — pediu ele com voz rouca.

— De jeito nenhum. Afinal, não passo de uma solteirona amarga. Não foi isso o que você disse a Helen na noite de reveillon?

— Minha irmã não lhe contaria uma coisa dessas!

— Pois foi exatamente o que ela fez, com a melhor das intenções. Naquela noite eu chorei tanto que Helen já não sabia como me consolar. Por fim decidiu me contar a verdade, pois é mais fácil superar a dor quando não se tem qualquer esperança.

— Eu nunca soube que você se sentia atraída por mim Afinal, anos atrás, sempre que eu tentava me aproximar, você fugia. Tanta rejeição acabou me magoando.

— Sinto muito. É que sua proximidade me deixava ainda mais tímida. Eu nunca conseguia encontrar algo interessante para dizer. Mas agora tudo faz parte do passado, Nick. Estou noiva de Daniel e pretendo me casar.

— Você não ama Daniel.

— Eu o respeito e gosto dele. Na minha idade isso é o bastante. Posso viver sem uma grande paixão, que não passa de um sentimento fugaz.

   — Então o que você experimentou comigo, ontem à noite no sofá, foi um sentimento fugaz?

— Claro — Tabby falou, desviando o olhar. — Talvez porque sua presença me fizesse lembrar do passado, talvez porque eu quisesse saber como era ser amada por você. Agora minha curiosidade já está satisfeita.

— Não completamente — retrucou Nick, em tom arrogante. — Por que não vai para cama comigo e me deixa amá-la de verdade? Assim saberá como é ser possuída por mim.  

— A amostra foi suficiente.

— O que fizemos juntos foi mais que uma simples amostra.  

—Nick, preciso me vestir agora e ir trabalhar.  

Trabalhar. Ele também precisava se dedicar ao caso para o qual fora contratado. Porque então parecia se esquecer de tudo, a não ser o desejo que o consumia?

— Tire a camisola e me deixe olhar para você — pediu ele com voz rouca. — Quero vê-la nua.

Tabby permaneceu imóvel, tentando se salvar daquela humilhação final. Estava claro que Nick a queria, mas depois de possuí-la uma vez não hesitaria em deixá-la, pois jamais assumiria um compromisso definitivo.

— Não trabalho em clube de strip-tease — retrucou ela, fria. — Sou antropóloga, lembra?

— Uma profissão tão que lida com coisas antigas combina com atitudes ultrapassadas, não é?

— Não fui criada para ser devassa, e você também não. Mas talvez a educação que seus pais lhe deram já não tenha tanta importância.

— Não sou do tipo que se mantém preso à falsa moralidade, a mitos antiquados.

— Cada um vive como quer. Agora vá embora, Nick. Estou ocupada.

— Você ainda me parece um pouco nervosa, hoje. Daniel não teria um ataque histérico se soubesse o motivo?

— Daniel não teria um ataque nem se soubesse que fiz sexo com um marciano. Ele é um homem inteligente e saberia entender.

— Será? Poderíamos testá-lo.

— Por que nos darmos ao trabalho? Na verdade, Nick, você não me quer. Talvez sinta apenas curiosidade depois de ter descoberto que, anos atrás, eu me sentia fascinada por você. Mas a brincadeira pára aí. Você não tem a menor intenção de casar-se, de ter filhos.

— Não — ele admitiu. —Mas se algum dia eu pensasse em constituir família, seria ao seu lado.

— Sinto-me lisonjeada — Tabby respondeu com um sorriso incrédulo.

— Sou um tipo inquieto, agitado. Creio que jamais serei capaz de me fixar em algum lugar durante muito tempo. Gosto de correr riscos. Gosto da minha profissão e ela não combina com a vida de casado. Não posso suportar a idéia de ver você preocupada, temendo por minha segurança todos os dias do ano.

— Se eu tivesse certeza de ser amada, poderia enfrentar tudo, mas o amor é um sentimento que você desconhece, não é?

— E provavelmente nunca conhecerei. Escapar de perseguidores e uma coisa, mas me sentir nas mãos de uma mulher é algo muito diferente.

Tabby sabia muito bem o que Nick estava tentando lhe dizer.

Com certeza não fazia parte dos planos daquele homem auto-suficiente deixar-se prender pelos encantos de uma mulher e vir a ser magoado outra vez, como quando Lucy, a tal agente do FBI, fora morta. Tabby suspirou. O mais sensato seria parar de atormentar a si mesma, alimentando falsas esperanças de um dia ser amada por Nick. Melhor casar-se com Daniel e pôr a cabeça no lugar. .

— Você é um tipo independente — ela comentou, melancólica. — Mas estou cansada de viver sozinha e depender apenas de mim mesma. Daniel e eu nos damos bem e nossa vida a dois será agradável.

— Claro, desde que você não tenha de aturá-lo na cama com muita freqüência.

— Que comentário de mau gosto!

— Não seja tão puritana, querida. Se Daniel fosse capaz de satisfazê-la como mulher, eu não teria tido tanta facilidade para excitá-la ontem à noite. Você já estava pronta para ser possuída no primeiro instante em que a toquei.        

— Sexo não é tudo numa relação a dois...

— Mas pode significar o fracasso ou o sucesso de um casamento. Se você não deseja Daniel fisicamente, ele irá perceber isso e sua vida será um inferno.

— Eu me acostumo — ela respondeu, pensando no quanto Daniel ficava irritado cada vez que se beijavam; sua falta de entusiasmo e ardor o enfurecia ao extremo.

— Você se acostuma?!

— Claro, é melhor eu ter um homem com quem possa conversar que... Nick!

Em questão de segundos ele a tinha jogado sobre à mesa da cozinha, enquanto procurava-lhe a boca com sofreguidão. Incapaz de conter a onda de desejo que a deixou atordoada, Tabby entreabriu os lábios e rendeu-se às exigências da língua masculina e explorava sua boca com paixão alucinada. Ao sentir a mão de Nick subindo-lhe pelas coxas, ela estremeceu e pensou em protestar porém não teve forças para quebrar o encanto, para ignorar o clamor do próprio corpo.                    

— Você não está usando calcinha — ele sussurrou. — Costuma dormir sempre assim?

— Sim — respondeu ela com voz sumida.

— E sempre sozinha?

— Sempre.                                                                  

— Não é preciso ficar tão tensa. Não percebe que eu seria incapaz de magoá-la?

— Sim.

Nick deslizou as mãos sob o tecido fino da camisola até encontrar os seios redondos e empinados. Lentamente, começou a acariciar os mamilos eretos, aumentando a pressão até ouvir Tabby arfar de prazer.

— Por tantas vezes eu a vi nua em meus sonhos... Agora vou torná-los realidade. Meu Deus! —ele exclamou ao livrá-la da camisola. — Você é linda!

Tabby gemeu e arqueou as costas ao sentir os mamilos sendo sugados pela boca ávida de Nick. Num gesto incontrolável, puxou-o pelos cabelos, ansiosa por um contato ainda mais íntimo. O toque súbito do telefone arrancou-os do transe erótico, quebrando o clima de intensa sensualidade.

— O telefone está tocando — disse Nick com voz rouca.

— E parece que não vai parar...

— Eu pensava que você era muito magra, mas vejo que me enganei. Quero me deitar sobre seu corpo, Tabby, quero possuí-la agora.

— Nick, não!

Ele ficou imóvel durante alguns segundos antes de levantá-la da mesa e cobri-la com a camisola. Os olhos escuros, faiscantes de desejo e frustração, pareciam penetrar-lhe a alma, desvendando os segredos mais íntimos.

— É melhor que você atenda o telefone então.

— Alô — ela murmurou, pegando o fone com mãos tremulas.

— Tabby, já são nove horas — reclamou a voz de Daniel, impaciente. — Seus alunos estão cansados de esperá-la.

— Sinto muito. Acho que... Dormi demais. Estarei aí em poucos minutos. Será que você poderia me substituir na primeira aula?

— Está bem. Sorte sua eu estar livre até às dez horas.

— Obrigada por me ajudar. Até logo.

Tão logo ela desligou o telefone, Nick pediu:

— Esqueça a universidade, vamos para a cama.

— Não posso. Por favor, pare de brincar comigo! Essa situação está me enlouquecendo!

— Você me deseja, Tabby.

— É claro que o desejo, mas não há futuro para nós.

— Então vamos viver o momento, sem pensar no amanhã. Eu seria incapaz de magoá-la.

— Estou noiva.

— Noiva de um idiota. Daniel está usando você!

— E não é isso que você está tentando fazer, também?

— Se você prefere colocar as coisas nestes termos... Eu preciso de uma mulher, você precisa de um homem. Não há nada de mal em nos satisfazermos. Afinal, nos conhecemos há bastante tempo.

— Eu gostaria que você fosse embora agora, Nick.

— Não, não gostaria. Na verdade você está tão faminta do meu corpo quanto eu do seu.

— Só que já recuperei o bom senso e consigo raciocinar. Não trairei Daniel.

— Quem falou em traição? Vocês ainda não estão casados.

— Essa é uma regra que não se aplica ao meu mundo, pois os anos não me transformaram numa mulher cínica. Ainda tenho sonhos, ideais românticos. Acredito no casamento e no amor eterno.

— Relacionamentos não duram para sempre, Tabby. Você seria uma tola se insistisse em acreditar em contos de fada.

— Tudo o que sei é que minhas chances de ser feliz são maiores ao lado de Daniel do que ao seu lado. Por favor, vá embora.

— Ok, como preferir. A propósito, pedi a Helen para checar algumas informações e deverei ter um retorno hoje. Também gostaria de entrevistar unia ou duas pessoas no seu escritório.

— Você não está pretendendo armar nenhuma confusão, não é mesmo?

— Alem de investigador experiente, sou advogado — ele retrucou secamente.

— Desculpe-me.

— Sei que você está nervosa por ter sido acusada de algo que não fez e quero deixar claro que, caso seja preciso, não hesitarei em ferir a vaidade de seus colegas para esclarecer a situação.

— Não quero ganhar inimigos à toa, Nick.

— Sei disso.

— Como você pode ter tanta certeza de que sou inocente, quando não há provas?

— Porque a conheço -— ele respondeu com seriedade. — Vejo-a na universidade, então.        

Horas depois, sozinho cm casa, Nick perguntava-se como era possível Tabby insistir naquela relação absurda com Daniel, onde não havia espaço para romantismo nem atração física.

Entretanto, quando ela estava em seus braços, a história era muito diferente. Ainda podia sentir os contornos daquele corpo delicado colado ao seu, excitando-o além da imaginação. Ele a desejava mais que tudo no mundo; o preço para possuí-la, porem, era alto demais.

Enquanto Tabby dava aulas, Nick usou o microcomputador do escritório dela para estudar as fichas dos funcionários da universidade. Em seguida decidiu chamar o dr. Flannery, professor assistente de biologia, para uma conversa informal. De acordo com as informações levantadas por Helen, Flannery estava passando por sérias dificuldades financeiras, além de já ter sido acusado de roubo quando adolescente. Daniel, por sua vez, havia passado alguns dias na cadeia nos anos sessenta, por participar de uma passeata contra a guerra do Vietnã; ao ingressar no corpo docente da universidade Thorn, omitira deliberadamente a informação.

O dr. Day, o terceiro homem de quem Nick suspeitava, pertencia ao departamento de arte e esbanjava dinheiro, quando seu salário de professor jamais lhe permitiria ostentar um padrão de vida tão elevado. Dos três homens, Daniel era considerado por todos, alunos e professores, o mais antipático do campus; Nick não conseguia refrear o impulso de considerá-lo o suspeito número um. Infelizmente não poderia dizer nada a Tabby, pois ela atribuiria suas acusações a puro ciúme.

Não que Nick pudesse culpá-la por tentar defender o noivo depois de seu comportamento absurdo dos últimos dias, quando não conseguia refrear o desejo de tocá-la sempre que estavam juntos. A verdade era que a queria com tanta intensidade que perdera por completo o bom senso. Embora a situação já fosse complicada o suficiente, ele sabia que não teria paz até possuí-la por inteiro.

 

Tensa e abatida, Tabby tentava esquecer os acontecimentos daquela manhã, quando se deixara acariciar de modo íntimo e ousado sobre a mesa da copa. Como fora capaz de agir de maneira tão desavergonhada?      

Estava claro que Nick a queria. Contudo, o sentimento de posse nem sempre caminhava ao lado do amor e Nick nunca escondera seu desprezo por relacionamentos permanentes, exceto quando estivera envolvido com a agente do FBI, Lucy. Decidida a obter certas informações que julgava importantes, Tabby resolveu ligar para Helen.

— E então, alguma novidade? — a amiga indagou, ansiosa.

— Nick não tem me dito nada sobre o desenrolar das investigações. Na verdade eu telefonei porque gostaria de saber algo sobre Lucy — disse Tabby.

— Eu já estava me perguntando quando você iria tocar nesse assunto — Helen comentou com delicadeza.— Vejamos... Meu irmão começou a sair com Lucy logo depois que você recusou o convite para viajar conosco a fim de esquiarmos nas montanhas.

— Mas foi você quem me convidou!

— Só porque meu irmão me pediu para fazê-lo, temendo ser rejeitado mais uma vez.

— Nick me contou que Mary me enganou várias vezes, inventando histórias mentirosas.

— É verdade, e é uma pena que eu só tenha descoberto o jogo daquela invejosa anos depois. Mary queria meu irmão, embora soubesse que ele não a suportava. Bem feito que tenha acabado por se casar com um banqueiro careca, vinte anos mais velho. E pelo que ouvi dizer, ela tem sido bastante infeliz.

—   Coitada.                                                                                              

— Coitada de você! Se não fosse pela maldade de Mary, talvez você e Nick estivessem casados, agora.

— É pouco provável. Ele não é do tipo família.

— Não esteja tão certa, Tabby. A morte de Lucy o abalou porque o fez enxergar como é duro perder alguém de quem se gosta. Meu irmão tem medo de amar porque, se entregar o coração a uma mulher, será de forma completa e apaixonada. A propósito, ele não tem sido o mesmo desde a tal festa de reveillon.

— Como era Lucy?

— Elegante, bonita, ativa. Adorava correr riscos, assim como Nick.                                              

— Ele a amava?

— Não. Apenas a considerava excitante e sensual, e embora tivesse mencionado casamento, nunca, demonstrou muito entusiasmo pela idéia. O mais provável era que o caso fosse terminar depois de alguns meses.

— Suponho que as mulheres apreciem um homem tão sofisticado e experiente quanto Nick.

— Especialmente na cama — Helen falou rindo. — Ainda que meu irmão se mostre relutante hoje em dia, ele acabará desejando uma relação permanente e dará um ótimo pai de família. Escreva o que estou dizendo.

— Bem que eu queria acreditar nisso...

— Então não desista. Dê-lhe uma chance.

— Nick me deseja, sabia?

— Ótimo. É um passo na direção certa. Mas não se entregue, Tabby. Essa seria a melhor maneira de afastá-lo.

— Eu sei, mas é tão difícil resistir... Eu amo Nick, Helen.

— Meu irmão é um homem especial, assim como você. Trate de ter paciência e me telefone logo que o caso do roubo for resolvido. Tente manter-se animada, pois tenho certeza de que esse pesadelo terminará em poucos dias.

— Assim espero — Tabby respondeu, sem muita convicção.

 

Ao sair do escritório de Tabby, depois de ter usado computador durante horas, Nick surpreendeu-se com a pequena multidão reunida no corredor, à porta do laboratório de biologia. Curioso, foi ver o que estava acontecendo. Entre risos e piadinhas, alunos e professores divertiam-se com os esforços do dr. Flannery para acalmar Pai e arrancar um chaveiro das mãos do macaco.                                                        

— Devolva as chaves do dr. Day — pedia Flannery, o rosto vermelho e brilhante.

— Você está ensinando Pal a roubar? — Daniel perguntou num tom irônico, ostentando o ar de superioridade que o tornava tão antipático.

   —Claro que não!—indignou-se Flannery.

— Esse animal é um ladrão nato e eu o vigiaria de perto, se fosse você.

— É o que estou tentando fazer.

— O projeto envolvendo Pal é pura perda de tempo. A única coisa que aprendemos até agora é que ele tem tendência a roubar. A propósito — Daniel virou-se para Nick sem esconder a irritação —, você está precisando de algo?

   — Apenas de Tabby — ele respondeu num tom carregado de sensualidade.

— Minha noiva está dando aula.

— Eu sei. Foi simpático da sua parte substituí-la esta manhã.

— Como é que você soube, disso?

—Por que não pergunta a Tabby?

   Seguro de si, Nick terminou de falar e deu-lhe as costas, saindo à procura do escritório do dr. Day. Ao atravessar o campus, lotado de estudantes, nem sequer reparou que várias moças o olhavam com interesse e sorriam, convidativas. Na verdade só conseguia enxergar o rosto de Tabby e aquele corpo escultural, escondido pelas roupas severas e simples.

— Dr. Day? — indagou Nick logo depois, entrando no escritório de Day. — Estou colhendo informações sobre o roubo recentemente acontecido na universidade e gostaria de contar com sua ajuda.

— Você acha que estou envolvido? — perguntou Day, um homem alto e magro, na defensiva.

— Oh, não! Quero apenas sua opinião a respeito do assunto.

— Bem, as pessoas costumam roubar para obter dinheiro.

— Há outros motivos também — Nick falou, observando os dedos trêmulos do professor. — Ciúme profissional, seria um deles. Por exemplo, o dr. Daniel Myers e a dra. Harvey já foram sérios rivais na profissão, mas presumo que tenham resolvido o assunto, pois estão noivos agora.

Depois de mais alguns minutos de conversa, Nick deu-se por satisfeito e voltou ao escritório de Tabby, encontrando-a no meio de uma acalorada discussão.                                      

— Não foi assim que aconteceu — ela estava dizendo. — Daniel, você não pode acreditar numa coisa dessas!

— E no que mais eu poderia acreditar? Meu Deus, você se transfigura quando aquele homem se aproxima! Desde que ele chegou nunca mais tivemos tempo de trabalhar no livro. E como foi que o idiota soube que eu a substituí na primeira aula? Como?

— Vá em frente, querida. Conte tudo — Nick a desafiou, parando na soleira da porta.

— Não piore a situação, Nick — ela pediu, corando até a raiz dos cabelos.

— Ora, que mal há em dizer a verdade? — retrucou ele. — Tabby se atrasou por minha causa, Daniel.

— Então foi isso — Daniel murmurou, vermelho de raiva. — Vocês dois são amantes, não são?

— Não! — Tabby gritou, indignada.

— E provavelmente também estão conspirando contra mim. Não iria ficar surpreso se você tivesse roubado o tal vaso, Tabitha, apenas para jogar a culpa em mim e me desacreditar perante toda a faculdade. Sei que você tem medo de que eu assuma a direção do departamento de história quando Brown se aposentar.

— Daniel, o que você está dizendo não faz sentido. Além de não sentir ciúmes profissionais, o roubo desacredita apenas a mim — argumentou Tabby.

— Mas estamos noivos portanto eu também sofro as conseqüências. Céus, eu devia estar louco quando a pedi em casamento!

Dando-lhe as costas, ele saiu da sala pisando duro, o rosto congestionado de despeito e frustração.                  

— Eu não acredito que você tenha roubado o objeto — Nick falou, fitando-a com intensidade.

— Obrigada pelo voto de confiança. Por que deixou Daniel pensar que somos amantes, quando nada de irreparável aconteceu entre nós?

— Mas teria acontecido se você fosse menos rígida. Venha, vamos almoçar juntos.

Cansada demais para discutir e certa de que estaria a salvo de   investidas amorosas num lugar público Tabby aceitou o convite.

Entretanto Nick parecia ter outras idéias, pois depois de comprar um farto lanche levou-a para um parque próximo, escolhendo um lugar deserto, protegido por árvores e vegetação densa.

— Não é bonito aqui? — ele perguntou, terminando de comer um sanduíche de frango.

— Dá uma sensação de paz.

Na verdade ela se sentiria mais tranqüila se o local fosse menos isolado. O único ruído que lhes chegava aos ouvidos era o de um córrego próximo. Os dois pareciam ser as únicas pessoas em todo o parque.

— Por que você contou ao Daniel que estávamos juntos hoje de manhã?

— Por que tentar esconder a verdade? Ele não é seu dono, Tabby! Você nem mesmo o deseja. Tudo o que aquele homem quer é usá-la em proveito da própria carreira. Qualquer cego pode enxergar isso.

— O que ele quer de mim é problema meu. Eu só queria...

— Você só queria me magoar porque eu a rejeitei no reveillon, me mostrar que tem pretendentes à sua disposição.

— Eu estava bêbada naquela noite.

— Não. Você me desejava e eu não a quis.

— Sei disso, não é preciso ficar jogando a verdade na minha cara.

Nick recostou-se no tronco de uma árvore, os olhos escuros atentos   a cada detalhe da mulher à sua frente. Tabby parecia mais jovem do que de costume, os cabelos presos num rabo-de-cavalo, o vestido verde deixando entrever as pernas longas e bem torneadas.— Eu não sabia o quanto seus beijos podiam me enlouquecer — ele falou num murmúrio. — Sempre me senti curioso a seu respeito, mas toda vez que tentava me aproximar, você se afastava.

— Você nunca tentou se aproximar de verdade.

— Sim, várias vezes. Lembra-se de quando eu estava na universidade e convidei-a para me acompanhar a uma festa, promovida pela minha turma?

— Você estava apenas querendo se divertir às minhas custas.

— Não, o convite foi sério.

— Estou certa de que não lhe faltou companhia.

— Não. Mas era você quem eu queria. Quis muito ser seu namorado, mas cada vez que eu me aproximava você fugia de mim. Quando comecei a trabalhar no FBI, tentei lhe falar dos meus sentimentos e também não fui ouvido. Foi assim que desisti e caí nos braços de Lucy, para provar a mim mesmo que ainda era capaz de conquistar uma mulher.

— Dizem que você nunca se recuperou da morte dela.

— Foi algo inesperado e doloroso. Nós nos dávamos bem e talvez pudéssemos ter chegado a nos casar. Mas Lucy era uma espécie de prêmio de consolação, nada mais. Uma substituta para a mulher que eu queria e não podia ter. Será que você ainda não compreendeu toda a situação? Eu passei anos da minha vida dizendo a mim mesmo que jamais a possuiria e então, quando você começou a me beijar naquela festa de reveillon, não conseguia acreditar que realmente a atraía. Julguei que você estava bêbada e não tinha consciência das suas ações... Venha cá — ele falou de repente, abrindo os braços.

— Não.

Sorrindo, Nick tirou a camisa, expondo o peito forte e bronzeado aos olhos ávidos de Tabby. Ele repetiu o convite com tanta sensualidade que ela não teve como resistir, ainda que o bom senso lhe dissesse para ir embora. Logo suas bocas se encontravam num beijo ardente, imperioso e sufocante.

— Toque-me — ele murmurou com voz rouca.

Tabby suspirou. Como era bom sentir a rigidez dos músculos fortes sob seus dedos, acariciar o peito másculo daquele homem envolvente. Ao perceber que Nick guiava-lhe a mão até seu sexo intumescido, Tabby tentou recuar, assustada com a intensidade das próprias emoções. Mas ele a impediu de afastar-se, beijando-a com maior insistência e ardor, suas línguas se acariciando com paixão.

Inebriada de amor, Tabby só conseguia pensar no quanto gostaria de ser tocada de maneira ainda mais íntima, em como seria bom deixá-lo beijar todo seu corpo para aplacar o estranho fogo que parecia consumi-la. Sem que se desse conta, ela sussurrava sua urgência com palavras doces e eróticas, enlouquecendo-o de paixão.

O local onde estavam era deserto e Nick, completamente cego desejo, levantou a saia de Tabby para livrá-la da calcinha.

_Nick! Nós... não... podemos! — ela murmurou atordoada.

_ Oh, Tabby, por favor, me deixe amá-la, preciso possuí-la...

Num movimento impetuoso ele a penetrou, enquanto sugava-lhe os lábios com sofreguidão. Tabby deixou escapar um gemido de dor para momentos depois se entregar à dança instintiva do sexo.

Eram incríveis as sensações provocadas pelas investidas lentas e deliberadas de Nick, como se ele soubesse tocar cada fibra, cada nervo ligado ao prazer. O mundo parecia ter cessado de existir, só restando o calor do membro viril que se apossava de sua carne, tornando-a mulher. Tabby contorcia-se e gemia alto, tomada de uma paixão que beirava a loucura. Estremecendo violentamente, ela atingiu o clímax, quase no mesmo instante Nick arqueou o corpo, gemendo extasiado. Ainda em fogo, Tabby pressionou os quadris contra os dele enterrando as unhas nas costas largas e buscando-lhe a boca com avidez, até que outro orgasmo descontrolou-a por completo, sufocando-a em ondas de um erotismo avassalador.

Momentos depois Tabby voltou à realidade, sentindo frio e vergonha. Os dois nem ao menos estavam despidos, só haviam arrancado as peças que lhes cobriam o sexo. Oh, Deus, como tivera coragem de se entregar, de fazer amor num parque público? O fato de ser um local deserto pouco significava, de qualquer forma a situação era humilhante.

Incapaz de conter o desespero, ela cedeu às lágrimas, mal escutando as palavras angustiadas e cheias de remorso de Nick.

— Eu perdi a cabeça — ele dizia, como se não pudesse acreditar que acabara de fazer. — Meu, Deus, eu perdi a cabeça! Sinto muito, de verdade.

Ao ouvi-lo, Tabby chorou ainda mais força e não apenas porque perdera a virgindade, mas pela certeza de que para Nick, tudo não passara de um momento fugaz de prazer. Sentindo-se uma mulher sem moral e pudor, ela secou os olhos e se levantou, esforçando-se para parar de tremer.

— Você quer que eu a leve para casa?

— Quero voltar para a universidade. Preciso... preciso...

— Eu a machuquei — ele falou, tentando abraçá-la.

Tabby deu-lhe as costas e correu até que Nick pegou-a pelo braço, obrigando-a. fitá-lo..                                                    

— Vou levá-la para casa. Você precisa de um banho. Talvez devesse procurar um médico...

— Eu não preciso de médico!                              

— Está bem. Vamos, então.

O trajeto para casa pareceu durar uma eternidade, o silêncio no carro tão pesado que dava a impressão de asfixiá-los. Ao chegar, Tabby ligou para a universidade, avisando que chegaria atrasada. Que eles pensassem o, que quisessem, pois agora não passava mesmo de uma mulher perdida. A mulher de Nick. Não, apenas a... Amante.

Depois de um banho rápido, Tabby vestiu calça comprida preta e uma blusa cinza, as cores escuras traduzindo bem a amargura que lhe ia na alma. Tenso, Nick a aguardava para levá-la de volta ao trabalho.

— Pronta? — indagou sem esconder o nervosismo.

Tabby nada respondeu e depois de apanhar a bolsa e trancar a porta, caminhou para o carro. Ao sentar-se, não conseguiu reprimir um murmúrio de desconforto.

— Eu sinto muito — ele falou outra vez, cheio de remorso.

— Acho que... Sentir dor é uma conseqüência natural, não é?

— Não posso dizer com certeza, pois foi a primeira vez que fiz amor com uma virgem.

— Não fizemos amor — Tabby o cortou com frieza. — Aquilo não passou de uma transa rápida, porque você precisava possuir uma mulher e eu estava à mão.

Nick estacionou o carro, acendeu um cigarro e fitou-a fixamente:

— Foi rápido, sim, mas não porque você estivesse à mão é eu precisasse de sexo. É pelo que me lembro, você não teve tempo de reclamar de nada e apenas me implorava para saciar seu desejo!

Tabby escondeu o rosto nas mãos, tomada por uma angústia infinita,

— Meu, Deus, eu não queria que as coisas tivessem acontecido daquela maneira — Nick murmurou. — Você foi maravilhosa, muito mais mulher do que todas as que eu já havia possuído antes. Por um momento tive medo de não ser capaz de satisfazê-la. Eu simplesmente não consegui me segurar e nem mesmo fiz algum esforço para... Tabby — ele indagou, apreensivo — você está num período seguro, não é mesmo? Há alguma chance de que tenha engravidado?

— Eu não sei — ela respondeu apavorada. — Oh, Nick...

— Só me faltava essa!

Tabby fechou os olhos, desejando ser possível voltar no tempo e apagar o acontecido. Como ter forças suficientes para enfrentar esse pesadelo, meu Deus?

Não precisa se preocupar, pois mesmo que eu esteja grávida não pretendo incomodá-lo em nada.                      

— Nós simplesmente fizemos amor! — ele explodiu.— Não é pecado dormir com alguém!

— Será? Então por que estou me sentindo tão envergonhada e vulgar?

—Não faça nenhuma estupidez, ouviu bem? O mundo não acabar.

— Não sou nenhuma desmiolada. Agora, por favor, me leve para a universidade.

   Nick observou-a atravessar o campus e entrar no prédio, maldizendo o momento de paixão que acabara por estragar suas vidas, Com certeza Tabby passaria a evitá-lo agora, tornando tudo ainda mais difícil. E se ela tivesse engravidado? Oh, droga! Por que não ficara em Houston?                              

O resto do dia pareceu durar uma eternidade e Tabby desempenhava suas tarefas como um verdadeiro autômato. Tudo o que conseguia pensar era que se mantivera virgem por vinte e cinco anos com a intenção de se entregar apenas ao homem amado. E então, num momento de loucura, deixara-se possuir no meio de um parque público.

O fato de amar Nick e o desejar acima de tudo no mundo, não justificava seu comportamento inconseqüente e apaixonado, pois o sentimento não era recíproco.

   Ao anoitecer, já em casa, ela não conseguia parar de se recriminar e ao mesmo tempo ansiar por um telefonema de Nick. Quando a campainha tocou, correu para atender, certa de que ele viera se desculpar pelo acontecido. Mas para sua total decepção, o visitante era Daniel.

— Eu sei que você está zangada com as coisas que eu disse — Ele foi logo se explicando. — Porém depois de pensar muito, cheguei conclusão de que uma mulher do seu tipo não iria se interessar, pôr aquele detetive playboy. Por isso vim me desculpar.

— Oh, Daniel! — Tabby exclamou deixando-se abraçar, o rosto molhado de lágrimas.

 

Da varanda de sua casa, Nick presenciou a cena, os olhos fuzilando de raiva. Ele estivera a ponto de procurá-la, mas a súbita visão o deixara confuso, magoado e profundamente enciumado. Será que Tabby pretendia levar o noivo para cama, agora que possuía um pouco mais de experiência sexual? Não, ela jamais faria isso, mesmo se amasse Daniel.

Pela primeira vez na vida, Nick se sentia inseguro, cheio de dúvidas. O fato de não ter conseguido se conter no parque, de ter seduzido uma virgem num local público, o deixava bastante perturbado. Nunca perdera a cabeça antes, sempre agira de maneira racional em seus relacionamentos amorosos. Tabby lhe dera um prazer que jamais experimentara com mulher alguma. Seria impossível esquecer uma sensação tão intensa e absoluta. Entretanto ele não soubera como lhe oferecer consolo depois de tudo terminado e provavelmente era isso o que Daniel estava fazendo neste momento.

 

— Bater em quem?

— No seu noivo. Eu vou acabar com ele, Tabby, se vir o miserável encostando a mão em você outra vez. Você me pertence!

— Não, não lhe pertenço. Por favor, me deixe em paz.

— Não posso. Primeiro tenho que resolver o caso do roubo do vaso.

— Pois faça o seu trabalho, mas não chegue perto de mim. Uma vez foi suficiente.

— Não, querida, de jeito nenhum. Você é tão doce... Jamais senti tanto prazer assim antes. Somente com você, Tabby...

Sem dizer nada, ela desligou e foi para cama, ignorando o toque insistente do telefone.

Nunca, nunca se entregaria a Nick de novo. De alguma maneira conseguiria esquecê-lo, pois não pretendia fazer parte da sua lista de conquistas. Só pedia a Deus que aquele momento de paixão não deixasse conseqüências, como uma gravidez não planejada.

 

Na manhã seguinte, Tabby precisou de toda sua força de vontade para sair da cama e vestir-se. Ainda que tentasse passar uma imagem de normalidade aos alunos, suas aulas foram dadas de maneira mecânica e impessoal.

Felizmente desde a noite anterior não falava com Nick e era provável que ele estivesse em casa, tentando curar a ressaca. Oh, Deus, como fora capaz de se entregar a um homem que sequer a amava? Como pudera ignorar seus princípios morais?

Porque o amava, pensou, amargurada. Aos seus olhos, o ato sexual tinha sido uma declaração de amor e compromisso, mas para Nick não passara de um breve momento de prazer, destituído de qualquer responsabilidade futura. Seu único consolo era o fato de que ele, sempre frio e controlado, perdera a cabeça por completo, se esquecendo de tudo na ânsia de possuí-la.

Ela nunca imaginara ser possível experimentar um êxtase tão absoluto, um prazer tão intenso e mesmo agora, com o corpo ainda dolorido e a alma em pedaços, não conseguia deixar de desejar o toque daquelas mãos sobre sua pele nua, o calor dos lábios famintos sobre os seus.

Helen já lhe havia dito que entregar-se a Nick seria o mesmo que perdê-lo para sempre, e era exatamente isso o que já estava acontecendo. Ele com certeza não a respeitava mais e não demoraria a esquecê-la, com a mesma facilidade que esquecera as outras conquistas ao longo dos anos.

Atordoada pelo rumo dos pensamentos, Tabby se esforçou para terminar a aula com tranqüilidade. Afinal, os alunos não tinham nada a ver com os problemas particulares dos professores.

— Esta placa de argila foi feita pelos sumérios, habitantes da região onde hoje se localiza o Iraque. Inteligentes e curiosos, foram unidos primeiros povos a desenvolver a linguagem escrita. Como vocês podem reparar, este artefato é recoberto por sinais pictográficos, onde os símbolos substituem as palavras. Algum tempo depois, os sumários adotaram a escrita cuneiforme, fazendo uso de sílabas. — Ela interrompeu-se e olhou para o relógio. — Bem, está na hora de terminar. Não se esqueçam de que haverá prova na quarta-feira. Estarei à disposição hoje à tarde, caso alguém tenha dúvidas e precise de explicações adicionais —disse, antes de deixar a sala.

Tabby foi para seu escritório. Depois de trancar a pequena placa de argila numa redoma de vidro e guardar a chave no bolso, resolveu ir até a sala de materiais. Ao voltar, encontrou Daniel à sua espera na companhia de um fotógrafo.

Ela cumprimentou-os com um leve sorriso, pensando que o melhor seria terminar o noivado com Daniel o quanto antes. Jamais seria capaz de se casar com um homem depois de ter se entregado a outro, especialmente quando havia a possibilidade de estar grávida.

— Tabitha, quero apresentar-lhe Tim Mathews, do Washington Inquirer. Ele veio fotografar a placa de argila.

— Claro, já ia devolvê-la a você. Espere um instante até eu destrancar a porta do meu escritório...

A fechadura cedeu facilmente, copio se alguém a tivesse forçado antes. Atônita, ela parou no meio da sala, incapaz de acreditar no que estava vendo.

— Puxa, que furo isso vai dar! — o.fotógrafo exclamou, apontando a câmera para a redoma quebrada e vazia. -— Você não disse que a placa estava num lugar trancado a chave?

—Sim — Daniel respondeu sem jeito.—Tabby, você não falou que havia deixado a porta trancada? Não foi essa a minha impressão.

—- Tenho certeza de que tranquei a porta. Acredite em mim, Daniel!

— À placa desapareceu. Olhe, tem alguns pêlos sobre a escrivaninha. Você trouxe alguma pele de animal para cá?

— Não que eu me lembre.

— A situação não me parece nada boa, Tabitha.

— Eu sei — ela murmurou encostando-se na parede. — Parece que alguém quer me incriminar.

— Acho melhor você procurar o reitor e explicar o que está acontecendo.

— Dra. Harvey, eu gostaria de tirar uma foto sua. Posso?— o fotógrafo interveio, disparando o flash sem esperar resposta.

Tabby tentou desviar o rosto e saiu do escritório, sendo imediatamente seguida por Daniel. Oh, Deus, o reitor nunca iria acreditar na sua história, Com certeza pensaria que fora ela quem roubara a peça. Ninguém apostaria na sua inocência.

— Sinto muito por tudo o que está acontecendo. Nunca duvidei da sua inocência, embora tenha dito aquelas palavras duras ontem de manhã... Acho que a presença de Nick Reed me tira do serio.

— Obrigada, Daniel —ela murmurou, os olhos cheios de lágrimas. — Mas quem mais irá acreditar na minha boa fé?

O reitor ouviu o relato do acontecido com atenção e não conseguiu esconder a irritação ao saber da presença do fotógrafo.

— E havia um jornalista na sala? O efeito será desastroso sobre a nossa reputação.

— Eu não roubei nada — Tabby falou, erguendo a cabeça num gesto de dignidade.

— Oh, não, claro que não, dra. Harvey. Não sou tão ingênuo a ponto de acreditar que você arriscaria seu emprego e reputação roubando dois artefatos cujo valor seria reconhecido apenas por um colega de profissão ou colecionador.

— Obrigada pelo voto de confiança, porém estou certa de que ninguém mais acreditará na minha inocência. Também não tenho dúvidas de que a imprensa tratará o caso com sensacionalismo.

— É verdade. Os jornais irão pintar o quadro ainda mais negro. Vá para casa agora, dra. Harvey. Tente descansar um pouco. Amanhã conversaremos.

Daniel a acompanhou até o estacionamento, tentando oferecer palavras de conforto:

— Pelo menos o jornalista já foi embora. Odeio vê-la passando por momentos tão duros.

— Realmente tem sido bastante difícil — Tabby respondeu, pensando que no espaço de dois dias sua vida virara de ponta cabeça.

— Você quer que eu vá até sua casa para revermos algumas anotações? Talvez o trabalho a distraísse um pouco.

— Não — ela retrucou depressa.

Depois dos últimos acontecimentos, a única coisa a fazer era romper o noivado, mas tinha que ser no momento certo, quando conseguisse pensar mais claramente.

— Então nos veremos amanhã. Tente descansar, querida.

— Sim. Obrigada pelo apoio.

Ao chegar em casa Tabby decidiu ligar para Helen sob o pretexto de não ter conseguido localizar Nick. Embora soubesse que precisava informá-lo sobre o novo roubo, não tinha coragem de procurá-lo.

— A redoma foi quebrada e a placa sumiu. Estava no meu escritório, a responsabilidade era minha. Eles jogarão a culpa em mim...

— Vou entrar em contato com Nick e mandá-lo procurá-la o quanto antes — Helen retrucou, percebendo a aflição da amiga.

— Não! Quero dizer, eu não estarei em casa. Preciso sair agora. Apenas conte a ele o que eu lhe falei, ok?

— Claro. Você tem certeza...?

— Sim. Obrigada.

— Então nos falamos outra hora. Tchau.

Depois de desligar o telefone, Tabby entrou no carro e rumou para a universidade, planejando deixar o veículo no estacionamento privativo e voltar para casa de táxi. Que Nick pensasse que ela passara a noite fora. Qualquer coisa seria melhor do que enfrentá-lo e às lembranças do que haviam feito juntos.

 

Nick tinha acordado com uma terrível dor de cabeça e decidira que era hora de não beber mais nem uma gota. Afinal nunca fora o tipo de buscar refúgio na bebida e não pretendia começar agora.

Seu dia fora dedicado a procurar indícios do culpado. No final da tarde, passara no laboratório do FBI para levar outra amostra de pelo animal encontrada no escritório de Tabby.

Ele chegou em casa ao anoitecer, e ao encontrar um recado da irmã na secretária eletrônica, resolveu ligar imediatamente para ela.

— Você está dizendo que Tabby não conseguiu entrar em contato comigo? — indagou, ansioso.

— Foi o que ela me disse — respondeu Helen. — Por acaso está acontecendo algo entre vocês dois que eu não saiba?

— Falo com você outra hora. Até logo irmãzinha.

Ele desligou o telefone irritado com o que acabara de ouvir. A casa de Tabby estava completamente às escuras e não havia sinal do carro dela. Será que fora se encontrar com Daniel?

Algum tempo depois Bart, o velho amigo do FBI, ligou cheio de novidades:

— Já analisei o pêlo animal que você me entregou. Está preparado para receber as notícias?

— Sim. Pode falar.

Nick começou a sorrir para si mesmo tão logo ouviu as primeiras palavras do amigo. Imediatamente uma teoria tomou forma em sua mente, a solução do caso apontando para um desfecho surpreendente. Ainda bem que não se precipitara acusando os suspeitos, pois teria exposto detalhes muito íntimos das vidas de três pessoas sem necessidade.

Depois de despedir-se de Bart, Nick ligou para a casa do reitor e embora não revelasse sua teoria, fez uma serie de perguntas e pareceu ficar bastante satisfeito com as respostas.

Agora tinha certeza de que a verdade viria a tona. Seria uma questão de armar a armadilha e chamar as pessoas certas para testemunhar o evento.                        

Mas antes de mais nada precisava falar com Tabby. Disposto a insistir a noite inteira, caso fosse preciso, discou os números e aguardou pelo que pareceu uma eternidade.

— Alô.

— Sou eu — ele falou. — Ei, você está me ouvindo?

— Sim. Outro objeto desapareceu hoje.

— Helen me contou. Será impressão minha ou você tem me evitado? Será que ainda não superou o que aconteceu entre nós?

— Eu... não sei como lidar com esse tipo de situação. Nunca vivi nada assim antes.

— Não é preciso ficar me lembrando o tempo inteiro que eu a seduzi. Minha consciência já é o bastante.

— Eu deveria ter dito não, na hora.

— Você realmente acredita que um simples "não" teria conseguido me deter naquela altura dos acontecimentos?

— Não sei...

— É muito difícil para um homem recuar depois de alcançar aquele estágio de excitação. Mas foi a primeira vez que perdi a cabeça e não consegui me controlar.

— Você descobriu alguma coisa nova? — Tabby indagou, mudando de assunto, esforçando-se para aparentar naturalidade.

— Sim, mas não me pergunte o quê. Tenho algo planejado para amanhã que com certeza irá inocentá-la.

— Então já sabe quem roubou os objetos?

— Sim.

— Daniel não é culpado de nada, é?

— Você o ama? — ele perguntou rudemente. — Quero uma resposta agora, Tabby!

— Como você mesmo disse, se eu amasse meu noivo não me entregaria a outro homem.

— Sarcasmo não combina com você. Além do mais, alguém da sua idade já deveria saber que amor e sexo nem sempre andam juntos. E como nunca amei ninguém, não sou a pessoa indicada para falar do assunto.

Tabby fechou os olhos, sentindo uma tristeza infinita. Nick acabara de deixar bem claro que na relação entre ambos só havia lugar para desejo sexual. Ao perceber o quanto fora insensível, ele tentou consertar:

— Você é importante para mim e faz parte da minha vida, do meu passado. Nos conhecemos há anos. Eu quis possuí-la, mas não de uma maneira impessoal. Se fosse apenas sexo, não teria perdido o controle a ponto de não tomar precauções para protegê-la de uma gravidez indesejada.

— Indesejada da sua parte.

— Não estou pronto para a paternidade. Sou um tipo inquieto e não pretendo me fixar em lugar nenhum, por enquanto.

— Não lhe pedi isso.

— Se você estiver grávida...

— Se eu estiver grávida, falaremos sobre o assunto quando chegar o momento. Jamais farei um aborto, portanto essa opção está fora de cogitação.

Nick não disse uma palavra, pois não sabia o que dizer. A idéia de ter um filho a quem não pudesse ver crescer era dolorosa demais. Na verdade ele tinha medo de amar e perder, por isso se negava a deixar os sentimentos florescerem.

Tabby não podia saber o que passava pela cabeça de Nick e interpretou o silêncio como total falta de interesse. Convencida de que não tinham mais nada a se dizer, desligou o telefone.

Oh, Deus, se ao menos não precisasse depender de Nick para provar sua inocência! Tão logo o caso fosse resolvido ele voltaria para Houston e os dois perderiam o contato. Tabby tentava ser realista, dizendo a si mesma que ele não voltaria a procurá-la depois de já tê-la possuído uma vez e satisfeito a curiosidade. Mas apesar de seus esforços, só conseguia pensar no quanto o amava e no quanto o queria perto de si. Para sempre.

Exausta física e emocionalmente, ela desligou as luzes e deitou-se. Talvez o futuro lhe parecesse menos negro depois de uma boa noite de sono.

 

Tabby continuou sua rotina com aparente tranqüilidade, dando aulas na universidade e fazendo pesquisas. Mas mesmo depois de já terem passado três dias, ainda tinha a sensação de que todos olhavam para ela e adivinhavam o que tinha feito com Nick no parque.

Ao final de uma aula, encontrou Daniel esperando-a na porta do escritório, parecendo seriamente perturbado.

— Eu nunca deveria ter trazido aquele jornalista aqui — ele foi logo dizendo.— Temo ter tornado as coisas ainda piores para você.

— Não se preocupe — Tabby respondeu sem interesse. — Não foi culpa sua.

— Estive pensando, acho que deveríamos voltar a procurar um anel de noivado. Afinal visitamos apenas uma joalheria, e há outras opções na cidade...                                

— Daniel, eu não posso me casar com você — disse, ela, em tom firme. — Sinto muito.

— Mas por que não?

— Simplesmente... Não posso. Não daria certo.              

— Tabitha, você está preocupada por causa da acusação de roubo?

— Não. Nós não fomos feitos um para o outro, só isso. É claro

que continuarei a ajudá-lo na pesquisa para o livro, mas casamento está fora de cogitação.      

— Então você não se importar em me ajudar no livro?

— Não — respondeu ela, sentindo-se quase enojada.

Então a única preocupação de Daniel era mesmo o livro, o rompimento do noivado não significava nada para ele! Nick tinha razão: Daniel não passava de um egoísta interesseiro.

— Responda sinceramente, há algo entre você e Nick Reed? — indagou Daniel, de repente.

— Ele não quer assumir nenhum compromisso.

— Entendo... Bem, quero deixar claro que não guardo ressentimento por causa do rompimento de nosso noivado — Daniel murmurou, fitando-a com curiosidade. — Telefono para você mais tarde, para trocarmos idéias sobre o novo capítulo do livro, ok?

Mais tarde, ao sair de seu escritório, Tabby encontrou-se com o reitor, que parecia bastante agitado.

— Sinto ter de lhe dizer isso, mas a história sobre o roubo das peças está em todos os jornais. Talvez fosse bom você tirar alguns dias de licença, pois os jornalistas não parecem dispostos a sair do campus e não lhe darão sossego — sugeriu o reitor. — Um professor substituto assumirá suas aulas até que o assunto seja resolvido.

— Você acredita que eu possa ter roubado as peças? — indagou Tabby, preocupada.

— Não — o reitor respondeu com delicadeza e sinceridade. — Tente não se preocupar demais. Tudo dará certo.

— Então ficarei em casa e só voltarei ao trabalho quando o caso estiver esclarecido. Eu só gostaria de frisar mais uma vez que não sou culpada. Se eu quisesse roubar algo, escolheria objetos que pudessem ser vendidos rapidamente, como uma das jóias da nossa coleção espanhola. Afinal, placas e vasos de cerâmica costumam ser apreciados apenas por colecionadores e historiadores.

— É claro que você tem razão. Nem por um momento a considerei culpada, mas precisamos pensar na reputação da universidade e nos efeitos negativos que tal publicidade pode causar.

— Entendo. Só gostaria de poder expressar esse ponto de vista à imprensa.

— Pode ficar tranqüila, eu me encarregarei de fazê-lo.

— Obrigada.

Tabby caminhou cabisbaixa até o estacionamento. Entrou no carro e tomou o caminho de casa, pensando que nunca se sentira tão arrasada em toda sua vida. Além da possibilidade de vir a ser mãe solteira, também corria o risco de perder o emprego. Tanta angústia estava além das suas forças e no momento não podia fazer nada a não ser chorar.

Embora tivesse quase certeza absoluta sobre a identidade do culpado, Nick continuava estudando outras possibilidades. Segundo as informações levantadas por Helen, o dr. Day mantinha um padrão de vida elevado porque sua esposa recebera uma herança poucos meses atrás. Já o dr. Flannery estava enfrentando dificuldades financeiras justamente porque sua mulher fugira com outro homem, deixando dívidas enormes para trás. E as despesas com o divórcio minguavam ainda mais seu salário de professor.

Restava apenas Daniel, cuja omissão deliberada de acontecimentos passados o colocava no topo da lista de suspeitos. Mas por que ele roubaria um objeto antigo, lançando suspeitas sobre sua noiva e colaboradora no livro que estava escrevendo?

O toque do telefone interrompeu os pensamentos de Nick. Era o oficial de polícia com quem ela falara horas antes, acertando o dia e a hora em que deveria ir à universidade. Um outro telefonema garantiu a presença de outra testemunha importante. Agora só precisava preparar a armadilha e aguardar.

Logo Tabby se veria livre das suspeitas e ele poderia voltar para Houston, colocando um ponto final no que acontecera entre ambos. Oh, Deus, se ao menos não a tivesse tocado conseguiria se sentir em paz com a própria consciência. Era verdade que apenas tomara o que lhe fora oferecido, entretanto quase nada dera em troca e nem mesmo fora capaz de amá-la com doçura, deixando uma lembrança suave do ato de amor. Seu desejo alucinado o fizera pensar primeiro em alcançar o próprio prazer. Droga! Deveria ter sido mais gentil, mais delicado. Contudo, de nada adiantava remoer o remorso. O melhor a fazer era pensar no presente e resolver o caso para o qual fora contratado.

Agora que, segundo sua teoria, as evidências apontavam para o culpado, precisava agir o quanto antes. Mas primeiro teria que colocar Tabby a par de seus planos.

Nick foi até a janela e olhou a casa vizinha. O carro já estava na garagem, portanto ela devia estar em casa.  

Embora desejasse muito vê-la, ainda hesitava. A certeza de que agira de modo indesculpável, destruindo todos os sonhos românticos de uma mulher pura e inexperiente, o deixava profundamente deprimido. Mesmo que não houvesse uma gravidez indesejada, a lembrança daquele dia no parque a assombraria para sempre.

Nick tentava se consolar, dizendo a si mesmo que jamais tivera intenção de insultá-la e que perdera o controle apenas porque a desejava desesperadamente. Por outro lado, sabia-se um homem experiente e deveria ter sido capaz de parar antes que o irremediável acontecesse. Por que então agira como um adolescente apaixonado?

Por fim Nick decidiu não procurá-la, mesmo que a vontade de vê-la fosse quase insuportável.

   Tenso, ligou o aparelho, de som e preparou-se para passar mais uma noite em claro.

 

Tabby olhou-se ao espelho, mal se reconhecendo naquela mulher abatida e desanimada. O fato de não poder ir trabalhar servia apenas para piorar as coisas, aumentando a sensação de solidão e abandono. Depois de ligar a secretária eletrônica, para se ver livre dos telefonemas insistentes dos jornalistas, resolveu fazer uma faxina geral na casa. Quem sabe assim conseguiria desviar o pensamento do assunto que tanto a afligia. Mas ao reconhecer a voz de Helen deixando um recado na secretária, agarrou o fone no mesmo instante,ansiosa para ouvir uma palavra amiga.

— Helen, que bom falar com você! O telefone não parou de tocar o dia inteiro, o reitor não quer que eu vá trabalhar e...

— Vá com calma, minha amiga — interrompeu-a Helen. — Já sei que a história saiu nos jornais. À imprensa diz que você é a principal suspeita e que foi suspensa da universidade.

— Oh, Helen, o que eu vou fazer da minha vida? — ela murmurou, deixando-se cair numa poltrona.

— Nick ainda está aí, certo? Ele deve estar trabalhando para solucionar o caso, não se preocupe.

— Sim, seu irmão está aqui, mas creio que ainda não tem nenhum suspeito.

— Engano seu. Na verdade, de uma lista de três suspeitos, restou somente um O dr. Flannery e o dr. Day parecem inocentes. Daniel Myers, por sua vez...

— Daniel?

— Sim. Mas Nick se recusa a entrar em maiores detalhes e também se nega a falar de uma determinada teoria sobre o possível ladrão.

— O que vocês descobriram, a respeito de Daniel?

— Desculpe-me, querida, essas são informações confidenciais. Fique tranqüila, Nick vai resolver o problema muito em breve.

— Daniel seria incapaz de roubar, Helen, e o que quer que ele possa ter feito no passado não vem ao caso. Você o conhece tão bem quanto eu, sabe que Daniel é um tipo certinho, para quem a lei e a ordem estão acima de tudo. Uma personalidade tão reta não combina com o perfil de um ladrão.

— Não, é claro que não... Mas ele é o único suspeito com motivo e oportunidade para praticar o roubo.

— Há um outro suspeito. Eu. Talvez eu tenha dupla personalidade e por isso não consiga me lembrar de certos atos, daí...

— Pare com isso, minha amiga! Tente manter a cabeça fria. Nick vai provar sua inocência.

— Parece difícil -— Tabby resmungou, aflita. — Bem, preciso desligar agora. Acho que tem um jornalista lá fora, tentando tirar fotos através da janela.

— Jogue um vaso na cabeça dele.

— Se eu o matar acidentalmente irei para a cadeia, acusada de assassinato — ela respondeu, tentando rir — Do jeito que a minha sorte anda, é só o que falta me acontecer.

— Não se entregue ao desespero.

— Você não sabe nem da metade.

— Tente descansar, dormir durante algumas horas. Se vir Nick, peça a ele para me telefonar. Quem sabe não terei outras informações?

— Combinado. Obrigada por telefonar, amiga.

— Não deixe de entrar em contato comigo se precisar de ajuda, ok? E não se preocupe, tudo acabará bem.

— Você está querendo dizer que a verdade aparecerá? Mas isso pode demorar, até lá já estarei velha.

— Deixe de tolices e vá dormir, menina.

— Está bem. Boa noite.

— Boa noite. Telefono outro dia.

Tabby voltou a ligar a secretária eletrônica e o número de recados deixados por jornalistas não parava de aumentar. Se ela estivesse mais calma poderia até mesmo preparar uma nota para ser distribuída à imprensa, porém não se sentia em condições de raciocinar com clareza. Olhando através da janela, reparou que havia pegadas na grama do jardim. Ótimo, pensou, o tal fotógrafo deve ter conseguido uma foto minha. Exausta, fechou a cortina e sentou-se diante da tevê, tentando esquecer as preocupações.

Os próximos dois dias foram de intenso sofrimento e Tabby sequer linha coragem de pensar cm Nick. Daniel telefonou algumas vezes, dizendo que gostaria de visitá-la, no que foi desencorajado. Um jornalista permanecia de plantão, acampado defronte ao portão; era incrível pensar que o sumido de uma peça antiga pudesse ter provocado tanto rebuliço na imprensa. Será que não estava acontecendo mais nada de interessante no mundo?

No fim do terceiro dia, alguém bateu à porta. Era Nick. Embora relutante, Tabby deixou-o entrar.

— Eu desliguei a cafeteira do jornalista de plantão e a criatura insistente não teve outro remédio a não ser ir até a lanchonete mais próxima para comer alguma coisa.

— Obrigada.

_ Você não vai me deixar entrar? — ele indagou, sentindo-se estranhamente emocionado.

— Suponho que não tenha outra alternativa.

Tabby estava usando um vestido azul de algodão e tinha os longos cabelos presos numa única trança. A ausência de maquiagem a deixava ainda mais pálida, evidenciando as olheiras escuras.

— Será que é imaginação minha ou você tem me evitado?

— Por que veio me procurar, Nick? — ela perguntou friamente.

— Descobri uma nova pista. O ladrão deixou pequenas evidências no último furto: um tufo de cabelos e pequenas gotas de sangue.

— Então nosso suspeito é um homem careca e ferido?

— Não necessariamente. Levei as amostras para o laboratório do FBI e já tenho os resultados. Também entrei em contato com um oficial de polícia e com o jornalista que andou rondando sua casa. Pedi a ambos que fossem à universidade hoje à noite. Vamos todos nos trancar em seu escritório e esperar pelo ladrão. Gostaria que você estivesse presente.

— Helen disse que Daniel encabeça sua lista de suspeitos.

— De fato. Quando conversei com minha irmã, tudo apontava para o seu noivo. Isso a incomoda?

— Sim. Embora tenhamos rompido o noivado, Daniel continua sendo um bom amigo e colega de trabalho.

— O quê? Vocês romperam o noivado?

— Eu não podia continuar noiva depois... Depois do que aconteceu entre nós.

— Mas nosso envolvimento foi passageiro — ele respondeu irritado. — Mulheres modernas têm casos rápidos com freqüência.

— Mas eu não — Tabby rebateu, fitando-o fixamente. — Não sou do tipo capaz de me comprometer com um homem quando já estive envolvida de maneira íntima com outro. Ainda mais agora, sem ter certeza se estou grávida ou não.

— Não é comum uma mulher engravidar logo na primeira vez. Talvez você esteja se preocupando a toa.

— A que horas você quer ir para a universidade? — ela indagou, mudando de assunto.

Nick sentia-se estranhamente abalado, como se aos poucos estivesse perdendo o controle da situação e de si mesmo. Quando a fitava só conseguia pensar no corpo perfeito, escondido sob camadas de roupas severas, no ardor com que Tabby se entregara, louca de paixão... Como se contentar com as lembranças, agora que já provara um prazer tão intenso? — Posso lhe dar uma carona — ele sugeriu.                  

— Não, obrigada. Daniel virá me buscar.

— Ele não foi convidado.

— Mesmo assim, estará lá. Você o considerou o suspeito número um durante algum tempo, portanto creio que ele tem o direito de estar presente quando o mistério for esclarecido.

— Talvez fosse uma boa idéia convidarmos os vizinhos também — Nick ironizou.

— Por mim, tudo bem. Quanto mais pessoas testemunharem minha inocência, melhor. Oh, Deus, aposto que tem gente acreditando que eu seja uma agente secreta, roubando microfilmes,

— Escondidos em peças de cinco mil anos de idade? Apenas jornalecos seriam capazes de imaginar tamanho disparate. Então está combinado, nos encontramos na universidade às dezoito horas.

— Daniel seria incapaz de roubar alguma coisa — ela insistiu, acompanhando-o até a porta.

— Não se preocupe, seu amigo não é o culpado. Devia ter sido ele seu acompanhante no parque, não é?

— E que diferença isso faz agora?

— Nenhuma, acho. Se eu pudesse voltar atrás, não teria feito o que fiz.

— Nem eu — ela murmurou sem esconder a profunda tristeza. Ao ver-se sozinha de novo, Tabby decidiu se arrumar, vestindo um conjunto de saia e camisa de seda rosa clara. Sem dúvida o encontro seria tenso, tendo o policial, o jornalista Nick e Daniel confinados numa mesma sala, só Deus sabia por quanto tempo.

Se tudo desse certo, seu nome logo estaria limpo e Nick voltaria imediatamente para Houston. Então ela se dedicaria às aulas de antropologia e contaria os dias até ter certeza de que o encontro no parque não deixara conseqüências. É claro que não se casaria com ninguém, pois a despeito de si mesma, continuava amando Nick mais que a própria vida. Talvez fosse sua sina, apaixonar-se por um homem disposto a permanecer solteiro para sempre.

Ansiosa para passar o tempo, Tabby ligou para Daniel contando os últimos acontecimentos é tendo o cuidado de não mencionar que ele fora um dos suspeitos.

— Então Reed apanhou o ladrão?

— Parece que sim — ela retrucou. — Acho que Nick não chamaria a polícia e o jornalista se não pudesse apresentar provas concretas. Não seria uma atitude inteligente.

— Realmente não. Mas para ser sincero, não creio que seja preciso muita inteligência para desempenhar as funções de detetive. Pouca gente desse círculo deve ter uma educação intelectual aprimorada.

— Talvez você se surpreenda.

— Não com o seu amigo de infância — Daniel retrucou com desdém.—A propósito, você tem trabalhado nas anotações que eu lhe dei? Já acrescentou-as ao livro?

— Sim. Como não saí de casa nos últimos dias, passei horas adiantando várias capítulos.

— Ótimo! Ah... Será que você se importaria de levar o material para eu ler hoje à noite?

— Sim —ela respondeu, irritada.

Mesmo num momento tão decisivo quanto aquele, tudo em que Daniel conseguia pensar era no tal livro.

— Obrigado. Vejo você às dezoito horas então.

Tabby desligou o telefone, sentindo-se mais insignificante do que nunca. Por que teimava em se envolver com homens que a consideravam inteligente, porém pouco digna de ser amada? Nunca, nunca iria casar-se.

Mas talvez estivesse grávida. A idéia de ter um bebê era adorável, embora assustadora. Ela dedicaria toda sua vida a criar o filho e nada diria a Nick.

Ou melhor, não, seria impossível esconder a criança. Helen suspeitaria de que algo estava errado e logo mencionaria o fato ao irmão. Tabby suspirou fundo, dizendo a si mesma para pensar nos problemas presentes e deixar o amanhã entregue nas mãos de Deus.

Minutos depois ela abria a porta de seu escritório, tentando se preparar para a longa noite. Já estava escurecendo lá fora e os outros não tardariam a chegar.

Era incrível pensar como sua vida mudara em tão pouco tempo. Há menos de um mês atrás ela estava noiva de Daniel e dedicava suas horas às aulas na universidade e ao livro. Desde a festa de reveillon jurara esquecer Nick, pois finalmente se convencera de que seu amor jamais seria correspondido. Resignada com a sorte, decidira ser esposa de Daniel e dar aulas até se aposentar.

Entretanto o destino fora cruel e lhe pregara uma peça. Talvez até mesmo pudesse reatar o noivado, mas teria que ser sincera e contar o que acontecera entre Nick e ela, expondo sua vergonha aos olhos de terceiros.

Uma batida à porta arrancou-a dos pensamentos sombrios.

— Entre — falou, nervosa.                                               .

— Estes são Jennings, oficial de polícia, e Tim Mathews, jornalista — Nick entrou na sala e apresentou os dois homens que o acompanhavam. — Tim é aquele mesmo que esteve acampado no seu jardim, Tabby, mas acho que agora pretende ficar um bom tempo no seu escritório, pois trouxe até uma cafeteira elétrica!

— Prazer em conhecê-los— ela respondeu, tentando conter o riso.                                                                                                                                      

— Você sabia que Tabby tem mestrado em antropologia?

— Sim. É uma profissão muito interessante — Mathews retrucou. — Sinto-me como uma espécie de detetive. Escavamos mistérios do passado e tentamos resolvê-los.

— Pensei que seu ex-noivo viesse também — Nick interveio.

— Já deve estar a caminho.

— É melhor que chegue logo, ou atrapalhará meus planos.

— Atrapalhar quais planos? — Daniel indagou, entrando na sala. —Estou atrasado?    

— Sim, mas não se preocupe —.Nick retrucou, irônico.

— É o que farei. Você quer que eu tranque a porta?

— Sim, por favor.

— Você trouxe as anotações que lhe pedi? — Daniel perguntou a Tabby.

— Desculpe, mas esqueci a papelada sobre a mesa da sala de jantar.

— Oh, droga! Bem, na volta passarei na sua casa para apanhar o material.

— Tabby tinha outras preocupações — Nick falou secamente, fitando Daniel com desprezo. — Tenho certeza de que limpar o próprio nome é mais importante que algumas anotações.

— Sim... Claro — o outro respondeu sem jeito. Tentando mudar de assunto, virou-se para o policial e indagou: — Essa situação não é uma cilada?

— Não exatamente. O sr. Reed sabe mais sobre o assunto do que eu.

— Imagino que saiba porque trabalhou no FBI — Daniel resmungou irritado.

— Claro que não — Jennings respondeu, firme. — É porque ele é advogado.

— Você nunca me disse que era advogado — Daniel falou, fitando Nick com novo interesse. — Em qual universidade estudou?

— Harvard.

— Oh... — foi tudo o que Daniel conseguiu dizer ao saber que Nick se formara numa das melhores universidades do mundo. — Tabitha, você está parecendo abatida. Por que não se senta um pouco?

— Essa foi a semana mais longa da minha vida.

— Não se preocupe, menina, nós limparemos seu nome. E então você poderá reconsiderar o oferecimento daquele anel de noivado.

Tabby nada respondeu e fechou os olhos, não notando a raiva estampada no rosto de Nick.

— É melhor ficarmos quietos agora — Jennings sugeriu. —Talvez tenhamos que passar a noite em claro.

— Espero que não. Não vejo a hora de tudo terminar — Tabby murmurou, suspirando.

— Eu também — Daniel falou. Mas ninguém lhe deu atenção.

 

Duas horas se passaram sem que nada acontecesse. Tabby sentia-se tão nervosa que mal podia respirar. E se Nick estivesse errado? E se o ladrão não aparecesse? Então sua carreira estaria encerrada e seu nome manchado para sempre.

— Isso é absurdo — Daniel resmungou. — Estamos perdendo tempo.

— Esteja à vontade para se retirar — Nick falou com desprezo. — Ficaremos bem sem você.

— Bem... Acho que esperarei mais um pouco.

Um súbito barulho quebrou o silêncio. Nick levou um dedo aos lábios e fez sinal para que todos se abaixassem.

Embora a porta estivesse trancada, alguém parecia não ter problemas para arrombar a fechadura.                  

Segundos depois, a porta foi escancarada e na escuridão do escritório ouviu-se o barulho de uma cadeira caindo no chão.

— Agora! — Nick gritou, acendendo a luz, enquanto o jornalista disparava o flash da câmera.

Sentado sobre a escrivaninha, segurando a estatueta de plástico que servira de isca na mão enfaixada, estava Pal.

— Meu Deus! — Daniel exclamou. — É o danado do macaco!

— Pal! — Tabby murmurou incrédula. — Como foi que ele conseguiu abrir a fechadura?

— Aposto que Pal está escondendo os produtos de seus roubos no laboratório de biologia. Vamos!

Todos saíram atrás de Nick, que provou ter razão. Dentro de uma caixa, usada para guardar sementes, estavam o vaso e a placa de cerâmica, além de outros objetos.

— Aqui está meu batom Tabby observou, rindo. — E o espelhinho que eu não conseguia achar. Olhe, Daniel, a haste do seu cachimbo!

— Que história isso não vai dar! — Tim exclamou, tirando fotos do grupo.

— Será que devemos levar esta coleção de objetos roubados para o dr. Flannery? — Daniel indagou, parecendo divertir-se com a situação. — Ele vai ter um ataque! Quero ser um mico de circo se o reitor não cancelar a pesquisa.

— Tim, gostaria de ver a história nos jornais de amanhã para que Tabby possa se ver livre de todo esse aborrecimento.

— Não se preocupe, Nick. Já estou até vendo as manchetes: "Bela Professora Acusada Em Lugar De Um Macaco!" Acho que darei um toque romântico à reportagem, dizendo que Pal colecionava objetos pertencentes a Tabby porque estava apaixonado por ela.

— Oh, meu Deus! — exclamou Tabitha, rindo.

— Será que você, Nick, poderia me contar como chegou à conclusão de quem era o ladrão? —pediu o jornalista. — Quero escrever a história completa e preciso de detalhes.

— O ferimento na mão de Pal foi a chave para a solução do mistério. No dia do segundo furto, descobri uma pequena mancha de sangue e um tufo de pêlos sobre a escrivaninha de Tabby. Depois de colher o material, mandei-o para o laboratório do FBI para ser analisado. O resultado dizia tratar-se de sangue e pêlos pertencentes a um macaco. Na verdade eles foram até mesmo capazes de estabelecer a altura, peso e idade aproximada do animal, todas as informações partindo da pequena amostra.

— Incrível, não? — Tim comentou, admirado. — E pensar que uma simples gota de sangue contém tantas informações sobre um animal ou uma pessoa! É um avanço da medicina capaz de ajudar na solução de muitos crimes. Bem, dra. Harvey, agora eu gostaria de tirar mais algumas fotos suas, e depois a deixarei cm paz.  

— Acho que vou deixar para pegar as anotações amanhã — Daniel falou aproximando-se de Tabby enquanto Nick conversava com o jornalista e o oficial Jennings — Talvez eu possa lhe dar uma carona até o trabalho.

— Obrigada.

— Estou feliz que tudo tenha sido esclarecido. Por algum tempo pensei que suspeitassem de mim também. Sabe, no início dos anos setenta participei de uma passeata contra a guerra e por isso dormi uma noite na prisão. Omiti essa informação da minha ficha por medo de ser considerado um radical.

— Não se preocupe. Acho que nunca chegaram a duvidar da sua integridade.

— Mesmo assim, sinto-me aliviado agora.

— Eu também.                                                              

Sim, era bom que tudo estivesse terminado. Logo Nick voltaria para Houston e ela tentaria juntar os cacos nos quais sua vida se transformara.

No estacionamento da universidade, ao se verem a sós, Nick sugeriu:

— Você poderia deixar seu carro aqui e ir embora comigo. Já que Daniel vai passar na sua casa amanhã de manhã para pegar as anotações, ele pode lhe dar uma carona até o trabalho.

— Não acho que...

— Está tarde e não é seguro andar por aí sozinha. Vou ficar mais tranqüilo se você for comigo.

Era incrível como Nick tinha coragem de dizer uma coisa dessas depois de tê-la seduzido num parque público!

O trajeto foi feito no mais absoluto silêncio. Depois de estacionar o carro, ele pegou Tabby pelo braço e caminhou na direção da própria casa.

— Espere, não pretendo entrar!

— Sim, você vai entrar. Precisamos conversar a sério.

— Poderemos conversar amanhã...

— Amanhã voltarei para Houston.

— Oh.

— Sente-se — Nick falou, apontando na direção do sofá. — Gostaria de beber algo?

— Não, obrigada.

— Eu estava pretendendo lhe oferecer café.

— Oh... Sim, por favor.

Ele foi até a cozinha e depois de preparar a cafeteira elétrica, voltou para a sala.

— Não há mais nada com que se preocupar, Tabby. Seu nome está limpo e tenho certeza de que o reitor a receberá amanhã com um pedido de desculpas. Aposto que o dr. Flannery também se desculpará pelo transtorno que lhe causou.

— Na verdade o dr. Flannery não tem culpa nenhuma. Eu é que me sinto um pouco culpada quando penso que você precisou vasculhar o passado de meus colegas sem necessidade.

— Nós não sabíamos que não seria necessário. Além do mais nunca lhe contei o que descobri sobre os suspeitos, nem jamais contarei a ninguém. Sou detetive particular, lembra-se? Tenho um código de ética a obedecer.

— Eu sei. Mas não consigo fugir à sensação de que causei problemas a muita gente.

Nick ficou um silêncio durante vários minutos pensando no quanto Tabby se encaixaria em sua vida com perfeição, caso estivesse decidido a casar-se. Mas como não era essa sua intenção, melhor deixar tudo bem claro.

— Eu queria me desculpar, mais uma vez, pelo que aconteceu entre nós. Também gostaria de dizer que se houver certas... complicações... gostaria de ser informado.

— Não creio que haja necessidade, porque não pretendo me livrar da criança. Mesmo que isso lhe seja inconveniente.

— Mas eu não sugeri...

— Não importa — ela falou levantando-se, o rosto em fogo, as mãos tremulas.

— Você não consegue superar o fato de ter feito sexo comigo, não é mesmo Tabby? Talvez pense que tenha cometido um pecado mortal.

— Nick...

— A sua ingenuidade é surpreendente — ele murmurou, tocando-a nos ombros.— E o que eu mais odeio nessa história toda e que não tive tempo de lhe ensinar os prazeres de fazer amor.

— Não, por favor...

— Apenas um beijo, nada mais...

Nick beijou-a apaixonadamente, moldando os corpos de ambos num abraço intenso, carregado de sensualidade. Tabby tentou resistir, porém o desejo era maior do que o medo e logo seus lábios se separaram para receber a língua do homem amado,

— Você é tão doce, querida... É como se o gosto de seus lábios me deixasse embriagado...

Ao sentir as mãos fortes abrirem os botões de sua blusa e livrarem-na do sutiã, ela fechou olhos, rendendo-se aos sentimentos. Sim, amava Nick e nada mais importava a não ser o prazer do momento presente.

Nick sabia que já era tarde demais para voltar atrás. O desejo mútuo transparecia nas carícias ávidas, nos beijos vorazes. Seria impossível evitar o que estava para acontecer; Tabby sequer esboçou qualquer gesto de resistência quando foi pega no colo e levada para o quarto. Ela o desejava desesperadamente e aquela seria a última vez que fariam amor...

Logo estavam os dois sobre a enorme cama de casal, acariciando, beijando, seduzindo um ao outro. Nick murmurava palavras ternas e a tocava de maneira ousada, deixando-a num estado de excitação febril e alucinada. Ao sentir os mamilos serem sugados com força, Tabby estremeceu e gemeu alto, entreabrindo as pernas num movimento inconsciente. Louca de paixão, ela abraçou-o com força, implorando para ser possuída.

— Devagar, querida. Ainda não.

— Por favor...

— Confie em mim — Nick murmurou com voz trêmula. — Tente se acalmar. Quero fazer amor com você a noite inteira, excitando-a até a explosão final. Vamos alcançar o clímax juntos, será algo que jamais conseguiremos esquecer...

Então ele recomeçou a acariciá-la, lambendo e sugando cada parte daquele corpo perfeito, deixando-a num estado quase irracional de prazer. Ao sentir as investidas tornarem-se cada vez mais profundas e urgentes, Tabby enterrou as unhas nas costas largas, gritando o nome de Nick sem nem mesmo perceber.

O êxtase foi tão intenso, que Nick estremeceu violentamente, o corpo forte sacudido por convulsões. Quando por fim conseguiu pensar, murmurou:

— Pelo menos desta vez fui capaz de protegê-la de uma possível gravidez.

Tabby mal ouviu o que ele estava dizendo. Apenas fechou os olhos e dormiu, exausta e saciada.

A luz da manhã acabou por acordá-la. Atordoada, ela sentou-se na cama, o corpo nu ainda guardando as marcas da noite anterior. A visão de Nick saindo do banheiro, com uma toalha amarrada na cintura, a trouxe de volta ao presente.

Sem nada dizer ele se aproximou da cama, fitando os seios de Tabby fixamente.

Num gesto inconsciente de pudor, ela puxou o lençol para cobri-los, embora não conseguisse desviar o olhar do peito másculo e bronzeado.                  

— Você quer me ver por inteiro? — ele indagou baixinho, deixando a toalha cair no chão e revelando seu estado de crescente excitação.

Tabby respirou fundo, fascinada por tanta perfeição. Nick era o ideal de beleza masculina, o sonho de qualquer mulher.

— Seu corpo tem o mesmo efeito em mim — ele falou arrancando o lençol da cama e expondo a nudez de Tabby aos seus olhos ávidos. — Você está se sentindo bem, hoje?

— Se está querendo saber se estou dolorida, a resposta é sim — ela respondeu, enrubescendo.

— Suponho que fosse de se esperar. Ontem à noite pude protegê-la de uma gravidez indesejada, mas hoje teria de contar apenas com a minha força de vontade e não sei se conseguiria. Não queria ir embora sem mostrar a você como deveríamos ter feito amor naquele dia no parque.

— Pode estar certo de que conseguiu — ela murmurou cobrindo-se com o lençol. — Obrigada pela aula.

— Não tive intenção de lhe dar uma aula — Nick retrucou sem jeito, passando a toalha ao redor dos quadris. — Foi um pedido de desculpas.

— Você é um amante perfeito — Tabby tentava falar com naturalidade, embora tivesse a alma cheia de mágoa. — E certamente encontrará parceiras à sua altura, o que não parece ser o meu caso.

— Você é apenas uma mulher sem experiência, mas se sair da redoma em que vive logo aprenderá como as pessoas agem no mundo real. Fazer amor é tão natural quanto respirar, e não é preciso sentir remorso ou sentimento de culpa.

— Tenho que ir agora. Meus alunos logo estarão chegando à universidade — desconversou Tabby.

Nick entrou no banheiro e bateu a porta, odiando-se por se sentir envergonhado. Droga! Não é preciso estar apaixonado para se entregar aos prazeres do sexo! Ao sair encontrou Tabby já vestida, os cabelos presos num coque severo, o rosto sem maquiagem. Ela parecia quase a mesma de antes, exceto pela tristeza infinita do olhar.

— Droga! Você me queria, também! — ele explodiu. — Você se entregou porque me desejava!

— Porque te amava — Tabby corrigiu, fitando-o fixamente. — Não acho que essa declaração seja novidade, pois é impossível que um homem com a sua experiência ainda não tivesse percebido nada. Se você também me amasse eu não estaria me sentindo envergonhada, e sim feliz. Mas como o sentimento não é recíproco, não passo de mais uma conquista, de uma amante casual. Talvez seja por isso que me sinta tão... sórdida.

Nick ficou em silêncio, sem saber o que pensar, o que responder. Tabby sempre fizera parte de sua vida e agora estava a ponto de perdê-la por causa da sua precipitação em estabelecer um tipo de relacionamento que nenhum dos dois estava preparado para enfrentar. Talvez tivesse sido mais sensato não possuí-la, entretanto como ignorar aquele desejo intenso que consumia seu corpo cada vez que estavam juntos? Depois de ter experimentado um êxtase tão absoluto, seria impossível não ansiar por mais...

Sim, ele sabia que Tabby o amava. O abandono, a sofreguidão com que ela se entregara só podia ler uma explicação: amor. E quem sabe aquele amor não frutificaria, dando-lhe um filho...

Sem saber o que se passava no íntimo de Nick, Tabby deu-lhe as costas e saiu do quarto. Que os vizinhos pensassem o que quisessem ao vê-la sair da casa de um homem àquela hora da manhã. Sua reputação já estava mesmo arruinada e jamais voltaria a ser considerada a moça de conduta impecável que sempre fora. Nem mesmo por si mesma.

— Tabby — ele chamou, alcançando-a na sala. — Não vá ainda. Precisamos conversar.

— Não temos mais nada a nos dizer.

Sem lhe dar tempo para responder, ela caminhou na direção de casa, fazendo questão de manter a cabeça erguida. Bastava de humilhações.

Nick correu atrás dela, mas Tabby fechou a porta sem lhe dar ouvidos, sem desconfiar que ele pretendia falar de um sentimento estranho, de uma sensação desconhecida que vinha tomando conta de seu coração. Um homem só perdia completamente a cabeça por uma mulher quando dominado por intensa emoção. Uma simples atração sexual não desencadearia uma paixão tão alucinada quanto a que os unira nas duas ocasiões em que haviam feito amor. Sim, ele era capaz de se comprometer seriamente com alguém, desde que essa pessoa fosse Tabby. Só precisava conseguir se convencer de que seus dias de conquistador iam ser deixados para trás.          

Ao terminar a primeira aula, Tabby encontrou Daniel esperando-a no corredor, cheio de novidades.

— Acabei de receber um telefonema do editor com quem conversei na semana passada.Eles estão interessados no nosso livro!

— Que notícia maravilhosa!

— Que tal se eu fosse à sua casa hoje à tarde para trabalharmos nos três últimos capítulos?

— Está bem — concordou Tabby, depois de certa hesitação. — Apareça por volta das cinco horas. Farei algo leve para o jantar.

— Como nos velhos tempos, querida...

Mais tarde, enquanto se preparava para ir embora, depois de terminar as várias aulas do dia, Tabby recebeu a visita do dr. Flannery, que parecia francamente sem jeito.

— Meu programa de pesquisa foi desativado, e Pal será mandado para o zoológico — anunciou ele. — Acho que começarei a estudar o comportamento dos iguanas, a partir da semana que vem.

— Eles mordem? — Tabby perguntou, pensando nos répteis que lembravam animais pré-históricos.

— Não, dra. Harvey, os iguanas são vegetarianos. E com certeza são incapazes de destrancar portas.

Os dois riram da brincadeira e se despediram com um caloroso aperto de mãos.

 

O jantar transcorreu na mais perfeita calma, como nos velhos tempos. Depois de ajudá-la com a louça, Daniel tirou a jaqueta, os sapatos, e esparramou-se no tapete da sala com um maço de papeis nas mãos. Usando um conjunto amarelo de short e miniblusa, Tabby estava simplesmente adorável.

— Você está linda hoje, — elogiou Daniel, fitando-a por um longo instante. — Não sei como dizer, mas nos últimos dias mal a tenho reconhecido... Está muito mais feminina.

Tabby enrubesceu, sabendo que estava diferente por causa do que acontecera entre ela e Nick. Fora ele quem a transformara em mulher.

— Obrigada, Daniel.

— Tem certeza de que não quer reatar o noivado? — indagou, aproximando-se devagar. — Acho que seria delicioso me casar com você, Tabitha. Nunca a vi tão linda...

Daniel tentou beijá-la nos lábios. Tabby o empurrou com delicadeza, sem perceber que para o homem que acabara de entrar sem bater, a cena passava uma impressão bastante romântica.

Furioso o rosto másculo transformado numa máscara de ódio, Nick parecia ainda mais alto e dominador do que nunca.

— Sua mulher à toa! — acusou ele, num tom baixo e vibrante. — Imagino que você e Daniel tenham reatado o noivado.

—Nick, por favor — Tabby murmurou, corando até a raiz dos cabelos.

— Oh, não tem importância. Afinal você sempre soube que relações permanentes nunca foram o meu forte.

— Sim, eu sei —ela falou num fio de voz, sentindo a última esperança se apagar.

— Foi divertido enquanto durou — Nick continuou, querendo revidar a dor que sentira ao encontrá-la nos braços de Daniel.

— Talvez o dr. Myers faça mais o seu tipo e não se importe em perder a liberdade. Desejo aos dois toda a felicidade do mundo.

— Espere um momento — Daniel interveio. — Não estou entendendo nada. Por que está sendo tão agressivo, Nick?

—Por quê? Simples! Eu sempre julguei Tabby uma mulher incapaz de passar dos braços de um homem para outro em menos de dois dias. Que ingênuo eu fui!

— Mas isso não é verdade! — ela gritou, compreendendo afinal que Nick estava morto de ciúmes. E ciúmes muitas vezes significava... amor! — Escute-me, Nick, por favor!

— Já ouvi mais do que o suficiente. Adeus, Tabby. Horrorizada com a idéia de estar deixando escapar sua única chance de ser feliz, ela saiu correndo, enquanto gritava desesperada:

— Nick, espere!

— Deixe-me em paz.

Os vizinhos começaram a surgir nas janelas e varandas, atraídos pelo som das vozes alteradas. Aparentemente a reservada dra. Harvey estava correndo atrás de um homem. Que espetáculo inédito!

— Nick, eu te amo!

— Não. Você ama aquele sujeito engomadinho e me usou apenas para fazer sexo!

— Como ousa dizer uma coisa dessas? — Tabby gritou, horrorizada pelo fato de os vizinhos estarem presenciando uma discussão tão íntima. — Como ousa dizer esse absurdo em público?

— Volte para aquele cabeça oca lá dentro e veja se ele consegue fazê-la gemer de prazer como eu fiz!

— Nunca irei perdoá-lo por essa humilhação! — ela murmurou, cobrindo o rosto com as mãos.

— Por que eu arruinei sua reputação imaculada? E esse o prêmio por seduzir homens inocentes e depois trocá-los por outros!

— Eu não o seduzi!

— Besteira.

— Por favor, me escute.

— Claro. Da mesma maneira que você me ouviu ontem à noite — ele finalizou entrando em casa e fechando a porta com força.

Tabby hesitou por um segundo e então bateu na porta várias vezes. Sem obter resposta, chamou por ele até ficar rouca. Ainda assim não foi atendida. Desesperada, começou a gritar:

— Maldito seja, Nick Reed! Eu não me casaria com você nem que fosse o último homem sobre a terra!

— Eu não sou do tipo que se casa com mulheres volúveis! — ele respondeu abrindo a janela. — Sua traiçoeira!

— Olhe quem está falando! O playboy metido a conquistador!

— Pelo menos eu já encerrei essa fase da minha vida, mas você está apenas começando! Vá, case-se com seu escritor de meia tigela. Eu não a quero!

— Mas você me queria.

— Apenas por uma noite — Nick falou friamente, observando-a corar de vergonha e humilhação. — Foi bom, mas já tive melhor. Vá para casa!

Ele fechou a janela com força, fazendo-a perder por completo a cabeça. Tabby praguejou como nunca o fizera cm toda sua vida, xingando-o de todos os nomes que conseguia se lembrar em inglês e em outras duas línguas. Finalmente, rouca c exausta, voltou para casa.

— Eu... Acho que seria melhor não trabalharmos mais no livro, por hoje — Daniel falou sem jeito.

— Sim — ela respondeu, percebendo que sua explosão intimidara o colega. — Desculpe tê-lo feito vir ate aqui à toa.

— Pelo menos não preciso mais perguntar o que você sente por Nick Reed. Desejo-lhe sorte, Tabitha, já que pelo visto não tenho a menor chance de conquistá-la.

— Sinto muito, Daniel.

— De qualquer forma será um prazer trabalharmos junto. E eu que a considerava uma mulher fria...

— Boa noite. Já está ficando tarde.

— Boa noite, Tabby. Ligo para você amanhã.

Era incrível como não sentia vergonha nem remorso pela cena armada lá fora, ela pensou ao ver-se sozinha. Nick a tinha transformado numa mulher diferente, e não necessariamente melhor. Mais tarde, talvez, pudesse experimentar algum sentimento de culpa pelo espetáculo proporcionado aos vizinhos, porem no momento estava vazia de qualquer sentimento, a não ser uma mistura efervescente de amor e ódio. Depois de ligar dezenas de vezes para a casa de Nick e não ser atendida, Tabby desistiu e foi para cama. Amanhã tentaria outra vez. Se ele, um homem tão controlado, fora capaz de agir com tamanho ardor e desatino, era porque ainda havia esperança para os dois. Talvez Nick ainda não quisesse admitir isso por pura teimosia, mas o dia de começarem uma família não devia estar muito longe.

 

No dia seguinte Tabby voltou a ligar para a casa de Nick antes de sair para a universidade, porem ninguém atendeu. Com certeza ele ainda estava emburrado, pensou desanimada.

A manhã pareceu se arrastar e a única coisa que lhe trouxe ânimo foi ter sido chamada ao escritório do reitor para um pedido de desculpas oficial.

— Eu sei que você sempre acreditou na minha inocência, mesmo quando todas as evidências apontavam contra mim. Sei também que meu afastamento temporário foi necessário para proteger o nome da universidade.

—Havia outros suspeitos e devo admitir que dois deles estavam no topo da minha lista. Felizmente o ladrão não passava de uma criatura pequena e cabeluda!

— Graças a Deus tudo terminou. Então continuo no meu cargo?

— Claro que sim! Você é uma de nossos melhores profissionais e não gostaria de perdê-la por nada.

— Adoro o que faço e durante o tempo em que estivesse afastada pude perceber o quanto esta universidade significa para mim.

—É nos momentos de crise que damos valor ao que temos.

Os dois se despediram com um caloroso aperto de mãos e Tabby tomou o rumo de casa, pensando nos acontecimentos do dia anterior. Nick tinha agido de um modo muito estranho e sua ingenuidade não a deixara perceber o quanto ele estava emocionalmente envolvido. Mas talvez conseguisse consertar a situação se pudesse encontrá-lo outra vez.

Ao chegar do trabalho Tabby correu à casa vizinha. Encontrou tudo fechado, às escuras. Não havia sinal do carro alugado na garagem. Nick tinha ido embora, sem nem mesmo dizer adeus ou deixar um bilhete de despedida. Estava tudo acabado. E com certeza não haveria volta.

Sentindo-se deprimida e humilhada, ela voltou para casa e tentou distrair-se corrigindo algumas provas, mas a dor da alma era tão grande que não conseguia se concentrar em nada. Os olhos inchados e vermelhos já não tinham mais lágrimas e sua consciência continuava a culpá-la por ter se entregado a um homem incapaz de amar. O envolvimento dos dois não passara de um caso rápido e ela seria lembrada apenas como uma conquista a mais, uma mulher sem rosto e sem importância.

Os dias foram se tornando cada vez mais longos e sem sentido, o trabalho foi perdendo o encanto, o entusiasmo pela vida diminuindo. Tabby parecia quase uma sombra, pálida e silenciosa. Se Nick a amasse de verdade, teria voltado a procurá-la. Ele simplesmente não a queria e o melhor era aprender a viver com essa dor.

Um único acontecimento lhe trouxe alívio: sete dias depois da partida de Nick, teve certeza absoluta de não estar grávida. É claro que queria ter filhos, mas não fora dos laços do casamento.

 

Ao perceber o estado de confusão emocional de seu amigo e sócio, Lassiter achou que o trabalho seria a melhor solução para fazê-lo voltar ao normal. Foi assim que, tão logo chegou a Houston, Nick se viu envolvido num caso atrás do outro.

Entretanto não conseguia se esquecer de Tabby um minuto sequer. Por que agira como um idiota cabeça dura, recusando-se a ouvi-la? A verdade era que não suportara vê-la nos braços de Daniel e agira como um marido traído. Passada a raiva, sentia-se mais preocupado do que nunca. E se ela estivesse grávida? E se tomasse uma atitude desesperada, não suportando ter sido seduzida e abandonada? Talvez Helen pudesse lhe dar alguma informação. Afinal, as duas eram amigas há anos!

— Não. Não tenho falado com Tabby ultimamente — respondeu Helen, quando o irmão a questionou.  

— Pensei que ela tivesse telefonado para dizer como as coisas estão indo — Nick resmungou, sem graça.

— Por que você mesmo não telefona para ela, já que está tão curioso?                                                                    

— Estou sem tempo. Tenho outro caso para resolver fora da cidade.

— Tolice, um telefonema não leva mais do que cinco minutos.

— Esqueça.

Helen observou o irmão sair da sala com renovado interesse.

Embora Tabby o estivesse preocupando ele recusava-se a telefonar para ela. Porque?

Naquela mesma noite Helen resolveu tirar o caso a limpo, ligando para a amiga.

— Gomo vai você? — indagou, sem preâmbulos. —Nick não me diz claramente, mas está apreensivo por sua causa.

— Estou bem. Se ele perguntar, diga-lhe que não há motivo para preocupação e que não precisa gastar seu precioso tempo pensando no que possa estar acontecendo comigo — respondeu Tabby.

— E como vai Daniel?

— Continua trabalhando no livro comigo, mas desistiu do noivado ao descobrir que tenho um temperamento forte. Não tem importância, pois descobri que odeio os homens!

— Você rompeu o noivado?

— Sim. Daniel é uma boa pessoa e merece mais do que posso dar a ele.

— Você está me parecendo diferente — Helen murmurou, preocupada.

— E talvez esteja mesmo. Enfrentei dias difíceis e aprendi algumas lições de maneira bastante dolorosa.

— Algo a ver com Nick?

— Sim. Finalmente me convenci de que ele jamais irá me amar. —Tabby riu com amargura. — Seu irmão foi embora daqui sem se dar ao trabalho de me dizer ate logo.

— Sinto muito — Helen falou com sinceridade. — Ele tem andado diferente desde que voltou para Houston, e eu tinha esperanças de que fosse por sua causa.

— Não existe a menor possibilidade disso, pois seu irmão não quer me ver nem pintada. Pensando bem, foi melhor assim. Não sei se seria feliz ao lado de um homem incapaz de se contentar com uma só mulher.

— Ele não tem saído com ninguém desde a festa de reveillon, Tabby. Não é estranho?

Embora sentisse o coração bater mais forte, Tabby se recusou a pensar no significado daquela revelação. Já tinha sofrido demais por amor.

— Nick nem mesmo tem falado sobre a vontade de mudar de emprego — continuou Helen.

— Talvez porque já tenha se decidido a trabalhar com o pessoal da alfândega — sugeriu Tabby.

— Engraçado, mas ele não mencionou nada disso.

—Provavelmente vai lhe contar em breve. Bem, preciso desligar agora. Tenho uma pilha de provas para corrigir.

— Ligue quando puder, ok? Seu bem-estar me preocupa.

— Eu também me preocupo com você, Helen. Mesmo que não tenhamos o mesmo sangue, eu a considero minha irmã.

— O sentimento é recíproco. E... É uma pena que Nick seja incapaz de enxergar um palmo à frente do nariz.

— Além de cego, ele também gosta de se fingir de surdo. Mas deixa para lá, não daria certo mesmo. Não sou do tipo inconseqüente, para quem o amor não passa de sexo.

— Entendo.

— Se o seu irmão se der ao trabalho de perguntar por mim, diga-lhe apenas que não há motivo para preocupação.

— Darei o recado. Cuide-se, menina.

— Você também.

 

Helen desligou o telefone certa de que alguma coisa séria havia acontecido. Nick teria de lhe contar o que era, já que Tabby se recusara a fazê-lo. Infelizmente, porém, ele estava fora da cidade, portanto ela só poderia satisfazer sua curiosidade no dia seguinte.

Nesse meio tempo Harold a procurou e lhe propôs casamento imediato. Ele precisaria passar um ano na América do Sul, supervisionando um dos investimentos da empresa do pai, e não queria ir sozinho. Helen aceitou o pedido sem hesitar e procurou Tess Lassiter, a esposa do chefe, para explicar a situação.

— Detesto a idéia de deixar a agência de uma hora para outra, Tess, mas amo Harold e quero acompanhá-lo. Precisamos nos casar logo, pois deixaremos o país dentro de dez dias.  

— Vai ser difícil encontrar alguém para substituí-la, mas entendo muito bem a sua decisão. O amor vem em primeiro lugar. Não se preocupe, daremos um jeito.

A solução para o problema surgiu horas depois, quando Kit Morris entrou na sala de Tess aos prantos.

— Ele me despediu — murmurou a jovem, abraçando a amiga.

— Logan Deverell, seu chefe, a despediu? Mas você trabalhava para ele há três anos!

— Tudo aconteceu porque aquele insensível arrumou uma nova namorada que não me suporta. Durante uma discussão, ela jogou uma xícara de café quente em mim e Logan ainda disse que a culpada era eu! Aos berros, me mandou sair e nunca mais voltar.

Tess estava horrorizada com a história. Kit sempre desempenhara suas funções de secretária com extremo profissionalismo, inclusive fazendo horas extras sem nenhuma recompensa; E agora Logan a despedia por causa de uma mulher sem educação. Inacreditável!

— O que vou fazer agora? — choramingou Kit. — Meu aluguel vence em poucos dias, ainda não acabei de pagar o carro, e aquele cretino não disse uma só palavra sobre o pagamento do aviso prévio.

   Oh, Deus!

— Kit, você alguma vez já pensou em trabalhar numa agência de detetives? — indagou Tess.

 

Nick finalmente estava voltando para casa depois de perseguir um ladrão até San Francisco e vê-lo morrer esmagado sob as rodas de um bonde. O fato de presenciar a morte estúpida de alguém tão jovem o tinha abalado de maneira profunda, fazendo-o pensar na própria mortalidade. Se ele morresse hoje, faria falta apenas a Helen. Não tinha esposa, não tinha filhos, não tinha ninguém a quem amar... Exceto Tabby. Ela quisera amá-lo, porém ele tivera medo de se comprometer. Mas agora tudo parecia diferente. A vida não tinha sentido sem amor.

Bastava de esconder a verdade de si mesmo: jamais seria feliz sem Tabby. Desde que a possuíra nunca mais desejara outra mulher, e a solidão passara a pesar em seu coração.

Como pudera ser tão idiota a ponto de deixar Tabby, de tratá-la daquela maneira insensível quando bem no íntimo sabia que a amava? Ê se ela já tivesse se casado com Daniel? E se a tivesse perdido para sempre?

Ao chegar em Houston, Nick foi direto do aeroporto para o escritório, e depois de falar com Dane saiu à procura da irmã.

— Será que você não entendeu? — Helen perguntou irritada, quando percebeu que Nick a ouvia sem prestar muita atenção. — Vou me casar com Harold e passar um ano morando na América do Sul. Talvez na floresta amazônica, no meio de pigmeus.

— Pigmeus vivem na África — ele respondeu, distraído. — Nick, o que o está perturbando, afinal?

— Você conversou com Tabby?

— Sim. Por quê?

— Ela está bem?

— Me pareceu um pouco estranha.

— Deprimida? Com tendências suicidas, talvez?

— Claro que não! Na verdade se mostrou mais madura e independente que nunca.

— Helen... Será que ela está grávida?

— Ah... Então é isso.

— Ela teria lhe contado se estivesse, não é mesmo? — Nick indagou, embaraçado, sem conseguir sustentar o olhar da irmã.

— Tabby não está grávida — ela falou depois de um longo momento de silêncio.

— Por que você não disse logo?

— Por quê? Na verdade minha amiga não me contou nada e falou a seu respeito como se o odiasse. Pediu apenas para lhe dizer que não havia motivo para preocupação. Depois dessa nossa conversa, foi fácil deduzir.

— Por favor, vamos parar por aqui.

— Você pretende se casar com ela? — Helen insistiu. — Sair por aí seduzindo garotas ingênuas nunca fez o seu gênero.

— Eu sei. Acredite, não planejei nada, as coisas simplesmente aconteceram. E Tabby nunca mais confiará em mim, pois consegui estragar tudo.

— Por que não vai a Washington procurá-la?

— Foi por seguir seu conselho, indo descansar alguns dias naquela cidade, que me meti nessa confusão!

— Tabby te ama, e o amor não morre de uma hora para outra, por causa de uma discussão boba.

— Será? Talvez ela sentisse apenas entusiasmo por mim, nada mais.

— Duvido. Tente conversar com...

— Onde diabo você meteu minha secretária? — indagou um homem enfurecido, entrando de repente na sala.

— Se você está se referindo a Kit — Helen respondeu, encarando o recém-chegado com frieza — ela saiu com Tess e Dane.

— Saiu para fazer o quê?

— Para almoçar, imagino.

— Pois saiba que aquela ingrata escondeu minha agenda e alterou todos os arquivos do microcomputador antes de sair. Basta eu digitar uma tecla qualquer para o monitor ficar em branco. Quando encontrá-la de novo, sou capaz de matá-la!

— Acho que posso ajudá-lo com o computador, sr. Deverell. Quanto a Kit, ela estará de volta às quatorze horas.

— Aqui? Por quê?

— Dane Lassiter acabou de contratá-la.

Logan Deverell abriu a boca, mas foi incapaz de emitir qualquer som, tamanha sua surpresa. Espumando de raiva, saiu da sala. Helen o seguiu em silêncio, lutando para esconder a satisfação. Sabia que na verdade não havia problema algum com o computador, o sr. Deverell é que não sabia como usá-lo.

Nick voltou para seu apartamento e fumou um cigarro atrás do outro, até que um violento acesso de tosse o fez jogar o resto do maço no lixo. Inquieto, andou de um lado para outro centenas de vezes antes de, finalmente, decidir ligar para Washington.

Tabby tinha acabado de chegar em casa quando o telefone tocou. Com certeza devia ser Daniel, interessado nos detalhes dos últimos capítulos do livro.

— Alô — atendeu, desanimada.

O som da voz suave fez o coração de Nick disparar no mesmo instante.

— Oi Tabby. Por favor, não desligue. Telefonei apenas para saber notícias.

— A respeito de quê? — ela indagou friamente, reconhecendo a voz de Nick.

— Diga-me, você está esperando um filho meu?

— Não, não estou. Pedi a Helen que lhe dissesse...

— Ela me deu o recado.

— Então por que esse telefonema?

— Para ter certeza absoluta. Como vai você? — perguntou ele com delicadeza.

—Muito bem, obrigada.

— Quer saber como tenho passado?

— Não tenho o menor interesse.

— Que tal você vir a Houston?

— Para quê?

— Dar um toque feminino no meu apartamento, É tudo tão vazio aqui, a decoração é tão triste.

— Talvez eu devesse cavar um fosso no meio da sua sala e enchê-lo de crocodilos.

   — Tabby, entendo a sua mágoa, pois admito que tenho agido como um verdadeiro idiota. Naquele último dia em que nos vimos me senti traído, embora tivesse lhe dado todos os motivos para se afastar de mim. Eu vim embora, mas não consegui parar de pensar em você.

— Não é preciso se sentir ameaçado por mim — ela falou num murmúrio.

— Fecho os olhos e vejo você, Tabby. Seu gosto ainda está na minha boca.

— O meu e o de todas as mulheres do país, imagino.

— Desde que a possuí nunca mais desejei mulher alguma, e duvido de que volte a desejar.

— Não vai dar certo, Nick — Tabby obrigou-se a dizer. — Eu não o quero. Vou me casar com Daniel.

— Não foi isso que Helen me contou.

— Oh, aquela fofoqueira! Juro que nunca mais conto nada a ela.

— Pegue um avião e venha para cá. Venha viver comigo, Tabby.

   Oh, Deus, ela pensou, a proposta era tentadora. Mas morar com um homem nunca fora seu ideal. Sempre sonhara em casar-se de véu e grinalda, ter filhos, formar uma família. E Nick estava lhe oferecendo apenas um caso.

— Não... Não posso fazer isso.

— Mas por que?

— Não daria certo. Não sou o tipo capaz de viver um caso amoroso sem pensar no amanhã.

— Caso?

— Preciso desligar agora — ela mentiu —, a campainha está tocando. Adeus.

Desesperada, Tabby atirou-se no sofá e chorou até sentir-se exausta. Por que Nick decidira atormentá-la daquela maneira? Por mais que o amasse não poderia aceitar uma situação que ia contra seus princípios morais.

Nick fitou o telefone mudo tentando entender o que acontecera. Por que será que Tabby mencionara a palavra "caso"? Afinal, tinha apenas lhe proposto que morassem juntos e...

Meu Deus, que estupidez a minha, ele pensou, dando um tapa na testa. Como Tabby poderia adivinhar suas intenções quando se esquecera de mencionar casamento? É claro que sua proposta de dividirem o mesmo teto incluía cerimônia civil e religiosa para oficializar a união!

Ansioso para desfazer o mal entendido, ele voltou a ligar para Tabby dezenas de vezes, mas só dava ocupado. Com certeza o fone fora tirado propositalmente do gancho. Agora, só havia uma maneira de resolver o problema.

Na manhã seguinte Nick tomou o primeiro avião para Washington.

— Boa sorte! —disse Helen, que o acompanhara ao aeroporto.

—Obrigado. Com certeza irei precisar.

Tomara que Nick consiga convencer Tabby de sua sinceridade, pensou Helen, ao ver o irmão afastar-se rumo ao portão de embarque. Seria uma pena se já fosse tarde demais.

 

Ao chegar ao aeroporto de Washington, Nick alugou um carro e tomou o caminho que seu coração escolhera. Como era sábado, Tabby não tinha aulas na universidade, portanto deveria estar em casa. Nick Só esperava que Daniel não estivesse por perto. A conversa particular que precisava ter com Tabby dispensava a presença de terceiros, especialmente depois do vexame que haviam dado na frente dos vizinhos.

Não ia ser nada fácil reconquistar a confiança de Tabby depois de tê-la magoado tanto. Ele pusera sua própria liberdade e independência acima dos sentimentos, e agora rezava para não ter perdido sua única chance de ser feliz.

Nick estacionou o carro diante da casa de Tabby e permaneceu imóvel durante vários minutos, armando-se de coragem para enfrentá-la. Lentamente caminhou até a porta da frente, mas num impulso resolveu usar a entrada lateral.

Deitada numa espreguiçadeira no meio do pequeno pátio, Tabby tomava banho de sol vestindo um minúsculo maio azul. A visão daquele corpo perfeito quase deixou Nick louco de ansiedade e desejo.

Confiante de que o elemento surpresa agiria em seu favor, ele aproximou-se por detrás e deitou-se sobre Tabby num movimento repentino, enquanto perguntava baixinho:

— Adivinha quem é?

— Nick! — Tabby exclamou, abrindo os olhos e tentando se levantar.

Com infinita ternura, ele começou a beijá-la na boca, pressionando-a gentilmente contra a espreguiçadeira, suas pernas se entrelaçando nas dela.

— Estamos em plena luz do dia — ela murmurou, sabendo-se indefesa diante da força de suas próprias emoções.

Sentira tantas saudades de Nick que nada mais importava a não ser senti-lo junto de si.

— Será que eu já lhe disse como é linda? — Nick indagou, em tom suave. — Por favor, querida, me abrace forte. Meu corpo dói de tanto desejo.

— Os vizinhos...

— Eles devem estar assistindo tevê... Isso, me abrace, assim... É delicioso, não é mesmo?

— Nick, por favor, pare! — Tabby gemeu, tentando manter um resto de orgulho. — Oh, por que você voltou? Logo agora que eu estava começando a esquecê-lo!

— Não, não estava. Da mesma maneira que também não consegui esquecê-la. Estamos presos um ao outro, de maneira absoluta e irreversível. Sua ausência me deixa louco.

— Mas você queria apenas que morássemos juntos!

— Sim. Pelo resto de nossas vidas. Quero me casar com você, Tabby.

— Então por que foi embora, por que se recusou até mesmo a atender meus telefonemas? — perguntou ela, ao mesmo tempo confusa e feliz.

— Você também não quis atender meus telefonemas ontem à noite. Precisei viajar milhares de quilômetros para ter a chance de ser ouvido. Confesso que um sentimento tão forte me causou um certo medo a princípio, mas bastou vê-la nos braços do tolo do Daniel para ter certeza de que a queria acima de tudo.

— Não houve nada entre mim e Daniel. Ele apenas queria me beijar e eu o estava empurrando.

— Realmente quem poderia culpá-lo por querer beijá-la? Mas você pertence a mim — Nick falou num tom possessivo. — Fui seu primeiro e único homem. Quero ser o último também.

— Não há ninguém mais conservador do que um solteirão apaixonado — Tabby respondeu rindo.

— Solteirões costumamos nos transformar em ótimos maridos e pais de família. Case comigo e descubra por si mesma. A idéia de ter filhos com você é excitante, me faz ver o futuro com outros olhos. Que tal tentarmos fazer um bebê agora mesmo?

— Melhor não — ela sussurrou, apontando disfarçadamente para um vizinho que os observava da janela.

Nick fitou o desconhecido com tanta dureza que o homem resolveu entrar na mesma hora.

— Não gostei do jeito como ele a estava olhando — resmungou em seguida.

— Não seja ciumento — Tabby riu, deliciada.

— Não consigo controlar os ciúmes. Você é minha. Depois da festa de reveillon bem que tentei manter distância, mas meus esforços não valeram nada. O que aconteceu naquele dia, no parque, foi inevitável, e a noite que passamos juntos cm minha casa foi a mais bela de toda a minha vida.

— Mesmo assim você foi embora.

— Não tive outra escolha. Senti tanto ciúme de Daniel que perdi completamente a cabeça. Eu já sabia que não era apenas atração física o que me prendia a você e a intensidade do sentimento me assustou. Ao mesmo tempo em que desejava um relacionamento duradouro, tinha medo de me comprometer. Agora já não existem dúvidas.

— Você não é obrigado a assumir um compromisso. Não estou grávida...

— Sim, eu sei. Quero muito ter filhos, mas acho que eles devem vir no momento esperado e não acidentalmente.

— Você tem razão. Essa é uma decisão do casal.

— E não devem ser concebidos fora do casamento — Nick murmurou, beijando-a no rosto.

— Não. Crianças precisam da presença do pai e da mãe.

— Então acho melhor nos casarmos logo, pois estou ansioso para começar uma família. Gosto demais de você, querida...

Gostar não é amar mas já é um começo, Tabby pensou abraçando-o com força. Nick tinha aberto mão da própria liberdade para tê-la, e ela estava disposta a correr qualquer risco a enfrentar uma vida vazia, sem o homem a quem amava.

— Talvez algum dia você se arrependa de ter se casado comigo.

— Casamento é aquilo que fazemos dele. O nosso será perfeito — Nick respondeu com ternura.

— Imagino que sim.

— O fato de deixar a universidade e se mudar para Houston a preocupa?

— Ainda não pensei no assunto — ela respondeu, sabendo como seria difícil abrir mão de anos de dedicação profissional.

— Posso perceber que a mudança de cidade não a entusiasma muito. Para ser sincero, quando um pouco cansado de Houston e gostaria de voltar para Washington. Também estarei próximo ao FBI

— Não, não pretendo voltar a trabalhar lá — ele apressou-se a dizer, ao notar o olhar assustado de Tabby. — Não quero vê-la aflita e ansiosa o tempo inteiro. Prefiro continuar sendo detetive particular.

— Eu jamais lhe pediria para abandonar um trabalho que lhe desse satisfação. Eu te amo — ela sussurrou cheia de emoção.

— Mesmo depois de eu tê-la magoado tanto?

— O amor não acaba tão facilmente, Nick, e sobrevive a quase tudo.

—Tenho sido um idiota, não é mesmo?

— Casamento é algo muito sério. Não sou adepta da filosofia do "se não der certo, separa".

— Tampouco eu. Quero ter filhos, quero uma família bem estruturada. Confie em mim, não tenho a menor intenção de traí-la.

— Não sou uma mulher sofisticada como aquelas com quem você costumava sair. Sou quieta e reservada.

— Temos muito em comum. Nunca fui dado a badalações.

— Tudo vai dar certo — Tabby falou um pouco ansiosa — Você não está se sentindo forçado a assumir um compromisso que não deseja, não é mesmo?              

— Quero passar cada noite da minha vida em seus braços, quero acordar cada manhã ao seu lado. Isso lhe dá a impressão de que estou agindo contra minha própria vontade?

— Acho que não.

— Quero você mais do que tudo no mundo.

— Então não se trata apenas de desejo?

Nick beijou-a com paixão antes tomá-la nos braços e levá-la para dentro de casa, sem realmente responder a pergunta.

— Será que você podia fazer um café para nós? Vim direto do aeroporto e gostaria de tomar algo quente.

— Claro — Tabby retrucou indo para a cozinha e sentindo-se pisar nas nuvens.

— Solte os cabelos — ele pediu, fitando-a com um sorriso sedutor. — Adoro seus cabelos soltos e sempre achei que você os prendia naquele coque apenas para me torturar.

— Talvez seja verdade.

— Porem na noite em que a vi sendo beijada por Daniel, seus cabelos estavam soltos.

— Não foi nada intencional.

— Oh, Tabby, senti tanta saudade de você! — Nick murmurou abraçando-a sensualmente. — Eu pensei que odiaria me sentir preso a alguém, mas não posso suportar a solidão, a idéia de não tê-la ao meu lado. Dividir o mesmo teto com uma pessoa deve ser estranho a princípio, entretanto a vontade de acertar torna tudo mais fácil.

— Nick, não sei se...

— Você me ama, e esse amor deve lhe dar a certeza de que seremos felizes. Sabe, estive pensando e acho melhor não fazermos amor antes do casamento. Eu agi mal com você, Tabby, e desta vez quero fazer a coisa da maneira certa.

— Hum... Nunca pensei que meu futuro marido fosse tão convencional — ela respondeu rindo.

— É difícil a gente esquecer totalmente os valores morais aprendidos na infância.

— Os valores são essenciais para a sobrevivência da sociedade. No meu trabalho é fácil constatar que a queda das grandes civilizações aconteceu por causa da decadência moral. As pessoas perdem o rumo e o caos é inevitável.

— Ainda bem que nossa civilização continua de pé e que você faz parte dela. É o mais importante: aceitou ser minha mulher. Agora me dê um beijo e vamos fazer alguns planos.

Nick tinha que voltar ao escritório dentro de dois dias e o casamento ficou marcado para o fim de semana seguinte, em Houston.

— Vou morrer de saudades — Tabby murmurou abraçando-o no saguão do aeroporto.

— Daqui a três dias estaremos juntos para sempre — ele respondeu cheio de paixão. — Mas antes tenho alguns casos para resolver, além de supervisionar o treinamento de Kit Morris, a garota contratada para assumir o lugar de Helcn.

— Ela é bonita?

— Na verdade, nunca reparei. Só sei que ela está atravessando uma fase difícil, pois é apaixonada pelo chefe e foi despedida. Quando a vi tão desesperada logo pensei no quanto fiz você sofrer, Tabby.

— Isso nunca mais acontecerá. Mas você não me pediu em casamento por que teve pena de mim, não é mesmo, Nick?

— Não, não foi por piedade. Eu te amo. Acho que sempre a amei. Satisfeita, agora?

— Oh, querido...

Tabby beijou-o com avidez, e Nick sentiu seu sexo reagir imediatamente à pressão daquele corpo sinuoso contra o seu.

— Por favor, pare — pediu com voz rouca. — Se continuarmos mais um pouco serei capaz de perder o vôo e o auto-controle.

— Que tal fazermos amor aqui mesmo? — ela sugeriu com um sorriso maroto.

— Preciso embarcar agora — disse Nick, erguendo estrategicamente a maleta na frente do corpo para disfarçar o volume de seu membro rijo. — Vejo você depois de amanhã.

— Vou esperá-lo com ansiedade. Até já comprei uma camisola preta, toda rendada...

— Meu Deus, não sei como vou agüentar esperar tanto tempo! Despediram-se com um beijo rápido e apaixonado. Tabby voltou para o carro pensando que jamais imaginara existir tanta felicidade no mundo.

 

Três dias mais tarde, Nick e Tabby tornaram-se marido e mulher numa cerimônia íntima e emocionante.

A pequena igreja, decorada com guirlandas de flores brancas, era o cenário ideal para a felicidade dos noivos e de seus convidados.                                                      

Tess e Dane, Helen e Harold, o pessoal todo da agencia, ninguém escondia a alegria. Ao final da recepção, Kit Morris, que parecia uma pouco abatida por causa de sua paixão não correspondida, despediu-se com carinho dos recém-casados:

— Tenho certeza de que ambos serão muito felizes. Nick é um homem especial e cuidará bem de você, Tabby.

— Obrigada — ela respondeu, sorrindo.

Tabby estava linda no vestido de noiva rendado e enfeitado com pequeninas pérolas. Na cabeça, trazia uma delicada grinalda que prendia o véu fino, vaporoso. Nick não se cansava de elogiá-la, dizendo-lhe que noiva alguma jamais fora tão bela.

— Vamos embora — ele murmurou baixinho. — Estou faminto.

— Quer uma fatia de bolo? — ofereceu Tabby.

— Tenho fome de algo muito mais doce que uma fatia de bolo. Será que você pode satisfazer esse meu desejo, querida?

— Não sei, mas tentarei com prazer — respondeu ela, enrubescendo.                                                                                

— Vamos, Tabby. Não vejo a hora de ficarmos a sós...

A lua de mel seria nas ilhas Cayman, mas para a noite de núpcias o casal reservara a suíte presidencial de um dos mais luxuosos hotéis de Houston. — Nossa bagagem ainda está lá embaixo, no porta-malas do carro! — Tabby exclamou ao vê-lo trancar a porta do quarto. — Precisamos mandar alguém pegá-la.

— Mais tarde — Nick respondeu, fitando-a apaixonadamente. — Não precisaremos de roupas tão cedo.

Ele a despiu sem pressa, sussurrando palavras de amor, acariciando a pele acetinada com extrema delicadeza, deixando-a arrepiada e lânguida. Segundos depois os dois estavam nus sobre a cama enorme, enlouquecidos na ânsia de possuírem um ao outro.

Quando Nick a penetrou, Tabby deixou escapar um gemido de satisfação e agarrou-se ao corpo másculo, cheia de desejo.

— Eu te amo como jamais pensei ser possível amar alguém. Preciso de você como do ar que respiro. Sinta a intensidade do meu amor — sussurrou Nick, com voz rouca.

Ele beijou-a com ardor e começou a mover os quadris, a princípio devagar, e depois as investidas foram tornando-se cada vez mais profundas e urgentes, arrastando Tabby ao abismo do prazer. Ela acompanhava o ritmo de Nick movendo-se com sensualidade e ousadia. Nada mais restava no mundo, a não ser o corpo forte de seu marido aplacando uma sede que parecia não ter fim...

Tabby tentou dizer alguma coisa, mas de seus lábios saíam apenas sons desconexos, gemidos entrecortados de paixão. Ao perceber o estado de excitação da esposa, Nick perdeu o controle por completo e aprofundou as investidas, como se quisesse possuí-la por inteiro, como se ainda não a sentisse suficientemente sua.

Suados e tensos, os dois beijaram-se e acariciaram-se, sôfregos, ate que o êxtase final atingiu seus corpos como uma onda violenta de prazer, deixando-o inertes e saciados.

— Pensei que ia morrer de excitação — Tabby conseguiu dizer vários minutos depois, acariciando o peito másculo do marido.

— É por isso que os franceses definem o orgasmo como uma pequena morte. Nunca imaginei que fazer sexo pudesse tocar minha alma também — disse ele, beijando-a de leve nas pálpebras. — Nunca experimentei uma sensação tão deliciosa e forte com ninguém, antes.

— Mas você é um homem experiente...

— Só que eu jamais tinha feito sexo com alguém a quem amava. Com você descobri algo diferente, mais espiritual que físico. Eu te amo. Você me ama. O que fizemos juntos foi a expressão de um sentimento intangível. Mesmo quando a possuí, ainda não me sentia próximo o suficiente de você.

— Eu sei. Também me senti assim.

— E esse é apenas o começo — Nick murmurou com um leve tremor na voz.

— Jamais o deixarei — Tabby respondeu, percebendo nele o medo de perdê-la. — Eu te amarei até a morte.                    

— Eu não conseguiria viver sem você. Preferiria morrer.

— Oh, querido, você não vai me perder! Nunca, nunca... Por favor, me ame outra vez.

Ela o beijou nos ombros, no peito, na boca, excitando-o com a urgência do próprio desejo. Louco de paixão, Nick a penetrou com tanto ímpeto que Tabby atingiu o clímax quase que no mesmo instante, o corpo sacudido por tremores intensos, deliciosos.

Gritando alto o nome da mulher amada, Nick também atingiu o orgasmo, e sua satisfação foi tão violenta que Tabby se assustou.

— Nick? Você está bem, meu amor?

— Eu tentei não me sentir assim — ele murmurou, ofegante. — Tentei não amar com tanta loucura. A força desse sentimento às vezes me amedronta.

— Sim. Eu sei. Também te amo demais, e pensei que ia morrer quando você foi embora.

— Eu te amo, Tabby. Sempre te amei, mas tinha medo porque sabia que ia me entregar de corpo e alma. E agora você me possui por inteiro.

—O que sentimos um pelo outro e recíproco, eterno. O amor verdadeiro é assim, Nick, nos vira pelo avesso, nos deixa muitas vezes inseguros, mas é a única coisa que realmente dá sentido a vida. Saber que sou amada com tanta paixão me deixa feliz, realizada como mulher.                                                              

— Você também fica à beira da inconsciência quando fazemos amor?— ele indagou baixinho, começando a relaxar.

— Claro! Será que ainda não percebeu o seu poder sobre mim? Nos seus braços esqueço de mim mesma e do resto do mundo. Afinal, amar só tem sentido quando a entrega é total.

— Por muito tempo tive medo de amar, mas com você aprendi que apenas o amor nos mantém vivos, querida.

Nick abraçou a esposa e fechou os olhos, sabendo-se comprometido para sempre. A sensação estava longe de ser desagradável, na verdade, dava-lhe uma paz que jamais julgara existir. Sentia-se mais livre que nunca agora que escolhera prender-se à mulher amada.

E nada iria separá-los, jamais.

 

                                                                                Diana Palmer  

 

 

Leia outros romances desta autora

 

 

A CAMINHO DO ALTAR

A FORÇA DO AMOR

A NOIVA CARRERA

A NOIVA DO REI

A PACIENTE

A TENTAÇÃO DO DESEJO

 

 

 

                      

O melhor da literatura para todos os gostos e idades

 

 

              Biblio"SEBO"